domingo, 21 de agosto de 2011

ATENTADO EM ISRAEL FOI AUTOPLANTADO?

Ataque de Israel à população de Gaza “em resposta", como sempre diz a mídia...

Por Baby Siqueira Abrão, de Ramallah, Palestina

MUDANÇA DE PAUTA EM ISRAEL: ENTRA O TERROR, SAEM OS INDIGNADOS

“Em Israel, há quem duvide da versão oferecida pelo governo. Nenhum crítico afirma que o atentado na área fronteiriça foi “plantado”, mas todos são unânimes em apontar o fato de que os protestos dos indignados, acampados em praças por todo o país, [estranhamente] sumiram das páginas principais dos noticiários.

Por Baby Siqueira Abrão

Quinta-feira, 18 de agosto, eu reunia informações para escrever sobre os indignados do mundo quando começaram a chegar pedidos de socorro por e-mail e pela rede social. Aviões [de ataque e bombas de última geração feitos e pagos (US$ 3 bi/ano) pelos EUA] e drones israelenses sobrevoavam Gaza, assustando a população da faixa costeira palestina. Os estrondos sucediam-se, acompanhados de gritos, de fogo, de fumaça, de sirenes. As mensagens que se acumulavam em minha caixa postal me davam a dimensão da tragédia: “Eles estão atirando!”, “Atingiram um prédio aqui perto!”, “A fumaça me sufoca”, “Por favor, salvem Gaza!”, “Não deixem que eles façam uma nova operação ‘Cast Lead’” (nome dos ataques militares israelenses que mataram cerca de 1.400 civis em Gaza, entre o fim de 2009 e o início de 2010), “Espalhem nosso SOS para o mundo!
Testemunha de diversas incursões do exército israelense nas vilas palestinas, eu sabia muito bem do que os internautas falavam. É difícil manter a calma quando se ouvem ruídos de aviões voando baixo, disparos de armas e mísseis, e quando a claridade provocada pelas explosões cria formas nas paredes de casa, invadindo até mesmo nossos olhos fechados.

O sofrimento das pessoas em Gaza passara do limite do suportável, e por isso nem mesmo o pavor de ser surpreendido pela morte tirava aqueles internautas da frente do computador. Era como se esse tênue contato virtual com o mundo suspendesse por instantes o bloqueio a que eles estão submetidos desde 2007. Preso numa faixa de apenas 360 km2, cercado por muros altos, cercas e ‘checkpoints’ sob controle israelense, o 1,6 milhão de habitantes de Gaza não tem para onde fugir quando atacado pelas forças do exército [invasor] sionista. Uma situação de absoluto terror, estampada, e quem sabe aliviada, em cada pedido de socorro enviado pela internet.

Mas... por que tanto medo? Qual o motivo daqueles ataques?

Tudo começou ao meio-dia de quinta-feira, 18 de agosto, quando um grupo armado atacou um ônibus numa estrada próxima à fronteira do Egito com Israel. Outro ônibus e dois carros, que se aproximavam, também sofreram ataques, que deixaram mortos e feridos. Israel culpou uma facção palestina baseada em Gaza, ‘Popular Resistance Committee’ (PRC), pelos atentados. O PRC desautorizou as fontes israelenses, negando ter participação no caso. Mas a conta foi cobrada, mais uma vez, da população civil de Gaza.

Os bombardeios israelenses noturnos mataram três dirigentes do PRC e duas crianças, de 13 e 2 anos de idade. Somadas às oito vítimas do lado israelense e a três soldados egípcios, as mortes totalizaram 16 pessoas. Em retaliação aos bombardeios sionistas, [minifoguetes rudimentares] de fabricação caseira foram atirados, de Gaza, em áreas abertas no sul de Israel, sem provocar danos. O primeiro ministro Benjamin Netanyhau prometeu revidar, dizendo, na visita que fez aos soldados feridos, que os ataques à faixa foram “apenas a resposta inicial”. Ou seja: teremos mais fogo, mais terror e mais mensagens de socorro pela frente.

Em Israel, há quem duvide da versão oferecida pelo governo. Nenhum crítico afirma [ousa explicitar] que o atentado na área fronteiriça foi “plantado”, mas todos são unânimes em apontar o fato de que os protestos dos indignados, acampados em praças por todo o país, "sumiu" [convenientemente] das páginas principais dos noticiários. A atenção, agora, se concentra nos “ataques terroristas” [sic] e em sua consequência mais imediata: a “necessidade” de o governo voltar-se ainda mais para as questões de segurança. Em outras palavras, mais verba para o exército e zero investimento em programas que aliviem os gastos das classes média e popular, que formam o grosso da população dos acampamentos.

Também está na mídia a questão do Sinai, região do norte do Egito que, segundo Israel, encontra-se "sem controle" desde a queda do ditador Hosni Mubarak. Alguém já falou, inclusive, em "policiar o Sinai", o que criará problemas diplomáticos com o Egito e trará à tona a ocupação israelense daquela área em 1967, na Guerra dos Seis Dias. ‘Pano pra manga’ em notícias, análises e comentários. Se o caso Sinai “pegar”, e se o pingue-pongue militar no sul do país continuar por algum tempo, os indignados serão obrigados a despedir-se de seus 15 minutos de fama. Sem a cobertura da mídia, eles conseguirão manter o foco nas demandas econômicas, que, descobriram pouco depois de iniciado o movimento, têm raízes no que denominam “injustiça social”?

Membros da esquerda israelense estão pagando para ver. “A maioria nem sabe o que é ‘justiça social’, expressão hoje comum na linguagem da classe média”, diz uma ativista que prefere não se identificar. “Fiquei no acampamento de Tel Aviv vários dias, tentando explicar a ligação entre os investimentos em ‘segurança’, nas colônias, na construção do muro, no confisco das terras palestinas, enfim, a relação entre o preço da ocupação da Palestina e a situação em que os indignados se encontram. Grande parte é incapaz de entender. Muitos nem sabem que Israel ocupa as terras de outro país, e olha que isso acontece há mais de 60 anos.”

Sem informação suficiente, impermeáveis aos que procuram mostrar de onde vem parte da injustiça social de que eles se queixam, os indignados israelenses talvez não consigam manter a mobilização por muito tempo. Educados desde a infância na doutrina da “segurança nacional”, que os torna reféns do medo de inimigos externos e da proteção do exército, os acampados podem muito bem abrir mão de suas reivindicações em favor de armamentos, equipamentos e pesquisas na área militar.

É preciso lembrar que setembro está chegando, e que as atenções da mídia estarão voltadas para a proposta do reconhecimento do Estado palestino, e de sua inclusão como membro pleno, que a ANP levará à ONU. A Assembleia Geral que receberá a proposta começará no dia 13 de setembro –daqui a menos de um mês, portanto–, e até lá bombardeios, foguetes e Sinai podem continuar como estrelas dos noticiários [muita coincidência...].

Ponto para o governo de Israel, que então terá se livrado de um tema incômodo e insolúvel sem mexer uma única vírgula em sua política econômica.”

FONTE: escrito por Baby Siqueira Abrão, jornalista, autora de diversos livros e pós-graduanda em Filosofia. Mora em Ramallah, Palestina, onde é correspondente do jornal “Brasil de Fato”. Artigo transcrito no site “Carta Maior”  (http://www.cartamaior.com.br/templates/analiseMostrar.cfm?coluna_id=5164) [título, entre colchetes e imagem do google adicionados por este blog ‘democracia&política’].

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