segunda-feira, 4 de abril de 2011

“COZIDÃO” PARA CRIAR CONSTRANGIMENTO ENTRE MINISTROS DO STF


Por Luis Nassif

“Um dos princípios jornalísticos mais sagrados à velha mídia é o do gancho –ou seja, uma matéria sai quando tem algum fato novo que justifique sua publicação.

Com poucas novidades, trata-se de um “cozidão”. O lide da matéria [da revista “Época”, das organizações “Globo”] está no pé:

As provas reunidas pela PF constituem a última esperança do ministro Joaquim Barbosa e da Procuradoria-Geral para que o Supremo condene os réus do mensalão. Nos últimos anos, as opiniões dos ministros do STF sobre o processo modularam-se ao ambiente político –que, sob a liderança simbólica e moral do ex-presidente Lula, fizeram o caso entrar num período de hibernação. Alguns ministros, que em 2007 votaram por acatar a denúncia do Ministério Público, agora comentam reservadamente que as condenações dependem de “mais provas”. Hoje, portanto, o Supremo se dividiu. Não se sabe o desfecho do processo. Sabe-se apenas que, quanto mais tempo transcorrer, maior a chance de absolvição dos mensaleiros. Se isso acontecer, a previsão feita por Delúbio Soares, num passado não tão remoto, num país não tão distante, vai se materializar: o mensalão virará piada de salão. Será o retorno da ficção: era uma vez um país sério”.

É aí que a matéria se entrega. O que a matéria tem de novo não é relevante; o que tem de relevante, não é novo. E isso faz toda a diferença.

Segundo a revista, as informações constam do relatório adicional solicitado pelo Ministro Joaquim Barbosa à Polícia Federal.

Há que se conferir melhor, mas as informações novas são as seguintes:

1. O aparecimento de um filho de Marco Maciel na história.

2. A inclusão da filha de Joaquim Roriz.

3. A inclusão de Aécio Neves, em algo que não tem nenhum desdobramento maior: uma cota de patrocínio de um evento que existiu, aconteceu e foi pago. Um factóide.

Todos os demais fatos, anunciados bombasticamente pela “Época”, são antigos e provavelmente já constam do inquérito inicial, que serviu de base para instruir o relatório de Joaquim Barbosa. A saber:

1. O caso do segurança de Lula. Matéria de 2006, do Estadão.

2. Os assessores de Pimentel, demitidos por ele na época.

3. O financiamento da festa de posse de Lula e outras despesas de campanhas, admitidas publicamente por Delúbio Soares.

Ou seja, os fatos retumbantes são velhos; e os fatos novos são irrelevantes. Se todos os fatos relevantes já estavam no relatório de Joaquim Barbosa, qual a razão para o “cozidão”? O fato de, segundo o “Estadão”, a denúncia de Barbosa provavelmente ser rejeitada pelo STF, por inepta.

Dias atrás, o “Estadão” publicou matéria dizendo que o julgamento do “mensalão” não daria em nada. A matéria é do repórter Felipe Recondo, do dia 27 de março passado.

Sob o título “PRESSÕES NO STF CRIARAM ILUSÃO DE CONDENAÇÃO”, a matéria diz que na época a denúncia de Joaquim Barbosa foi aceita na íntegra, passando a impressão de que não tinha furo, devido à matéria do Globo, sobre a troca de mensagens entre os Ministros Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia. Ocorre que tinha muitos furos.

Diz a matéria do “Estadão”:

Quando essa suspeita foi divulgada, houve um clima de constrangimento. O julgamento ficou pasteurizado. De acordo com integrantes da Corte, nenhum ministro sentiu-se à vontade para discutir à exaustão cada ponto da denúncia. O melhor a fazer, disse ao Estado outro integrante do STF, era acelerar a conclusão do julgamento em favor da abertura da ação.
Nesse cenário, o relator do processo, ministro Joaquim Barbosa, teve o trabalho facilitado. A denúncia foi recebida praticamente na íntegra e criou a impressão de que a investigação não tinha furos. Hoje, ministros dizem que vários pontos do inquérito seriam derrubados facilmente se o julgamento tivesse transcorrido em clima de normalidade“.


Na outra retranca – “ÔNUS DE ABSOLVIÇÃO SERÁ MAIOR PARA BARBOSA» a matéria diz:

É unanimidade entre os ministros do Supremo que, dos 38 réus que serão julgados, poucos serão os condenados. Como responsável pela ação penal, o ônus de absolver figuras-chave do esquema do mensalão poderá recair, em última instância, sobre Joaquim Barbosa.

Quando o processo chegar ao fim, será preciso lembrar, por exemplo, que o Ministério Público, responsável por produzir as provas necessárias para a condenação, pode ter falhado. Ou que o Supremo Tribunal Federal tem como fundamento a abnegada proteção do indivíduo ante os Poderes –o que no jargão jurídico é definido como garantismo. Assim, exige provas cabais para condenar alguém e não aceita uma condenação mesmo que as evidências sejam claras. Ou, ainda, que a denúncia recebida em 2007 já podia esconder furos, mas que o STF preferiu não atacá-los naquele momento
“.

O que provavelmente aconteceu? Para requentar o tema, passaram-se algumas informações adicionais para “Época” que –seguindo o velho modelo de Veja– requentou o cozidão, procurando criar um fato novo. A intenção é criar novo constrangimento entre os ministros.

Leia, a seguir, nota do ministro Joaquim Barbosa, do STF, repudiando “escândalo” produzido pelo “Estadão”, na linha dos assassinatos de reputação produzidos diariamente pela mídia brasileira:

JOAQUIM BARBOSA E OS FABRICANTES DE ESCÂNDALOS

Nota do ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal (STF), repudiando “escândalo” produzido pelo Estadão, na linha dos assassinatos de reputação produzidos diariamente pela mídia brasileira:

“Em razão de notícias veiculadas nos últimos dias em órgãos de imprensa, tenho a esclarecer:

1) Sofro de dores crônicas nas regiões lombar e quadril há três anos e meio;

2) Por essa razão, desde fevereiro de 2008, vi-me forçado a licenciar-me, de início por períodos de uma a três semanas, para tratamentos que se revelaram insuficientes;

3) O mesmo problema de saúde levou-me, em novembro de 2009, a renunciar ao prestigioso posto de ministro do Tribunal Superior Eleitoral, do qual eu me tornaria naturalmente presidente este ano;

4) Em abril último, resolvi licenciar-me por período mais longo no intuito de resolver definitivamente o problema, permanecendo licenciado de 26/04/10 a 30/06/10, com duas interrupções em 13/05/10 e 16/06/10. No período de férias legais, no mês de julho, permaneci em tratamento na cidade de São Paulo e, no último dia 02 de agosto, seguindo orientação médica, requeri nova licença por 60 dias, que agora interrompi por uma semana para participar de julgamentos pautados no Supremo Tribunal Federal;

5) Os dados médicos e os procedimentos a que me submeti ao longo dos últimos três anos estão fartamente documentados no serviço médico do STF;

6) Estes são os fatos e, diante das notícias de caráter sensacionalista e fotografias de qualidade duvidosa publicadas nos últimos dias, externo meu repúdio aos aspirantes a papparazzi e fabricantes de escândalos que, sorrateiramente, invadiram minha privacidade em alguns poucos momentos de lazer, permitidos e até aconselhados pelos médicos que me assistem.

7) Por fim, em meio ao esforço redobrado para alcançar uma plena recuperação, reitero meu compromisso de cumprir com as atribuições constitucionais que me impõe o honroso exercício do cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal.

Brasília, 09 de agosto de 2010
Ministro Joaquim Barbosa
”.

FONTE: postagem do jornalista Luis Nassif em seu blog; transcrita no portal “Viomundo” (http://www.viomundo.com.br/politica/luis-nassif-para-entender-a-materia-da-epoca.html) [imagem do google adicionada por este blog]

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