terça-feira, 24 de junho de 2008

OS EUA QUEREM AS FORÇAS ARMADAS BRASILEIRAS MENORES E VOLTADAS PARA O COMBATE INTERNO AOS TRAFICANTES

Esse conceito não é novidade. Trago-o à pauta por dois motivos. O primeiro é o acirramento do debate, depois do recente incidente do Morro da Previdência, quanto ao emprego das Forças Armadas brasileiras em ações internas de segurança e de combate ao narcotráfico. Alguns artigos da nossa imprensa questionam, até mesmo, a necessidade de o Brasil ter Forças Armadas.

O segundo decorre de eu ter reencontrado uma pasta perdida onde guardava recortes e anotações. Hoje, achei oportuno recordar uma reportagem da Veja da semana de 26/02/1992. O artigo da revista abordou a pressão do governo dos EUA sobre o então presidente Collor e seus ministros militares para que o Brasil reduzisse as Forças Armadas e destinasse o restante somente para o combate interno aos traficantes.

Por quê? É óbvio que, para o governo norte-americano, o mundo seria muito mais submisso aos seus interesses se somente as Forças Armadas dos EUA continuassem crescendo e se aparelhando até os dentes, cada vez mais, e os demais países ficassem sem capacidade de defesa contra agressões externas, apenas com reduzida força para a segurança interna, o combate ao narcotráfico e para outras pequenas ações de polícia. Se a China, a Rússia, a Índia, o Brasil e outros seguissem essas diretrizes de desarmamento expressas pelos norte-americanos seria o nirvana para o aumento e a perpetuação do poder hegemônico dos EUA.

RECORTES 11:

Vejamos trechos do recorte de uma reportagem da revista Veja da semana de 26/02/1992:

RECEITAS DE CASERNA

SECRETÀRIO DE DEFESA AMERICANO SUGERE QUE FORÇAS ARMADAS BRASILEIRAS EMAGREÇAM E COMBATAM O NARCOTRÁFICO

“O Secretário de Defesa dos Estados Unidos, Richard Cheney, 51 anos, ficou apenas 24 horas em Brasília na semana passada.

(...) Cheney usou na conversa de 25 minutos que teve na manhã de terça-feira com o Presidente Fernando Collor a mesma fala mansa de suas aparições na televisão para falar dos avanços aliados no Iraque.

No encontro, o secretário [...] disse a Collor que os Estados Unidos esperam do Brasil a redução de seu efetivo militar -cerca de 325.000 homens- e o maior engajamento das Forças Armadas no combate ao tráfico de drogas.

(...) Na visão americana, o ‘esfarinhamento’ da Guerra Fria e o fim da oposição entre os dois grandes blocos armados tornaram dispensável a manutenção de efetivos militares nas nações amigas dos americanos e inimigas do comunismo. A prioridade do governo americano na América Latina passou a ser o combate ao narcotráfico”

A revista Veja, como não poderia deixar de ser, logo “vestiu a camisa” do interesse norte-americano. Ela desenvolveu aquela reportagem já voltada com simpatia para aquelas diretrizes de Cheney. No seu tradicional estilo, debochou dos “nossos generais” que estavam reticentes e terminou o artigo com ironia:

“Na versão de um assessor direto de Collor, a implicância dos militares brasileiros [ao não simpatizarem com a orientação recebida dos EUA] não é constitucional: “A Marinha não quer virar uma simples guarda - costeira, a Aeronáutica não quer ser um táxi aéreo e o Exército tem medo de se transformar numa central de guarda - costas”. Não são missões tão ruins assim. São tarefas que poderiam até treinar e enrijecer a tropa enquanto ela se prepara para uma guerra que nunca virá.”

Aquelas “ordens” de Washington em fevereiro de 1992 não pegaram Collor de surpresa. Um antecessor de Cheney, o influente ex-secretário de defesa dos EUA e ex-presidente do Banco Mundial, Robert McNamara, já publicara, em abril de 1991, que o Brasil e outros países do Terceiro Mundo, mediante “severas condicionalidades”, “teriam suas ajudas financeiras vinculadas à redução dos gastos militares a níveis ideais, ao menos à metade até o final da década”.

Nos governos Collor e FHC houve o cordato desencadeamento daquelas instruções dos EUA, com todo o apoio da grande mídia brasileira.

Especialmente durante os dois governos PSDB/PFL/FHC, volta e meia era tema de autoridades e da nossa imprensa: “Forças Armadas para quê?”.

Sobre aquele veneno de fraqueza e subserviência em nós inoculado, vejo outros dois pequenos recortes na pasta que reencontrei:

O jornal Folha de S. Paulo (FSP) publicou em 02/05/2004, como “Opinião”: “O Brasil ter Forças Armadas é só por diletantismo, já que há décadas não há guerras e não há nenhuma guerra à vista”. Naquele mesmo ano, no dia da celebração da independência brasileira, a Folha publicou: “Parada militar para celebrar o chamado Dia da Pátria é, em país pacífico, uma imitação de países guerreiros e, acima de tudo, uma impropriedade absoluta e lamentável” (Jânio de Freitas, FSP, 07/09/2004).

Assim, naquele ambiente, as desarmadas Forças Armadas brasileiras se tornaram, ao longo da década de 90, ainda mais obsoletas, frágeis, sucateadas. Perderam todo o poder dissuasório. Muito fracas até frente a vários outros países sul-americanos.

O país, dolosa ou inocentemente, ficou sem o mínimo indispensável respaldo militar para uma política externa soberana. O US. Department of Defense (DoD) foi obedecido.

As gigantescas reservas petrolíferas agora descobertas pelo Brasil agravam muito mais esse grave quadro de ausência de capacidade de defesa do patrimônio brasileiro.

Contudo, conhecendo a nossa imprensa e os maiores interesses externos que elas atendem, não estou surpreso ao ouvir novamente: “Forças Armadas para quê?”

Por fim, uma observação. Como diz o velho ditado, tudo tem vantagens e desvantagens (exceto ser juiz do STF, que somente tem vantagens). A discussão atual decorrente do assassinato de três rapazes do Morro da Providência, debate esse magnificado por mesquinhas e regionais lutas Globo+Gabeira x Record+Crivella, traz uma vantagem para o Brasil. Por interesses menores e imediatos, o Exército está sendo condenado na mídia a afastar-se de missões de segurança pública, do combate a traficantes. E isso é ótimo para a defesa nacional e contraria aquelas ordens de Washington acima comentadas, que querem nossas Forças Armadas no máximo como polícias.

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