sexta-feira, 26 de setembro de 2014

RECADO AOS MESTRES DE MARINA: "SOMOS POBRES, PORÉM LIMPINHOS"





Hidroeletricidade em países tropicais, somos pobres porém...

Por Rogério Maestri

Somos pobres, porém limpinhos.

"Este nome "fonte alternativa de energia" não é por nada que é chamada "alternativa" porque é utilizada em países que NÃO TÊM MAIS OUTRAS FONTES. Tanto a Europa como os USA já barraram e construíram hidrelétricas em todos os locais que era possível, mas a América do Sul, a África e a Ásia não.

Na Europa, se procurarmos dados por países que geram energia renovável, veremos a Noruega em destaque, e num destaque muito semelhante ao que o Brasil pode atingir, eles têm o petróleo do Mar do Norte que eles estão utilizando para alavancar a economia de seu país; mas para a geração de energia utilizam a Hidroeletricidade e são elogiados por todos os VERDES do mundo. 


Quando se trata do Brasil, esses VERDES acham que a hidroeletricidade do Brasil e dos demais países periféricos é SUJA...

Os pretextos são vários. Primeiro, pelos habitantes das margens dos rios, esses geralmente estão em encostas íngremes, fazendo uma agricultura de queimada e de sobrevivência e passando fome e miséria. Realocá-los para regiões planas onde poderiam fazer uma agricultura familiar com condições de ter uma produtividade que lhes dê vida digna pode ser colocado no custo da hidroelétrica. Qualquer um sabe que fazer agricultura orgânica ou industrial em terrenos planos com infraestrutura é dezenas de vezes menos custoso para o agricultor, custoso em termos ENERGÉTICOS em termos humanos.

Como o fator ribeirinho pode ser resolvido com a melhoria de vida dos mesmos, partiram os VERDES brasileiros a contestar as hidrelétricas em termos ambientais. As grandes hidrelétricas geralmente são colocadas como reservatório de acumulação na cabeceira dos rios, regiões essas que já estão degradadas em termos de flora e fauna. Logo, por aí, não há como fazer oposição; logo sobram os famosos gases de efeito estufa.

Há um pesquisador que escreve artigos e artigos sobre a inconveniência das Hidrelétricas nos países tropicais. Ele chega a dizer que elas geram mais CO2 que uma termoelétrica a carvão. Para afirmar isso, ele utiliza dados de duas barragens, a barragem de Petit Saut (que escrevi o nome errado no artigo inicial!) que apesar de sua implantação apresentar problemas típicos de um projeto com erro, as afirmações desse autor que esse tipo de barragem é pior do que geração termelétrica não procedem.

Em um trabalho de 2001 feito exatamente para verificar esse caso problemático, “Emissions of greenhouse gases from the tropical hydroelectric reservoir of Petit Saut (French Guiana) compared with emissions from thermal alternatives”, se mostra uma curva de decaimento da geração de gases pelo reservatório e que, mesmo para esse caso problemático, a comparação entre a geração térmica e a hídrica é favorável à hídrica em longo prazo (o que interessa para as gerações futuras, como se coloca em todas as definições de desenvolvimento sustentável).

A figura 1 do trabalho mostra o decaimento da emissão de gases de efeito estufa no caso do aproveitamento de Petit Saut:

 

Emissions of greenhouse gases from the tropical hydroelectric reservoir of Petit Saut (French Guiana) compared with emissions from thermal alternatives

Para mostrar a comparação entre aproveitamentos hidrelétricos com outras fontes de energia, os autores traçam um gráfico de geração acumulada de gases de efeito estufa da usina de Petit Saut com o tempo, comparando-o com energias fósseis.


Emissions of greenhouse gases from the tropical hydroelectric reservoir of Petit Saut (French Guiana) compared with emissions from thermal alternatives

Apesar de, em longo prazo, o aproveitamento de Petit Saut ser melhor do que qualquer tipo de geração térmica, eles mostram na Tabela 1 uma das origens do problema tanto de Petit Saut como de Balbina no Brasil: a fraca relação entre potência gerada e área inundada. Esse é um dos problemas de aproveitamentos como os dois citados e junto com esses há mais uma série de outros que já são identificados e eliminados pelos projetistas nos dias atuais.

Como se pode ver, aproveitamentos como o de Belo Monte, que tem uma potência instalada de 11.233 MW para uma área de reservatório de 516 km², a relação P/S fica em 21,7 ou seja 207 maior do que Balbina e 69 maior do que Petit Saut (sem considerar que a maior parte desses 516km² já eram rio!).

Além desses fatores, ainda deve-se levar em conta, por exemplo, o tempo de retenção da água na barragem, o tipo de captação, e outros fatores, todos estes mais favoráveis a aproveitamentos com melhor projeto que Balbina e Petit Saut.

Ainda falando sobre os detratores da geração Hidrelétrica, esses usam para os seus cálculos um simples escalamento de geração de gases de efeito estufa, ou seja, pegam valores de geração de gases de efeito estufa unitários numa usina tipo Balbina e Petit Saut e simplesmente multiplicam pela a área de diferentes aproveitamentos. Esse tipo de raciocínio ignora totalmente a especificidade de cada aproveitamento (como a capacidade das equipes técnicas acharem as melhores soluções).

Uma boa crítica ao emprego de um simples escalamento de um ou dois reservatórios para centenas de diferentes características pode ser lida em “Challenges and solutions for assessing the impact of freshwater reservoirs on natural GHG emissions” ou em “GHG emissions from hydroelectric reservoirs in tropical and equatorial regions: Review of 20 years of CH4 emission measurements”, e a grande conclusão que esses autores chegam é que, até a data do trabalhos, não haviam dados conclusivos sobre o assunto, excetuando-se a barragem de Petit Saut, já citada.

Pela total falta de dados conclusivos, foi feita uma campanha de campo de mais de 2 anos com um grupo de 108 pesquisadores brasileiros que levantaram os dados que mostram que, realmente, a emissão de gases de efeito estufa nas nossas barragens próximas aos trópicos são tão limpas ou em alguns casos até mais limpas do que as congêneres de clima frio.

Em resumo, podemos construir a nossa independência energética através da hidroeletricidade, pois como diz o ditado: "Somos pobres, porém limpinhos".

REFERÊNCIAS:

---DELMAS, R., GALY-LACAUX C. RICHARD, S.. 2001. “Emissions of greenhouse gases from the tropical hydroelectric reservoir of Petit Saut (French Guiana) compared with emissions from thermal alternatives” . Global Biogeochemical cycles, Vol. 15, n4, 993-1003, December 2001
---DEMARTY, M. & BASTIEN, J.. 2011. "GHG emissions from hydroelectric reservoirs in tropical and equatorial regions: Review of 20 years of CH4 emission measurements". Energy Policy, Vol. 39, Issue 7, July 2011, 4197-4206.
---GOLDENFUM, J.A. 2012. "Challenges and solutions for assessing the impact of freshwater reservoirs on natural GHG emissions. Ecohydrology & Hydrobiology", Vol 12, Issue 2, 2012, 115-122

FONTE: escrito por Rogério Maestri e publicado no "Jornal GGN" (http://jornalggn.com.br/fora-pauta/hidroeletricidade-em-paises-tropicais-somos-pobres-porem).

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