segunda-feira, 20 de outubro de 2008

POLÍTICA: CIÊNCIA OU FUTEBOL?

Li ontem no site “Carta Maior” o seguinte artigo do filósofo e cientista político Emir Sader:

Os resultados das eleições municipais e as conseqüências da crise econômica internacional são os dois novos fatores que compõem a conjuntura política que se abre no dia 27 de outubro, projetando-a para a sucessão presidencial.

Eleições são propícias para a proliferação de supostos “cientistas políticos”, disfarçando sua plumagem tucana sob a suposta aura “universitária”, quando são tratados como “professores” – da mesma forma que os jogadores de futebol tratam a todos os treinadores. Análise política é tão ciência quanto futebol. E os analistas todos, assim como os comentaristas esportivos, têm partido e clube.

Tentar fazer da análise política uma “ciência” é recair no positivismo mais grosseiro, que tentou, durante muito tempo, passar a idéia de que as verdades das ciências naturais poderiam ser reproduzidas nas ciências humanas, tentando esconder que os homens são objetos e não apenas sujeitos nestas últimas, impedindo radicalmente que a mesma objetividade e universalidade das primeiras se reproduza nas ciências humanas.

Se a política fosse ciência, ninguém melhor que FHC, que ganhou cátedra de política na USP, teria realizado um governo “cientifico”, objetivo, sem erro, imparcial.

Mesmo os que não sabiam naquele momento, podem se dar conta hoje que a percepção do povo brasileiro é de que foi “um governo para os ricos”. Se fosse ciência, a política poderia ter previsto que ele quebraria o Brasil três vezes, que provocaria uma prolongada recessão, que perderia as duas eleições presidenciais seguintes e que seria avaliado como o pior líder político atual no país.

No entanto, as páginas dos jornais, os noticiários de televisão, os comentários nos sites das grandes empresas do jornalismo privado, não deixam de abrir espaço para charlatães que fazem cara séria e emitem seus juízos pessoais como se fossem mais do que isso – seus juízos pessoais. Erram tanto quanto seus colegas analistas econômicos nos mesmos espaços, que não previram a maior crise capitalista em oito décadas, uma tragédia anunciada pelos críticos do neoliberalismo, que eles tomaram como doutrina sagrada. E os “cientistas políticos” deram o governo Lula como morte e sepultado. Já salivavam, pavlovianamente, com a volta dos seus partidos e a promiscuidade com as salas do poder a que sempre estiveram acostumados.

São os mesmos que, “objetivamente”, decretaram o fim das diferenças entre direita e esquerda. Mas como celebram o mercado como “o melhor alocador de recursos”, deveriam se dar conta que essa é uma visão central da direita, que naturaliza as desigualdades sociais, acredita que no mercado se define quem ganha e quem perde, que é melhor e quem é pior, atribuindo-lhe o poder de diferenciar as pessoas conforme o critério da competição no “livre mercado”. Por que será então que a esmagadora maioria dos filhos de pobres são pobres e a esmagadora maioria dos filhos de ricos são ricos”. Ou, nas palavras de Adib Jatene: “O problema de ser pobre é ter amigos pobres.” E, claro, os ricos, amigos ricos, que se multiplicam no poder ao longo dos tempos.

Ser de esquerda é privilegiar os direitos sobre o mercado, a esfera pública contra a esfera mercantil, é lutar contra a injustiça e a desigualdade como objetivo central da luta política, é dar conteúdo social e cultural à democracia política, é preferir a instabilidade para promover a justiça do que se conformar com a “ordem”, se ela é injusta.

O Brasil entra em um novo período de debate, que vai desembocar na eleição do novo presidente da República, como objetivo maior de 2010 e vai definir assim se terá continuidade e aprofundamento o governo que têm 80% de apoio (FHC, nesta altura dos seus mandatos, tinha 18%) e 8% de rejeição, apesar de ter toda a grande mídia privada contra, ou se romperá com ele. Ao invés da euforia de dirigentes tucanos, seus pré-candidatos já se anunciam não como anti-Lula, mas como pós-Lula, mostrando como acumulam o golpe.

No que mais falham esses “cientistas políticos” é na explicação da popularidade do governo Lula. Quem não decifra o enigma Lula – com tudo o que ele tem de contraditória -, termina deglutido por ele. O que é o caso desses analistas e dos colunistas políticos que ocupam a quase totalidade dos espaços da mídia nacional e só conseguem convencer a 8% da população de rejeitar ao governo. Deveriam perder o emprego, por incompetência. E entender que futebol e política têm algo em comum: não há imparcialidade. Eles escolheram seu lado, o povo escolheu o outro. Placar: 80 a 8”.

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