[Planos de Lula e FHC têm [muitíssimos] pontos em comum. Porém, de modo geral, durante o governo FHC/PSDB/PFL-DEM, a imprensa tratava o plano como moderno avanço democrático"...]
Propostas para direitos humanos editadas em 96 e 2002 e a atual coincidem em temas como mídia e reforma agrária
Maior mudança da política lulista é a proposta de criar comissão para investigar e mesmo punir envolvidos na repressão durante ditadura
"Quando observados de maneira detida, os três Programas Nacionais de Direitos Humanos até hoje publicados guardam semelhanças entre si. A grande mudança na versão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, divulgada em 21 de dezembro, é a política a respeito da busca de dados para eventualmente punir os envolvidos na repressão durante a ditadura militar (1964-1985).
Em vários aspectos o texto de Lula coincide com as duas versões anteriores, publicadas em 1996 e em 2002, durante o governo do tucano Fernando Henrique Cardoso.
É possível dizer que as políticas do PSDB e do PT trilharam a mesma estrada, caminhando para um discurso mais liberal no quesito costumes a cada documento.
O número de palavras usadas nos três programas mostra que a tendência era mesmo de aumentar a abrangência. Em 1996, foram necessárias 6.585 palavras. Apenas uma delas foi "homossexuais". O termo "gay" ainda era um tabu em documentos oficiais.
Em 2002, pulou-se para 22.947 palavras. O termo "gays", no plural, apareceu duas vezes. "Transexuais" está em três trechos. Já em 2009, foram 29.538 palavras -com a presença de "gays" em seis partes do documento. Transexuais surge em dez frases.
Antes, com FHC, falava-se de maneira mais contida. Agora, a linguagem é mais "desabrida", numa definição do advogado José Gregori, 76 anos, ex-ministro da Justiça de FHC e principal responsável pelo primeiro plano, de 1996.
Em alguns casos, a linguagem mais aberta traz, também, uma inflexão importante de política pública.
Tome-se o caso da descriminalização do aborto. Em 1996, nenhuma palavra. Em 2002, o assunto foi abordado. Propunha-se "considerar o aborto como tema de saúde pública", garantindo o "acesso aos serviços de saúde para os casos previstos em lei", mas revendo a legislação e alargando os casos de "prática do aborto legal".
O texto de Lula, que deve ser alterado nesse item, foi mais direto: "Apoiar a aprovação do projeto de lei que descriminaliza o aborto, considerando a autonomia das mulheres para decidir sobre seus corpos".
No caso do controle da mídia, um dos aspectos mais atacados pelos críticos do texto de Lula, o assunto já aparecia, com outras palavras, nos projetos do governo tucano.
Em 1996, de maneira comedida. A ideia era só "promover o mapeamento dos programas radiofônicos e televisivos" que estimulassem a apologia do crime, da violência, da tortura e das discriminações em geral, com o objetivo de "identificar responsáveis e adotar as medidas legais pertinentes".
Evoluiu-se em 2002 para "apoiar (...) o controle democrático das concessões de rádio e televisão" e também "regulamentar o uso dos meios de comunicação social" para "coibir práticas contrárias aos direitos humanos". Para isso, propunha a "fiscalização da programação das emissoras de rádio e televisão, com vistas a assegurar o controle social sobre os meios de comunicação e a penalizar, na forma da lei, as empresas de telecomunicação que veicularem programação ou publicidade atentatória aos direitos humanos".
Em resumo, desde 2002 o plano já propunha enquadrar os meios de comunicação que não se adequassem aos ditames do governo nessa área. Agora, com o texto de 2009, o governo petista sistematizou como seria essa fiscalização.
Lula fala na criação de "ranking nacional de veículos de comunicação comprometidos com os princípios de direitos humanos". Rádios e TVs, concessões públicas, seriam avaliadas com base em um "marco legal" que estabeleceria "o respeito aos direitos humanos nos serviços de radiodifusão".
FHC também falava em punição, mas o assunto nunca saiu do papel. Sob Lula, se vingar a ideia, as emissoras também poderão receber "penalidades administrativas como advertência, multa, suspensão da programação e cassação [do direito de concessão], de acordo com a gravidade das violações praticadas".
Quando se trata de trabalhadores rurais sem terra, reforma agrária e invasões, Lula baixou um texto muito parecido com os editados por FHC.
Em 2002, o tucano queria "adotar medidas" para "coibir práticas de violência contra movimentos sociais que lutam pelo acesso à terra". Além disso, defendia uma lei regulando de maneira mais rígida a reintegração de posse de terras invadidas: condicionando a devolução da propriedade à comprovação de que havia ali "função social", sempre com o "obrigatória" intervenção do Ministério Público em todas as fases processuais.
O texto de Lula vai na mesma linha. Pede uma lei sobre reintegração de posse que garanta "a observância do respeito aos direitos humanos" e propõe a realização de audiências coletivas com os envolvidos.
Essas propostas de Lula, como foram as de FHC, dependem de leis a serem aprovadas pelo Congresso. Nesse aspecto, o petista e o tucano são quase idênticos em seus planos. Lula cita a necessidade de uma "lei" ou "leis" 48 vezes. Em seu texto de 2002, FHC menciona esses termos 49 vezes."
FONTE: escrito por FERNANDO RODRIGUES, da Folha de São Paulo. Publicado hoje (12/01) [título e entre colchetes colocados por este blog].
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