O professor Pedro Henrique Pedreira Campos. / UFRRJ
Empreiteiras já roubavam na ditadura
"Quem faz o orçamento são as empreiteiras" (Adib Jatene).
Do portal "Conversa Afiada"
"Numa singela colaboração ao implacável Dr Moro, aquele que que só pega tucano morto, amiga navegante Marília sugere a leitura desta importante entrevista:
“PAGAMENTO DE PROPINA NA PETROBRAS TRANSCENDE O PT E O PSDB”
"Nem durante o Governo do tucano Fernando Henrique Cardoso, como disse a presidenta Dilma, nem no primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, como afirmou o delator da Lava Jato Pedro Barusco. Nenhum dos dois partidos foi pioneiro quando o assunto é corrupção na Petrobras, segundo Pedro Henrique Pedreira Campos, professor do departamento de História da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).
Campos é autor do livro ‘Estranhas Catedrais – As Empreiteiras Brasileiras e a Ditadura Civil-Militar’ (Editora da UFF, 2014), que mostra como as mesmas construtoras que hoje estão no banco dos réus da operação Lava Jato já pagavam propinas e se organizavam em cartéis durante o regime militar. E até antes.
O título, ele explica, é uma referência a “Vai Passar”, gravada por Chico Buarque em 1994, que cita as “estranhas catedrais” erguidas no país das “tenebrosas transações”.
Pergunta. Com a Lava Jato, há um debate sobre a origem da corrupção na Petrobras. Quando começou a corrupção na estatal?
Resposta. Existe um jogo de empurra para ver de quem é a culpa, e isso fica muito à mercê dos conflitos políticos atuais. O problema transcende as principais siglas partidárias, PSDB e PT. A prática de pagamento de propina na Petrobras vai além disso. Pode ser que tenha surgido no governo do FHC e do Lula um esquema para financiamento de campanha. Esse tipo específico de procedimento talvez tenha sido criado nesses governos, com o envolvimento de diretores da estatal e repasse para partidos. Mas isso é apenas um indicativo de quão incrustadas na Petrobras estão essas construtoras. Muitas dessas empresas prestam serviço para a estatal desde 1953, e existem registros de que essas práticas ilegais já existiam nessa época.
P. A corrupção é a exceção ou a regra no mercado das construtoras?
R. A impressão que tenho, e temos indícios disso, é de que a prática de cartel é institucionalizada no mercado de obras públicas. As vezes existem conflitos, mas o que impera é o acordo; os empresários não querem uma luta fratricida, porque isso reduziria as taxas de lucro deles; então eles tentam dividir os serviços. E isso remonta há muito tempo, desde a década de 50, quando o mercado de obras publicas no Brasil começa a se firmar.
P. Qual era a situação das grandes construtoras antes ditadura?
R. Na segunda metade da década de 50, com a construção de Brasília no Governo de Juscelino Kubitschek e a as obras de infraestrutura rodoviária, as empresas começaram a prosperar. Antes de JK, elas tinham apenas alcance local e regional: eram empreiteiras mineiras, paulistas e cariocas que realizavam obras em seus respectivos Estados. Naquele período, elas não tinham sequer o domínio sobre técnicas para obras hidrelétricas, por exemplo.
P. Como era a relação das empreiteiras com os militares?
R. Elas foram sócias da ditadura. Nisso a Camargo Corrêa se destaca. O dono era muito próximo do regime, e ela financiou a Operação Bandeirante, que perseguiu militantes de esquerda no país. As empreiteiras tiveram uma participação importante no golpe de 1964, que foi um golpe civil-militar. Várias associações de empresários foram antessalas do golpe, que contou com uma participação intensa do setor de construção. E depois elas colheram os frutos desse apoio.
P. Qual construtora que mais cresceu durante a ditadura?
R. A Odebrecht, que hoje é uma gigante do mercado, era muito periférica antes da ditadura. Era uma pequena empreiteira nordestina, bastante secundária. Não participou das obras do plano de metas do JK, nem das rodovias, mas ela cresce de maneira impressionante durante o período de exceção. Em grande parte porque ela tinha presença muito forte junto à Petrobras, que na época tinha muitas obras no Nordeste. Quando a estatal começou a crescer, a Odebrecht foi junto. E à partir daí ela conseguiu o contrato do aeroporto do Galeão (RJ).
P. O que deu força às empreiteiras brasileiras na ditadura?
R. O decreto presidencial 64.345 de 1969 estabeleceu uma reserva de mercado paras empresas brasileiras, que caiu como uma luva para elas, que não tinham como concorrer com as estrangeiras. [Segundo o texto, “só poderão contratar a prestação de serviços de consultoria técnica e de Engenharia com empresas estrangeiras nos casos em que não houver empresa nacional devidamente capacitada”] O decreto facilita a formação de cartel entre elas, a aumentou muito o volume de recursos e obras que as construtoras passaram a obter de contatos públicos. Com esse dinheiro, elas vão adquirir tecnologia para realizar outras obras, como aeroportos supersônicos, as usinas nucleares etc. Com o decreto, elas passaram a tocar as obras do chamado ‘milagre econômico’ da ditadura, o que permitiu que elas obtivessem lucros altíssimos e aprofundassem as práticas de cartel e corrupção no Governo.
P. Não havia investigação dessas práticas irregulares na ditadura?
R. [Essas práticas] não eram coibidas. Muitas vezes obras eram contratadas sem concorrência, isso era muito comum na época. As investigações sobre práticas de cartel eram raras, os mecanismos de controle estavam amordaçados, não havia Ministério Público e a imprensa era censurada.
P. Existe algum indício de que durante a ditadura haviam pagamentos de propina?
R. Naquele período, vinham menos denúncias a público, mas isso não quer dizer que não houvesse corrupção. Há indícios que havia um sistema de propina institucionalizado naquela época. Documentos do Serviço Nacional de Informação indicam que haviam pagamentos irregulares, e que alguns agentes públicos seriam notórios recebedores de propina e comissões. Isso era muito comum e corriqueiro no período. Com o fim da ditadura, isso passa a vir mais a público.
P. Com a democratização, o modus operandi das empreiteiras mudou?
R. Houve uma mudança bastante pronunciada, que segue a mudança da organização do Estado. Durante a ditadura, as atenções das empreiteiras estavam voltadas para o poder Executivo – ministérios e empresas estatais, principalmente. E quando o país se abre para a democracia, a correlação de forças muda, e elas tentam se adaptar. Elas passam a atuar junto às bancadas e aos partidos políticos, porque o Legislativo ganha força. Elas passam a ser ativas para obter emendas parlamentares e verba para obras. Existe, inclusive, no Congresso uma bancada da infraestrutura, e eles são bastante afinados com o desenvolvimento das empresas.
P. Existe um mito de que, durante a ditadura, a corrupção era menor. Isso se comprova factualmente?
R. Eu diria que a corrupção era mais difundida e generalizada, pela falta de mecanismos fortes de fiscalização.
P. As empreiteiras ainda influenciam as decisões do Estado?
R. Acho que sim, elas são muito poderosas. Estamos vivendo um momento singular, elas estão bastante acuadas, mas elas são muito importantes no Parlamento, no processo eleitoral e para pautar as políticas públicas. Vimos no governo Lula a retomada de vários projetos que foram concebidos durante a ditadura, como a transposição do rio São Francisco e a construção de Belo Monte, por exemplo. E isso remete ao poder que esses empresários continuam tendo no Governo. “Quem faz o orçamento da republica são as empreiteiras”, disse o então ministro da Saúde Adib Jatene em 1993. O fato é que os empresários fizeram uma transicão de muito sucesso para a democracia. Elas haviam se apropriado de parte do Estado durante a ditadura, e continuam lá na democracia.
P. Os acordos de leniência que o Governo quer assinar com as empresas da Lava Jato são uma ferramenta que pode mudar a maneira de as empreiteiras atuarem?
R. Historicamente, elas já estiveram envolvidas em vários escândalos. E a lógica da política brasileira é colocar panos quentes e continuar adiante. A linha do governo é clara: estão na defesa declarada dessas empresas. Para mudar a relação do Estado com as empresas no Brasil seria preciso uma mudança profunda, repensando o sistema de financiamento eleitoral, e criando alternativas às empreiteiras privadas no país."
FONTE: entrevista com Pedro Henrique Pedreira Campos, professor do departamento de História da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) Transcrita e comentada no portal "Conversa Afiada" (http://www.conversaafiada.com.br/economia/2015/03/26/empreiteiras-ja-roubavam-na-ditadura/).
4 comentários:
Desde a ditadura não, desde JK. Ele quem inventou este esquema.
Só vejo futuro para o fim dessa corrupção absurda das empreiteiras brasileiras com transparencia total na concorrencia e abrindo completamente para as estrangeiras, especialmente as chinesas que fazem uma obras custando tres vezes menos do que essas porcarias nacionais.
O conluio entre o governo do PT e a Odebrecht foi vergonhoso.
Ao Iurikorolev,
Quanto à origem, concordo.
Contudo, não concordo com a sua visão seletiva, quanto ao tal "conluio". Essa afirmação, evidentemente partidária, é típica na mídia tucana e até na operação Lava Jato. Demonstra total e até cômica ausência de autocrítica da direita.
Maria Tereza
Os vagabundos da Elite Socialista do PT que roubam e exploram o povo através do Mensalão, Petrolão, Lava Jato, Pixuleco e ect. e ainda na maior cara de pau falam de "ditadura" militar! Por aí se vê que esses parasitas e ladrões não gostam de militares, porque no governo militara não podem roubar!
Ao Nicolae Sofran,
Recordo trecho de uma postagem nossa:
"Infelizmente, a corrupção em todas as suas formas já vem de muitas décadas. Cresceu muito, mas não nasceu nos famosos, comprovados e ainda incompreensivelmente impunes bilionários escândalos de corrupção dos governos FHC/PSDB. Até nos tempos da ditadura militar já grassava. Às páginas 150 e 151 do seu livro “História indiscreta da ditadura e da abertura, 1964-1985“ o ex-ministro Ronaldo Costa Couto reproduz frase do ditador Geisel ao Almirante Faria Lima: (…) “Porque a corrupção nas Forças Armadas está tão grande que a única solução para o Brasil é a abertura…” Frases nesse mesmo sentido são atribuídas ao ex-presidente da ditadura e general Castelo Branco e ao ex-ministro da Justiça e censor-mór da ditadura Armando Falcão.
Uma grande diferença de hoje, em relação àqueles tempos, é que nesta década a Polícia Federal está livremente atuante e muito mais bem equipada, capacitada e profissional. Já há investigações como nunca. Diferentemente do passado, os governos Lula e Dilma aumentaram os quadros, equiparam e capacitaram a Polícia Federal e não inibem, nem abafam as investigações, nem interferem no Ministério Público e no Poder Judiciário. Nem mais conseguiriam isso se quisessem. O Ministério Público não tem mais na sua chefia um preposto engavetador dos processos contra o governo e seus aliados. A mídia, nos últimos 12 anos, também saiu do silêncio cúmplice e passou a denunciar intensamente. Ainda não é perfeita. É semiperfeita. Hoje, somente não denuncia e não faz bombásticos escândalos se a denúncia atinge partidos e interesses da direita [PSDB, DEM, PPS, ...], quando então ela mantém o seu tradicional respeitoso silêncio."
Maria Tereza
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