segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

AS CONTRADIÇÕES DA IMPRENSA LIVRE SOBRE A POSSE DE DILMA




A posse de Dilma Rousseff e as contradições da imprensa livre

Por Fábio de Oliveira Ribeiro

"A posse da presidenta reeleita conseguiu aprofundar a distância entre a maioria do povo brasileiro e a imprensa que supostamente tem a missão civilizatória de construir uma representação do país para si mesmo. O espetáculo de barbárie dado pelos telejornalistas durante a posse de Dilma foi evidente e ridículo.

Dilma Rousseff foi eleita por maioria de votos em eleições consideradas legítimas pela Justiça Eleitoral. Mesmo assim, foi tratada pela maioria dos veículos de comunicação como se fosse uma ladra que se apossou daquilo que pertencia a outra pessoa.

O partidarismo da mídia, que se manifestou durante as eleições, foi o único fato desagradável durante a posse da presidenta. Tudo o mais correu segundo previsto pelo cerimonial. O povo foi às ruas de Brasília comemorar o evento. As Forças Armadas demonstraram sua fidelidade à CF/88. A presidenta foi prestigiada pelos representantes dos Estados com os quais o Brasil mantém relações diplomáticas e comerciais. Nenhum incidente grave ocorreu. Dilma Rousseff não declarou uma guerra injusta como Bush Jr., não quebrou a economia brasileira três vezes como FHC, não mandou espancar jornalistas como Costa e Silva e, mesmo assim, a imprensa a cobriu de lama ao noticiar sua posse.

As imagens geradas pelas redes de TV não se ajustaram ao discurso irracional elaborado pelos telejornalistas e comentaristas de TV para “enquadrar” o episódio. Por isso, após escutar várias atrocidades, que não me vou dar ao trabalho de reproduzir aqui, resolvi ver a posse de Dilma Rousseff sem som. Só aumentei o volume da televisão durante o discurso da presidenta.

Hoje pela manhã, refletindo sobre as contradições da posse da presidenta, uma pergunta incômoda me ocorreu: Uma imprensa irrelevante e livre é pior do que uma imprensa submetida à censura?

A censura é uma monstruosidade pública. Mesmo assim, permite a construção de algumas virtudes privadas. Para burlar a censura, os jornalista são obrigados a descobrir meios de dizer aquilo que não poderia ser dito. Isso faz com que o discurso jornalístico se torne sofisticado e irônico. Sob intensa pressão, os jornalistas são obrigados a correr riscos. As adversidades são capazes de permitir ao público distinguir os corajosos dos covardes. Os jornalistas que adularam os militares durante a Ditadura eram desprezados pelos seus colegas que ajudaram a derrubar o regime e passaram a ocupar merecidas posições de destaque após 1985.

Desde a promulgação da CF/88, a imprensa é livre no Brasil. A censura prévia é proibida. Os conteúdos divulgados podem gerar responsabilidade civil e criminal, mas para que isso ocorra o caso tem que ser submetido ao Judiciário após a circulação da notícia. À empresa de comunicação/jornalista judicialmente acionada são garantidos todos os meios de defesa, provas, prazos e recursos.

Apesar da liberdade que lhe é concedida, a imprensa brasileira se tornou irrelevante. O fenômeno parece estar ligado ao seu partidarismo exacerbado. Durante as quatro últimas eleições, as empresas de comunicação disseram ao povo quem deveria ser eleito e quem não poderia ser votado. O povo também é livre, votou como quis e elegeu presidentes odiados pelos jornalistas. Indignados, eles passaram os quatro anos seguintes construindo a imagem de um candidato de oposição e tentando destruir o presidente eleito. As derrotas seguidas renovaram e amplificaram as frustrações partidárias dos jornalistas e telejornalistas. O resultado pôde ser ouvido durante a posse de Dilma Rousseff.

[Na posse], o Brasil foi apresentado aos brasileiros por jornalistas que se comportaram como se fossem estrangeiros num território inimigo. O discurso bizarro que eles construíram para emoldurar a posse da presidenta eleita foi mais ridículo que o dos jornalistas norte-coreanos durante a reeleição de Bush Jr. e dos "American newsboys" quando Leonid Brejnev chegou ao poder na URSS. O povo brasileiro não é inimigo da imprensa brasileira, pois de fato não tem qualquer obrigação de votar nos candidatos preferidos pelos jornalistas.

Ao tentar fazer Dilma Rousseff afundar num mar de lama e de corrupção criminosa durante a posse, os jornalistas deixaram bem claro que odeiam a maioria do povo brasileiro que a elegeu. No fundo, muitos deles se comportaram como se as empresas de comunicação fossem a única e verdadeira fonte do poder político. O desprezo dos jornalistas pela soberania popular (fundamento do poder segundo a CF/88) ficou mais do que evidente para mim durante a cerimônia de posse. É nesse desprezo que reside um perigo fundamental.

As circunstâncias momentâneas, o método de avaliação do problema, a honestidade intelectual e a erudição de quem avalia os dados coletados ou obtidos possibilitam várias respostas para uma mesma pergunta. Uma imprensa irrelevante e livre é pior do que uma imprensa submetida à censura? Neste momento, com os dados que disponho, a única resposta que posso dar a essa pergunta é SIM. Afinal, se uma minoria acreditar cegamente nessa imprensa partidarizada e frustrada, pode ficar tentada a chegar ao poder pela força bruta, desprezando o valor público que fundamenta o poder político atribuído e exercido por Dilma Rousseff.

O Brasil não precisa nem de uma revolução, nem de uma guerra civil. E precisa menos ainda dessa imprensa destrutiva e irrelevante. Algo deve ser feito para civilizar os jornalistas brasileiros, para que eles parem de se comportar como estrangeiros hostis em território inimigo. A diversificação pode ser a resposta, mas o estimulo à autocensura não pode ser descartado. O uso seletivo das verbas públicas de propaganda pode ser a chave para abrir essa outra caixa preta. O lucro fácil garantido às empresas de comunicação pela União, Petrobras, CEF, BB e etc… é a principal fonte da degeneração do discurso jornalístico? Essa, meus caros, é a verdadeira pergunta que o governo Dilma deve responder."

FONTE: escrito por Fábio de Oliveira Ribeiro no "Jornal GGN" (http://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/a-posse-de-dilma-rousseff-e-as-contradicoes-da-imprensa-livre).

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