segunda-feira, 11 de abril de 2011

Bresser-Pereira: “VAMOS FAZER GUERRA A TODOS ELES?”

Bagdad sofre ataque sob falso pretexto de possuir “armas de destruição em massa”

A LÍBIA, POR NÃO SE MOSTRAR DÓCIL AO COLONIALISMO INFORMAL DAS POTÊNCIAS, AGORA ESTÁ SENDO PUNIDA

Por Luiz Carlos Bresser-Pereira

"O espetáculo de mísseis americanos, britânicos e franceses pulverizando países árabes e muçulmanos no meio da noite provoca um pressentimento. Tais aventuras geralmente começaram com boas intenções e um ingênuo excesso de confiança, mas..."

Com essas palavras a [revista britânica] "The Economist" iniciou seu editorial de 26 de março. Analisava a nova "guerra humanitária" empreendida pelo Ocidente. E perguntava: "Como terminará ela?"

Eu também não sei, mas estou seguro que, nessa aventura, não há boas intenções. Não se busca "impedir o massacre de um povo insurgente" como se alega, mas sim recuperar o domínio sobre um país rico em petróleo e governado por um ditador que é violento e desagradavelmente nacionalista.

O problema é que esse governo soube usar a riqueza do petróleo para alcançar razoável grau de desenvolvimento, de forma que não será tão fácil derrubá-lo.

O Ocidente aproveitou a oportunidade criada pela rebelião na Tunísia e no Egito para iniciar a guerra, mas naqueles países havia dois povos em revolta lutando pela democracia. Na Líbia, porém, não há povo em revolta. Há luta de tribos, há guerra civil.

A única manifestação "de massa" que os fotógrafos jornalísticos conseguiram flagrar foi a de "uma massa de automóveis" em Benghazi comemorando os bombardeios. Quanto ao massacre previsto, já estão morrendo mais líbios do que provavelmente morreriam se não houvesse a intervenção estrangeira.

Essa guerra não terminará bem porque há muito desapareceu a legitimidade de aventuras imperialistas. No século 19, ser um império era uma glória para um país rico e industrial. Mas o imperialismo causou tantos males aos povos dominados que, depois da Segunda Guerra, eles se libertaram e o colonialismo aberto passou a ser condenado.

Foi, entretanto, substituído pelo colonialismo informal: a associação das velhas metrópoles com elites corruptas dos países pobres.

O Oriente Médio foi o objeto privilegiado desse tipo de associação, ao lado dos pobres países da América Latina e da África. Apenas os países asiáticos e alguns países como a Líbia não se mostraram dóceis a essa nova forma de dominação.

Por isso, cresceram e melhoraram o padrão de vida de sua população. Seu índice de desenvolvimento humano [da Líbia] está em 52º lugar, contra o 72º lugar do Brasil.

Agora, as duas velhas potências imperiais, a França e o Reino Unido, seguidas pelos Estados Unidos, punem essa insubordinação.

O novo paladino do Ocidente é Nicolas Sarkozy, que imagina lograr ser reeleito dessa maneira. Ele subestima os franceses. Como todos os povos, eles são também nacionalistas, mas os franceses sabem que essa guerra faz pouco sentido, e que não podem confiar em Sarkozy.

Por isso, não obstante “a guerra” fosse aprovada por 61% da população, seu índice de popularidade desceu para níveis muito baixos: em 6 de abril, depois de iniciada “a guerra”, atingiu 30%. Como a esperança que a guerra seria vencida rapidamente mostrou-se equivocada, esse apoio localizado logo desaparecerá.

O que restará é mais uma guerra sangrenta, nada humanitária, contra um ditador que pouca coisa tem a seu favor. Mas há tantos ditadores nas mesmas condições. Vamos fazer guerra a todos eles?”

FONTE: escrito por Luiz Carlos Bresser-Pereira e publicado na Folha de São Paulo (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1004201112.htm) [imagem do Google adicionada por este blog].

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