domingo, 6 de maio de 2012

Neste domingo: “ROLOU A CABEÇA DO REI SARKÔ!”

Sarkozy - Hollande

Por Pepe Escobar, no “Asia Times Online” , no “The Roving Eye blog” sob o título “Off with King Sarko’s head”. Artigo traduzido pelo “pessoal da Vila Vudu”; postado no blog "Redecastorphoto"

Pepe Escobar

“O homem fez pose de fenomenal grandeur, como neoimperial Libertador da Líbia – poucos anos depois de o coronel Colonel Muammar Gaddafi ter ajudado a financiar sua campanha eleitoral, com nada menos que límpidos 65 milhões de dólares.

Servindo-se de um misterioso pacto entre o Espírito Santo e uma camareira africana em “New York”, ele livrou-se do adversário que já o desafiava e muito provavelmente o derrotaria na reeleição, o ex-diretor-geral do Fundo Monetário Internacional, Dominique Strauss-Khan, libertino assumido.

E mesmo assim, os franceses, neste domingo – nova tomada da Bastilha em estilo Facebook remix – lá estarão, aos gritos de “cortem a cabeça dele!”.

Por quê? Pela arrogância. Pela húbris. O presidente francês Nicolas Sarkozy, também conhecido como Rei Sarkô, o Neonapoleônico; ex-rei do chacoalhar de correntes de ouro e diamantes de pescoço [bling bling]; “Chuchu” para a primeira dama, a italiana Carla Bruni [1], é o pior inimigo dele mesmo.

ESTILO RITZ DE VIVER

Bashir Saleh é ex-chefe de gabinete de Gaddafi e ex-presidente do Fundo Soberano Líbio. Foi o encarregado de ir e vir, quando Gaddafi decidiu financiar a campanha eleitoral de Sarkozy, em 2007.

Rei Sarkô

O Rei Sarkô, como seria de prever, negou tudo e disse que processaria “Mediapart”, website francês que revelou o que, para muitos, nem foi novidade. Seja como for, na 5ª-feira, 3 de abril, o ex-primeiro-ministro líbio Baghdadi Ali al-Mahmoudi confirmou tudo, outra vez. E disse exatamente o que o filho de Gaddafi e ex-aluno de prestígio da “London School of Economics”, Saif al-Islam, já dissera antes, em março de 2011: “Sarkozy que devolva todo o dinheiro que aceitou da Líbia, para pagar sua campanha presidencial.”

Saleh está na lista de procurados da Interpol, mas permanece na França, autorizado pelo regime “rebelde” da OTAN na Líbia, o qual, simultaneamente, também diz estar à procura dele. Guarda com ele confortáveis US$ 5,2 milhões, bem próximo da fronteira suíça, com vista para o Mont Blanc.

Tudo isso protegido pela polícia do Rei Sarkô, que disse que o negócio todo é feito com “pleno conhecimento e acordo do presidente [do Conselho Líbio de Transição] Abdel Jalil”. A vida é bela. Essa semana, Saleh foi visto badalando no Ritz, em Paris [2].

MEU VOTO É DA CARLA

A campanha presidencial na França passou hoje pelo proverbial anticlímax, depois de debate de quase três horas de duração entre o Rei Sarkô e o desafiante, François Hollande, do Partido Socialista. Consumiram-se trilhões de bytes nas telinhas, para descrever o debate como essencialmente “tenso”. Sem nocaute. Sarkô mexeu-se mais que coelho movido a pilhas alcalinas, enquanto Hollande – carismático como linguiça seca – mostrou-se, de fato, sólido e relativamente preciso.

A mentira rolou solta. Sarkô defendeu um seu recorde de empregos criados. Em abril de 2007, prometia 5% de desemprego ao final de cinco anos de governo. A França já chegou aos 9,4% de desempregados na população urbana ativa. Depois de cinco anos de Sarkô, há hoje um milhão de franceses desempregados a mais.

Como a broinha que completa o café, o centrista Francois Bayrou – que recebeu 9,1% dos votos no primeiro turno – manifestou sua repulsa pelo que fez a campanha de Sarkô, que tentou seduzir a extrema direita; e anunciou que votará em Hollande.

Vale lembrar que nada menos que 33% dos franceses mantiveram-se longe das urnas no primeiro turno; preferiram concentrar-se nas ramificações geopolíticas da franja de Carla Bruni, visão absoluta de top model [3].

Carla Bruni

Realmente vitoriosa no primeiro turno – embora opere como míssil político Hellfire tóxico, sem tirar nem por – foi a extrema direita francesa, com a Frente Nacional (18% dos votos) “normalizada” por Marine Le Pen, empresária espertíssima e filha do fundador do partido e conhecido fascista Jean-Marie Le Pen.

O crescimento da influência da Frente Nacional desde os anos 1980s em todos os círculos da extrema direita europeia é simplesmente espantoso. O câncer espalhou-se por toda parte, da França à Itália, Grã-Bretanha, Bélgica, Países Baixos (Holanda), Áustria, Hungria, Suécia, Dinamarca, Finlândia e até Grécia.

A xenofobia e a islamofobia estão vivas e fortes, por toda uma Europa paralisada de medo, afundada em crise. Na Áustria, a extrema direita, depois de anos de liderança do carismático Jorg Haider, já está hoje completamente normalizada e legitimada.

Geert Wilders

Nos Países Baixos, liderado pelo hiper-islamófobo Geert Wilders, o PVV (Partij voor de Vrijheid, Partido pela Liberdade) obteve 24% dos votos nas eleições de 2010 e fez parte da coalizão conservadora no poder, a qual acabou por rachar por causa, mais uma vez, de Wilders.

Na Escandinávia, a extrema direita é rampante; na Suécia, por exemplo, os Democratas Suecos (belo toque orwelliano), pela primeira vez puseram os pés no Parlamento.

Quem faça campanha a favor da extrema direita na Europa praticamente jamais erra; basta por-se contra a globalização e os imigrantes “marrons” e “pretos”; denunciar elites corruptas; demonizar o Islã; alertar sobre os perigos que ameaçam a identidade nacional, por culpa do multiculturalismo; e, essencialmente, apresentar-se como “contra o sistema”. É como se o espectro da Alemanha Nazista flutuasse nos céus, do sul da França às montanhas dos Cárpatos.

Não surpreende que, se um partido de extrema direita tem 15% dos votos dos franceses, os partidos conservadores ponham-se a abraçar as políticas de direita. Foi exatamente o que fez o Rei Sarkô; perdido o primeiro turno, ele logo declarou que Marine Le Pen era “compatível com a República”. Pouco funcionou – porque milhões de eleitores alimentavam neles mesmos, de fato, outra espécie de fúria: a própria eurofobia.

EURÓFOBOS, UNI-VOS

Merkozy

A crise da eurozona, países falidos, ortodoxia de “austeridade” por todos os lados, desemprego, a mão de ferro das agências de avaliação de riscos e dos tecnocratas do orçamento, e horror econômico generalizado; milhões de franceses, como outros europeus, culpam Bruxelas. E acontece que o Rei Sarkô é parte dessa mesma elite odiada – vale 50% do par “Merkozy” (com a chanceler alemã Angela Merkel) que, em teoria, está tentando “salvar” a Europa.

Assim, um problema extra para o rei Sarkô do chacoalhar de correntes de ouro e diamantes de pescoço [bling bling] é que ele não é nem jamais foi capaz de vender qualquer projeto político, cultural e social, uma visão sua para a Europa. Ou, que fosse, apontar algum modo de recriar alguma Europa pós-crise (supondo-se que a atual crise suma logo, o que não acontecerá).

Hollande é um pepino frio e tudo que diz talvez seja mesmo “superado” – acusações que ouviu do Rei Sarkô e de "The Economist"-; mas, pelo menos, o retorno dos socialistas ao poder na França tem alguma chance de sacudir o tabuleiro trôpego.

A União Europeia terá forçosamente de reexaminar o eixo franco-germânico nesse momento “pós-Merkozy”; esse, afinal, é o eixo que realmente governa a Europa. Já se fala muito, em Paris e Berlim, sobre “continuidade”. Aconteceu também antes, entre Giscard d'Estaing e Helmut Schmidt, e entre Francois Mitterrand e Helmut Kohl.

Mas a verdadeira incógnita é o que algum governo de Hollande conseguirá fazer a favor de uma Europa mais social e mais igualitária. The Economist – quer dizer, os interesses financeiros da City de Londres – já lamenta o destino do Rei Sarkô, que tentava “salvar” não só a França mas também a Europa. Bobagens.

Bye bye, Rei Sarkô – e já vai tarde!”

NOTAS DOS TRADUTORES:

[1] 14/8/2009, Pepe Escobar, “Jihad bling bling”, Asia Times Online, em inglês.
[2] 2/5/2012, Paris Match, “La drôle de fuite de Bachir Saleh” [O estranho desaparecimento de Bachir Saleh], em francês.
[3] 2/5/2012, Repubblica, “Carla Bruni, nuovo look com la frangetta” [Carla Bruni, novo look com a franginha'], em italiano.

FONTE: escrito por Pepe Escobar, no “Asia Times Online” , “The Roving Eye blog”, sob o título “Off with King Sarko’s head”. Artigo traduzido pelo “pessoal da Vila Vudu”. Postado por Castor Filho no blog “Redecastorphoto”  (http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2012/05/pepe-escobar-e-rola-cabeca-do-rei-sarko.html). [Tempo verbal do título modificado por este blog 'democracia&política'].

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ATUALIZAÇÃO (FONTE: do portal UOL; adicionada por este blog ‘democracia&política’:

SARKOZY RECONHECE DERROTA E FRANÇOIS HOLLANDE COMO NOVO PRESIDENTE DA FRANÇA

François Hollande
Do UOL, em São Paulo

“O atual presidente da França, Nicolas Sarkozy, adiantou seu discurso inicialmente previsto para as 21h30 (16h30 no horário de Brasília) deste domingo e reconheceu a derrota no segundo turno das eleições presidenciais para o rival, o socialista François Hollande.

A França tem um novo presidente e nós temos que respeitar”, disse ele, aplaudido pelos eleitores. "Estou prestes a me tornar um francês entre os franceses", declarou.

No discurso, Sarkozy disse que assumia a responsabilidade pela derrota e também agradeceu a oportunidade de ser presidente durante cinco anos, e deixa o cargo como o segundo presidente a não conseguir se reeleger no país nos últimos 30 anos. Além disso, ele torna-se o 11º líder a perder o poder depois da crise econômica na Europa

Sarkozy disse ter ligado para Hollande e desejado sorte no seu primeiro mandato como presidente. "Uma nova era começa na França. (...) E vocês podem contar comigo para defender seus ideais", disse ele no discurso.

Após o fechamento dos colégios eleitorais, às 20h (15h no horário de Brasília), diferentes institutos confirmavam a vitória de Hollande. Segundo o instituto CSA, o socialista obteve 51,8% dos votos, para o Ipsos 51,9% dos votos e para o TNS Sofres, 52%. Na capital francesa, partidários do socialista já comemoram a vitória, ainda não oficializada.

Com a confirmação da vitória, Hollande será o segundo presidente socialista eleito no país e traz a esquerda de volta ao poder após um hiato de 17 anos. Antes dele, o primeiro socialista eleito presidente foi o francês François Mitterrand.

Dados preliminares do Ministério do Interior francês mostram que 71,96% dos eleitores registrados votaram até as 17h na França (meio-dia no horário de Brasília). A participação dos votantes no segundo turno está um pouco acima do comparecimento do primeiro turno, que fora de cerca de 70,59% até as 17h de 22 de abril.”
 
FONTE DA ATUALIZAÇÃO: portal UOL (http://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2012/05/06/sarkozy-reconhece-derrota-e-francois-hollande-como-novo-presidente-da-franca.htm) [Imagem do blog do Noblat]

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