terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Entrevista com Gilberto Carvalho: “OPOSIÇÃO NÃO DEVE SE AGITAR; TEMOS UM PELÉ NO BANCO DE RESERVAS”



A oposição não deve se "agitar" em caso de dificuldades na gestão Dilma Rousseff porque o governo tem um 'Pelé na reserva': Luiz Inácio Lula da Silva".

O recado é do mais próximo auxiliar do ex-presidente, o ex-chefe de gabinete e agora ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, 59.

Durante entrevista à [tucana] ‘Folha’, na manhã de domingo, ele chorou várias vezes ao lembrar da relação com Lula.

A despeito da discussão sobre corte de despesas federais, Carvalho revelou que está na mesa da presidente proposta de aumento salarial para os ocupantes de cargos de confiança. Ele disse que não sabe qual será o índice de reajuste.

Sobre o PMDB, partido do vice-presidente da República, Michel Temer, afirma que o aliado tem uma oportunidade de "melhorar sua imagem" no governo.

Folha - Qual será seu maior desafio no ministério?

Gilberto Carvalho -
Administrar as tensões naturais das demandas dos movimentos sociais e o que o governo consegue atender. Exemplo: salário mínimo, reforma agrária e a questão indígena. As demandas do funcionalismo. Embora não seja a minha secretaria a responsável pela discussão, tem uma tensão.

Circula no governo a informação de que haverá um aumento para os ocupantes de cargos de confiança.

Há uma decisão já tomada de fazer um reajuste de DAS [sigla para designar cargos de confiança]. Não sei adiantar em que nível. Mas há uma ideia de fazer uma correção. O último reajuste foi há quatro anos.

Já passou pela presidente?

A decisão foi tomada pelo Planejamento. Mas não deu tempo de fazer no governo Lula. Caberá a Dilma fazer. O problema sempre é manter o salário num nível que não seja elevado em relação ao mercado, mas também não tão defasado que te impeça de ter quadros de qualidade.

Não é um sinal ruim dar aumento quando há necessidade de corte de despesas?

É o que ela (Dilma) chama de gasto inteligente. Se não há um funcionalismo minimamente motivado, se a pessoa tem a preocupação de o dinheiro não dar até o fim do mês, prejudica o desempenho profissional. Se fosse um reajuste desmedido, bom. Mas não é o que se está pretendendo. É correção da perda dos últimos quatro anos.

O temperamento de Dilma não impõe risco de isolamento dos movimentos sociais?

O que a gente perde em relação ao Lula com a Dilma é aquilo que chamaria de reação epidérmica aos movimentos desse contato, pelo carisma, pela história dele, pela facilidade com que captava os sinais. A gente perde.

Mas a Dilma tem essa sensibilidade. Quando me chamou, disse: "Sei que preciso dessa relação mais do que Lula precisou". Não é a área que me preocupa.

Qual é? É a política?

A política, na medida em que não temos o peso definidor da figura do Lula, a capacidade de sedução que ele exerceu. A Dilma não tem naturalmente essa relação. Vamos ter que construir.

O Sr. disse, em entrevista, que, se houvesse dificuldades, o Lula poderia voltar. Levou bronca?

Falei a coisa mais óbvia. Acho que o governo da Dilma será de muita competência. Se Deus quiser, faremos um belíssimo governo e ela será reeleita. É evidente que, se não der certo, temos um curinga. Estou dizendo para a oposição: "Calma. Não se agitem demais. Temos uma carga pesada. Não brinca muito que a gente traz. É ter o Pelé no banco de reservas".

Que dificuldade pode existir?

Tenho até medo de falar e se tornar uma profecia ruim. Mas digamos que haja uma dificuldade na gestão, na economia, algum acidente, por exemplo, na economia do mundo.

O PMDB não está satisfeito com a perda de espaço. Falam que haverá troco.

Há importantes discussões a serem feitas no segundo e no terceiro escalões. O PMDB tem a grande chance histórica de mudar sua posição, de ser de fato um partido com unidade, e se converter numa verdadeira alternativa de poder. Aposto na soma desses fatores: mais participação do PMDB em outros escalões e o fato de que o partido tem uma chance de mudar de posição...

Mudar de imagem?

Mudar de imagem. De romper essa tradição de um partido regionalista e que não foi até hoje alternativa de poder efetivo.

Lula pode impor uma sombra à Dilma? Ele vai ser usado com moderação?

Lula vai ter um comportamento rigorosamente discreto. Não vai falar em público, não vai me usar para mandar recado. Não precisa disso. A relação deles é tão direta, tão próxima. Quando ela me abraçou, disse: "Nossa, você viu como ele estava triste quando desceu a rampa? Vi nos olhos dele que ele estava triste".

Dilma e Lula chegaram a um ponto da relação que isso supera qualquer necessidade de intermediação. Lula não precisa de mim. Seria muita pretensão querer ser o espião do Lula no Planalto. Vou continuar tendo uma relação com o Lula... (chora).

Como foi para o Sr. vê-lo descendo a rampa?

Difícil dizer. Tem uma coisa enorme de agradecimento a Deus e à vida por essa possibilidade de ter convivido com esse cara. Tem uma coisa de perda de cotidiano, de liberdade. Vou ficando velho e ficando chorão. Caramba. Não pensei que doía tanto. É isso, um tempo da minha vida que sei que terminou.

Há uma avaliação de que, em relação à ética, Dilma seria mais firme. O Sr. concorda?

Acho uma bobagem. Lula sofreu muito com tudo isso, vocês não imaginam como ele sofreu com os problemas da nossa turma e de outros aliados. Se fosse isso ele não tinha tirado do governo tantas pessoas tão ligadas a ele.

A Polícia Federal o informava das operações antes de elas acontecerem.

Ele nunca ligou para o irmão para dizer que a polícia iria entrar na casa dele. Falar que esse cara contemporizou? Eu acompanhei o episódio do Vavá. Doeu na alma do Lula [chora]. Ele sabia que era uma bobagem, que o irmão dele era um ingênuo sendo utilizado por um bando de picaretas. Mas não ligou para o Vavá.

Acha que essa tolerância...

Eu quero insistir: não houve tolerância, eu não aceito a palavra tolerância. Quando o Lula fala que ele se insurgiu contra o mensalão, não é que ele concordou com as atitudes do Delúbio, não é isso.

Ele disse que não houve mensalão no sentido de que o governo não precisava pagar para que bandidos votassem com o governo.

A insurgência não é contra os erros que aconteceram. É também contra essa história de que o governo dele foi o inventor da corrupção, quando a gente sabe que governo começou a combater a corrupção, porque, antes tudo, era discretamente e tucanamente muito bem guardada.”

FONTE: reportagem de Cátia Seabra e Natuza Nery publicada pela Folha de São Paulo (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/po0301201122.htm) [pequeno entre colchetes na introdução e imagem obtida no portal de Luis Nassif  adicionados por este blog].
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