terça-feira, 14 de dezembro de 2010
OS ECONOMISTAS NEOLIBERAIS, NOVOS CRIMINOSOS DE GUERRA
“O escritor marxista colombiano Renán Veja Cantor (historiador e professor da Universidade Pedagógica Nacional, em Bogotá) é autor de candente avaliação dos ideólogos do neoliberalismo, que se ocultam sob títulos acadêmicos para planejar e legitimar crimes contra os povos.
Trata-se do livro “Os economistas neoliberais - novos criminosos de guerra: o genocídio econômico e social do capitalismo contemporâneo” (Bogotá, Centro Bolivariano, 2005).
O texto a seguir é a apresentação do livro, cujo título é “Economistas ou criminosos”:
ECONOMISTAS OU CRIMINOSOS
Por Renan Vega Cantor
“Você deve chamar por seu nome a tudo o que vê e nunca ignorar as consequências. Esta é a única maneira de enfrentar a barbárie.
Esta é uma análise dos economistas neoliberais, mas não pretende ser um livro de economia no sentido convencional da palavra, isto é, carregado de números, equações, modelos e gráficos, instrumentos que, no caso do economista ortodoxo, são usados nem tanto para esclarecer seu pensamento senão, mas ocultar sua ignorância. Esse tipo de escritura dos economistas se transforma, em grande medida, em barreira para o conhecimento dos problemas econômicos e sociais do mundo e em mecanismo de desmobilização política das pessoas comuns.
Não tem nenhum sentido escrever para os economistas, pois já inúmeros deles se escrevem entre si e para si mesmos, porque isso significa usar uma linguagem hermética e incompreensível, distante das expectativas imediatas dos seres humanos. Somente o conhecimento acadêmico é gerado por essa terrível mania de dirigir-se de maneira exclusiva aos “membros da tribo”, sem que se façam o mínimo esforço de comunicar-se com o resto dos mortais, com aqueles que não têm as credenciais de “especialistas”, o que limita o conhecimento e a amplitude intelectual.
Como bem disse Günther Anders sobre o tema da filosofia: “escrever textos sobre moral que só podem ser lidos e compreendidos por colegas universitários me parece sem sentido. Algo cômico, se não inclusive imoral. Tão carente de sentido como um se um padeiro fizesse seus pães apenas para outros padeiros”. Seguindo tão sábio conselho, este livro não tem como destinatário principal nem exclusivo os economistas nem foi escrito a partir da lógica convencional da economia, cada vez mais distante do mundo real e dos problemas dos homens e mulheres de carne e osso.
Quando aqui se fala de economistas neoliberais não se considera apenas os detentores de títulos de economia, mas a todos os neoliberais – sejam eles de qualquer profissão ou disciplina do conhecimento - porque têm assumido como sua a lógica estreita e mecânica da ortodoxia da “economia de mercado”, ou seja, a vulgata neoliberal.
Tal vulgata é repetida como uma litania por advogados, pedagogos, sociólogos, historiadores, pesquisadores e técnicos quando pretendem explicar o funcionamento das diversas instâncias da sociedade. Por essa razão, os postulados básicos de todos os neoliberais se subordinam à “racionalidade” dos economistas, a partir da qual podem ser analisadas suas políticas criminosas nos mais diversos terrenos da realidade social.
Os economistas liberais são a pedra angular para entender os crimes econômicos de nosso tempo, porque, como já anunciou a revista Business Week, em março de 1977, vendem suas habilidades profissionais, “seus contatos, sua destrezas, e, na opinião de alguns, até sua alma, no tenebroso mundo da política de Washington”. Como parte de suas habilidades de negociantes se destaca a abertura de cátedras de “livre empresa” em universidades de todo o mundo com o objetivo manifesto de expandir a ideologia capitalismo, que converteu ao fundamentalismo neoliberal indivíduos e grupos procedentes de várias profissões e de diferentes origens intelectuais e políticas, universalizando os crimes econômicos e sociais.
Durante a pesquisa, foi se reafirmando a estreita relação entre neoliberalismo e capitalismo, porque aqui se enfatiza que não é possível separá-los e pensar que o neoliberalismo seja uma negação do “capitalismo civilizado” existente faz algumas décadas em sua versão social-democrática. Esse tipo de análise pode ser antineoliberal, mas não é anticapitalista, supondo que se possa chegar a um capitalismo social sem os incômodos “extremismos” dos “fundamentalistas de mercado”.
Ao contrário, ao longo destas páginas mostramos que existe um vínculo indissociável entre capitalismo e neoliberalismo e, portanto, é óbvio que a criminalidade destes últimos não pode ser entendida sem que se faça referência à barbárie capitalista. Por isto o subtítulo desta obra é “O genocídio econômico e social do capitalismo contemporâneo”.
A criminalidade neoliberal tem estendido as redes delinquentes do capitalismo até níveis impensáveis há algumas décadas. No mundo atual, os neoliberais desempenham o mesmo papel genocida que antigamente desempenharam a Igreja católica e os missionários, os piratas e aventureiros, os negreiros e os colonizadores. Embora todos eles continuem atuando de forma criminosa no capitalismo contemporâneo, subordinaram-se à lógica do neoliberalismo, cobrindo-se com o novo manto delinquente que agora os envolve a todos.
Com o neoliberalismo, o capital ampliou o caráter criminoso de sua estrutura a todo o mundo e aos mais diferentes aspectos da vida social e natural, o que pode ser constatado em diferentes âmbitos: o mundo do trabalho, a educação, o meio ambiente, a biotecnologia, o sistema de saúde, as migrações internacionais, a alimentação e a água.
O capitalismo converte a tudo o que encontra em seu caminho em mercadoria, destruindo sociedades, cultural, economias, tradições e costumes, deixando em sua passagem morte e desolação. Isso se evidencia com a mercantilização da natureza, dos genes, dos órgãos humanos, das crianças e das mulheres... E o neoliberalismo se converteu no legitimador “teórico” e ideológico da brutal conversão de todos os valores de uso em vulgares mercadorias , com suas devastadoras consequências sobre os seres vivos.
Nestes momentos estamos suportando um impiedoso genocídio que pode ser corroborado com números eloquentes sobre a pobreza e a riqueza, sobre fome e obesidade, sobre sede e águas residuais, sobre analfabetismo e fastio informativo, sobre a exploração do trabalho e os fabulosos lucros dos empresários capitalistas... Este panorama de antagonismos se sustenta na exploração intensiva de milhões de seres humanos e na destruição acelerada dos ecossistemas.
O conjunto desse duplo processo destrutivo explica a amplitude e a variedade dos crimes do capitalismo e o papel que desempenham os neoliberais, como legitimadores ideológicos de tal projeto genocida, mas também como partícipes diretos e responsáveis nessa guerra contra o s pobres do mundo.
Nesta pesquisa quisemos mostrar tanto a responsabilidade do sistema capitalista como dos economistas neoliberais na perpetuação dos crimes de muito diversa natureza, ressaltando que muitos dos delinquentes, com brilhantes títulos de Doutores em Economia de prestigiosas universidades norte-americanas, planejam o assassinato em massa de milhões de seres humanos a partir de suas cômodas cadeiras de burocratas em seus tecnologicamente avançados escritórios do Banco Mundial, do Fundo Monetário Internacional ou das instituições econômicas de cada nação.
Esses assassinatos se materializam na prática cotidiana quando são aplicadas as Armas Econômicas de Destruição em Massa, como os Planos de Ajuste Estrutural, contra povos inteiros. E, como sempre acontece com os delinquentes, que justificam seus crimes com argúcias, no caso dos economistas com sofismas sobre modernização, crescimento econômico, êxito exportador, eficiência, eficácia, qualidade, transparência... e mil falácias desse tipo. Se houver dúvidas, recorde-se o que ocorreu com Argentina, Bolívia, Colômbia, Nicarágua, Rússia, Gana, Zâmbia e outros 100 países devastados por projetos neoliberais.
É bom recordar que são tão criminosos os que apertam o gatilho para matar suas vítimas como os que selecionam e planejam a forma de executá-las. Isto, aplicado à economia capitalista contemporânea, significa que os assassinos não são somente os políticos que implementam os Planos de Ajuste Estrutural ou privatizam as empresas de serviço público ou assinam os Tratados de Livre Comércio para entregar ao capital imperialista os recursos de um pais. Atrás deles estão os criminosos de colarinho branco que, com sevícia, preparam os assaltos e roubos do patrimônio dos povos, o roubo de seus recursos naturais e matérias primas e a eliminação dos sindicatos e representantes dos trabalhadores. Como escreveu Bertolt Brecht em seu célebre poema “Muitas maneiras matar”:
“Há muitas maneiras de matar;
Podem enfiar uma faca na tua barriga
Tirar-lhe o pão
Não tratar de uma doença
Enfiá-lo em uma casa insalubre
Empurrá-lo ao suicídio
Torturá-lo até à morte pelo trabalho
Levá-lo à guerra, etcétera
Só algumas destas coisas são proibidas em nosso estado”
Ao mesmo tempo, os economistas neoliberais pretendem apresentar-se como novos oráculos dotados de poderes divinos para interpretar as “objetivas” e impessoais forças do mercado, em nome das quais perpetram todos seus crimes, da mesma maneira que todos os ideólogos dos impérios coloniais sempre justificaram seus delitos em nome de uma razão suprema (como as pretensas raças superiores, a civilização ou o progresso).
Agora, a “mão invisível” do mercado guia os seres humanos pelo caminho da prosperidade e os únicos que podem interpretar de maneira correta os signos cabalísticos dessa força suprema são os neoliberais, o que também, nos asseguram, é uma expressão da superioridade moral do capitalismo. Trata-se da “grande moralidade” que o capitalismo demonstrou através da história, escravizando seres humanos, assassinando crianças, exterminando indígenas, colonizando povos... como tem demonstrado nos últimos anos, com os milhões de vítimas que produz em todos os rincões da Terra!
A partir dos dogmas do “livre mercado”, que fundamentam o pressuposto da globalização como realidade irreversível – uma espécie de “lei de gravidade social” - os neoliberais justificam suas ações criminosas e sua impunidade, e responsabilizam as próprias vítimas, às quais apontam o dedo acusador por não terem sido capazes de adequar-se às sacrossantas leis da competitividade e do êxito. A vulgata neoliberal sustenta que o homem é egoísta por natureza, que o mercado é uma condição natural dos seres humanos, que a competição premia os vencedores e castiga os perdedores, que tanto na sociedade como na selva sobrevivem os mais aptos, e estes são os melhores... Todas estas mentiras, cuidadosamente elaboradas pelos meios de comunicação, imprensa, revistas, livros e universidades, são apresentadas como a verdade revelada ante a qual é preciso submeter-se ou perecer.
Por sorte, o novo sentido comum de tipo criminoso que o neoliberalismo tratou de impor nas últimas décadas, e cujos ideólogos mais visíveis são os economistas, está repleto de contradições insolúveis porque não pode combinar as promessas de riqueza e prosperidade com as quais apresenta suas receitas mágicas, com a dura realidade da miséria, o desemprego e a desigualdade, nem sua distopia de um crescimento infinito com os limites naturais da terra.
Por isso, até na tão elogiada União Europeia, apresentada como paradigma de uma pretensa integração neoliberal exitosa, e que hoje faz água por todos os lados, se levantam as vozes de repulsa e de protesto, que se somam a todas as dos povos do mundo periférico, como nós, e a de todos aqueles que durante muitos anos temos combatido o capitalismo e, desde nosso modesto lugar como trabalhadores do pensamento, temos promovido um combate aberto contra as falácias criminosas dos elogiados heróis do mercado total, os neoliberais, apoiando-nos na sábia definição de José Martí, quando dizia: “Os que lutam pela ambição, por fazer escravos a outros povos, por ter maior domínio, para roubar a terra de outros povos, não são heróis, mas criminosos”. Por sua vez, em nosso caso pessoal, se afronta este combate teórico e político, plenamente convencido de que, para dizê-lo com palavras do José Gervasio Artigas (líder da independência do Uruguai), ‘com a verdade, não ofendo nem temo’.”
FONTE: texto do escritor colombiano Renán Veja Cantor (historiador e professor da Universidade Pedagógica Nacional, em Bogotá). Publicado no portal “Vermelho” (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=143541&id_secao=2) [Imagem obtida no Google e adicionada por este blog].
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