sexta-feira, 31 de outubro de 2008

QUEM GANHOU AS ELEIÇÕES DE 2008?

Li ontem no site “Vermelho” o seguinte artigo de Altamiro Borges. O autor é jornalista, editor da revista Debate Sindical e autor do livro “Venezuela: originalidade e ousadia” (Editora Anita Garibaldi, 3ª edição).

“Com os olhos voltados para a sucessão presidencial, todas as forças políticas se proclamam como vitoriosas das eleições municipais. Mas quem, de fato, saiu mais fortalecido deste pleito?

Muitos colunistas da mídia burguesa, verdadeiros “jornalistas da boquinha” – tal sua intimidade com as elites –, alardeiam que Lula foi derrotado e que José Serra já é quase o novo presidente do Brasil. Pura mistificação ideologizada. Já alguns aliados do presidente Lula, mais realistas do que o rei, insistem em afirmar que está “tudo bem” e não enxergam qualquer perigo no horizonte”.

Nem uma coisa nem outra. Uma visão mais nuançada do pleito municipal, que é uma prévia da sucessão presidencial, mas não determina o resultado do jogo, indica que o seu resultado foi de certo equilíbrio. No geral, três blocos ganharam musculatura nesta eleição: as forças aliadas do governo Lula, incluindo seu núcleo mais a esquerda, cresceram bem; os setores mais centristas e pragmáticos, em especial o PMDB, aumentaram o seu poder de barganha; e, apesar da regressão eleitoral do PSDB, DEM e PPS, a oposição de direita consolidou a candidatura do tucano Serra.

MANIPULAÇÃO DA MÍDIA SERRISTA

Parte da mídia hegemônica tenta vender a imagem de que o governo Lula foi derrotado no pleito e sai fragilizado para a sucessão presidencial. Colunistas que fazem a cabeça de camadas médias entorpecidas, como Lucia Hippolito e Boris Casoy, nem sequer disfarçam a empolgação tucana. Reinaldo Azevedo, um serrista pedante paparicado pela revista Veja, ridiculariza quem fala em “equilíbrio do resultado” e garante que “Lula, o PT, Dilma Rousseff” e outros críticos do deus-Serra foram os derrotados. “Ah, sim. O Chico Buarque também perdeu. Ele promete agora dar apoio a Raúl Castro se um dia houver eleições diretas em Cuba”, esbraveja o anticomunista.

Embalado por esta cantilena midiática, o senador Sérgio Guerra, presidente do PSDB, recobrou a sua arrogância de coronel. “A sucessão presidencial já começou” e Lula “não vai eleger qualquer poste”. O alvo do tucano, que não consegue unir sequer seu partido e foi escorraçado pelas urnas no seu estado, já é a ministra Dilma Rousseff. “Ela é uma candidata produto da assombração de Lula.

Não tem característica de líder popular, é autoritária e arrogante”. Até o moribundo FHC saiu da catacumba para posar ao lado do demo Gilberto Kassab – para a frustração do candidato oficial do seu partido, Geraldo Alckmin, que foi fritado e rifado na eleição da capital paulista.

A TRAJETÓRIA ASCENDENTE DAS ESQUERDAS

Mas há mais vontade do que realidade nestas avaliações. Basta analisar os números dos prefeitos eleitos e a própria simbologia política desta batalha. A base aliada do governo Lula, que reúne 16 partidos numa gelatinosa composição, irá governar 93,5 milhões de eleitores no país – 72,5% do eleitorado brasileiro. Já a oposição de direita, formada pelo PSDB, DEM e PPS, governará 35,4 milhões de eleitores. A difusa base aliada comandará 20 das 26 capitais no país. PT, PSB, PDT e PCdoB, que compõem o núcleo de esquerda do governo, foram os partidos que mais cresceram, mantendo a trajetória ascendente dos últimos pleitos. Já a oposição de direita encolheu.

Afora os números inquestionáveis, o cinismo da direita e da mídia fica patente quando se recorda como transcorreu a campanha eleitoral. Nenhum oposicionista agora arrogante atacou o governo. Preferiu se travestir de “amigo” do presidente, temendo a sua alta popularidade. O tucano eleito em São Luiz usou o bordão “sou Lula, voto Castelo”. Irônico, Lula desdenhou: “Parece que não existe oposição neste país”. Para Emir Sader, “se os tucanos consideram que Lula foi derrotado, deveriam tê-lo atacado na campanha. Se fosse fazer a lista dos que elogiaram o Lula – incluindo até o Kassab –, ele seria o vencedor praticamente unânime no Brasil inteiro”.

PARA ONDE CAMINHA O PMDB?

Além da trajetória ascendente das esquerdas, a novidade deste pleito foi o crescimento de forças centristas, em especial do PMDB. Este “partido-ônibus”, que reúne inúmeros caciques regionais, faz parte da base de sustentação do governo Lula, controlando importantes ministérios. Mas ele é movido pelo pragmatismo exacerbado. A maioria dos seus dirigentes defende a manutenção da base de apoio de Lula, inclusive com a indicação do vice na sucessão de 2010. Mas algumas de suas lideranças não escondem a vontade de desembarcar na oposição de direita, dependendo das suas condições de competitividade em 2010 e dos efeitos da crise econômica no país.

Orestes Quércia, agora absolvido pela mídia que antes o taxava de “fisiológico”, virou aliado de Serra, emplacando a vice do demo Kassab. O cacique paulista do PMDB prega uma guinada na política de alianças do seu partido. “Prefiro a composição com Serra para presidente para mudar essa administração do PT”. Dada a capilaridade da legenda, que elegeu mais de mil prefeitos, ela será alvo de intensa cobiça. Para o ex-ministro José Dirceu, que nunca pecou pela falta de visão estratégica, a experiência da capital paulista, manietada por Serra e que uniu o DEM e o PMDB, aponta para a possibilidade de um “perigoso bloco eleitoral” contra as esquerdas.

Para ele, o PT deve superar seus graves erros na política de alianças e priorizar a “conquista o centro político”.

FORÇA E FRAGILIDADE DE SERRA

Por último, as eleições de 2008 alavancaram José Serra. Sem escrúpulos, o grão-tucano fritou o candidato do seu próprio partido, num dos mais cruéis processos de “cristianização” da história política brasileira, bancou seu demo-laranja na capital e ainda atraiu parcelas do PMDB. Hoje, ele governa o maior estado da federação, manieta a prefeitura de uma das maiores metrópoles do mundo e mantém forte hegemonia no estado.

Além disso, conta com o apoio ativo da mídia, que não noticia nada sem pedir-lhe permissão, e do grosso da elite empresarial. Seria cegueira não enxergar os riscos no horizonte para a continuidade da experiência progressista do governo Lula.

Mas também não dá para exagerar na força do tucano, como induz sua mídia. Em primeiro lugar, porque a oposição de direita encolheu nas urnas. O demo só se safou do inferno devido à traição de Serra; o PPS definhou e já discute sua extinção; e o PSDB também recuou. Em segundo lugar, porque Serra sofrerá para recompor a unidade do seu partido.

Alckmin até pode deixar a legenda e Aécio Neves parece não se acovardar diante do sangrento “moto-Serra”. Em terceiro, porque a aliança com o PMDB é sempre uma aposta de risco. É bom lembrar a derrota do tucano-verde no Rio de Janeiro. Ou seja: Serra consolidou o seu bloco e venceu uma batalha, mas não a guerra”.

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