sexta-feira, 1 de abril de 2011
O “ALFABETISMO FUNCIONAL”
“Apenas 27% da população entre 15 e 64 anos é plenamente alfabetizada, segundo o último “Indicador de Alfabetismo Funcional” (INAF), produzido pelo Instituto Paulo Montenegro, referente ao ano de 2009.
O levantamento aponta que 52% dos brasileiros que estudam até a 4ª série conseguem atingir, no máximo, o grau rudimentar de alfabetismo [ou “alfabetismo funcional”, ou “semialfabetismo”], onde estão classificadas pessoas com capacidade de ler e entender textos curtos, realizar operações de matemática simples, mas incapazes de fazer uma redação relatando como foi seu dia, ou de interpretar um artigo de jornal.
Entre os alunos do ensino médio, apenas 41% apresentaram o nível pleno de alfabetização. E, não que possa chamar mais atenção, 29% dos estudantes que ingressam no ensino superior não dominam leitura e escrita.
Na última década, o país praticamente universalizou o acesso ao ensino fundamental (98%) de jovens entre 7 e 14 anos, reduzindo a taxa de analfabetismo, conforme registro da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), de 11,5%, em 2004, para 9,7%, em 2009. A mesma pesquisa revela que a taxa de “alfabetismo funcional” diminuiu de 24%, em 2004, para 20% em 2009, na população de 15 anos ou mais de idade.
O coordenador-geral de alfabetização de jovens e adultos da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (SECAD), do Ministério da Educação, Mauro da Silva, explica que não há hoje no país uma ação específica para combater o “alfabetismo funcional”. Esse público acaba sendo atendido pelos cursos de atenção a jovens e adultos (EJA), no país como um todo.
O último levantamento do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) registrou queda de 5% nas matriculas de educação básica do EJA, de 2009 para 2010. As matrículas no último ano totalizaram 4.234.956, sendo 67% no ensino fundamental e 33% no ensino médio. O porta-voz do MEC, diz que o que tem sido feito de imediato para derrubar as taxas de “alfabetismo funcional”, bem como de “analfabetismo” no país, é a “Agenda Territorial de Desenvolvimento Integrado de Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos”, com estados e municípios, de forma a induzir a realização de pactos entre esses entes e a União. A ação foi lançada oficialmente em dezembro de 2008, e ainda está em fase de implementação.
Para a professora Onaide Schwartz Correa de Mendonça, coordenadora do curso de pedagogia da Universidade Estadual Paulista (UNESP), a estratégia para diminuir o índice de “alfabetismo funcional” é trabalhar leitura e conhecimentos específicos da alfabetização (o que são letras, como se combinam) insistentemente de forma a não deixar de lado o diálogo e leitura crítica da realidade do aluno, referindo-se a metodologia pregada pelo educador e filósofo Paulo Freire.
ESTRATÉGIA
Entretanto, a professora defende que, antes de combater o “alfabetismo funcional”, é preciso combater o “analfabetismo”. “Com a alfabetização de adultos acontece o mesmo processo que vem ocorrendo com a alfabetização infantil. Os materiais encaminhados para esses cursos são adequados apenas para quem já sabe ler e escrever, pois contém atividades que visam desenvolver habilidades de leitura escrita (o letramento)”, explica. A consequência disso é que o aluno não consegue aprender de modo geral e abandona o curso, uma vez que os conteúdos específicos para o aprendizado da língua não são bem trabalhados desde o início.
Onaide afirma que a maioria dos cursos de formação pedagógica no país não têm sequer uma disciplina que trate da alfabetização, e que um dos grandes problemas da educação brasileira está nas políticas públicas que não sabem orientar a alfabetização. Ela recomenda que os governantes prestem atenção nas grades curriculares dos cursos de formação de professores no país.
A condição econômica, assim como as salas de aula super lotadas, contribuem para o conjunto de fatores que prejudicam a alfabetização, principalmente nas escolas públicas. Ainda assim, o número de analfabetos no país poderia ser bem menor do que o registrado na PNAD 2009, de 14,1 milhões.
Em 2007, a professora realizou uma experiência pedagógica numa comunidade de cortadores de cana no interior de São Paulo, com alunos de 7 anos de idade. “Eu me desdobrava, mas, em meados de maio, 70% da sala já estava lendo e, no final do ano, todos estavam lendo e escrevendo. Frente ao fracasso da alfabetização de hoje, sou levada a acreditar que o maior problema seja o metodológico, ou menos, a ausência de metodologia e de conteúdo específico da alfabetização”, conta. Onaide defende o método de alfabetização sociolinguístico –“sócio” de socialização e conscientização por meio do diálogo, e “linguístico” por desenvolver conteúdos específicos de alfabetização.
O método viria para substituir o que tem sido utilizado nos livros de alfabetização do país, criados a partir da “má interpretação da teoria construtivista, Psicogênese da língua escrita”, que proporciona o letramento, ou seja, o uso da leitura da escrita. Mas se esquece da alfabetização de, simplesmente, ensinar crianças com se combinam consoantes e vogais na composição de sílabas.
ORIGEM DOS CONCEITOS “ANALFABETISMO” E “ALFABETISMO FUNCIONAL”
O termo “alfabetismo funcional” foi cunhado nos Estados Unidos na década de 30 e utilizado pelo exército norte-americano durante a Segunda Guerra, indicando a capacidade de [pelo menos] entender instruções escritas necessárias para a realização [por recrutas e soldados] de tarefas militares [mais simples] (Castells, Luke & MacLennan, 1986).
A partir de então, o termo passou a ser utilizado para designar a capacidade de utilizar a leitura e escrita para fins pragmáticos, em contextos cotidianos, domésticos ou de trabalho, muitas vezes colocado em contraposição a uma concepção mais tradicional e acadêmica, fortemente referida a práticas de leitura com fins estéticos e à erudição. Em alguns casos, o termo “alfabetismo funcional” foi utilizado também para designar um meio termo entre o “analfabetismo absoluto” e o domínio pleno e versátil da leitura e da escrita, ou um nível de habilidades restrito às tarefas mais rudimentares referentes à "sobrevivência" nas sociedades industriais.
A definição de alfabetização que a UNESCO propusera em 1958 fazia referência à capacidade de ler compreensivamente ou escrever um enunciado curto e simples relacionado à sua vida diária. Vinte anos depois, a mesma UNESCO proporia outra definição, qualificando a alfabetização de “funcional’ quando suficiente para que os indivíduos possam inserir-se adequadamente em seu meio, sendo capazes de desempenhar tarefas em que a leitura, a escrita e o cálculo são demandados para seu próprio desenvolvimento e para o desenvolvimento de sua comunidade.
O apelo do termo “alfabetismo funcional” nos fóruns internacionais pode ser atribuído a essa polissemia de sua definição (...) Para uns, a funcionalidade da alfabetização dizia respeito, principalmente, à formação de mão-de-obra apta a adaptar-se às exigências da modernização econômica; para outros, a funcionalidade deveria ser interpretada como adequação das iniciativas de alfabetização aos interesses da população pobre, oprimida ou marginalizada, devendo, nesse sentido, visar à transformação das estruturas políticas e econômicas e não à adaptação dos indivíduos a elas.”
FONTE: por Lilian Milena, da Agência Dinheiro Vivo, no Brasilianas.org, no blog de Luis Nassif (http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/o-combate-ao-alfabetismo-funcional#more) [trechos entre colchetes e imagem do Google adicionados por este blog].
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