Os números da medicina que virou só negócio
Por Fernando Brito
"A médica Bruna Silveira, no blog Outras Palavras [de Braga, Portugal], resumiu em poucas linhas o drama da medicina brasileira, tomada por um sentido comercial chocante:
1. Há quatro vezes mais médicos no setor privado do que no setor público;
2. Dentre os 387.736 profissionais em atividade no país, 53,68% são especialistas e 46,32% não têm nenhum título de especialista (ou seja, são generalistas);
3. Os especialistas em "Atenção Primária à Saúde" (APS) correspondem a apenas 1,21% de todos os especialistas. Em número absoluto, são apenas 3.253 médicos com título em "Medicina de Família e Comunidade", enquanto, por exemplo, a (…)a Dermatologia (conta) com quase 6 mil e a Cirurgia Plástica com quase 5 mil.
Obvio que nada contra o médico ter atividades privadas, autônomas ou não, nem contra aqueles vocacionados para a cirurgia plástica, que é, aliás, importantíssima como meio de reparar lesões graves e terríveis sobre o ser humano e a outras que, embora menos sérias, causam pesados problemas a seus portadores.
Mas isso é um quadro intolerável em matéria do essencial na atividade médica, que é prover de bem-estar a vida humana, todas as vidas humanas.
É por isso que Bruna aponta a necessidade de políticas de direcionamento da atividade médica que a visão mercantilista de parte da corporação médica denuncia como “bolivarianismo”, embora o exemplo venha de um país como o Canadá:
“Enquanto em outros países os profissionais de saúde têm um comprometimento ético e social com as demandas da população e a saúde é realmente um direito e uma questão de seguridade social, no Brasil, a saúde é tratada como mercadoria e a profissão médica é tratada como um bom negócio. No Canadá, por exemplo, o governo regula as vagas de residência (especialização) médica de acordo com as necessidades da população e, portanto, quase metade dos médicos são especialistas em Atenção Primária à Saúde. No projeto inicial do Programa Mais Médicos, constava uma proposta de regulação das vagas de residência médica semelhante a do Canadá. Porém, essa proposta foi vetada por pressão da categoria médica e essa questão, que é de interesse social, continua reduzida às leis de mercado.”
Leis de mercado, bem entendido, com o vasto subsídio estatal fornecido à medicina privada pelos mecanismos de isenção sem limites que se concede às despesas médicas privadas.
É tão básico e evidente que os recursos públicos – inclusive os que não se recolhe, por isenções – devem se dirigir prioritariamente para a medicina de acesso universal e preventiva que só há uma razão para que isso não seja entendido pelo Brasil.
Ou talvez haja: é que ninguém o diz, nem faz.
Quando diz e faz, como no "Mais Médicos", mesmo com toda a grita corporativa, as explorações ideológicas e a campanha intensa da mídia, o povo entende e apóia."
FONTE: escrito por Fernando Brito em seu blog "Tijolaço" (http://tijolaco.com.br/blog/?p=28318).
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