domingo, 5 de setembro de 2010

SER MODERNO NO BRASIL, NA RÁDIO CBN

Por Luiz Carlos Azenha

“Encontro-me preso em um imenso engarrafamento, na marginal Tietê, em São Paulo. Recém-reformada, a via não tem iluminação e a sinalização é precária. Trata-se, no linguajar dos paulistas, de “excesso de veículos”, nunca da falta de vias adequadas, da falta de transporte público ou de engenharia de trânsito. Perdoado, é véspera de feriado.

Recorro ao rádio. Aparentemente, a violação do sigilo fiscal da filha de José Serra é a notícia mais importante do universo. Mais importante que o PIB recém-anunciado. Que a operação de capitalização da Petrobras, de mais de 120 bilhões de reais. Ainda não vigora, na rádio do Ali Kamel, a mesma norma do Jornal Nacional, que fala em “violação ilegal”, como se houvesse violação legal de sigilo. Kamel acredita que a ênfase vá render alguns votos a José Serra.

Rodo por várias emissoras e quando volto à CBN a Lúcia Hippolito castiga a candidata Dilma Rousseff pela decisão de evitar a sabatina com editores do jornal O Globo, durante a qual o mundo deixará de respirar.

No vai e volta, mais tarde, sou abençoado com a fala do economista Carlos Alberto Sardenberg. Sardenberg no rádio é garantia de que haverá algum tipo de ginástica para justificar a alta de juros. Pimba. O crescimento maior que o esperado do PIB significa, na visão de Sardenberg, que o Banco Central errou. Deveria ter continuado a aumentar os juros. Será que ele é dono de banco? Ou que subestima a capacidade cognitiva dos ouvintes?

Nova rodada entre as rádios e agora, na CBN, está no ar um debate. Se não errei o nome do programa, é algo como Fim de Feira.

O universo dos entrevistadores soa sofisticado. A gente sabe quando alguém está tentando parecer sofisticado pelas referências intelectuais às quais recorre: um Woody Allen aqui, um Machado lá (dizer “Machado de Assis” soaria pouco íntimo), um Andy Wharol acolá (um chato, diga-se, que só se tornou famoso por conhecer os novaiorquinos certos).

Ah, sim, a referência intelectual dos meninos é Nova York, que aparentemente conheceram de frequentar tourist traps. Mas a entrevistada, pelo que ouvi, é uma mulher interessante. Psicanalista, fala da contradição central das mulheres de hoje. Ela se refere às mulheres urbanas, que ficam entre exercitar a autonomia social — se afastando, portanto, das amarras familiares — e o papel social de reproduzir a cultura, o que as coloca no centro da família. Ela dá um rumo interessante ao debate que começou por causa da referência a Lula como pai da Pátria e ao papel de mãe que seria reservado a Dilma. Mas os entrevistadores não estão engajados na conversa e não conseguem transcender seu próprio “universo” de orelha de livro.

Cortam o raciocínio da entrevistada no momento em que ela oferece a escada para sustentar a piadinha — tem sempre uma piadinha com essa moçada moderna –, segundo a qual Lula e Dilma formam “a família Monstro”. Volto às buzinas do congestionamento.”

FONTE: escrito pelo jornalista Luiz Carlos Azenha e publicado em seu portal “Viomundo” (http://www.viomundo.com.br/opiniao-do-blog/ser-moderno-no-brasil-na-radio-cbn.html).

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