sábado, 11 de outubro de 2008

O MERCADO NÃO SABE MAIS O QUE O MERCADO QUER

Li no jornal “Folha de São Paulo” a notícia a seguir transcrita, produzida pelo enviado da Folha a Madri:

"O que está acontecendo nos mercados financeiros, que não sossegam nem mesmo depois de uma sucessão de pacotes de ajuda, todos eles reclamados pelos próprios mercados? A Folha fez essa pergunta ontem a um punhado de economistas e executivos de bancos. A resposta mais cândida veio de Roger Kubarych: "Quem é que sabe o que os mercados querem a esta altura?".

Kubarych pode ser tido como o rosto dessa entidade tão poderosa quanto invisível chamada mercado. Foi o economista-chefe da Bolsa de Valores de Nova York e, hoje, é o economista-chefe, nos Estados Unidos, do banco alemão Bayerische Hypo-und Vereinsbank.

Se um homem tão fincado no mercado não tem idéia do que seus pares querem, quem poderia saber? Os governos, certamente, não, tanto que estão sendo continuamente atropelados.

Basta acompanhar a seqüência apresentada por outro homem de mercado, Juan José Ruiz, economista-chefe do grupo Santander: "Tivemos zilhões de dólares de injeções de liquidez pelos bancos centrais; tivemos corte de taxa de juros de bom tamanho; tivemos bancos nacionalizados [na verdade estatizados]; tivemos cobertura governamental para os depósitos -tudo para pouco ou nenhum resultado", diz.

O que fazer, então? "Não perca o ânimo ainda; tudo eventualmente terá um impacto", aconselha, muito mais para psicólogo do que para economista. Deixa um lembrete: "Lembre-se de que os governos são os únicos jogadores na praça".

PONTO DE IGNIÇÃO

Brad Setser, pesquisador do Council on Foreign Relations, e Kubarych, a cara do mercado, coincidem em apontar a quebra, no mês passado, do Lehman Brothers como o ponto de ignição para a tormenta.

Setser diz que a quebra do Lehman levou "a uma perda de confiança nas instituições financeiras, de forma tal que fundos financeiros não emprestam para bancos, e entre as instituições financeiras, que não emprestam umas para as outras".

Para o pesquisador, as medidas até agora tomadas "são fracas demais para pôr fim a esse ciclo".

Nas palavras de Setser, o ciclo funciona assim: "A força do desalavancamento [instituições que investiram com dinheiro emprestado estão agora vendendo seus investimentos para fazer caixa para pagar o empréstimo] é agora muito poderosa e alimenta-se dela própria, na medida em que cada venda puxa os preços para baixo e provoca novas vendas".

Já Kubarych descreve assim o ciclo: "Ao empurrar o Lehman à bancarrota, o governo dos EUA injetou medo e incerteza no jogo para todos os demais grandes bancos.
Qualquer um deles poderia ser o próximo, como reclamaram os investidores globais.
Então, eles boicotam os bancos e outras instituições financeiras, recusando-se a fornecer a liquidez costumeira. Preferem, em vez disso, comprar títulos do Tesouro dos EUA, com o que as taxas dos títulos de curto prazo afundam para níveis próximos de zero, no estilo do Japão [nos anos 80/90]".

O ciclo, sempre segundo Kubarych, pulou para a Europa. Dá-se, então, o seguinte: "Quando a crise financeira cruzou o oceano e as instituições européias precisaram de resgate governamental, os investidores começaram a dar-se conta de que um sistema financeiro ferido significa uma recessão global".

BRASIL

No Brasil, Armínio Fraga, com a experiência de quem viveu a crise do real em 1999 na posição de presidente do Banco Central e de quem é homem de mercado (antes e depois de presidir o BC), concorda com ambos:

"Estamos vivendo um pânico generalizado lá fora, alimentado por um desmonte de posições alavancadas e total aversão ao risco. Os governos estão aos poucos absorvendo o risco em seus balanços, garantindo os bancos e tentando assim acalmar os mercados.

Mas ainda não foram capazes de dar uma resposta de impacto".

E o Brasil, como fica? "Aqui temos uma versão local do que se vê lá fora, em boa parte porque o Brasil era um dos favoritos, e agora estão vendendo tudo. Não temos o "subprime" e a bolha imobiliária, mas os bancos vão jogar na defesa por um bom tempo."

ACIONISTAS

A Folha ouviu também, de um executivo que prefere não ser identificado, a explicação de que parte do contínuo tumulto vem do fato de que os pacotes já lançados protegeram os depositantes, mas não os acionistas.

O caso concreto do banco belga Fortis lhe dá razão: meio milhão de pequenos acionistas perderam cerca de 8 bilhões com o colapso da instituição, de acordo com reportagem de ontem do jornal ‘De Standaart’.”

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