Thomas Shannon
DILMA RECONHECE QUE EUA GERENCIAM MELHOR A CRISE
"Embaixador afirma que, apesar das críticas que dirigiu ao seu país, mandatária sabe que "resposta" americana é superior à de outros"
Por Eliane Cantanhêde, colunista tucana, na americanófila “Folha de São Paulo”
“O embaixador dos EUA em Brasília, Thomas Shannon, que participou dos encontros Dilma-Obama na semana passada, disse que os dois manifestaram preocupação com a crise europeia e seu efeito negativo sobre o crescimento da economia global.
Segundo ele, Barack Obama e Dilma Rousseff concordaram em que "há a avaliação de que a Europa tem de fazer mais para melhorar a capacidade de crescimento."
Shannon disse que a secretária de Estado, Hillary Clinton, discutirá Síria e Irã com o chanceler Antonio Patriota em Brasília (em 16 e 17/04) e que o Brasil terá papel na negociação com o Irã sobre o seu programa nuclear, retomada anteontem em Istambul.
Seguem os principais trechos da entrevista, concedida na embaixada, na sexta (13):
-Folha - O foco da visita de Dilma foi a economia?
Thomas Shannon - Um dos focos foi a economia, com o desejo de encontrar maneiras de aprofundar e melhorar as relações comerciais e de investimentos. O comércio bilateral está em US$ 74 bilhões, o mais alto da história dos dois países, e hoje o Brasil faz investimentos nos EUA em nível recorde. Mesmo assim, os dois presidentes reconhecem que podemos fazer mais.
-Em que áreas?
Especialmente em ciência, tecnologia e inovação, em produtos de valor agregado na área industrial.
-E quanto às críticas de Dilma ao protecionismo e à desvalorização do dólar?
Uma parte importante do nosso diálogo é a confiança de poder falar sobre as coisas que afetam os interesses nacionais. A presidente Dilma está preocupada não só com as políticas monetárias de vários países, mas com a falta de um vínculo entre elas, as políticas fiscais e as reformas estruturais. Dilma, porém, reconheceu que nos EUA há uma resposta às crises mais equilibrada do que em outras partes do mundo.
-Houve críticas à Europa?
Não uma crítica, mas uma preocupação. Há uma preocupação e uma avaliação de que a Europa tem de fazer mais para melhorar sua capacidade de crescimento.
-Quando George W. Bush veio ao Brasil, o foco foi etanol. E agora, o que pesou mais, biocombustíveis ou petróleo?
Os dois. Nossa relação na área de energia é diversificada, com interesse tanto na energia renovável, alternativa, como no pré-sal. O Brasil será fornecedor importante de gás e de petróleo. Esse papel será bom para o Brasil e bom para a economia global. Funcionará como estabilizador de preços no mercado energético.
-Algum avanço no plano conjunto para o etanol?
Os dois países trabalham em diferentes frentes. Primeiro, para fazer uma ‘commodity’ global de etanol. Segundo, para antecipar e avançar em ciência e tecnologia do etanol. Terceiro, para desenvolver trabalho conjunto em outros países, para que eles desenvolvam sua capacidade de produzir etanol. Isso é importante porque a demanda para o etanol será maior do que nossa capacidade de produção e fornecimento.
-Por que o comunicado conjunto da visita foi tão vazio e tão amorfo sobre a Síria?
Não foi vazio e amorfo... os dois presidentes lamentaram o abuso de direitos humanos no país, reconhecendo a importância de encontrar uma solução e abrir um espaço político para enfrentar os desacordos e as diferenças dentro da Síria. Brasil e EUA têm quase a mesma posição sobre Síria, apesar de, às vezes, expressarmos nossas posições com vocabulários diferentes.
-Em que Hillary e Patriota podem avançar quanto à Síria?
O importante agora é trabalhar dentro do Conselho de Segurança [da ONU] e ganhar o apoio do órgão para encontrar uma solução, aproveitando o trabalho da Liga Árabe e do secretário-geral da ONU.
-A solução é tirar Assad?
Eventualmente. É quase impossível, ou melhor, impossível imaginar que a solução na Síria inclua Assad.
-É aí que está a diferença da posição brasileira?
O Brasil insiste em que é o povo da Síria que tem de tomar essa decisão, mas, do nosso ponto de vista, a situação chegou a um ponto em que Assad pode até começar um processo de transição, mas não concluí-lo.
-O que Obama e Dilma conversaram sobre Irã?
Os dois presidentes falaram sobre a importância de encontrar uma solução diplomática para o Irã.
-Por que o Brasil foi excluído da nova rodada de negociações em Istambul?
Não é que foi excluído. Historicamente, o P5+1 [as cinco potências do Conselho de Segurança mais a Alemanha] é que assume a dianteira, mas claro que há espaço para o engajamento de outros países.
-Que papel? O que Hillary e Patriota podem acertar?
Vou deixar que eles mesmos falem sobre isso, mas há poucos países no mundo em que o Irã tem confiança, e o Brasil é um deles.
-Dilma fez gestão junto a Obama contra a suspensão da venda dos aviões Super Tucanos para a Defesa dos EUA?
O presidente Obama explicou que estamos num processo de aperfeiçoar o sistema de contratos da nossa Força Aérea e, no momento que abrirmos de novo esse contrato, a Embraer terá a oportunidade de participar mais uma vez.
-Sem compromisso?
É um processo competitivo de um contrato, mas a Embraer tem nossa confiança.
-Obama falou sobre a proposta da Boeing para vender 36 aviões de caça para a FAB?
Sim. A venda dos caças é importante para nós.
-Quais os próximos passos a partir da visita de Dilma?
A vinda da secretária Hillary será importante. Depois, virá o secretário de Defesa, Leon Panetta, para um novo diálogo nessa área.
-Em que direção?
Há a visão de um Brasil que está modernizando as Forças Armadas, especialmente na área de sistemas importantes, como submarinos, caças e capacidade de o Exército controlar as fronteiras. Há oportunidades na área comercial. O Brasil está assumindo papel importante na manutenção da paz. Isso aumenta o perfil das Forças Armadas do Brasil no palco global de maneira positiva.
-E na aviação civil?
A secretária Hillary e o ministro Patriota assinaram um acordo para os vários setores privados e sistemas públicos envolvidos em aviação articularem política de "open sky" [sem barreiras e limites para voos comerciais entre os dois países, numa espécie de competição livre entre o leão e o cordeiro, deixando reinar o vencedor].
-Quantos anos até o fim da exigência de vistos?
Não sei, mas não serão muitos anos, não.
-Qual o prazo para o início dos dois novos consulados, em Porto Alegre e em BH?
Acho que já em 2013.
-Dilma disse nos EUA que essa é a última Cúpula das Américas sem Cuba. Será?
É a nossa esperança. Uma Cuba democrática, entrando na OEA e na Cúpula das Américas, seria algo fantástico.
-Com ou sem os irmãos Castro?
Democrática, seja como for.
-A declaração de Dilma desejando sucesso a Obama foi encarada como manifestação de apoio à reeleição dele?
Eu deixo à presidente a resposta, mas ficou óbvio que os dois líderes têm excelente relação. Quando dois presidentes têm confiança, respeito e amizade, eles não querem perder essa relação.
-Obama virá à Rio+20?
Vamos ter uma delegação de alto nível aqui.
-Obama apoiou a Índia no Conselho de Segurança, mas continua em cima do muro quanto ao Brasil. O que falta?
O problema da reforma não são os EUA, que são um aliado do Brasil nessa questão. O problema são países que não querem a reforma, alguns deles membros dos BRICS que o Brasil conhece bem.”
NOME: Thomas A. Shannon Jr. ;
FORMAÇÃO: Filosofia no College of William and Mary, na Virgínia (EUA), com mestrado e doutorado em política em Oxford (Reino Unido) ;
CARREIRA: Embaixador dos EUA no Brasil desde 2010; já havia trabalhado como assistente especial na embaixada, em Brasília, de 1989 a 1992. Foi secretário-assistente para Assuntos do Hemisfério Ocidental nas gestões de George W. Bush (2001-2009) e Barack Obama.”
FONTE: entrevista conduzida pela colunista tucana Eliane Cantanhêde, na americanófila “Folha de São Paulo” (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/37421-dilma-reconhece-que-eua-gerenciam-melhor-a-crise.shtml ) [Imagem do Google e trecho entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’]
Nenhum comentário:
Postar um comentário