Charles Abugre
[Postado por sugestão do leitor Probus]
1ª PARTE
Por Charles Abugre, no "Counterpunch", boletim bisemanal publicado nos Estados Unidos
THE TRUE COSTS OF THE WAR ON LIBYA: A WICKED, HEARTLESS FOLLY
A INVASÃO FOI PLANEJADA E A OPORTUNIDADE PARA EXECUTÁ-LA, MUITO PROPÍCIA.
“Há quem diga que “o tempo cura todas as feridas” emocionais. Se fosse assim, por que me sinto cada dia mais furioso com a escandalosa invasão da Líbia, sob falsos pretextos, há quatro meses?
Trata-se exatamente disso: a Líbia está sob ataque por mar e ar, sob bombardeio direto de forças especiais estrangeiras em território líbio.
O objetivo exposto da invasão seria o que se tem chamado de “troca de regime”. O objetivo visível das bombas que matam líbios e estão reduzindo a ruínas a capital Trípoli é um só: ajudar um grupo de rebeldes, que o ocidente reuniu e armou, a depor o governo do coronel Gaddafi. O bombardeio aéreo começou sob expectativa delirante de que, no instante em que as bombas começassem a cair sobre Trípoli, os líbios de Trípoli levantar-se-iam contra Gaddafi; na situação que assim se criaria, um grupo já armado viria de Benghazi e assumiria o poder. O tempo passou, e, agora, a única estratégica dos invasores é o desespero. Vale qualquer tática para tentar matar ou expulsar Gaddafi e seus filhos.
É exatamente a mesma tática dos anos 1960s, usada outra vez pelos mesmos atores, para derrubar governos que não se ‘subordinaram’.
O plano fracassou. Quatro meses depois do início da carnificina, Gaddafi ainda salta do esconderijo de onde resiste e pode gritar insultos contra os exércitos invasores.
A invasão à Líbia foi planejada. No que tenha a ver com os EUA, já estava planejada desde os primeiros dias da ‘guerra contra o eixo do mal’ de George Bush Filho. No que tenha a ver com a França, o planejamento já era ativo, no mínimo, desde outubro de 2010. É altamente provável que o planejamento tenha começado por assegurar que houvesse armas e alguns soldados em Benghazi, à espera do momento propício.
Só isso explica que as manifestações civis em Benghazi, que começaram como outras em Túnis e no Egito, como manifestações de civis desarmados, em apenas dois dias tenham-se transformado em rebelião armada; e que, em menos de um mês, a rebelião local já estivesse convertida em invasão militar por forças da OTAN e da França. É absolutamente impossível que esses eventos tenham-se sucedido tão rapidamente, sem planejamento.
Não há nem o que discutir: é inegável que já havia forças britânicas, holandesas e francesas, além de forças especiais italianas, dentre outras, em campo1; não só em Benghazi, mas por todo o país. São fatos já sabidos: a mídia britânica noticiou; como houve notícias, também, do modo como Holanda e Grã-Bretanha tentavam introduzir soldados de suas forças especiais na Líbia, nos primeiros momentos das manifestações. Houve o caso do helicóptero de forças especiais britânicas que pousou no meio de tropas rebeldes e foi imediatamente capturado e a captura foi comemorada... antes que os rebeldes percebessem que eram “soldados aliados”. Dias depois, os holandeses fizeram ainda pior: pousaram onde não deviam pousar e foram capturados pelas forças de Gaddafi, que os fez fotografar pela imprensa e em seguida devolveu-os à Europa. Para saber que nada ali havia sido forjado, bastava ver o brilho no rosto do filho de Gaddafi.
Já havia penetração clandestina de forças especiais em território líbio, como informa Franco Bechis, jornalista italiano, na edição de 24 de março do jornal “Libero” [1] (matéria reproduzida em “Economics NewsPaper” [2] ), no mínimo, em 16/11/2010, quando um grande grupo de franceses chegou a Benghazi, apresentando-se como empresários que sondavam oportunidades de negócios para investir na agricultura líbia. Muitos desses “empresários” eram, de fato, soldados.
Segundo Franco Bechis, no “Maghreb Confidential” [3], os franceses começaram a planejar ativamente a troca de regime na Líbia dia 21/10/2010, quando Nuri Mesmar, chefe de protocolo de Gaddafi e seu braço direito, chegou a Paris para uma cirurgia. Mesmar não esteve com médicos. Todos seus contatos foram agentes do serviço secreto francês e assessores próximos de Sarkozy. Mesmar também era responsável pelo ministério da Agricultura. Dia 16 de novembro, Mesmar aprovou a estratégia de introduzir soldados na Líbia disfarçados como delegação de empresários. Dois dias depois, um avião pousou em Benghazi, levando soldados, dentre outros agentes, e ali se reuniram com comandantes militares líbios; o objetivo era convencê-los a desertar. Um dos que concordou foi o coronel Gehan Abdallah, que, chegado o momento, liderou a rebelião armada. De onde veio essa informação? Do serviço de inteligência italiano.
A função de Nuri Mesmar –os franceses usaram-no para apunhalar pelas costas um seu amigo, que o receberia sem cautelas– é velha como a história de Brutus e Cesar, na peça “Julius Caesar” de Shakespeare; faz pensar também no que fez o capitão Blaise Campaoré de Burkina Faso, usado pelos franceses para executar seu mais íntimo amigo, Thomas Sankara.
Mas não foram somente os franceses que planejaram o movimento ‘dos rebeldes’ de Benghazi. O chefe do Conselho Nacional Líbio, coronel Khalifa, chegou dos EUA dia 14 de março para comandar a rebelião armada, um mês depois de iniciada. O coronel Khalifa vivia nos EUA desde os anos 1980s, trabalhando, como se suspeita, como agente da CIA. Esse fato foi revelado em livro publicado em 2001, de Pierre Pean, intitulado “O Manejo da África” [African Handling].
A edição de 31 de março do “New York Times” publicou matéria em que se lê: “A CIA infiltrou agentes secretos na Líbia para reunir inteligência de orientação para ataque aéreo e fazer contato com veteranos e rebeldes que combatem as forças do coronel Gaddafi, segundo declararam agentes americanos.” [4] Khalifa, Mesmar e outros serão acompanhados, na liderança do Governo Provisório, por alguns dos mais temidos membros do regime de Gaddafi, entre os quais Jalil Mustafa Abud, que até o levante fora ministro da Justiça e é listado pela Anistia Internacional como um dos mais notórios violadores de direitos humanos do planeta.
RIDÍCULOS FALSOS PRETEXTOS
Escolhi deliberadamente a expressão “ridículos falsos pretextos” para caracterizar as desculpas que foram servidas à opinião pública por imprensa facciosa. Por quê? A resolução nº 1.973 da ONU define o único objetivo de “proteger civis”. Há dois conjuntos de princípios a partir dos quais se pode inferir que seja o caso de proteger civis. Um, o princípio segundo o qual todos os combatentes são responsáveis, nos termos da Convenção de Genebra. Esse princípio está acolhido nas resoluções do Conselho de Segurança nº 1.265, 1.296 e 1.820, dentre outras.
Combatentes armados, dos dois lados em luta, que violem a Convenção de Genebra, podem ser considerados responsáveis, nos termos dessas resoluções, e podem ser apenados e, por extensão, podem ser levados à ‘Corte Internacional de Justiça Criminal’ [ing. ‘International Criminal Court’ (ICC)], pela prática de violações definidas como crimes contra a humanidade e crimes de guerra ou genocídio. Mas essas resoluções, evidentemente, não legalizam nenhuma intervenção militar por força estrangeira.
O segundo princípio é o princípio da “responsabilidade de proteger” (“R2P”). Baseia-se no conceito de segurança “sem limites de fronteira”, que é título do relatório da ‘Comissão sobre Intervenção e Soberania do Estado’ [ing. International Commission on Intervention and State Sovereignty (ICISS)] divulgado em dezembro de 2001 e subsequentemente adotado como princípio operacional pela ONU. Essa comissão, presidida por Gareth Evans e Mohamed Sahnoun, estudou o relacionamento entre (a) os direitos dos estados soberanos, sobre os quais se construíram a maior parte das relações internacionais; e (b) o chamado “direito de intervenção humanitária” que tem sido exercido esporadicamente –na Somália, Bósnia e Kosovo, mas não em Ruanda–, com graus variados de sucesso e controvérsia internacional.
O relatório examina a seguinte questão: “em que casos será apropriado que estados empreendam ação coercitiva –especificamente militar– contra outro estado, com vistas a proteger pessoas que estejam em risco naquele outro estado”?
O estudo concluiu que a prioridade deve ser garantida aos seres humanos, não à soberania do estado. Portanto, se houver ameaça à segurança de seres humanos –à segurança física e à dignidade humana– e ameaça criada pelo estado, ou no caso de o estado manifestar incapacidade severa para defender seus cidadãos, a comunidade internacional passará a ter a responsabilidade de agir, incluída aí a ação de intervenção militar armada. O princípio R2P impõe que a lei humanitária se sobreponha aos direitos de soberania. O princípio R2P tem sido muito citado, sobretudo por organizações humanitárias ocidentais, e a ONU tem celebrado sua adoção.
Mas há também os que chamam a atenção contra os riscos de adotar-se esse princípio, e por inúmeras razões. Em primeiro lugar, pôr a lei humanitária à frente da soberania implica impor razões humanitárias acima dos direitos do cidadão, que dependem de respeito à soberania. Em segundo lugar, o princípio R2P abre a porta para intervenções seletivas e justiça seletiva, que passa a poder ser exercida por quem controle o Conselho de Segurança da ONU. Cria-se, assim, uma relação em que todos os países passam a depender politicamente (e legalmente) do Conselho de Segurança da ONU e de países militarmente fortes. Assim, se acabará por minar as próprias fundações da justiça e da paz duradoura, que dependem de processos políticos locais, domésticos.
Mas fato é que a Resolução nº 1.973 foi elaborada sob o pretexto do R2P, para “legalizar” a invasão à Líbia. Os países da OTAN desejavam invadir, isso sim; não apenas minimizar algum eventual dano que os civis líbios viessem a sofrer. Os países da OTAN invadiram para derrubar o governo do coronel Gaddafi.
É razoável invadir militarmente um país, alegando razões humanitárias? É, no mínimo, muito discutível. No caso da Líbia, a resposta certa somente seria conhecida depois da invasão... no caso de as forças de Gaddafi virem a bombardear Benghazi como Gaddafi ameaçou fazer. O que se sabe hoje é que a força aérea de Gaddafi não bombardeou alvos civis em Benghazi, e, como a Anistia Internacional já declarou, não se constataram estupros em massa pelas forças do estado líbio. Também se sabe que a repressão violenta contra a manifestação civil do dia 15 de fevereiro não foi a primeira. O último grande caso de repressão violenta contra manifestantes aconteceu na Líbia em 2006. Como vários ditadores norte-africanos e do Oriente Médio, Gaddafi reprimiu com violência o levante de 2006, feriu alguns e prendeu outros. Não houve assassinatos em massa e, naquela ocasião, a ação de Gaddafi foi tacitamente apoiada –com destaque para o apoio que recebeu dos EUA– como legítima resposta à influência maléfica da Al-Qaeda.
A verdade simples é que, dois dias depois de iniciado o levante popular, a situação já era de guerra na Líbia. Já estava convertida em insurgência armada; e todos os estados têm pleno direito de usar o exército contra insurgência armada.
Estamos cansados de ver acontecer nos EUA, sempre que respondem a fanáticos religiosos ou a gangues de traficantes em bairros pobres, de maioria negra.
Não haveria melhor modo de proteger vidas humanas? Claro que sim, se dessem uma chance à paz.
Todos sabemos que o presidente Lula da Silva (ex-presidente do Brasil) ofereceu-se para liderar uma missão de mediação, que tentaria negociar um cessar-fogo.
Foi iniciativa apoiada por países da América Latina, pela União Africana e, até, pela sempre acovardada Liga Árabe. Gaddafi aceitou a ideia de um cessar-fogo, desde que as forças internacionais também aceitassem. A OTAN rapidamente destruiu essa iniciativa, com seus vassalos em Benghazi. A missão da União Africana foi humilhada em Benghazi e toda a grande mídia ocidental dedicou-se a promover “debates” que nada fizeram além de ridicularizar as iniciativas da União Africana. Ninguém deu qualquer chance à paz. Por quê? Porque a agenda real visava a derrubar Gaddafi, não a proteger civis.
Se a intervenção militar seria tão boa via para proteger civis, por que a OTAN não invadiu o Iêmen, onde levante absolutamente pacífico foi suprimido a tiros, com munição real e máxima brutalidade? Robert Gates, que até recentemente foi secretário de Defesa dos EUA respondeu: “Não nos parece que seja nossa obrigação intervir nos assuntos internos do Iêmen”. Talvez, porque o ditador do Iêmen seja “nosso ditador”? Talvez porque lute contra separatistas de esquerda, de quem “nós! não gostamos? Talvez porque o Iêmen hospede a 5ª. Frota dos EUA?"
E quanto ao Bahrain, minúsculo, onde a família real é proprietária de quase todas as ilhas que compõem o reino, e onde, com apoio de soldados sauditas, grande número de manifestantes desarmados foram fuzilados nas ruas? Ouve-se algum boato de que o sultão será julgado pela Corte Internacional de Haia? Esse, precisamente, é o uso discriminatório, seletivo, do princípio da “responsabilidade para proteger” que muitos tanto temiam.”
NOTAS DOS TRADUTORES
[1] “Libia. La Francia ha armato i ribelli di Bengasi? Le manovre degli 007 di Sarkò con un fedelissimo di Gheddafi”, 23/3/2011 (em italiano).
[2] “Understanding the war in Libya”, Economics Newspaper.
[3] Em português, no Blog Maria Frô, 25/3/2011, (tradução de Victor Farinelli).
[4] “C.I.A. Agents in Libya Aid Airstrikes and Meet Rebels”, New York Times, 31/3/2011. A matéria prossegue: “Apesar de o presidente Obama insistir em que nenhum militar norte-americano participa da campanha na Líbia, pequenas unidades de agentes da CIA já trabalham na Líbia há várias semanas, como parte de força clandestina ocidental que o governo Obama espera que possa ajudar a sangrar o exército de Gaddafi – disseram fontes oficiais”. Em “SlantRight 2.0”, que visivelmente é página da extrema direita dos EUA, reúne matérias de praticamente todos os grandes jornais dos EUA, da mesma data, dizendo, todas, exatamente a mesma coisa: que a CIA estava na Líbia em março de 2011.”
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2ª PARTE
[MEDIAÇÃO DE LULA]
“O plano da União Africana [com iniciativa e apoio do ex-presidente Lula] para um acordo negociado ainda é o melhor –cessar-fogo imediato; intervenção humanitária por força externa ao conflito; governo de transição constituído de representantes dos dois lados em luta; cronograma para que se formem partidos políticos; eleições; e processo legal para investigar, identificar e punir os responsáveis. E –se posso contribuir– compromisso, das forças invasoras, de não requerer reparações de guerra.
Essa, precisamente, seria a via acertada a ser seguida, desde o início, se ‘o ocidente’ não tivesse impedido que a estratégia proposta pelo presidente Lula do Brasil e União Africana prosperasse.
A intervenção militar estaria salvando vidas? Claramente não! Como bombardeios aéreos de acampamentos civis e atrocidades cometidas por milícias armadas pela OTAN implicariam salvar vidas de civis? Serão os habitantes de Benghazi talvez “mais civis” que os habitantes de Trípoli e outras cidades?
A história das invasões militares ocidentais sempre significa somente salvar vidas de quem se empenha em matar. No Iraque, por exemplo, morreram um milhão de pessoas por efeito direto de bombas e por efeito indireto da violência sectária, e mais um milhão de pessoas perderam casas e terras e foram convertidos em refugiados de guerra. Nem Saddam, durante anos de ditadura, matou tanta gente e arrancou tantos de suas terras e casas. Ou no Afeganistão, na Somália e, também, nas intervenções nos Bálcãs.
Esses invasores ocidentais encontram pretextos e falsos motivos para justificar invasões armadas? Sim, há muitas provas de que sim. É bem conhecida a história das mentiras e falsas razões que uma mídia sectária vendeu à opinião pública, para justificar a invasão do Iraque. George Bush e Tony Blair sabiam perfeitamente que Saddam Hussein não tinha armas de destruição em massa [1]. Mas já estava decidido que o Iraque seria invadido; e fizeram de tudo para inventar um modo de ‘justificar’ a invasão. Antes da invasão ao Afeganistão, feita sob o falso pretexto de caçar Osama Bin Laden e a Al-Qaeda, os Talibãs já haviam proposto entregar Bin Laden para ser julgado por tribunal internacional, se os EUA provassem que estivera envolvido nos ataques do 11/9 às Torres Gêmeas em New York. E há histórias, bem provadas, semelhantes a essas, também no caso dos bombardeios contra a Iugoslávia.
POR QUE A “MUDANÇA DE REGIME”?
Sabendo-se de tudo isso, e sabendo-se também que os levantes no Norte da África, que respingaram na Líbia, criaram o quadro ideal para forçar a ‘mudança de regime’ que já estava planejada há muito tempo e que ‘salvar vidas’ não foi o verdadeiro objetivo da intervenção militar, por que EUA e os países europeus estavam tão desesperadamente interessados em derrubar o coronel (“Irmão”) Muammar Gaddafi e afastá-lo, com os filhos, do poder? Há várias teorias.
RETALIAÇÃO
Diferentes governos têm diferentes questões contra “o Irmão”. Há quem diga que Sarkozy trabalha para encobrir questões que lhe causariam dores de cabeças com a lei, se acontecesse de o letárgico sistema judiciário francês acordar e divulgar informes sobre o importante apoio que a família Gaddafi deu, em dinheiro, à campanha eleitoral que levou Sarkozy à presidência da república francesa.
“Papi Silvio” (Berlusconi) também tem interesse em afastar “o Irmão” que lhe causou embaraços quando montou sua tenda beduína em Milão, num momento em que Berlusconi enfrentava a ira popular por causa de escândalos em que aparecia envolvido em casos extraconjugais.
O “Irmão” falou a uma platéia de italianas indignadas, cercado por sua guarda pessoal constituída só de mulheres “liberadas” (e armadas), ocasião em que se apresentou como protetor das mulheres italianas. Britânicos e norte-americanos talvez tenham questões mais graves, como a explosão de um avião da Pan Am sobre a cidade escocesa de Lockerbie.
E o mesmo tipo de ira-ressentimentos também pode ter levado vários países africanos a aceitar a Resolução nº 1.973. Muitos gostariam de ver pelas costas esse beduíno estranho, que jamais reverenciou o ocidente como o ocidente está habituado a ser reverenciado e expôs tantos governantes ao ridículo também em seus respectivos domínios. E não se recomenda ridicularizar, muito menos enfurecer, esses poderosos exércitos.
EM APOIO A UMA LUTA LEGÍTIMA POR INDEPENDÊNCIA
Dmitry Isayev, no “New Eastern Outlook journal” [2], cita “Papi” Silvio (Berlusconi), que diz que a guerra da Líbia seria a guerra de independência da Cyrenaica (leste da Líbia), que seria colonizada pela Líbia Ocidental, em processo semelhante ao que levou à separação do Sudão do Sul. Nesse caso, a Itália de Berlusconi estaria apoiando claramente um movimento separatista.
Por menos que essa visão da guerra seja partilhada por outros estados-membros da OTAN, as ideias de Berlusconi encontraram eco. A insurreição armada foi lançada de Benghazi (capital do leste), cidade que por vários séculos foi sede da monarquia. Durante o período monárquico, a Cyrenaica controlou o petróleo, um porto importante, a pesca e, assim, a riqueza líbia.
Essa, precisamente, foi a monarquia que Gaddafi derrubou em 1969, com o apoio das tribos do oeste. Desde então, o leste foi política e economicamente marginalizado. Mas se objetivo da guerra é criar duas Líbias, como se articulam esse objetivo e a Resolução nº 1.973 do Conselho de Segurança da ONU, que autoriza exclusivamente a proteger civis?
INTERESSES GEOPOLÍTICOS
Na edição de 23/6/2011 do jornal “Pambazuka News”, principal publicação online sobre questões africanas, Ismael Hossein-Zadeh sugere que a OTAN decidiu derrubar Gaddafi por sua insubordinação, que ameaça interesses estratégicos e os fundamentos do poder na região.
Um dos pontos em que a radical insubordinação de Gadaffi parece “imperdoável” é a recusa, apoiada pela Síria –são as únicas “nações árabes” que tomaram essa decisão– a deixar-se absorver nos arranjos de segurança estratégica comandados por OTAN/França/EUA para controlar a bacia do Mar Mediterrâneo e o Oriente Médio: “Líbia e Síria não participaram, há dez anos, da operação “Active Endeavor” de patrulhas e exercícios navais no Mediterrâneo; a Líbia não é membro do “Diálogo Mediterrâneo”, parceria militar da OTAN que reúne quase todos os países da região: Israel, Jordânia, Egito, Tunísia, Argélia, Marrocos e Mauritânia; e a Líbia de Gaddafi sempre se opôs ao “Africon” (US Africa Command)”.[3]
São “infrações” graves, dada a importância estratégica do Mediterrâneo. Ficar de fora implica que Gaddafi não participa das preocupações com a segurança de Israel –país, ao que parece, intocável. Com Gaddafi fora da “aliança”, importantes recursos de petróleo, gás e minérios não ficam acessíveis ao ocidente e não podem ser incluídos no planejamento estratégico ocidental.
Admitir o “não-alinhamento” de Gaddafi também cria perigosa “abertura”, para que outros países que não integram a OTAN, sobretudo China, Brasil, Índia e Rússia, encontrem base de apoio na região. Gaddafi fora da “aliança” é perigoso risco geoestratégico, que a OTAN não poderia admitir.
Tampouco se deve esquecer a necessidade de conter Índia e China. Perguntado sobre os reais motivos da invasão ao Afeganistão, Henry Kissinger, secretário de Estado dos EUA durante a Guerra Fria, diz que “tendências apoiadas por Japão e China, para criar uma área de livre comércio na Ásia –um bloco de oposição que reuniria as nações mais populosas do planeta, com muitos recursos estratégicos e algumas das nações mais industrializadas, não é consistente com os interesses nacionais dos EUA. Por isso, os EUA devem manter presença na Ásia” (“Does America need a foreign policy?”, citado em Economicsnews [4]). Faz perfeito sentido com as ideias de Zbigniew Brzezinsky, secretário de Estado de Jimmy Carter, que há quem diga que foi o “tutor” político de Barack Obama, que o encaminhou ao partido e à presidência. Para Brzezinsky, a Eurásia seria um “tabuleiro de xadrez no qual se disputa o controle global”. O Mediterrâneo é o coração da Eurásia.
Em discurso do dia 28 de março, Barack Obama disse, sobre a invasão da Líbia: “Quando os interesses e valores da América estão em jogo, temos responsabilidade de agir (...). A América tem importante interesse estratégico em impedir que Gaddafi derrote os que lhe fazem oposição”.[5]
INTERESSES ECONÔMICOS ESTRATÉGICOS
Há três áreas nas quais se manifestam claramente interesses econômicos estratégicos: nas políticas econômicas que influenciam a acumulação, a propriedade e os movimentos do capital, de bens e serviços; no controle direto ou indireto de recursos naturais; e no poder para manter dívidas de longo prazo. No artigo já citado do jornal “Pambazuka”, Ismael argumenta que o controle sobre as fontes de petróleo é importante, mas que os países da OTAN e França já controlam essas fontes, mediante a presença, ali, de suas empresas.
A questão é que Gaddafi recusou-se a privatizar seus poços de petróleo e, portanto, na Líbia, o estado ainda exerce controle efetivo. Por isso, Gaddafi é visto como ameaça, exatamente como Hugo Chavez da Venezuela também é tratado como perigoso inimigo. Mas Gaddafi mantém política de acolher empresas estrangeiras. Por essa via, a China pode, facilmente, entrar na Líbia –o que, sim, aos olhos de OTAN/EUA complicaria a questão do que chamam “a segurança estratégica”. Como George Bush explicou “quem não está conosco, está contra nós”. Obama apenas repete.
Além do mais, quem controle os recursos naturais controla as políticas. O neoliberalismo talvez esteja morto nos círculos intelectuais, mas está bem vivo na “real politik”. Não fosse assim, Goldman Sachs não comandaria literalmente, como comanda, a política econômica dos EUA. Também nessa área, Gaddafi nunca se ‘alinhou’.
Se se analisam os índices de desenvolvimento do Banco Mundial, vê-se que a Líbia não tomou empréstimos nem do Banco Mundial nem do FMI, mesmo depois de as sanções terem sido levantadas. A economia líbia é marcadamente estatal. O país tem índices de qualidade e expectativa de vida comparáveis aos mais ricos países do mundo. Nada disso é admissível.
Ainda pior: ao apoiar ativamente, inclusive com fartos recursos, os sonhos das três principais instituições panafricanas –o Fundo Monetário Africano, o Banco Africano de Investimentos e o Banco Central Africano– a Líbia trabalha ativamente contra as instituições de “Bretton Woods” controladas pelos países da OTAN e França. Romper o domínio que essas instituições têm sobre a África também implica enfraquecer a influência geopolítica dos países da OTAN/França sobre o continente.
E a Líbia também compete por investimentos na África. O portfólio africano da Líbia prevê cerca de 8 bilhões de dólares dirigidos para investimentos africanos nos setores de telecomunicações, turismo, algumas manufaturas e distribuição de gás e petróleo. A Líbia está reaplicando boa parte de seus fundos soberanos, tirando-os de papéis do Tesouro dos EUA e orientando-os para investimentos na África. Nada disso é admissível, dado que os EUA dependem dos petrodólares para vender as ações do Tesouro.
A GUERRA COMO MEIO PARA TIRAR DA LÍBIA O CAPITAL DE QUE O OCIDENTE PRECISA
O ataque militar à Líbia já resultou em grandes transferências de capital, da Líbia para a economia dos países invasores. Diretamente, já confiscaram dinheiro do povo líbio, sob a guarda de instituições públicas líbias, que está sendo consumido na própria defesa. São gastos com equipamento militar e apoio logístico ao exército líbio. Os EUA congelaram cerca de 30 bilhões de dólares, que Ismael sugere que a Líbia estaria reservando para a construção das instituições pan-africanas acima mencionadas. A Grã-Bretanha congelou depósitos; e teme-se que entregue aos ‘rebeldes’ o equivalente a 700 milhões de dinares líbios que estavam sendo impressos pela empresa britânica “De la Rue”. A guerra também tem importante efeito de estímulo fiscal na economia desses países, todos produtores de material bélico.
Antes da guerra, várias figuras da “oposição” líbia discretamente transferiram para o exterior os seus fundos financeiros mal havidos, em vários casos, para paraísos fiscais controlados por empresas dos países invasores. Jamais se saberá quanto.
Mas talvez o meio mais significativo e de longo prazo, para forçar capitais para fora da Líbia, será exigir pagamento de indenizações de guerra. O custo de cada bala usada pelos “rebeldes” líbios e pelos soldados da OTAN/França; o custo de cada míssil disparado de jatos ou de navios; o custo de cada avião espião que invade o espaço aéreo líbio; o custo de cada soldado mobilizado para a invasão; o custo dos agentes de inteligência e de empresas privadas contratadas serão cobrados do povo líbio, em petróleo e gás, ao longo de décadas, no futuro. E não será pouco.
Jornais britânicos especulam que, se a guerra continuar até o outono, a Grã-Bretanha gastará mais de 1 bilhão de libras. Ao final de maio, as forças armadas britânicas estimavam que tivessem feito 1.500 ataques aéreos, atacado 300 alvos e disparado, no mínimo, 20 mísseis Tomahawk, ao preço, cada um, de 1 milhão de dólares norte-americanos. Cada viagem de um jato bombardeiro Tornado, ida e volta, da base até Trípoli (cerca de 3.000 milhas), custa 300 mil dólares por voo. Um avião de transporte C-17 custa 60 mil dólares por hora de voo. Os britânicos dizem que têm mais de mil soldados e agentes envolvidos na operação.
Estima-se que, até o outono, os contribuintes norte-americanos terão gasto 1 bilhão de dólares. Em março, os EUA tinham 75 aviões de combate envolvidos na operação e o “Financial Times” noticiou que, no primeiro dia da operação, os EUA gastaram 110 milhões de dólares. Se a guerra do Kosovo pode ser usada como parâmetro, ao final do terceiro mês de operações os EUA haviam ali gasto 2,4 bilhões de dólares. Somem-se a isso os gastos dos demais parceiros da OTAN e aliados árabes. e é possível que, ao final do mês de julho, a invasão da Líbia já tenha consumido, no mínimo, 10 bilhões de dólares. David Cameron, primeiro-ministro britânico, disse claramente, pela televisão, que, aconteça o que acontecer naquela guerra, a Líbia terá de pagar o que os britânicos consumiram ali. E também se têm de somar os custos de reconstrução e indenizações, os salários dos mercenários e o simples roubo praticado pelos escroques do governo provisório. O povo líbio foi assaltado, de fato, em dezenas de bilhões de dólares.
O QUE OS INVASORES ESPERAM GANHAR NO LONGO PRAZO
Deve-se lembrar que o poder da dívida não está só no volume de dinheiro que alguém deva, mas, sim, no efeito que a dívida tem nas relações de poder. Se for derrotada, a Líbia ficará escravizada aos credores, mesmo que a dívida seja resultado de invasão militar odiosa. Terá de abrir suas políticas econômicas aos interesses dos credores. Terá de abrir a eles os seus bancos, terá de importar o que eles lhe queiram vender; terá de privatizar empresas –inclusive o petróleo. Se for derrotada, a Líbia será obrigada a conformar-se e integrar-se às mesmas organizações das quais tão atentamente fugiu até hoje.
E quanto a os invasores destruírem a Líbia... quanto mais destruição, melhor! Destruído o país, começam os negócios da reconstrução. É o que mais interessa às empresas de construção dos vitoriosos, fornecedores de materiais de construção, arquitetos, engenheiros. Os depauperados bancos europeus e norte-americanos serão reenergizados pelos financiamentos massivos para reconstruir a Líbia –que aumentarão o peso com o qual terá de arcar a população líbia, mas engordarão os lucros dos bancos de investimentos e o exército de rentistas que vêm com eles– contadores, advogados e especialistas na jogatina financeira. A guerra, sobretudo contra países ricos em petróleo, sempre interessa a economias agonizantes.
IMPACTO NO CONTINENTE AFRICANO
Apresentei a invasão da Líbia como perversa e mal intencionada, bem deliberadamente. É perversa e é mal intencionada, movida por uma agenda de ganância que levou à invasão e ao ataque militar à Líbia que em nenhum momento considerou o impacto que terão sobre o povo líbio. Se a Líbia for derrotada, a invasão terá convertido os líbios, de povo orgulhoso de si, em nação de miseráveis (o que a Líbia jamais foi, apesar da ditadura de Gaddafi e de vários anos de sanções econômicas). A Líbia corre o risco de ser convertida em típica nação subsaariana: uma pequena elite rica nadando num oceano de miseráveis e desesperados, cujo orgulho terá sido ferido fundo. Não é inconcebível que se constituam ali vários grupos armados que se porão a matar-se uns os outros, até a consumação dessa loucura “ocidental”.
O ocidente terá reaberto chagas históricas: divisões centenárias entre clãs e tribos terão sido ampliadas, não superadas ou conciliadas. Se espalhará o ódio racial, já desencadeado ali pela imprensa ocidental que continua a falar muito sobre o apoio dos africanos negros a Gaddafi. Há risco de a Líbia ser destruída para sempre. E se se vê o que foi feito no Iraque, pode-se ter certeza de que nenhuma “mudança” na Líbia foi ou será para melhor, por muitos e muitos anos.
E os efeitos mais perversos não ficarão limitados ao território líbio. Alguma coisa entre 500 mil e 1 milhão de trabalhadores de todo a região sul do Saara foram expulsos de onde viviam e trabalhavam; somam-se hoje ao oceano de desempregados que já extravasa em todas as direções. O presidente do Niger estima que haja hoje cerca de 200 mil cidadãos do Niger, que trabalhavam na Líbia, desempregados. Quem pagará compensações de guerra por essas perdas?
O efeito dessas ondas de refugiados e desempregados não está em simplesmente agravar a já difícil situação de miséria em toda a África, mas também no potencial que tem para exacerbar a insegurança nessas áreas frágeis –sobretudo na região que vai da Mauritânia, pelo Niger, Mali, Chad, Sudão, Etiópia, Somália, Eritreia e Djibouti. São áreas frágeis e voláteis em vários sentidos –ecologicamente, economicamente, socialmente e, também, porque são expostos ao surgimento de conflitos armados.
A invasão da Líbia tornou ainda mais perigosa a situação nessas áreas, porque há hoje, ali, ainda mais armas de todos os tipos, circulando praticamente de mão em mão. São as armas levadas para lá e distribuídas fartamente pela OTAN/França.
E a invasão é mal intencionada, é maléfica, também, porque visa a privar a África de recursos de investimento e bloqueia o processo de criação de instituições, sem as quais o continente mais pobre não conseguirá transformar suas economias nacionais e superar a indignidade e as dores da miséria. A invasão de OTAN-EUA-França à Líbia, já praticamente converteu a União Africana, de instituição que representava toda a África, em parainstituição que só representa o sul do Saara, como a Líbia foi descrita pelos invasores –como país árabe–, caracterização que os “rebeldes” parecem carregar orgulhosamente nas camisetas.
O QUE NOS ESPERA
Muita água já correu sob a ponte. A família Gaddafi provavelmente deixará o poder. De fato, ninguém, seja quem for, pode arrogar-se poderes sobre os recursos da terra, sem ser democraticamente eleito. Aplica-se à família Gaddafi, como se aplica também à gangue que se autodenomina “governo de transição”, sobretudo se se sabem que ali se reúnem alguns dos mais perigosos elementos do governo Gaddafi.
Isso implica que não resta qualquer via de negociação a ser tentada. Até os invasores da OTAN/França foram obrigados a reconhecê-lo, sobretudo quando se viram presos numa situação que não esperavam: não derrotaram Gaddafi.
O plano da União Africana [e do Brasil] para um acordo negociado ainda é o melhor –cessar-fogo imediato; intervenção humanitária por força externa ao conflito; governo de transição constituído de representantes dos dois lados em luta; cronograma para que se formem partidos políticos; eleições; e processo legal para investigar, identificar e punir os responsáveis. E –se posso contribuir– compromisso a ser assumido pelas forças invasoras, de não requerer reparações de guerra. Essa, precisamente, seria a via acertada a ser seguida, desde o início, se ‘o ocidente’ tivesse permitido que a estratégia proposta pelo presidente Lula do Brasil e da União Africana prosperasse.
A conclusão é que foi guerra imprudente, ensandecida. Mas minha maior tristeza, minha maior vergonha, foi ver a ONU batendo tambores de guerra, incendiando o desvario geral, em vez de conclamar à paz. Vivemos tempos muito tristes. De que outro modo se pode descrever o que foi feito contra a Líbia, senão como ‘loucura perversa, mal intencionada’?”
NOTAS DOS TRADUTORES
[1] Sobre isso, ver “Pela porta dos fundos, Mr. Murdoch, please”, 22/7/2011, Geoffrey Wheatcroft, The New York Review of Books Blogs, vol. 58, n. 12, em português.
[2] “The Economics of the Libyan War and NATO's Crisis”, Dmitry Isayev, New Eastern Outlook, 17/5/2011.
[3] “Why Regime Change in Libya?”, Ismael Hossein-Zadeh, Pambazuka, ed. 536, 23/6/2011.
[4] “Understanding the war in Libya”, Economics Newspaper.
[5] 28/3/2011, “Remarks by the President in Address to the Nation on Libya”, na National Defense University.
FONTE: escrito por Charles Abugre, no “Counterpunch”. O autor é mestre em Economia para o Desenvolvimento pelo ‘Institute of Social Studies’, em Haia; formado em Geografia e Economia pela Universidade de Ghana em Accra; e está concluindo seu doutoramento na Universidade de Wales, Swansea, Reino Unido. Em 2009, foi nomeado diretor da Campanha “Milênio” da ONU, para a África. Transcrito por Castor Filho no seu blog “Rede Castor Photo”; traduzido pelo “Coletivo da Vila Vudu” (http://redecastorphoto.blogspot.com/2011/07/guerra-contra-libia-uma-loucura.html) e (http://redecastorphoto.blogspot.com/2011/07/guerra-contra-libia-uma-loucura_31.html) [imagens do Google e pequenos entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].
7 comentários:
Não sei Maria Tereza, mas todas as vezes que eu leio esses textos não mais fico revoltado, dá vontade de chorar.
"Quanto mais conheço os homens, mais admiro os animais."
Não sei, mas vai ser o MAIOR atentado contra a SOBERANIA braSileira e no$$o erário se nós CONTINUARMOS a fazer NEGÓCIOS com o Grupo BILDERBERG situado em São Carlos, São José dos Campos, São Bernardo do Campo, Itajubá e Aramar: Submarinos, Embraer, Helibrás, FX-2, VANTs, Satélites e agora, possivelmente, e desgraçadamente, a AVIBRÁS.
E ainda: Ocupam NO$$A terra através de laranjas; Usam no$$a$ universidades, no$$a ENERGIA Elétrica, no$$a Água e no$$o$ minérios; Pagam baixos salários; Poluem no$$o meio ambiente; Comercializam entre si e quando no$ vendem, vendem pelo preço que querem.
Só não vê quem não quer. Esse negócio de fabricar no BraZil é um bom negócio, pra eles...
CHEGA DE ESCRAVIDÃO E SUBSERVIÊNCIA, "ELES" SÃO SÁDICOS, NÓS SOMOS MASOQUISTAS??????
Discurso Sobre a Servidão Voluntária
Etienne de La Boétie
O primeiro e um dos mais vibrantes hinos à liberdade dentre os que já se escreveram.
- O poder que um só homem exerce sobre os outros é ilegítimo.
- A preferência pela república em detrimento da monarquia.
- As crenças religiosas são frequentemente usadas pelas monarquias para manter o povo sob sujeição e jugo.
Etienne de La Boétie afirma no Discurso a liberdade e a igualdade de todos os homens na dimensão política. Evidencia, pela primeira vez na história, a força da opinião pública. Repele todas as formas de demagogia. Incursiona pelo que mais tarde ficará conhecido como psicologia de massas, informa da irracionalidade da servidão, INDICADA COMO UMA ESPÉCIE DE VÍCIO, DE DOENÇA COLETIVA.
O Discurso, que no século XVI Montaigne considerava difícil prefaciar, hoje em dia é ainda tristemente atual.
O ser humano encontra-se em amarras auto-infligidas por toda a parte.
“Se em 1600 era tarefa difícil escrever um prefácio a La Boétie, hoje não é mais fácil. Hoje como nos tempos de La Boétie e Montaigne, a alienação é demasiado doce (como um refrigerante) e a liberdade demasiado amarga, porque está demasiado próxima da solidão. E da loucura.”
http://www.culturabrasil.org/boetie.htm
Hoje temos um bom texto básico, que serviu para a tradução portuguesa, comentada pela filósofa Marilena Chauí, e outros. Mas por que estou ressuscitando este livro para construir uma reflexão sobre alguns poderes de hoje que subjugam milhões de homens a seu mando?
http://www.recantodasletras.com.br/artigos/1531075
Comparato, a Líbia e o Brasil: a servidão voluntária
A SERVIDÃO VOLUNTÁRIA
Fábio Konder Comparato
Por estas bandas o povão vive tranqüilo e feliz, na podridão e na miséria.
http://www.conversaafiada.com.br/mundo/2011/02/25/comparato-a-libia-e-o-brasil-a-servidao-voluntaria/
http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/comparato-a-servidao-voluntaria.html
http://www.cartacapital.com.br/politica/a-servidao-voluntaria
http://www.advivo.com.br/blog/luiz-eduardo-brandao/a-servidao-voluntaria
Até que enfim!!!!!!!! Nós vamos fazer o que a ONU PIRATA não fez!!! Viva o Povo BraSileiro. O que fazem na LÍBIA hoje, pode ser feito em QUALQUER nação amanhã!!
12 DE AGOSTO DE 2011
Protógenes Queiroz e outros deputados visitarão a Líbia
Um grupo de políticos e ativistas sociais brasileiros embarca neste domingo (14) rumo à Líbia, atendendo a convite do dos Comitês Populares líbios.
O convite faz parte de esforços do governo líbio para envolver o Brasil, membro rotativo do Conselho de Segurança da ONU, na pressão pelo fim dos ataques criminosos da Otan (aliança militar ocidental).
Entre os convidados estão os deputados Brizola Neto (PDT-RJ), cujo avô, Leonel Brizola, conheceu Kadafi, e Protógenes Queiroz (PCdoB-SP), membro da Comissão de Constituição e Justiça.
Também integram a comitiva o escritor Mario Augusto Jakobskind, o advogado Felipe Boni de Castro, e de Curitiba, a militante feminista Alzimara Bacellar, entre outros.
“Queremos que a delegação brasileira veja com os próprios olhos as atrocidades cometidas pela Otan”, disse o embaixador da Líbia no Brasil, Salem Zubeidi.
A programação, que deve durar uma semana, inclui visitas aos hospitais de Trípoli onde são tratados os sobreviventes dos ataques da Otan e encontros com autoridades e a população civil.
Após a volta ao Brasil, os integrantes da comitiva pretendem redigir um relatório que será enviado à ONU, a exemplo de delegações de outros países que visitaram a Líbia recentemente e comprovaram diversos crimes contra a humanidade, entre os quais o bombardeio de escolas, hospitais, viadutos, conjuntos residenciais e indústrias.
“Inocentes estão morrendo e boa parte da imprensa mundial distorce os fatos. Meu papel será relatar a verdade e buscar uma solução de paz”, disse Brizola Neto.
Fonte: Jornal Água Verde
http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=161274&id_secao=9
"Não pergunte depois a tempestade onde para todas as folhas."
Vítor Hugo, Os miseráveis.
O Grande Gaddafi [1]
20/8/2011, Pepe Escobar, Asia Times Online
The Big Gaddafi
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu
A noite vai avançada em Trípoli, e o Grande Gaddafi beberica seu White Russian [2], fumando um do bom, do Maghreb, enquanto sintoniza uma gigantesca televisão de plasma em sua tenda na fortaleza de Bab al-Aziziyah. Ninguém, nem alguma voluptuosa enfermeira ucraniana, conseguiria apaziguar sua alma em revolta.
Assiste, com ar de quem não acredita nos próprios olhos, à narrativa que avança naquela sopa de letras ocidentais conhecida como “noticiário”; juram que Muammar Gaddafi está “sitiado”, “exaurido”, “tentando achar alguma rota de fuga”, “preparando-se para fugir” (para a Tunísia) e que “é só questão de tempo” antes do “colapso” de seu governo.
Tudo isso, porque um bando de beduínos bárbaros apoiados pelas bombas da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) decidiram mijar no seu tapete.
O Grande Gaddafi: “Aquele tapete era a base que mantinha em pé a sala”.
Não diria, de si mesmo, que esteja “sitiado”. Afinal, as pesquisas mostram que, na Líbia, a aprovação de seu governo no mínimo dobrou, nos últimos meses. E então um dos caras lá da Casa Branca disse ao pessoal lá que a Líbia aceitaria um acordo de cessar-fogo pelo qual a OTAN controlaria só alguns pontos da Cyrenaica – sim para Benghazi, não para Misrata – e abriria caminho para uma força de paz dos capacetes azuis da ONU.
Examina o calendário no seu iPhone; o mês do jejum santo dos muçulmanos, o Ramadã, estende-se até 29 de agosto. Faltavam só uns dez dias, para que o cessar-fogo entrasse em vigência. Mas os norte-americanos – como sempre – e sua cobiça sem limites! Queriam para eles todas as concessões de petróleo e gás, pôr as mãos em todas elas. E queriam que Gaddafi se aposentasse. Petróleo e gás são sempre negociáveis. Questão de acertar o preço. Quanto à aposentadoria, podem enfiar no seu rabo.
Guarda-costas do Grande Gaddafi: “E quando estivermos fazendo a entrega, eu pego um dos deles, arrebento o cara e arranco tudo dele, de volta. Que tal?”
O Grande Gaddafi: “Grande plano, porra, super engenhoso, se estou entendendo bem. Perfeito, porra, infalível como uma porra de relógio suíço, porra.”
Que tipo de guerra “popular” foi aquela? O pessoal do serviço secreto trouxe-lhe em bandeja de prata a mais recente pesquisa Rasmussen – segundo a qual, só 20% dos norte-americanos apoiam hoje o escandaloso bombardeio por EUA/OTAN, sobretudo porque aqueles panacas bombardearam civis e mais civis, até crianças. Os europeus – os que contam, gente de verdade, não os burocratas panacas de Bruxelas – estão ainda mais incomodados que os norte-americanos.
E dizer-se que os niilistas europeus tentaram vender a ficção de que ele, Gaddafi, seria um “ditador maléfico” que queria “matar o próprio povo”!
Guarda-costas do Grande Gaddafi: “Niilistas?! Agora, fodeu... Quero dizer, digam o que disserem dos princípios do nacional socialismo, Meu Chapa árabe, pelo menos era algum ethos”.
Os niilista europeus bombardearam a infraestrutura civil – privaram muita gente no oeste da Líbia, de água e comida, para que as ‘massas’ ‘se levantassem’ e derrubassem Gaddafi. É como funciona uma guerra para “proteger civis”, nessas cabeças ocidentais doentias: ensinar os civis a se borrarem de medo.
O Grande Gaddafi sempre soube que nunca esteve só. O povo de Trípoli não se borrou de medo. Estudantes, professores, cidadão comuns, todos armados com Kalashnikovs, lança-granadas e morteiros, todos prontos a escavar trincheiras, cercar a cidade, montar um cordão de pontos de controle, organizar a resistência casa a casa. Os ‘rebeldes da OTAN’ jamais tomariam Trípoli.
Guarda-costas do Grande Gaddafi: “Cara, recebi informações novas. Há mais merda no ar, do que pensávamos.”
Verdade. Gaddafi agora sabe com certeza que grandes tribos – Warfa'llah, Washafana, Tarhouna, Zlitan – todas sempre estiveram com ele. E que, ao contrário do que prega a propaganda dos “rebeldes da OTAN”, Zawiya, Gharian e Surman não caíram.
Gaddafi sempre soube que aqueles sujeitos sem sal nem vergonha do Conselho Nacional de Transição [ing. Transitional National Council (TNC)] nunca superariam ou superarão as guerras tribais seculares que os separam; todas elas, de fato, miniguerras civis.
Impossível acreditar que norte-americanos e europeus tenham sido idiotas a ponto de pôr dinheiro na brigada Abu Ubaidah bin Jarrah. A brigada recusa-se a lutar sob comando dos “rebeldes da OTAN” e já assumiu a “segurança interna”, pelo mesmo método de sempre: eles degolam inimigos.
Gaddafi hoje conta, inclusive, com o apoio da furiosa tribo Obeidi – que inclui a família do general General Abdul Fatah Younis, que foi ministro do Interior de Gaddafi, antes de virar desertor comandante-em-chefe dos ‘rebeldes’ e ser assassinado lá mesmo, pelos mesmos “rebeldes da OTAN”.
Ocidentais imbecis, que ainda ontem beijavam barra de túnica africana, em visita que faziam, em fila, à tenda itinerante. Hoje salivam só de ouvir falar de sumarentos acordos comerciais, ainda mais sumarentas perfurações nos campos de petróleo, certos – perfeitos idiotas – que conseguirão evitar a inevitável, monstruosa guerra civil tribal que descerá sobre eles.
O Grande Gaddafi: “Ok. Certo, certo. Então, se assinarem meu cheque, 10% de meio trilhão... 50 bilhões... Eu me mando. Sumo.”
Gaddafi sempre soube por que vieram até ali, mijar no seu tapete. Porque nunca deu a britânicos, franceses e ianques as concessões de petróleo que queriam. Então eles, e os insuperáveis salafrários sauditas, puseram-se a financiar aqueles fanáticos que tinham contatos com a al-Qaeda – exatamente o que fizeram no Afeganistão nos anos 1980s.
Banqueiros-gânsteres inventaram um Banco Central “alternativo” – com a prestimosa ajuda do HSBC – para assaltar a Líbia e roubar o dinheiro dos líbios. E também inventaram uma nova empresa de petróleo, nova, totalmente privada, administrada pelo Qatar, para roubar o petróleo da Líbia.
Ora, ora... Por que ele, Gaddafi, não pensou antes nesse lance de “guerra humanitária”? Que matança utilíssima, teria feito!
O Grande Gaddafi: “Vocês têm a história de vocês, eu tenho a minha. O que digo e provo é que confiei meu dinheiro a vocês e vocês – vocês! – roubaram o meu dinheiro que tinham sob sua guarda.”
A “Coalizão”: “Loucura! Como se algum dia tivéssemos SONHADO com roubar essa merda de dinheiro líbio!”
O que está sendo feito na Líbia terá troco – será horrível. De dar medo.
As bombas da OTAN já degradaram a indústria líbia de petróleo, que voltou ao ponto em que estava, no mínimo, há três anos passado. Mas os canalhas, covardes, não terão coragem de atacar Trípoli. Numa batalha por Trípoli, mulheres e crianças morrerão em massa.
O Grande Gaddafi: Ah, malditos! Fucking fascistas!
Terão de bombardear Trípoli até devolvê-la à idade da pedra – exatamente o que já fizeram em Bagdá. Ou usarão alguma arma biológica alucinada, que fará de Trípoli cemitério e deserto.
O Grande Gaddafi: “Não pode ser. Não será. Não vai ficar assim, ya know, essa violência não pode ficar sem castigo, man.”
OK. Seja. Se esse é o tipo de paraíso que a OTAN e os ‘democratas’ sauditas e qataris querem... o Nosso Chapa árabe lhes dará o que querem – e será como sobreviver no inferno. Mercado livre aberto para todos, uma base do Africom no Mediterrâneo, um governo fantoche, um Karzai da Líbia – e um exército de guerrilheiros fanáticos degoladores que os combaterão por muitas gerações, até o dia do Juízo Final. O Afeganistão remixed.
O Grande Gaddafi procurou The Chocolate Watchband [3] no seu iPod – “passei por aqui / só pra ver / em que condições / estava minha condição” – olhou em volta e andou diretamente para dentro da nem tão fresca noite norte-africana. Os jatos da OTAN circulavam no céu. Ouviram-se sete explosões em Bab al-Aziziyah.
O desconhecido: “Meu Chapa” desapareceu na escuridão – mais escura que cu de boi em noite sem luar na pradaria. Sem fundo.
Notas dos tradutores
[1] Para ler pensando em “O Grande Lebowiski” [The Big Lebowiski, 1993, dir. irmãos Coen]. Todas as falas aí citadas de Gaddafi, são falas do Grande Lebowski, no filme; falas de outros personagens do filme aparecem atribuídas aí a outros “falantes”. O filme nara a história de Jeffrey Lebowski, apelidado “The Dude” [‘Meu chapa’, ‘meu camaradinha’, ‘o cara’; gíria], que vive em Los Angeles no início dos anos 90s. Uma noite, ‘Meu Chapa’ chega em casa e encontra à sua espera dois homens que lhe dizem que sua mulher deve uma enorme quantidade de dinheiro a um homem chamado Jackie Treehorn; e que ‘Meu Chapa’ tem de pagar a dívida, dado que Treehorn sabe que ‘Meu Chapa’ é riquíssimo. Os homens torturam ‘Meu Chapa’, espancam-no, metem sua cabeça no vaso sanitário e, na saída, urinam no tapete que há na sala e ao qual ‘Meu Chapa’ é emocionalmente muito ligado. A questão é que ‘Meu Chapa’ não tem mulher, nem dinheiro algum; é desempregado crônico e vive de bicos. Os agressores, afinal, vendo, de fato, a miséria da casa onde ‘Meu Chapa’ vive, dão-se contra de que apanharam o Jeffrey Lebowski errado. E vão-se.
Depois de alguma reflexão sobre o ocorrido, ‘Meu Chapa’ aceita a sugestão do amigo Walter, de irem em busca do outro Jeffrey Lebowski, para exigir dele algum tipo de indenização pelo tapete urinado. Para grande surpresa de ‘Meu Chapa’, o outro Jeffrey Lebowski é um velho, preso a uma cadeira de rodas e perfeito canalha ‘de filme’: vive em mansão imensa, com piscina gigante, é violento contra visitantes como ‘Meu Chapa’, tem um capanga-guarda-costas (que bajula o chefe) e uma sexy jovem esposa-troféu – Bunny –, além de muitos tapetes caríssimos. ‘Meu Chapa’ rouba-lhe um tapete e dá-se por bem indenizado. Tapete a mais, tapete a menos, para quem tem tantos...
A história muda de registro quando Bunny é sequestrada e o Lebowiski milionário pede que o Lebowiski-‘Meu Chapa’ lhe sirva de portador, para entregar aos sequestradores o resgate de um milhão de dólares. Daí em diante a coisa é praticamente inenarrável, senão como o filme narra: misturam-se objetos de diferentes planos de discussão – calcinhas, cuecas, um tapete de alto valor sentimental, pornografia, niilistas, carros destruídos, esmalte verde para unhas, um pedófilo, disputas de boliche, para citar alguns itens-ícones. O filme é interessantíssimo e pinta retrato miserável dos EUA onde nem os sobreviventes sabem exatamente porque sobrevivem ou como, e são capazes de vinganças exemplares.
[2] Coquetel adocicado de vodka (White Russian).
[3] Banda de rock psicodélico “de garagem”, criada em 1965.
http://redecastorphoto.blogspot.com/2011/08/o-grande-gaddafi-1.html
CORREÇÃO DE FRASE:
"Não pergunte depois a tempestade onde foram parar todas as folhas."
Vítor Hugo, Os miseráveis.
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