Íntegra da Conferência do Ministro da Defesa do Brasil, Dr Nelson A. Jobim, na abertura da VII Conferência Forte de Copacabana, 03 Novembro 2010, Rio de Janeiro.
PERSPECTIVAS DA SEGURANÇA PARA A AMÉRICA DO SUL E A EUROPA
“SENHORAS E SENHORES,
IMAGINO QUE O TÍTULO DESTE PAINEL REFLITA A INTENÇÃO DOS ORGANIZADORES DESTA CONFERÊNCIA:
CONHECER DISTINTAS VISÕES SOBRE A PROBLEMÁTICA DE SEGURANÇA NOS CONTEXTOS SUL-AMERICANO E EUROPEU.
NÃO É A SEGURANÇA UM SUJEITO AUTÔNOMO, DOTADO DE VONTADE PRÓPRIA.
POR ISSO, CLARO ESTÁ QUE, NESTE CASO, OS REFERENTES DA SEGURANÇA SÃO A AMÉRICA DO SUL E A EUROPA.
ESSA TAREFA REVESTE-SE DE GRANDE DIFICULDADE.
O CONCEITO DE SEGURANÇA LATO SENSU PODE ABARCAR VIRTUALMENTE QUALQUER DOMÍNIO DA ATIVIDADE HUMANA.
PARA EVITAR TAL GENERALIDADE, CONCENTRO-ME APENAS NO PLANO DA SEGURANÇA INTERNACIONAL – RECORTE QUE EM SI MESMO É EXTREMAMENTE AMPLO.
RECORTO AINDA MAIS O CONCEITO.
ABORDO O QUE SE CONVENCIONOU CHAMAR DE "SEGURANÇA MILITAR EXTERNA".
OU SEJA, TRATAREI DE “DEFESA”.
FALEMOS AGORA, CONTUDO, SOBRE O CONCEITO MAIS AMPLO DE SEGURANÇA.
DESDE JÁ, DEVEMOS TER EM MENTE QUE OS CONTEXTOS SUL-AMERICANO E EUROPEU SÃO NOTAVELMENTE DISTINTOS.
É DISTINTA A REALIDADE DESSAS DUAS REGIÕES EM INÚMERAS OUTRAS DIMENSÕES.
FALAR SOBRE UMA PERSPECTIVA RELACIONADA À SEGURANÇA DA AMÉRICA DO SUL E DA EUROPA, SEM INCORRER EM GENERALIZAÇÕES GROSSEIRAS, CONSTITUI DESIDERATUM IMPOSSÍVEL.
A HONESTIDADE INTELECTUAL OBRIGA-NOS A FALAR EM VÁRIAS PERSPECTIVAS - NÃO SÓ UMA.
A AFIRMAÇÃO DA PLURALIDADE REPRESENTA O FATO INSOFISMÁVEL DE QUE HÁ INÚMERAS VOZES, INÚMEROS OLHARES, QUE FALAM SOBRE A REALIDADE INTERNACIONAL.
TODOS VÊEM ESSA REALIDADE DE FORMA DISTINTA, POR VEZES INCOMPATÍVEL.
COMO EXEMPLO PROVOCATIVO, MENCIONO AS IMPLICAÇÕES DA ADOÇÃO, EM ESCALA GLOBAL, DO PROBLEMÁTICO CONCEITO DE SEGURANÇA HUMANA.
SE FORMOS CONSIDERAR COM SERIEDADE ESSE CONCEITO E O SEU FOCO NO VALOR UNIVERSAL DA PROTEÇÃO DO INDIVÍDUO, VEREMO-NOS, NO LIMITE, CONFRONTADOS COM SITUAÇÕES EM QUE SERÁ IMPRATICÁVEL JUSTIFICAR A PRÓPRIA PROTEÇÃO DAQUELES QUE SE QUER PRESERVAR.
ESSA AFIRMATIVA NADA TEM DE OUSADA.
BASTA CONSIDERAR QUE O SER HUMANO, ATÉ O PRESENTE, NÃO ENCONTROU FÓRMULA QUE FOSSE UNIVERSALMENTE ACEITA COMO CAPAZ DE HIERARQUIZAR VALORES QUE, ISOLADAMENTE CONSIDERADOS, SÃO PERFEITAMENTE LEGÍTIMOS À LUZ DA ESCALA AXIOLÓGICA DOMINANTE NO MUNDO OCIDENTAL.
EXEMPLIFICO COM UMA PERGUNTA:
QUEM PODE AFIRMAR, DE MODO INEQUÍVOCO, A PREVALÊNCIA DO DIREITO À AUTODETERMINAÇÃO DO KOSOVO - ASPIRAÇÃO DA MAIORIA ALBANESA - SOBRE O DIREITO À PRESERVAÇÃO DA INTEGRIDADE TERRITORIAL DOS ESTADOS - ASPIRAÇÃO DA MINORIA SÉRVIA - QUE PRETENDE SE MANTER ATRELADA AO SEU ESTADO ORIGINAL?
NÃO SERIAM AS DUAS ASPIRAÇÕES LEGÍTIMAS?
NÃO SERIAM ELAS CONTRADITÓRIAS?
ESSAS PERGUNTAS RETÓRICAS NÃO DEVEM OCULTAR A VERDADE:
SIM, ESSES VALORES, ISOLADAMENTE CONSIDERADOS, SÃO LEGÍTIMOS.
NO ENTANTO, A POLÍTICA INTERNACIONAL NOS CONFRONTA COM ESCOLHAS AGÔNICAS EM QUE SE TORNA NECESSÁRIO OPTAR PELO MAL MENOR.
NÃO HÁ CASUÍSTICA QUE SIRVA DE BÚSSOLA PARA O HOMEM DE ESTADO EM SITUAÇÕES COMO ESSA.
A EXTREMA DIVERSIDADE E COMPLEXIDADE DOS RELACIONAMENTOS INTERNACIONAIS NÃO COMPORTAM SOLUÇÕES DE MANUAL.
ESSA DIGRESSÃO DE MODO ALGUM CONSTITUI DEFESA DO RELATIVISMO MORAL.
PRETENDE, ISTO SIM, PROBLEMATIZAR O CONCEITO DE SEGURANÇA HUMANA E SUA ÊNFASE NO INDIVÍDUO.
NOTE-SE QUE A ATOMIZAÇÃO EXTREMA DO REFERENTE DA SEGURANÇA, GERADA PELA APLICAÇÃO SIMPLISTA DA IDÉIA DE PRESERVAÇÃO DO SER HUMANO COMO UNIDADE INDIVISÍVEL PORTADORA DE VALOR, TORNA O CONCEITO IMPRATICÁVEL.
DAÍ DERIVA O COROLÁRIO LÓGICO DE QUE O OUTRO EXTREMO DO CONTINUUM - A HUMANIDADE - PASSA A SER, AO FIM E AO CABO, O REFERENTE DA SEGURANÇA HUMANA.
ESSE NÍVEL DE AGREGAÇÃO TÃO INCLUSIVO, CONTUDO, É IGUALMENTE PROBLEMÁTICO.
O FATO, LAMENTÁVEL OU NÃO, A DEPENDER DA PERSPECTIVA ADOTADA, É QUE A HUMANIDADE, COMO CONCEITO, POSSUI UMA LIMITADA CAPACIDADE DE MOBILIZAÇÃO POLÍTICA – E ISSO MESMO DEPOIS DO HOLOCAUSTO E DAS DECLARAÇÕES UNIVERSAIS DE DIREITOS HUMANOS DA ONU.
O VETOR PRIMORDIAL DA FORMAÇÃO DAS IDENTIDADES CONTINUA A SER O DO CONTRASTE ENTRE EGO E ALTER.
ISTO FAZ COM QUE A IDÉIA DE COLETIVIDADE HUMANA TENHA POUCO IMPACTO SOBRE A FORMAÇÃO DAS LEALDADES POLÍTICAS.
ORA, SE AS CONSIDERAÇÕES MENCIONADAS FIZEREM SENTIDO, PARECE-ME PERFEITAMENTE PLAUSÍVEL QUE O ESTADO NACIONAL SE MANTENHA COMO O REFERENTE MAIS RELEVANTE DA SEGURANÇA INTERNACIONAL.
É NELE QUE SÃO CONSTRUÍDAS E REPRODUZIDAS AS LEALDADES POLÍTICAS MAIS PROFUNDAS E DURADOURAS.
EM SÍNTESE, DEFENDO A TESE DE QUE O ESTADO NACIONAL DEMOCRÁTICO REPRESENTA DUAS FUNÇÕES:
(a) A MELHOR CHANCE DE PRESERVAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS; e
(b) O PILAR MAIS SÓLIDO DE MANUTENÇÃO DA PAZ, TANTO NO PLANO INTERNACIONAL COMO NO DOMÉSTICO.
NÃO CREIO QUE O ESTADO NACIONAL DEMOCRÁTICO VENHA A SER SUBSTITUÍDO EFICIENTEMENTE NESSAS FUNÇÕES:
(a) SEJA PELA FRAGMENTAÇÃO DE PODER, CONSUBSTANCIADA NA MIRÍADE DE GRUPOS SUBNACIONAIS;
(b) SEJA PELA CONCENTRAÇÃO DE PODER EM UMA ORGANIZAÇÃO PLANETÁRIA VERDADEIRAMENTE UNIVERSAL.
SE O ESTADO NACIONAL CONTINUAR A SER O REFERENTE TRANSCENDENTAL DA SEGURANÇA ENTENDIDA EM SENTIDO LATO, TEMOS DE PRONTO UMA DISTINÇÃO ÓBVIA ENTRE AS REALIDADES SUL-AMERICANA E EUROPÉIA.
A ÚLTIMA, PROPULSADA POR UM PASSADO DE INTERMINÁVEIS GUERRAS, MORTE E DESTRUIÇÃO, EMBARCOU NO MAIS AMBICIOSO PROJETO DE INTEGRAÇÃO CONHECIDO, TENDENTE À CRIAÇÃO DE UM SUPERESTADO.
ASSIM O FEZ PREOCUPADA EM GARANTIR QUE O FUTURO NÃO REPETISSE O PASSADO.
ESSE PROJETO, FUNDAMENTADO NOS IDEAIS COSMOPOLITAS DA ILUSTRAÇÃO, HOJE ENFRENTA DIFICULDADES DE TODA ORDEM.
FAÇO REFERÊNCIA A UM PENSAMENTO CORRENTE:
“A EUROPA É UM BOM LUGAR PARA VIVER, MAS NÃO PARA SONHAR”.
LOGO, ENQUANTO OS EUROPEUS SE DEBATEM PARA PROSSEGUIR NA ROTA DE CONSTRUÇÃO DE UMA CONFEDERAÇÃO DE ESTADOS, NADA DE SEMELHANTE EXISTE NA AMÉRICA DO SUL – NA VERDADE, EM QUALQUER OUTRA PARTE DO MUNDO.
OS PROJETOS DE INTEGRAÇÃO SUL-AMERICANOS SÃO MENOS AMBICIOSOS, MAS NEM POR ISSO MENOS BEM SUCEDIDOS NA MANUTENÇÃO DE UM AMBIENTE DE PAZ E COLABORAÇÃO.
NESTA PARTE DO MUNDO, PRETENDE-SE APROFUNDAR OS ESFORÇOS INTEGRACIONISTAS, INCLUSIVE NO PLANO DA DEFESA, MAS SEM QUE ISSO SIGNIFIQUE ABDICAÇÃO DE SOBERANIA A ORGANISMOS SUPRANACIONAIS.
HÁ QUE SE CONSIDERAR, IGUALMENTE, A EXISTÊNCIA, NO ÂMBITO EUROPEU, DE UMA ORGANIZAÇÃO QUE SE SUPERIMPÕE À UNIÃO EUROPÉIA NO QUE SE REFERE À DEFESA.
FALO AQUI NITIDAMENTE DA OTAN, CUJO MEMBRO MAIS IMPORTANTE NEM SEQUER PERTENCE AO CONTINENTE.
A DINÂMICA DA INSERÇÃO NORTE-AMERICANA NO TEATRO EUROPEU DE DEFESA TORNA AS REALIDADES DO VELHO MUNDO E DA AMÉRICA DO SUL AINDA MAIS CONTRASTANTES.
NÃO HÁ ESTADOS NUCLEARMENTE ARMADOS NO SUBCONTINENTE SUL-AMERICANO.
A GEOPOLÍTICA DA ENERGIA PROCESSA-SE DE MODO INTEIRAMENTE DISTINTO.
INEXISTEM NESTA PARTE DO PLANETA ALIANÇAS SE EXPANDINDO EM DIREÇÃO ÀS FRONTEIRAS DE ANTIGOS IMPÉRIOS.
TAMPOUCO O FENÔMENO DO TERRORISMO AQUI POSSUI A RESSONÂNCIA ADQUIRIDA NA EUROPA.
NA MESMA LINHA, NENHUMA NAÇÃO SUL-AMERICANA É PARTE DE UMA ALIANÇA REGIONAL DEFENSIVA QUE SE ARVORA PODER INTERVIR EM QUALQUER PARTE DO MUNDO COM BASE NOS MAIS VARIADOS PRETEXTOS.
SERIA ILUSÓRIO IMAGINAR QUE NÃO HOUVESSE QUAISQUER PROBLEMAS NO CAMPO DA DEFESA NA AMÉRICA DO SUL.
CONTUDO, ELES SÃO PLENAMENTE ADMINISTRÁVEIS NO SEIO DAS INSTITUIÇÕES CRIADAS PARA DELES DAR CONTA.
MENCIONO APENAS A MAIS RECENTE: O CONSELHO SUL-AMERICANO DE DEFESA, PARA CUJA FORMAÇÃO TIVE A HONRA DE CONTRIBUIR.
NESTE PONTO, ESCLAREÇO O SEGUINTE:
O BRASIL FAZ PARTE DA AMÉRICA DO SUL. O BRASIL NÃO É A AMÉRICA DO SUL.
VOLTO A REAFIRMAR QUE CADA ESTADO DEVA SER SOBERANO NA ESCOLHA DE SUA PRÓPRIA PERSPECTIVA SOBRE AS TEMÁTICAS DE SEGURANÇA E DEFESA.
POR ISSO, NÃO SERIA CORRETO, AO MENOS NESTA PARCELA DO GLOBO, QUE APENAS UM PAÍS FALASSE EM NOME DA REGIÃO.
A DESPEITO DAS CONSIDERAÇÕES GERAIS QUE FAÇO EM VISTA DO TÍTULO DESTE PAINEL, GOSTARIA DE SALIENTAR QUE FALO EM MEU NOME PRÓPRIO.
SERIA HIPÓCRITA, EM OUTRO SENTIDO, NEGAR A IMPORTÂNCIA DO PAÍS NESSE CONTEXTO E SEU PAPEL NA MANUTENÇÃO DE UMA AMÉRICA DO SUL ESTÁVEL E PACÍFICA.
AO CONSTITUIR A NAÇÃO BRASILEIRA ELEMENTO DE PONDERAÇÃO E EQUILÍBRIO NO PLANO REGIONAL, TORNA-SE IMPOSSÍVEL OLVIDAR A SUA CONTRIBUIÇÃO PARA A PRESERVAÇÃO DE RELAÇÕES AMISTOSAS NO SUBCONTINENTE E, POR EXTENSÃO, NO SISTEMA INTERNACIONAL.
MAIS UMA VEZ EM CONTRASTE COM A REALIDADE EUROPÉIA GENERICAMENTE COMPREENDIDA, CABERIA ASSINALAR QUE O BRASIL POSSUI UMA CLARA ESTRATÉGIA DE COOPERAÇÃO COM TODOS OS PAÍSES SUL-AMERICANOS.
NA EUROPA, NO ENTANTO, HÁ DISTINÇÃO ENTRE PAÍSES MEMBROS E NÃO MEMBROS DA ALIANÇA ATLÂNTICA.
NO ESPAÇO SUL-AMERICANO TODOS OS ESTADOS PARTICIPAM DAS INSTITUIÇÕES DE GOVERNANÇA REGIONAL, INCLUSIVE NO CAMPO DA DEFESA.
NÃO HÁ DIFERENCIAÇÃO OU EXCLUSÃO DE PAÍSES NO SEIO DO CSAD, POR EXEMPLO.
A FLUIDEZ NO DIÁLOGO, ACOPLADA À INCLUSÃO DE TODOS, A DESPEITO DE SUAS ÓBVIAS ASSIMETRIAS, PERMITE QUE A AMÉRICA DO SUL CAMINHE UNIDA NO SENTIDO DA AMPLIAÇÃO DE SEUS LAÇOS NO CAMPO DA DEFESA.
É INTENÇÃO DO BRASIL FORTALECER ESSE PROCESSO, DE MODO QUE A COLABORAÇÃO SUL-AMERICANA ALCANCE PATAMAR TAL QUE ELA PRÓPRIA SE TRANSFORME EM FATOR DE DISSUASÃO EXTRA-REGIONAL.
OUTRO ELEMENTO DIFERENCIADOR DAS REALIDADES REGIONAIS EM DISCUSSÃO É O QUE DIZ RESPEITO À CONJUNTURA.
A PROFUNDA CRISE ECONÔMICA QUE ASSOLA O VELHO CONTINENTE OBRIGA MUITOS DE SEUS ESTADOS A CORTAREM GASTOS MILITARES.
O ESGOTAMENTO DO CICLO DE VIDA DOS SISTEMAS DE ARMAS DOS EXÉRCITOS SUL-AMERICANOS (ADICIONADO À MANUTENÇÃO DO CRESCIMENTO ECONÔMICO DE GRANDE PARTE DOS PAÍSES DO SUBCONTINENTE) FAZ COM QUE VÁRIAS NAÇÕES, ENTRE ELAS O BRASIL, VEJAM-SE NA CONTINGÊNCIA DE APARELHAR SUAS FORÇAS ARMADAS.
O AUMENTO DO GASTO MILITAR NA AMÉRICA DO SUL É MUITO MAIS UMA DECORRÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIA ECONÔMICA FAVORÁVEL.
NÃO É O RESULTADO DE ESFORÇOS NACIONAIS VOLUNTARISTAS QUE OBJETIVEM COBRIR DEFICIÊNCIAS NO CAMPO DE SUAS ESTRUTURAS DE DEFESA EM FACE DE PERCEPÇÕES AGUDAS DE AMEAÇA.
NESSA LINHA, GOSTARIA DE RECHAÇAR VEEMENTEMENTE A NOÇÃO, POR SINAL INDIGENTE DO PONTO DE VISTA CONCEITUAL, DE QUE HAVERIA EM CURSO NA AMÉRICA DO SUL UMA CORRIDA ARMAMENTISTA.
A REGIÃO PERMANECE SENDO A MAIS DESARMADA DO MUNDO.
É UMA DAS REGIÕES QUE MENOR TENDÊNCIA APRESENTA À ESCALADA DOS CONFLITOS AO SEU LIMITE LÓGICO (A GUERRA).
ADEMAIS, OS SUPOSTOS ANALISTAS QUE DEFENDEM ESSA IDÉIA FALHAM EM CONSIDERAR AS DÉCADAS DE BAIXÍSSIMO INVESTIMENTO EM DEFESA PREVALECENTE NA REGIÃO.
DA MESMA FORMA, DESCONSIDERAM A CONVIVÊNCIA POLÍTICA CIVILIZADA PREDOMINANTE NO SUBCONTINENTE.
NÃO PRETENDO ME ESTENDER MUITO MAIS.
FALO SINTETICAMENTE SOBRE AS PERSPECTIVAS DAS DUAS REGIÕES NO QUE TOCA À DEFESA.
COMO TIVE OPORTUNIDADE DE REFERIR EM CONFERÊNCIA REALIZADA NO INSTITUTO DA DEFESA NACIONAL DE LISBOA, QUE DISCUTIU O NOVO CONCEITO ESTRATÉGICO DA OTAN, NÃO ACREDITO QUE A EUROPA SE LIBERTE DE SUA DEPENDÊNCIA EM RELAÇÃO AOS ESTADOS UNIDOS NO MÉDIO PRAZO.
TEM-SE AS DIFICULDADES ECONÔMICAS PREVALECENTES NESTE MOMENTO.
A ELAS SE SOMAM:
(a) O AUMENTO DA XENOFOBIA;
(b) A RECALCITRÂNCIA DAS ELITES EUROPÉIAS EM ADMITIR QUE O VELHO MUNDO TERÁ DE SE ABRIR À IMIGRAÇÃO PARA IMPEDIR O DECLÍNIO DEMOGRÁFICO; e
(c) OS PERCALÇOS RELACIONADOS AO APROFUNDAMENTO DO PROCESSO DE INTEGRAÇÃO.
TUDO ISSO LEVA A CRER QUE A UNIÃO EUROPÉIA NÃO SE TORNARÁ NOS PRÓXIMOS 30 ANOS UM ATOR GEOPOLÍTICO À ALTURA DE SEU ‘SOFT-POWER’.
A AMÉRICA DO SUL, A SE MANTER O RITMO ATUAL DE CRESCIMENTO ECONÔMICO, MUITO PROVAVELMENTE TERÁ O SEU BAIXO PERFIL GEOPOLÍTICO AMPLIFICADO.
ISSO DEVERÁ OCORRER POR DOIS MOTIVOS:
(a) O AUMENTO DA PARTICIPAÇÃO DA REGIÃO NO PIB MUNDIAL; e
(b) A CRESCENTE IMPORTÂNCIA DE ALGUNS DOS ATIVOS DE QUE DISPÕE EM ABUNDÂNCIA:
- ÁGUA POTÁVEL;
- PROTEÍNA ANIMAL;
- GRÃOS;
- ENERGIA RENOVÁVEL E NÃO RENOVÁVEL;
- MINÉRIOS, e
- BIODIVERSIDADE.
HÁ DEMONSTRAÇÕES EVIDENTES DE QUE JÁ EXISTE A PERCEPÇÃO DA TENDÊNCIA DE AUMENTO DO PERFIL GEOPOLÍTICO DO SUBCONTINENTE, ASSIM COMO DA ÁFRICA.
É O CASO, POR EXEMPLO, DE AÇÕES DE ALGUMAS POTÊNCIAS, INCLUSIVE EUROPÉIAS, QUE VISAM ENVOLVER O ATLÂNTICO SUL EM SEUS ESQUEMAS DIPLOMÁTICOS E DE DEFESA.
A RESPOSTA BRASILEIRA A ESSA TENDÊNCIA PRECISA DAR-SE EM VÁRIOS PLANOS:
- DIPLOMÁTICO;
- ECONÔMICO;
- AMBIENTAL; e
- MILITAR, DENTRE OUTROS.
NO DIPLOMÁTICO:
-- REDOBRAR OS ESFORÇOS DE INTEGRAÇÃO PARA QUE A AMÉRICA DO SUL POSSA ATUAR COESA FRENTE ÀS CIRCUNSTÂNCIAS QUE VIEREM A SURGIR – ALÉM DA MANUTENÇÃO DA DEFESA DA DEMOCRATIZAÇÃO DO PODER NO SISTEMA INTERNACIONAL.
NO ECONÔMICO:
-- DIMINUIR OS GARGALOS QUE TRAVAM NOSSA COMPETITIVIDADE E ATUAR PARA O ADENSAMENTO DA INFRAESTRUTURA DE INTERCONEXÃO DO SUBCONTINENTE (SOBRETUDO A DE TRANSPORTES E ENERGIA).
NO AMBIENTAL:
-- GARANTIR A EXPLORAÇÃO RACIONAL DOS IMENSOS ATIVOS DE QUE DISPOMOS, TRANSFORMANDO O POTENCIAL EM RIQUEZA E PROSPERIDADE PARA NOSSA POPULAÇÃO.
NO MILITAR:
-- CONSTRUIR UM APARATO DISSUASÓRIO VOLTADO PARA AMEAÇAS EXTRA-REGIONAIS QUE PERMITA AO PAÍS DIZER NÃO QUANDO TIVER DE DIZER NÃO.
ISSO ENVOLVE INVESTIMENTO NA REDUÇÃO DE NOSSAS VULNERABILIDADES MILITARES E NO REFORÇO DA CAPACITAÇÃO INDUSTRIAL BRASILEIRA.
POR FIM, ENTENDO QUE AS PERSPECTIVAS DO RELACIONAMENTO ENTRE A AMÉRICA DO SUL E A EUROPA DEPENDERÃO DE NOSSA CAPACIDADE DE ENCONTRAR SOLUÇÕES MUTUAMENTE SATISFATÓRIAS PARA AS DIVERGÊNCIAS QUE CERTAMENTE SURGIRÃO.
NO QUE TANGE À DEFESA, O BRASIL POSSUI EXCELENTE RELACIONAMENTO COM VÁRIOS PAÍSES EUROPEUS.
ALGUNS DELES SÃO PARCEIROS NO NOSSO PROCESSO DE APARELHAMENTO E CAPACITAÇÃO INDUSTRIAL.
HÁ ENORMES POSSIBILIDADES DE COOPERAÇÃO NESSE CAMPO.
ESSAS POSSIBILIDADES SERÃO TANTO MAIORES QUANTO MENOR FOR O APOIO DA EUROPA A ESQUEMAS DIPLOMÁTICO-MILITARES QUE VENHAMOS A ENTENDER COMO TENTATIVAS DE REDUZIR A MARGEM DE AUTONOMIA DO BRASIL.
FINALIZO COMO COMECEI.
ACREDITO QUE O ESTADO É E CONTINUARÁ A SER O PRINCIPAL ATOR DO SISTEMA INTERNACIONAL.
O BRASIL, PORTANTO, NÃO ABRE MÃO DE GARANTIR A SUA SOBERANIA DE MODO AUTÔNOMO.
POR ÓBVIO, NÃO DESCARTAMOS A PARCERIA DE TODOS AQUELES DISPOSTOS A CONTRIBUIR PARA ESSE OBJETIVO.
PELA NATUREZA DE NOSSA CULTURA E PELO PROCESSO HISTÓRICO QUE NOS DEU ORIGEM, NÃO CULTIVAMOS ÓDIOS OU SENTIMENTOS AGRESSIVOS.
SOMOS AMANTES DA PAZ E NENHUM MAL FAREMOS A QUEM QUER QUE SEJA.
CONTUDO, AMAR A PAZ NÃO SIGNIFICA INCAPACIDADE DE DEFENDER SEUS INTERESSES.
MUITO OBRIGADO.
Nelson A. Jobim, Ministro da Defesa do Brasil”
FONTE: publicado no site “DefesaNet” (http://www.defesanet.com.br/forte/vii_jobim.htm).
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