Boicotem Eduardo Cunha
Por Alex Solnik, jornalista
"A imprensa não pode ser esquizofrênica. Não pode não acreditar no que ela própria afirma.
Não pode ter duas cabeças.
Por um lado, dá espaço a um farto noticiário com inúmeras provas de que Eduardo Cunha está se afogando num mar de lama suíço, o que lhe tira qualquer legitimidade para continuar à frente de um dos postos mais relevantes e influentes da vida brasileira e, por outro, continua tratando-o como legítimo presidente da Câmara dos Deputados.
Ou a imprensa corrobora o que escreve – e não condena Cunha só nas páginas, mas no corpo a corpo do dia a dia – ou abdica do direito de ser o quarto poder da República.
Não dá para conviver sem uma ponta de revolta e de mal-estar com cenas como as que vemos hoje. Abrimos o jornal e jorram depoimentos, extratos, recibos, passaportes, contas secretas milionárias de Cunha e, quando ligamos a TV, lá está o mesmo Cunha cercado de microfones fazendo o seu proselitismo da perseguição e dando continuidade aos desmentidos e às chantagens habituais.
Se houvesse mesmo algum traço de honestidade nas palavras de Cunha, ele deveria fazer o mesmo que Romário. Acusado por uma revista de manter conta secreta na Suíça, viajou até lá, foi ao banco e obteve uma certidão de que não tem dinheiro algum. Provou, assim, que seus extratos eram falsos. E vai ganhar uma bolada da revista, com certeza, como forma de indenização, além das desculpas que já obteve.
Por que Cunha não faz exatamente isso? E prova que os extratos atribuídos a ele são mentirosos? Porque tem medo de fazer uma viagem internacional, pode estar numa lista de procurados da Interpol, tal como Paulo Maluf e acabar surpreendido, como José Maria Marin, preso até hoje na Suíça.
E depois, ele, mais do que ninguém sabe que seus extratos são verdadeiros.
Os repórteres que estão lá no Salão Verde da Câmara dos Deputados esticando seus microfones para ouvir Cunha cumprem ordens e não têm autonomia para acatar a minha proposta. Mas deveriam ser orientados pelas chefias: não entrevistem Cunha; boicotem Cunha; fechem seus microfones; virem de costas para ele; não deem voz a quem não tem mais legitimidade; ele tem que se tocar de que seu poder se esvaiu; suas palavras não significam nada desde que divorciadas da verdade.
E, no entanto, por mais incrível que pareça, os microfones vão continuar lá, obedientes, à disposição de seus desmentidos e ansiosos por serem os primeiros a registrar o momento mais esperado por suas chefias, o de dizer sim ao impeachment.
É para isso que os microfones estão lá."
FONTE: escrito por Alex Solnik, jornalista. Já atuou em publicações como Jornal da Tarde, Istoé, Senhor, Careta, Interview e Manchete. É autor de treze livros, dentre os quais "Porque não deu certo", "O Cofre do Adhemar", "A guerra do apagão", "O domador de sonhos" e "Dragonfly" (lançamento janeiro 2016). Artigo publicado no portal "Brasil 247" (http://www.brasil247.com/pt/blog/alex_solnik/202792/Boicotem-Eduardo-Cunha.htm).
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