[O GOVERNO FHC/PSDB/DEM IMITAVA A IRLANDA...]
A IRLANDA E A AMNÉSIA NEOLIBERAL
A IRLANDA E A AMNÉSIA NEOLIBERAL: COMO O TIGRE CELTA VIROU UM HAITI FINANCEIRO
“Nos anos 80 e 90, a palavra ‘Irlanda’ era pronunciada com a reverência reservada aos quitutes finos nos banquetes neoliberais. O ‘ajuste irlandês’, iguaria produzida a partir de uma receita de cortes brutais nos gastos públicos, demissão em massa de funcionalismo e isenções maciças de impostos, era vendido nas praças de alimentação do mundo pobre como o cardápio da hora. A Irlanda era, por assim dizer, a garota do quarteirão do Consenso de Washingnton. Ombrear-se a ela era possível, mas exigiria uma aplicação de ferro, explicavam os os ventríloquos nativos que agora demonstram súbita amnésia em relação ao passado destaque é a bola da vez da derrocada européia. Recapitulemos então:
1. Em meados dos anos 80, a Irlanda adotou um ‘padrão perene’ de ajuste fiscal, cercado de salvas & vivas da ortodoxia mundial;
2. Um serviço à la carte foi providenciado na cozinha irlandesa para atender a freguesia do mercado: a anistia tributária veio junto com cortes de despesas e redução dos investimentos públicos em 1987;
3. 14 mil funcionários públicos foram demitidos ou aderiram a programas de demissão voluntária (isso numa população de 4 milhões de pessoas);
4. O ajuste iniciado em 87 veio para ficar. Até meados dos anos 2000, a Irlanda manteve-se fiel ao tripé da bíblia neoliberal: controle dos gastos públicos, teto no reajuste dos salários públicos [taxa máxima de 2,5% ao ano entre 1988 e 1990 ]e incentivos 'amigáveis' aos mercados [leia-se, desonerações e vale-tudo];
5. O arrocho no setor público produziu, naturalmente, uma redução substantiva da dívida interna derrubando a despesa com juros de modo a obter um permanente superávit fiscal [outro mantra dos neoliberais];
6. A supremacia dos mercados desregulados foi criando vertedouros subterrâneos que corroíam as bases econômicas do país. Mas o foguetório de superfície permanecia: ‘o Tigre Celta’ crescia a taxas chinesas com macroeconomia de paraíso fiscal [nenhuma empresa pagava imposto acima de 12,5%) Quer coisa melhor que isso? Era o prato da hora. E resquícios da sua receita, agora indigesta, ainda frequentam a agenda do grupo pró-mercados que participa da equipe de transição da presidente-eleita Dilma Rousseff;
7. O desfecho irlandês recomendaria maior prudência na transposição de seus fundamentos aos ares tropicais. Os números indicam que o banquete redundou em um atordoante desarranjo gastrointestinal que transformou o ‘Tigre Celta’ numa espécie de Haiti financeiro. A saber:
a) A economia irlandesa degringola desde a explosão da bolha financeira em 2008: o país acumula uma queda de apreciáveis 11,6% do PIB, taxa que o coloca algumas cabeças à frente do que se poderia chamar de recessão. Depressão talvez seja um termo mais apropriado para a convalescência de sangue, suor e lágrimas que pode durar até 15 anos;
b) A Irlanda quebrou quando os fluxos de capitais deixaram de alimentar a ciranda doméstica ancorada em desonerações palatáveis aos fundos especulativos, cuja retribuição se dava em bolhas, sendo a imobiliária a terminal.
c) Os preços dos imóveis no mercado irlandês já perderam 50% do valor; a inadimplência grassa junto com o desemprego, a fuga de capitais e o arrocho salarial. Há milhares de imóveis vazios e os bancos estão virtualmente falidos: para salvá-los, o país negocia um empréstimo de 100 bilhões de euros com o FMI, sujeito às condicionalidades conhecidas.
d) O que a frivolidade midiática esquece, porém, é que o ‘Tigre Celta’ quebrou, sobretudo, porque não dispunha mais de políticas públicas, de aparato público e, sobretudo, de ideologia do interesse público, para contrastar a derrocada dos mercados especulativos com ações anticíclicas em defesa do emprego e da sociedade.
e) O ‘ajuste irlandês’ cantado em prosa e verso pelos bardos da mídia nativa havia reduzido o país a uma extensão direta dos mercados. Não havia como reagir a seus próprios instintos suicidas. A crise fulminou a Irlanda porque o modelo neoliberal irlandês era a própria essência da crise. Que sirva de alerta aos discípulos da 'agenda das reformas' que participam da equipe de transição da presidente eleita Dilma Rousseff.”
FONTE: escrito por Saul Leblon e publicado no site “Carta Maior” (http://www.cartamaior.com.br/templates/postMostrar.cfm?blog_id=6&post_id=617).[título e trecho entre colchetes colocados por este blog]
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