terça-feira, 11 de janeiro de 2011
OS INIMIGOS AINDA MAIS PERTO?
“QUANTO A ANTONIO PALOCCI E NELSON JOBIM, ESPERA-SE QUE A PRESIDENTA NÃO LEVE O VELHO DITADO TÃO AO PÉ DA LETRA
Sergio Lírio, na revista “Carta Capital”
“Personagens de ambições semelhantes, eles não poderiam ter se comportado de maneira mais antagônica no alvorecer do novo governo. Um franciscano Antonio Palocci fez um esforço genuíno para demonstrar humildade e discrição no fim de semana da posse de Dilma Rousseff. Sombra da candidata durante a campanha, Palocci mal circulou nos eventos do sábado 1º. No dia seguinte, ao discursar na cerimônia em que assumiu a chefia da Casa Civil, valeu-se de uma velha metáfora futebolística: ele seria mais um da equipe, alguém para somar e não dividir. Dito isso, recolheu-se.
Bronzeado e desenvolto, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, ocupou a ribalta abandonada por Palloci. Compareceu a todas as posses possíveis. E deve ter lamentado não possuir o dom da onipresença. Na nomeação da jornalista Helena Chagas para a Secretaria de Comunicação, sentou-se à mesa e ouviu elogios do ex-ministro Franklin Martins, militante de esquerda nas décadas de 60 e 70, que disse ter estabelecido uma “proveitosa parceria” com Jobim nos anos de governo Lula. Martins, relatam assessores, referia-se às supostas contribuições do ministro da Defesa no debate sobre a Comissão da Verdade e a Lei de Acesso à Informação, ambas ferozmente rejeitadas pelos comandos militares.
Tais contribuições não ficaram claras para o distinto público. Ao contrário. Enquanto Jobim entrava na fila para beijar a mão de Maria do Rosário, substituta de Paulo Vanucchi na Secretaria de Direitos Humanos e tenaz defensora da Comissão da Verdade, um indicado do ministro, o general José Elito Siqueira, nomeado chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), causava o primeiro mal-estar no governo. Ao tomar posse, Siqueira afirmou que a existência de desaparecidos políticos não deveria ser motivo de vergonha para o País e atacou qualquer iniciativa de investigação dos crimes da ditadura. “Temos é que pensar para frente.” Na terça (4), foi repreendido pela presidenta e disse ter sido “mal interpretado”.
Proclamada por um marechal, a República brasileira até hoje treme a cada espirro vindo das casernas. Mais de 25 anos após o fim da última ditadura, os militares continuam a ignorar a Constituição e resistem a se submeter ao poder civil. Nem os agrados de Lula, entre eles o expressivo aumento dos gastos das Forças Armadas, contiveram os ânimos. Um esperançoso petista integrante do governo fornece sua tese: militante da luta armada, ex-presa política, Dilma manteve Jobim para não melindrar os generais. Quanto mais forte a presidenta se sentir, diz o petista, menos chance teria o peemedebista de permanecer no cargo. Autoengano? Diga-se que a permanência de Jobim foi um pedido de Lula.
Até esse dia, se ele mesmo chegar, a presidenta terá de lidar com Jobim, e Siqueira. Sob o comando do GSI está não só a segurança pessoal de Dilma. Está também a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), antro de arapongas responsáveis pela maioria dos escândalos da última década e meia – os grampos do BNDES e a gravação da propina dos Correios que levou ao mensalão entre eles. Vazamentos, em geral, que atenderam a interesses bem específicos na luta pelo poder. A esperança de profissionalização da ABIN esvaiu-se quando Lula afastou Paulo Lacerda do comando da agência, episódio que, aliás, contou com a animada participação de Jobim.
Para quem não se lembra, em 2008, ante a “denúncia” de grampo feita pelo então presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, o ministro da Defesa veio a público dizer que a ABIN possuía equipamentos de escuta ambiental. Mendes havia chamado Lula “às falas” e Jobim proveu-o de um argumento para desafiar o presidente da República. Argumento fajuto, como ficaria claro dias depois – técnicos da ABIN provaram que o equipamento não grampeava. Já era tarde: Lula havia decidido exilar Lacerda em Lisboa, em meio à emboscada que uniu Mendes, Jobim e graúdos petistas citados nas investigações da Satiagraha.
Agora, às vésperas do ano-novo e da posse de Dilma, a Polícia Federal anunciou o que já se sabia. A suposta conversa entre Mendes e o senador Demóstenes Torres não foi grampeada. Na melhor das hipóteses, ou o ministro do STF ou o parlamentar fizeram a gravação.
A PF também arquivou o pedido de demissão de Protógenes Queiroz, condutor da Satiagraha, eleito deputado federal pelo PCdoB.
Convenientemente, o arquivamento saiu no mesmo dia da publicação da aposentadoria do último diretor da polícia no governo Lula, Luiz Fernando Corrêa, cujos feitos mais notáveis foram as vendetas contra aliados de Lacerda: perseguiu Protógenes e armou as “denúncias” contra Romeu Tuma Jr., demitido da Secretaria Nacional de Justiça após vazamentos de conversas telefônicas suas. Romeu Tuma pai, morto no fim do ano passado, foi um dos padrinhos da indicação de Lacerda para o comando da PF no primeiro mandato de Lula.
Siqueira construiu uma carreira na burocracia. Era coronel quando escolhido para cuidar da segurança das viagens presidenciais de Fernando Henrique Cardoso. Pelos serviços prestados, acabou nomeado general de brigada e, mais tarde, indicado para atuar no Haiti. Integra a linha dura do Exército, repleta de oficiais da ativa que ainda chamam o golpe de revolução e acham graça nos insultos e atentados à história cometidos pelos velhinhos do Clube Militar, que mais serviços prestariam ao País se organizassem torneios de bocha ou carteado.
Mas a nomeação do general adorna bem o quadro, como se diz no interior paulista, ao lado do novo diretor da PF indicado pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. O delegado Leandro Daiello Coimbra, ex-superintendente em São Paulo, foi outro servidor público empenhado em destruir a Satiagraha. Às vésperas da operação, Coimbra exigiu de Protógenes a relação de todos os investigados no caso. Protógenes negou-se e os dois discutiram. Os diálogos ríspidos, gravados, vazaram à mídia e revelaram as entranhas da disputa na corporação provocada pela investigação na corporação provocada pela investigação contra o banqueiro Daniel Dantas.
Ao que consta, Cardozo tentou emplacar o gaúcho Ildo Gasparetto, superintendente no Rio Grande do Sul. A presidenta, supostamente interessada em evitar a influência do ex-ministro Tarso Genro, teria pedido que “o leque fosse aberto”. Cardozo entendeu que Gasparetto estava fora e ofereceu outros dois nomes: Coimbra, o escolhido, e Roberto Troncon, diretor de Combate ao Crime Organizado. De qualquer forma, os tempos da PF atuante como nos anos de Lacerda parecem definitivamente encerrados.
O círculo só não se fechou completamente porque Dilma recusou um nome, desta vez indicado por Palocci. O chefe da Casa Civil queria emplacar o jornalista Eduardo Oinegue, diretor do portal IG, de Palocci, Dilma almoçou com o indicado em São Paulo. Oinegue é também sócio em empreendimentos editoriais do assessor de imprensa Marcio Chaer, “porta-voz” de Gilmar Mendes e um dos mais ardentes defensores da tese de que Dantas é um gênio das finanças perseguido por jornalistas corruptos. Neste caso, não funcionou. Dilma optou por premiar a competência e a lealdade de Helena Chagas, sua assessora durante a campanha presidencial.
Um ditado comumente repetido aconselha manter os inimigos por perto. Espera-se, porém, que a presidenta não o tenha levado muito ao pé da letra.”
FONTE: reportagem de Sergio Lírio publicada na revista “Carta Capital” desta semana e transcrita no portal da FAB (http://www.fab.mil.br/portal/capa/index.php?datan=10/01/2011&page=mostra_notimpol) [imagem do Google adicionada por este blog].
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2 comentários:
Maria Tereza
Tenho notado uma certa intenção de denegrir o Jobim.
Conheço pouco dos bastidores de Brasilia, mas penso que o Presidente Lula, uma pessoa muito inteligente, não colocaria nessa pasta uma pessoa vendida (muito menos a Dilma).
Além disso, Jobim soube direcionar a reestruturação da Defesa do Brasil segundo os interesses tecnológicos nossos, o que contraria grande parte da cúpula das Forças (que pouco se importa com nosso desenvolvimento tecnológico : só quer o equipamento).
Outra coisa : foi o primeiro civil que soube lidar bem com os militares.
Iurikorolev,
Obrigada pelo interessante comentário. Para respondê-lo, precisei de maior espaço do que este próprio de comentários. Veja a 1ª postagem de hoje (12).
Maria Tereza
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