Submarino Classe Scorpène, similar ao que será produzido pelo PROSUB
“O Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB) traz benefícios relevantes para o Brasil. Além de dar ao País capacitação em projeto e construção de submarino à propulsão nuclear, proporcionando independência tecnológica, resultará em maior proteção para a Amazônia Azul e suas riquezas [1].
Para isso, no entanto, é fundamental a continuidade dos investimentos públicos, sobretudo em formação e capacitação de capital humano, e a garantia da transferência de tecnologia.
Há mais de 30 anos, a Marinha do Brasil (MB) está engajada no desenvolvimento de um programa nuclear (Programa Nuclear da Marinha – PNM), que, lamentavelmente, sofreu recorrentes contingenciamentos de recursos a partir de 1987, o que prejudicou não apenas o PNM como, também, a então base industrial que nascia com o programa (em torno de 60 indústrias/empresas). Algumas reduziram drasticamente seu pessoal e outras, simplesmente, fecharam suas portas. Os cortes orçamentários [nos anos 90] atingiram duramente o segmento de defesa. Ao contrário de outros empreendimentos, a MB passou a direcionar 50% do seu [emagrecido] orçamento total ao Programa, a fim de manter sua preservação integral e as 'expertises' até então conquistadas.
Em 2007, essa situação começou a mudar. O então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, acompanhado do presidente da FIESP, Paulo Skaf e do Diretor Titular do COMDEFESA, Jairo Cândido, visitou o Centro Experimental em ARAMAR, onde, pelos benefícios estratégicos e tecnológicos que o programa proporcionaria ao País, Lula anunciou a liberação de orçamento adicional de R$80 milhões para a conclusão do projeto -somado aos R$50 milhões provenientes da Força– totalizando R$130 milhões anuais durante 8 anos.
A iniciativa está em consonância com a Estratégia Nacional de Defesa (END, criada em dezembro de 2008), que, entre outras medidas, destaca a necessidade do aumento de investimentos e a busca de parcerias necessárias à aquisição e capacitação do País em projeto e fabricação de submarinos convencionais e de propulsão nuclear.
No final de 2008, o Brasil assinou acordo com a França para a construção de quatro submarinos convencionais da classe Scorpène, a cooperação no projeto do submarino nuclear brasileiro com transferência de tecnologia para a construção do casco e a construção de um estaleiro e de uma base naval de submarinos. Desde então, iniciou-se o PROSUB e o PNM avançou. Porém, algumas questões ainda devem ser priorizadas.
O acordo franco-brasileiro prevê apenas a transferência de tecnologia para o submarino convencional (incluindo o casco, periscópios, sistemas de combate e de comunicações, testes dos hélices em laboratórios especializados etc).
Mesmo faltando à MB o conhecimento de ponta na parte crítica de soldagem do casco, ela tornou-se detentora do domínio do ciclo completo do combustível nuclear com a finalização da construção da Usina de Hexafluoreto de Urânio (USEXA), e avança cada vez mais no desenvolvimento do reator nuclear. O Scorpène é projeto de submarino com propulsão convencional desenvolvido com base nos avanços tecnológicos do submarino nuclear francês “SSBN Le Triomphant” e deverá ser o patamar tecnológico para transição do submarino nuclear brasileiro.
Não se sabe, contudo, se essa lacuna específica sobre soldagem do casco está contemplada no acordo de cooperação assinado com a França. Outra questão refere-se à capacitação da indústria brasileira, de forma a atender às futuras necessidades de modernização e manutenção dos submarinos, tanto o convencional quanto o nuclear.
A frota de submarinos franceses inclui vários tipos de navios de combate, barcos de patrulha, um porta-aviões nuclear e dez submarinos nucleares (quatro estratégicos da classe SSBN, capazes de lançar mísseis balísticos intercontinentais, e seis outros táticos da classe SSN2. Por trás dessa importância e expressividade, uma indústria naval pujante e moderna garante a operacionalidade dos meios [2]. Parte da 'expertise' francesa nesse campo deve ser absorvida pela indústria brasileira, por meio de parcerias, 'joint-ventures' e acordos comerciais bilaterais.
A adaptação do modelo convencional da classe Scorpène implicará na possibilidade de nacionalização de aproximadamente 36.000 itens produzidos por mais de 30 empresas brasileiras. Na Armada do Chile, um mesmo submarino [Scorpène] possui cerca de 30.000 diferentes itens aplicados, que necessitam de desempenho bastante rigoroso para que este se possa manter em operação.
Colocando em perspectiva, corremos o risco, assim como o Chile, de dependermos consideravelmente de fabricantes estrangeiros, caso o contrato não tenha previsão consistente da transferência da documentação técnica e da tecnologia empregados.
É fundamental dirimir dúvidas sobre a forma da cooperação francesa no SN-BR, inserir a indústria brasileira na participação das etapas de negociação de transferência de tecnologia, manter o investimento para formação de capital humano e promover a integração dos centros de pesquisas.
Dois estudos publicados pela “RAND Corporation” [3] chamam à atenção para as dificuldades enfrentadas pela Inglaterra e EUA na manutenção de sua capacidade técnica em capital humano na produção e manutenção constante dos seus projetos de submarinos nucleares, desafio que certamente enfrentará o Brasil.
Com a construção do estaleiro em Itaguaí, Rio de Janeiro, o PROSUB tem previsão de gerar, no pico da obra, 11.500 empregos diretos e 33.500 indiretos. Hoje, já são mais de 4.000 diretos e cerca de 12.000 indiretos na região. Mas deve-se estar atento aos desafios futuros decorrentes do desenvolvimento do projeto. A capacitação de capital humano e da indústria nacional deve ser levada em consideração para que o PROSUB represente, de fato, salto tecnológico para o País, garanta efetivamente a segurança da Amazônia Azul, fomente o adensamento da cadeia produtiva e projete soberania.
[1] Submarino à propulsão nuclear é um submersível cuja fonte de energia provém de um reator nuclear, onde o calor gerado vaporiza a água, possibilitando o emprego desse vapor para movimentar suas turbinas.
[2] Atualmente, está em andamento na França a atualização de submarinos nucleares, do Barracuda. Não há perspectivas de cooperação na propulsão nuclear.
[3] Autores: John F. Schank, Jessie Riposo, John Birkler, James Chiesa - “Sustaining Design and Production Resources – The UK Nuclear Submarine Industrial Base” (2005) e Autores: John F. Schank, Mark V. Arena, Paul DeLuca, Jessie Riposo, Kimberly Curry Hall, Todd Weeks, James Chiesa - “Sustaining U.S. Nuclear Submarine Design Capabilities” (2007). Disponível em: (www.rand.com).”
FONTE: publicado pelo Departamento da Indústria de Defesa (COMDEFESA) e transcrito no site “DefesaNet” (http://www.defesanet.com.br/prosub/noticia/2304/INFORME-COMDEFESA---PROSUB--importancia--avancos-e-duvidas) [imagem do google adicionada por este blog].
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2 comentários:
A França deu enorme salto tecnológico após a 2a guerra, chegando a fazer coisas mais sofisticadas até que os americanos, como o avião Concorde.
Mas para isto tem que ter vontade politica e MUITO investimento
Aqui estamos engatinhando na área tecnológica e não sei se o Governo está realmente empenhado nisto.
Discurso tem muito, mas as realizações são quase nenhumas.
Lula disse que o VLS ia voar em seu mandato (no primeiro!) e ...
Iurikorolev,
Também sou cética.
Falta compreensão da importância de investimentos em tecnologia, especialmente para defesa. A incompreensão é, não somente, dos governos, mas da sociedade e da mídia.
Mas tenho alguma esperança, pois as nossas Forças Armadas são mais persistentes e, mesmo quase sem recursos, com a manutenção dos objetivos e a continuidade administrativa vão avançando através das décadas.
Foi assim com o VLS que você citou. Nos governos Collor e FHC, os recursos financeiros e humanos foram drasticamente reduzidos, até chegar a zero, à quase morte em 1999. Não sei se isso era "compromisso" dos "neoliberais" com os EUA. Deu no que deu. Explosão e mortes. Poucos cientistas restantes tinham que atuar em várias áreas para compensar os quase mil que sairam (foram "saídos") nos anos 90 (com proibição de novas admissões). Para ressuscitar o projeto, há necessidade de muitos e muitos anos, principalmente para repor o pessoal especializado e formar novos cientistas na área. Os recursos financeiros melhoraram muito (qualquer coisa sobre zero é infinitamente maior), mas ainda são ínfimos em relação à necessidade e em comparação com que as grandes potências e os demais países do BRIC despendem na área.
Maria Tereza
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