sábado, 3 de dezembro de 2011
CELAC: SURGE INSTITUIÇÃO GEOPOLÍTICA INÉDITA
PRESIDENTES LATINO-AMERICANOS CRIAM NOVO BLOCO REGIONAL E DEIXAM EUA DE FORA
“Presidentes e representantes dos 33 países da América Latina se reuniram sexta-feira, em Caracas, para formalizar a criação da ‘Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos’ (CELAC).
Grupo enfrentará o desafio de implementar políticas independentes dos EUA.
Será a primeira vez que os países do continente se articulam em uma mesma plataforma política - com a tarefa de tentar aprofundar a integração regional - sem a presença dos Estados Unidos e do Canadá.
Segundo analistas, a CELAC nasce com o desafio de criar organização capaz de gerar consenso entre os países e cuja institucionalidade seja capaz de implementar políticas de integração, autônomas em relação aos Estados Unidos.
Entre as contradições a serem enfrentadas pelo bloco está a de construir políticas comuns em região ainda marcada por diferentes níveis de desenvolvimento econômico, pobreza, crime organizado e, em especial, antagonismos no campo político-ideológico.
O presidente venezuelano Hugo Chávez, conhecido pelas críticas ao governo de Washington [em resposta a indesejadas interferências norte-americanas], e pelo discurso anti-imperialista em encontros regionais, adotou tom moderado ao falar sobre a nova organização regional e reconheceu que ela deverá respeitar a heterogeneidade dos países e de seus projetos, estejam eles à esquerda ou à direita do campo político.
"Temos que ter muita paciência, muita sabedoria. Não podemos deixar-nos levar pelas ideologias governantes em um país ou outro", disse Chávez na última quinta-feira, minutos antes de receber a presidente Dilma Roussef no Palácio de governo.
"Este processo tem que ser independente do socialismo cubano, do socialismo venezuelano, ou do sistema de governo e ideologia do governo do Brasil, da Colômbia (...) [o importante] é a união política, geopolítica, e sobre essa união vamos construir um grande polo de poder do século 21." [...]
INSTITUCIONALIDADE
O maior desafio para a CELAC será "passar da afirmação de uma identidade e articulação política a uma institucionalidade que permita aos países tomar decisões", disse à “BBC Brasil” Luis Fernando Ayerbe, coordenador do “Instituto de Estudos Econômicos e Internacionais da UNESP”.
Uma das propostas do documento constitutivo da CELAC é um protocolo de defesa da democracia e direitos humanos, aos moldes da cláusula antigolpe de Estado estabelecida pela UNASUL (União de Nações Sul-Americanas).
Entre as divergências iniciais está a posição do novo bloco a respeito do futuro da “Organização de Estados Americanos” (OEA), cujo papel passou a ser questionado durante a crise boliviana, em 2008 e, depois, no golpe de Estado em Honduras, em 2009.
Venezuela, Equador e Bolívia defendem que a OEA já teria cumprido seu papel histórico no hemisfério e deve ser substituída.
"Não é possível que os conflitos latino-americanos tenham que ser tratados em Washington", defendeu o presidente equatoriano Rafael Correa, dias antes da Cúpula.
"(Espero) que mais cedo que tarde (A CELAC) possa substituir a OEA, que historicamente tem tido grandes distorções", acrescentou.
Essa posição, no entanto, ainda não é um consenso entre a maioria dos países da região, que até agora preferem defender a coexistência das duas instituições.
Para o analista internacional Edgardo Lander, professor da “Universidade Central da Venezuela”, a CELAC tende a contribuir para o enfraquecimento da OEA, mas ainda é cedo para falar de sua extinção.
"A substituição da OEA pela CELAC não será fruto de um decreto ou de declarações a favor ou contra, e sim pelas vias de fato", disse à “BBC Brasil”.
Lander cita, como exemplo, a atuação da UNASUL na resolução do conflito da Bolívia, em 2008, que ele considera 'decisiva'. "Se a CELAC mostrar que pode solucionar os conflitos regionais sem a intervenção dos Estados Unidos, o papel da OEA vai perder força naturalmente."
INDEPENDÊNCIA
Para o economista americano Mark Weisbrot, co-diretor do “Center for Economic and Policy Research”, de Washington, a CELAC é criada em momento em que a América Latina se consolida como região "mais independente do que nunca".
"Washington ainda é o principal problema no hemisfério, especialmente com respeito à democracia e à autodeterminação nacional", disse Weisbrot à BBC Brasil.
O analista político venezuelano Carlos Romero, professor de estudos internacionais da “Universidade Central da Venezuela”, diz que a criação da CELAC é "passo positivo que marca processo de maturidade política" da região.
No entanto, ele afirma que isso não necessariamente significará a existência de bloco antagônico a Washington. "Os EUA já não exercem a mesma tutela do passado", diz.
A discussão do grupo ainda deve incluir a criação de um fundo de reserva para enfrentar a crise financeira internacional.
"Quanto mais nos integrarmos, mais estaremos preparados para enfrentar esse furacão que a economia mundial está vivendo e a instabilidade do resto do planeta", afirmou o presidente colombiano Juan Manuel Santos, principal aliado dos Estados Unidos na América do Sul.
LIDERANÇA BRASILEIRA
Os especialistas concordam que o Brasil tende a assumir papel de "liderança natural" na CELAC, protagonismo que antes era dividido com o México quando se tratava do hemisfério como um todo.
"O Brasil é uma potência regional, tem sido (protagonista) pró-democracia e em defesa da independência regional na América Latina. Deve ajudar a desempenhar esse papel dentro CELAC", disse Mark Weisbrot.
O governo brasileiro vê a CELAC como o "terceiro anel" do processo de integração regional, seguido do MERCOSUL e da UNASUL.
A reunião de Cúpula para a abertura da CELAC havia sido marcada para 5 de julho, mas foi adiada imediatamente após o presidente venezuelano Hugo Chávez ser diagnosticado com câncer, no final de junho.
A CELAC unificará as estruturas do “Grupo do Rio”, mecanismo de consulta internacional regional criado em 1986, e da CALC (Comunidade América Latina e Caribe) e deve trabalhar em cinco áreas: política, energia, desenvolvimento social, ambiente e economia.”
FONTE: divulgado pela agência britânica de notícias BBC e transcrito no site “DefesaNet” (http://www.defesanet.com.br/geopolitica/noticia/3818/Presidentes-latino-americanos-criam-novo-bloco-regional-e-deixam-EUA-de-fora).
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