segunda-feira, 22 de março de 2010

TNP: "NÃO SÃO OS PAÍSES DESARMADOS QUE AMEAÇAM A PAZ"

ENTREVISTA COM O MINISTRO PINHEIRO GUIMARÃES (Secretaria de Assuntos Estratégicos)

"Pinheiro Guimarães: é ilógico dizer que desarmados ameaçam a paz


Ex-número 2 do Itamaraty e sucessor do ministro Mangabeira Unger na Secretaria de Assuntos Estratégicos, Samuel Pinheiro Guimarães ataca "potências nucleares que não cumprem o Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP)", mas exigem de países desarmados, como Brasil e Irã, "o estrito respeito de suas obrigações".

A dois meses de duas grandes cúpulas sobre a questão nuclear, uma em Washington, outra em Nova York, um dos ideólogos da política externa do governo Luiz Inácio Lula da Silva questionou a decisão brasileira de aderir ao TNP, em 1998. Em entrevista neste domingo (21) ao jornal O Estado de S.Paulo, ele também afirmou que nem um compromisso dos poderosos em reduzir significativamente seus arsenais poderá fazer o Brasil assinar o chamado "protocolo adicional" do tratado.

Guimarães coordena atualmente o esforço interministerial para conduzir o programa nuclear brasileiro. Tentando se esquivar de questões sobre política externa ("Não me ocupo mais disso"), o ministro deu sua opinião sobre a suposta "partidarização" do Itamaraty e negou acusações de envolvimento na crise hondurenha.

Por que o Brasil não assina o protocolo adicional do TNP?

O Brasil tem a sexta maior reserva de urânio do mundo e o conhecimento completo do ciclo de enriquecimento. Nossa Constituição obriga o uso de tecnologia nuclear somente para fins pacíficos e é preciso lembrar que o TNP, do qual somos signatários, tem duas partes. De um lado, o compromisso dos países nucleares de promover seu próprio desarmamento - e completo. De outro, países não nuclearmente armados se comprometem a não desenvolver a bomba, mas têm o direito a programas para fins pacíficos, incluindo com enriquecimento de urânio. A primeira parte do TNP não foi cumprida, mas os desenvolvidos exigem dos outros o cumprimento estrito de suas obrigações.

O presidente Barack Obama prometeu cortes drásticos nos arsenais americanos. EUA e Rússia estão prestes a concluir um acordo que substituirá o Start e terá reduções significativas, e nos próximos meses haverá duas cúpulas sobre o tema. Há sinais claros de desarmamento. Isso não pode mudar a posição brasileira?

Mas existe ainda outro problema, a da redução de ogivas e de aperfeiçoamento da letalidade do armamento. Deveríamos ter um protocolo adicional para países que continuam a desenvolver armamento nuclear e não cumprem suas obrigações. Quem não cumpre o TNP não tem moral para cobrar os outros. Sem contar que há países armados dos quais não se exige nada, muitos nem signatários do TNP são.

O sr. se refere a Israel?

Tire suas conclusões.

O sr. já escreveu que o "TNP é apresentado como uma vitória pacifista e progressista", mas na verdade trata-se de "uma violência unilateral". O sr. mantém essa visão?

Usei essa expressão "violência unilateral"? Estranho. De todo modo, o TNP visa impedir uma guerra nuclear, não apenas a "proliferação horizontal". Não se pode partir do princípio de que são os desarmados que ameaçam a paz internacional. Isso não é lógico.

O país aderiu ao pacto sob o governo de FHC. Foi um erro?

O Brasil, já em 1998, era um dos poucos que tinha em sua Constituição a obrigação de desenvolver atividades nucleares apenas para fins pacíficos. Só se justifica nossa participação no TNP na medida em que potências nucleares reduzam e eliminem arsenais.

Mas o sr. não se arriscaria a dizer que foi um erro assinar o tratado.

Não é que não me arriscaria. Mas é preciso observar a Constituição. E qualquer tratado em que o Brasil não esteja em igualdade de condições não corresponde ao princípio de igualdade soberana entre os Estados. O TNP é um tratado desigual.

Existe, então, a possibilidade de o Brasil denunciar o tratado?

De maneira nenhuma.

O sr. disse que quem não cumpre o TNP não tem "autoridade moral" para exigir dos outros. O presidente Lula usou uma expressão semelhante para se referir ao caso iraniano, disse que as potências "não têm superioridade moral para cobrar o Irã".

Eu concordo com o presidente. E lhe acrescento: antes da segunda guerra do Iraque (em 2003), foi propalado em todos os países que Bagdá tinha armas de destruição em massa e, por isso, seria uma ameaça internacional. Diziam que armas iraquianas destruiriam capitais europeias em segundos. O sr. Colin Powell (então secretário de Estado dos EUA) discursou com fotos no Conselho de Segurança da ONU. O Iraque foi invadido e não foi descoberta nenhuma arma de destruição em massa. Isso dá moral a alguém?

Mas o caso do Irã é muito distinto do iraquiano. Hoje sabe-se, por exemplo, que iranianos esconderam uma usina nuclear por anos na cidade de Qom. O sr. realmente acredita que Teerã negocia de boa-fé?

Não participamos diretamente das negociações. O Brasil acredita no diálogo e defende que o uso da força é improdutivo. Não podemos partir do princípio de que há países responsáveis e outros irresponsáveis. Mas não quero falar de política externa, quem se encarrega disso é o Ministério das Relações Exteriores.

Em 2001, o então chanceler Celso Lafer o destituiu do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais do Itamaraty depois que o sr. veio a público criticar a Alca. Como o sr. vê, hoje, esse episódio?

Cumpri o que achei que devia fazer. Julguei que se tratava de um momento de perigo à soberania brasileira. Por isso dei minha opinião.

Ao olhar para trás, o sr. acredita que essa posição foi correta?

Corretíssima. A adoção de um acordo como Alca - com tarifas a zero, impossibilidade de controle de fluxo de capitais, total abertura - teria levado, por exemplo, à privatização de todo sistema financeiro. Privatizariam o BNDES, Banco do Brasil, Petrobrás; instrumentos que foram de grande importância na crise financeira.

Há muitos anos, um sociólogo brasileiro disse: "o Brasil não é mais um país subdesenvolvido, é um país injusto." (A frase iniciava o plano de governo de FHC). Esse pensamento denota que podemos ter políticas econômicas de países desenvolvidos. Isso tem uma implicação horrível do ponto de vista de conhecimento da realidade.

A política externa está excessivamente partidarizada? Como o sr. vê, por exemplo, o fato de o chanceler Celso Amorim ter se filiado ao PT?

Outros chanceleres foram de partidos. Ou não? Nesse Ministério das Relações Exteriores, nenhum funcionário que exerceu cargos importantes em outros governos foi prejudicado. Basta ver onde estão servindo. Não houve perseguição.

Há ex-funcionários que fazem forte oposição, como o embaixador Rubens Barbosa.
Mas esses são aposentados. E têm todo direito de fazer oposição. Eu não tenho oposição à oposição (risos). Esse é um debate saudável e o fato de ele ter crescido reflete o próprio êxito da política externa. Não se discute tema desimportante.

O ex-chanceler mexicano Jorge Castañeda afirmou que foi o sr. quem arquitetou a volta do presidente deposto Manuel Zelaya a Honduras.

Não conheço o ex-chanceler. Nunca o vi na minha vida e não tenho a menor ideia de onde ele tirou isso. Se me lembro bem do texto, ele diz algo como "isso (a volta de Zelaya) é algo que só pode ter saído da cabeça de Pinheiro Guimarães".

E o sr. avalia que o retorno de Zelaya foi bom para Honduras?

Não falo de política externa."

FONTE: publicado hoje (22/03) no portal "Vermelho".

4 comentários:

Probus disse...

Oi Maria Tereza,

Não sei, mas, se tem um NACIONALISTA, aí está um: Samuel Pinheiro Guimarães

"Mas existe ainda outro problema, a da redução de ogivas e de aperfeiçoamento da letalidade do armamento. Deveríamos ter um protocolo adicional para países que continuam a desenvolver armamento nuclear e não cumprem suas obrigações. Quem não cumpre o TNP não tem moral para cobrar os outros. Sem contar que há países armados dos quais não se exige nada, muitos nem signatários do TNP são."

O sr. se refere a Israel?

"Tire suas conclusões."

Precisa dizer mais alguma coisa??

Unknown disse...

Prezado Eugênio,
Também tenho a mesma admiração pelo Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães. Li e recomendo a leitura de dois livros dele: "500 anos de periferia" e "Desafios brasileiros na era dos gigantes".
Maria Tereza

Probus disse...

Pois é Maria Tereza, a oposição ignorante não está nem aí com a IMPORTANTÍSSIMA Revisão da TNP em maio... e ELES vão vir com todas as pedras em cima do Lula e do Irã e vão se esquecer de Israel, Nagazaki e Argélia.

Só que o Lula não vai sozinho, o Samuel Guimarães, Leonam Guimarães, Celso Amorim e Nelson Jobim devem acompanhá-lo.

Yukiya Amano vai arregalar seus pequeninos olhos e o patrão dele, Obama-Boy, vai mudar de cor, tipo, Michael.

Probus disse...

Haaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa

Pinheiro Guimarães assegura que Rafale seria 'uma bela aventura'
56 minutos atrás
PARIS (AFP) - O secretário brasileiro de Assuntos Estratégicos, Samuel Pinheiro Guimarães, afirmou que o caça francês Rafale seria o ponto de partida de uma "bela aventura" para o Brasil e sua indústria de defesa, em uma entrevista que será publicada pela revista francesa Defense em sua edição de abril.

"Na medida em que determinadas partes serão produzidas no Brasil, o programa Rafale nos permite obter progressos substanciais nas áreas científica, tecnológica e comercial, sem contar com os benefícios em matéria de terceirização", ressaltou Pinheiro Guimarães.

O secretário brasileiro disse que "a opção do Rafale corresponde absolutamente" à "gestão" do vasto espaço aéreo brasileiro, nessa entrevista concedida à revista dos antigos editores do Instituto de Altos Estudos de Defesa Nacional (IHEDN, siglas em francês).

http://br.noticias.yahoo.com/s/afp/100324/mundo/fran__a_brasil_aeron__utica_ind__stria_defesa