Entrevista exclusiva concedida pelo Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, à rede de televisão Al Jazeera
Doha-Catar, 15 de maio de 2010
Jornalista: Senhor Presidente, bem-vindo ao Talk To AlJazeera. É de conhecimento de todos que o senhor vem de uma família pobre. Que o senhor deixou a escola na quinta série para ajudar a sustentar sua família. E que, quando era criança, o senhor limpou sapatos de homens mais ricos que o senhor. Quanto essas experiências, enquanto criança, ajudaram a formar o homem que acabou por tornar presidente?
Presidente: Eu penso que a minha personalidade se deve a uma educação que eu recebi, dentro de casa, da minha mãe. Eu acho que essa minha experiência de vida forjou a concepção que eu tenho hoje, como Presidente da República. Embora eu tenha consciência de que sou o presidente de 190 milhões de brasileiros, eu tenho consciência de que como chefe de Estado, eu tenho que priorizar os mais pobres, os mais necessitados, que são as pessoas que mais precisam do Estado. Com pouco dinheiro, você ajuda muita gente pobre e, às vezes, com muito dinheiro, você não contenta uma pessoa muito rica. Então, é uma questão de definição. Eu fui formado assim, depois aprendi no sindicato, e eu tento, na Presidência da República, retratar um pouco daquilo que eu vivi na minha vida.
Jornalista: Quero entender que sua primeira esposa morreu de hepatite quando estava no oitavo mês de gravidez e que perdeu o bebê também, seu filho. É verdade que isso o levou à política, porque, naquela época, o senhor não podia pagar uma assistência médica muito cara?
Presidente: Não, não, não, não foi por isso. Eu penso que a minha mulher morreu porque nós tínhamos um sistema de saúde precário, apesar de que a empresa em que eu trabalhava tinha convênio com um hospital que era tido como hospital de boa qualidade, que era um hospital em São Paulo. Mas, de qualquer forma, eu, hoje aos 64 anos e 40 anos depois, eu estou convencido de que se a minha mulher tivesse sido internada num hospital de melhor qualidade, ela poderia ter sido salva. Foi um momento muito difícil na minha vida, e...
Eu entrei na política por outra coisa. Eu, em [19]78, não gostava de política e não gostava de quem gostava de política. Aí, o governo militar tentou fazer uma lei que proibia que professor fizesse greve, que bancário fizesse greve, quem trabalhava em posto de gasolina enchendo tanque não podia fazer greve. Aí, eu fui a Brasília conversar com os deputados. Chegando em Brasília, eu descobri que não tinha nenhum deputado trabalhador. Aí eu falei: bom, nós temos que criar um partido. E aí começamos a trabalhar a criação do Partido dos Trabalhadores que, graças a Deus, em pouco tempo virou o maior partido de esquerda da América Latina.
Jornalista: E então o senhor se tornou presidente na sua quarta tentativa. E tem sido um período [à frente do Governo] de incrível sucesso. O senhor se surpreende com esse sucesso que o senhor tem tido em seus mandatos?
Presidente: Olhe, eu sempre quis provar que era possível colocar na prática aquilo que eu acreditava na teoria, nas minhas pautas de reivindicações. Uma vez, eu lembro como se fosse hoje, perguntaram para mim: “Lula, por que você quer ser presidente da República?” Eu respondi: porque eu quero provar que é possível atender as reivindicações que eu faço dos outros. Bem, eu tinha em mente que eu tinha que dar certo, porque se eu desse errado, não era alguém da elite política brasileira, da elite empresarial, da elite jurídica que fracassava, porque muitos fracassaram e não acontecia nada. Mas eu era um operário, um dirigente sindical. Se eu fracasso, nunca mais um operário ia chegar a presidente da República. E eu tinha muito em mente o Walesa, na Polônia. Ele foi um fracasso como governante, e eu lembrava que ele, depois de presidente, ele foi candidato e teve menos que 1% dos votos. Eu dizia: não, tem que dar certo. Então, eu me levantava todo santo dia com a certeza de que eu tinha que fazer mais, mais e cada vez mais. Graças a Deus as coisas deram certo.
Jornalista: Bem os aplausos têm sido muitos e entusiasmados, da parte de líderes mundiais, de pessoas em todas as partes do globo, inclusive da revista Time, que o elegeu o homem mais influente do Planeta. Como isso o faz se sentir?
Presidente: Olha, eu acho que nós estamos colhendo o resultado de um trabalho sério que nós estamos fazendo. Quando, no dia 10 de dezembro de 2002 – eu já estava eleito presidente da República –, eu fui à Casa Branca conversar com o presidente Bush, e ele estava obsessivo com a Guerra do Iraque. Eu disse ao presidente Bush: a minha preocupação, Presidente, não é o Iraque. A minha preocupação é a fome do meu povo. Eu tenho mais de 50 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza. Como é que eu vou me preocupar com o Iraque?
Bem, o dado concreto é que hoje, passados sete anos, nós elevamos 31 milhões de brasileiros à classe média e tiramos 24 milhões de brasileiros da extrema pobreza. Essa é uma coisa muito importante para mim, me deixa muito feliz, e eu acho que há o reconhecimento do mundo, porque nós vamos cumprir todas as Metas do Milênio bem antes do prazo. Qual é a coisa importante? É que eu não sou um homem de ficar procurando encrenca, eu não gosto de encrenca. Eu quero gastar a minha energia tentando pensar numa coisa positiva, tentando pensar em ajudar alguém, tentando construir a paz. Não é possível você governar procurando inimigo, querendo uma guerra. Você tem que governar para o seu povo, pensando em fazer o melhor e tentando dialogar com todo mundo.
Então, eu acho que nós vamos deixar no Brasil um legado de comportamento republicano que o Brasil não conhecia: tratar todo mundo com respeito – os líderes internacionais – mas também exigir um tratamento respeitoso, e não um tratamento de segunda classe.
Jornalista: Podemos dizer – não podemos? – que no decorrer do tempo na sua presidência o senhor foi transformando a política externa em parte importante de seus 10 anos como presidente. Mais de 40 embaixadas foram abertas ao redor do mundo, o senhor realmente tem tentado de aproximar de vários países ao redor do mundo. Qual é a força motriz por trás disso? Por que o senhor faz isso?
Presidente: Olha, eles estão falando isso porque, no dia 27 de janeiro de 2003, eu fui a Davos. Eu saí do Fórum Social, em Porto Alegre, no Brasil, e fui a Davos, e, na volta, eu disse ao meu ministro de Relações Exteriores: eu acho que nós temos que mudar a geografia comercial do mundo. Não é possível um país, do tamanho do Brasil, ficar dependendo apenas de dois grandes blocos: de um lado os Estados Unidos, de outro lado a Europa. Nós precisamos diversificar as nossas relações comerciais.
Priorizamos a América Latina, priorizamos a África, priorizamos o Oriente Médio. Eu visitei sete... oito Países Árabes e visitamos, também, uma parte do Mundo Asiático. O que aconteceu, de fato? Com o Mundo Árabe, de 2005 para cá, a nossa balança comercial cresceu cinco vezes. O Brasil era muito dependente da União Europeia e dos Estados Unidos, e eu achava que, pela dimensão do Brasil e pela potencialidade do Brasil, nós tínhamos que diversificar e não ficar dependendo de ninguém, mas ter boas relações com todo mundo. Hoje a América Latina é nosso maior parceiro comercial; hoje a China é o nosso maior parceiro comercial individual. Na África, nós temos hoje um fluxo de balança comercial acima de US$ 20 bilhões, e antes a gente não tinha nada, porque a elite política brasileira só olhava para a Europa e para os Estados Unidos, para a Europa... Não via nem a América do Sul, não via a África e não via o Oriente Médio. As autoridades brasileiras que viajaram para o Líbano, foi em 1876. Não é possível!
Jornalista: O senhor acha que o coroamento de seu tempo na Presidência seria o Brasil conseguir um assento permanente no Conselho de Segurança? Seria esse seu objetivo final?
Presidente: Olhe, eu estou há oito anos brigando por isso. É engraçado, é engraçado: todo mundo é favorável ao Brasil, todo mundo. Todo mundo concorda que o Brasil deva ter uma cadeira no Conselho de Segurança, mas ninguém quer abrir mão do poder que tem. É como se fosse um baile, em que tem cinco pessoas, numa festa bonita, e não querem deixar os outros entrarem. Veja, a geografia política de 2010 é muito diferente da geografia política de 1945, muito diferente. É só olhar o mapa da Rússia para ver como mudou. É só olhar o que aconteceu com a China, o que aconteceu com a Índia, o que aconteceu com o Brasil, é só olhar para o continente africano. Então, o que nós queremos? Que o mundo esteja representado no Conselho de Segurança. Não importa que seja um ou que sejam três da África. Não importa que seja um ou dois da América Latina. Como é que explica a Índia não estar no Conselho de Segurança? Como é que explica a China estar e o Japão não estar? Então, o que é que nós queremos? É abrir o clube e permitir que outras pessoas entrem. Você imagina, hoje, se tivesse uns dois ou três países no Conselho de Segurança como membros permanentes, que não têm bomba nuclear. Seria muito mais fácil negociar os acordos sobre não proliferação de armas nucleares.
Jornalista: O problema é que hoje, precisamente hoje, muitas pessoas sugerem que hoje suas chances de conseguir um assento permanente estão ameaçadas por causa de algumas de suas ações de política externa, particularmente no que se refere ao Irã, em tentar intermediar a questão nuclear .
Presidente: Não, veja, se a conquista de uma cadeira no Conselho de Segurança significa agir com subserviência, nós não queremos. Nós queremos uma cadeira para agir com soberania e sermos tratados em igualdade de condições. Nós não queremos ser melhores do que ninguém, mas não queremos ser inferiores a ninguém. Ali não depende do tamanho da economia do país, não depende do tamanho da população do país. Depende, única e exclusivamente, da importância estratégica de cada país no seu continente. E o Brasil é um país muito importante, como eu acho que a Índia é importante...
Jornalista: Vamos voltar à questão da questão nuclear iraniana. Muitas pessoas dizem que o senhor está perdendo oportunidades no exterior ao se envolver nesse tema. O que o faz pensar que o senhor pode ser bem-sucedido nisso, quando muitos outros países não o foram?
Presidente: Ora, deixa eu dizer uma coisa para você, com toda sinceridade: eu não ando à procura do sucesso. Eu tenho eleições no meu Brasil, em outubro, e eu deveria estar no Brasil cuidando das eleições brasileiras, para eleger a minha candidata. ( Eu ) não pense que eu ando confortável fora da minha casa. É que eu vivi a experiência do Iraque, que o Iraque foi uma mentira, foi uma mentira do governo americano, dizendo que tinha armas químicas, e foi uma mentira do Saddam Hussein, que não teve coragem de dizer para o seu povo que não tinha armas químicas.
Eu não quero que essa mentira se repita, eu quero que as pessoas conversem. O presidente Obama, o presidente Sarkozy, a primeira-ministra Angela Merkel, o primeiro-ministro Gordon Brown, que agora saiu, o presidente Hu Jintao, o presidente Medvedev, todos que fazem parte do Conselho de Segurança poderiam ter chamado o Ahmadinejad para conversar.
Jornalista: O senhor está confiante em que possa trazê-los à mesa de negociação?
Presidente: Veja, é que eu acho que, obrigatoriamente, eles têm que negociar. Eles são os membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas, e não se pode conversar com terceiros, pessoas de terceiro escalão, quarto escalão, quinto escalão. De vez em quando, os dirigentes políticos têm que assumir responsabilidade!
Você, imagine, que nós fracassamos na Rodada de Doha porque os líderes não querem discutir, ficam os prepostos discutindo! Na questão do Irã é a mesma coisa. Nós temos que acreditar no poder de convencimento do diálogo. Eu acho o Obama uma figura fantástica, eu acho o Sarkozy uma figura... Essas pessoas têm argumentos que poderiam convencer. Então, o que eu acho...
Jornalista: Mas não se viu isso, não é? Há alguma evidência de que o senhor poderia convencer o presidente Ahmadinejad a vir para a mesa?
Presidente: Sabe por quê? Veja, não funcionou, não funcionou porque as pessoas esticam a corda antes de conversar. Eu adoro que meus assessores façam política por mim, adoro. Eu tenho... o Itamaraty, que cuida da diplomacia brasileira, é um centro de excelência. Eu adoro que eles trabalhem por mim, mas na hora da decisão eu quero ver o meu interlocutor olhando nos meus olhos e eu nos olhos dele, para a gente dizer sim ou não. A gente não pode terceirizar a política. Só tem uma coisa que a humanidade não pode terceirizar: é a decisão de poder. E a decisão de poder tem que participar de um processo de conversa.
Jornalista: Mas o senhor, como Presidente do Brasil, o senhor está convencido de que a política nuclear do Irã é estritamente pacífica? O senhor está convencido disso?
Presidente: Eu quero que seja pacífica, vou trabalhar para ser pacífica.
Jornalista: Isso é suficiente?
Presidente: Eu quero para o Irã o que eu quero para o meu país. O meu país, está escrito na Constituição, a proibição de construção de armas nucleares. Não é a vontade do presidente Lula, é a Constituição. Então, eu quero, eu quero que o Irã possa desenvolver a pesquisa na área nuclear para produzir energia elétrica e para produzir remédios, na indústria farmacêutica. Fora disso, fora disso eu não quero, não quero nem para o Irã, não quero para o Brasil e não quero para nenhum outro país.
E quero que os países que têm armas nucleares desativem o que têm, para que a gente possa construir, definitivamente, um mundo de paz. Eu trabalho com essa convicção, de presidente de um país pacifista. Se tem um país no mundo que tem um povo pacífico, chama-se Brasil. Eu tenho certeza de que as pessoas querem paz. Eu tenho certeza de que não interessa ao presidente Obama, não interessa ao presidente Ahmadinejad conflito ou guerra. Então, nós precisamos encontrar um jeito de encontrar uma palavra, um gesto, uma atitude que possa dizer: somente a paz é que pode garantir a tranquilidade aos povos do mundo inteiro.
Jornalista: O senhor tem alguma evidência de que o Presidente do Irã irá escutá-lo?
Presidente: Olha, me ouvir, ele vai. Não sei se vai aceitar as minhas ideias. Como eu estou disposto a discutir com seriedade, não apenas o comportamento do Irã, mas o comportamento de todos nós. É mais difícil alguém que tem arma nuclear pedir para uma pessoa não fazer arma nuclear. Agora, é mais fácil quem não tem, como eu, pedir apenas para que seja igual a mim, porque a explicação do crescimento econômico brasileiro, a explicação do desenvolvimento do Brasil se deve ao clima de tranquilidade.
Eu fico imaginando, eu fico imaginando um dirigente político, quanta energia ele joga fora, pensando em coisas que não sejam prioridades para o seu povo. Eu não quero perder energia. Cada energia minha tem que ser perdida pensando em ajudar alguém a construir a democracia e a paz. É isso o que faz sentido a política, para mim.
Jornalista: O senhor voltará do Irã após uma viagem coberta de êxito? O senhor vai conseguir aquilo que se propôs fazer?
Presidente: Olha, eu não sei. Eu vou ao Irã. Depois do Irã eu tenho que ir à Espanha, porque tem um grande encontro empresarial. Depois eu passo cinco horas em Portugal e regresso ao meu país.
Jornalista: Sim, mas no que concerne ao Irã, o senhor acha que será uma missão bem-sucedida?
Presidente: Eu não sei, eu trabalho com a ideia que sim, eu trabalho com a ideia que sim.
Jornalista: E se não for bem-sucedida, o senhor aprovará as sanções das quais todo mundo está falando?
Presidente: Olha, se não for bem-sucedida, o Brasil é membro das Nações Unidas, e tudo o que as Nações Unidas decidirem, democraticamente, o Brasil não vacilará em apoiar.
Jornalista: O senhor concorda que as sanções são o caminho certo?
Presidente: Veja, tanto não concordo, que estou tentando negociar. Agora, se um país – o Irã ou outro qualquer – não quiser acatar uma decisão soberana, democrática, tirada na instância de decisão nas Nações Unidas, obviamente que todos nós temos que pagar pelos nossos atos. O que eu espero é que haja maturidade das lideranças iranianas, e compreendam que a paz e aceitar o compromisso da Agência é o que pode acontecer de melhor para o Irã.
Jornalista: Senhor Presidente, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, o descreve como um colega gladiador na batalha anti-imperialista. O senhor se sente confortável com essa descrição?
Presidente: (risos) Eu não sou um combatente anti-imperialista, eu sou um dirigente político que tem que tomar conta dos problemas do meu país. Trabalho fortemente para unificar a América do Sul, e já conseguimos criar a Unasul, já conseguimos criar um Conselho de Defesa da América do Sul, já conseguimos criar um Conselho de Combate ao Narcotráfico na América do Sul, e estamos fazendo a economia da América do Sul crescer. O Brasil tem muita responsabilidade, a nossa relação com a Venezuela é extraordinária, com o Peru, com a Colômbia. Esse é o papel do Brasil, o de construir a pacificação, a harmonia na América do Sul, e eu acho que estamos indo bem. Não precisa arrumar inimigo. Eu não trabalho, eu não trabalho procurando criar um inimigo primeiro, para justificar a minha política.
Jornalista: Este conceito de união da América Latina é realmente factível? Ele pode funcionar?
Presidente: Olha, eu trabalho com a ideia, primeiro, da América do Sul. A América Latina é muito espraiada. Eu trabalho muito com a América do Sul porque nós temos fronteira com dez países, só não temos fronteira com o Chile e com o Equador. Então, o Brasil, que é a maior economia, [tem] mais desenvolvimento econômico, [tem] mais tecnologia, [tem] mais população, o Brasil tem mais responsabilidade. Portanto, nós temos que cuidar com carinho. E nós trabalhamos para tentar tirar proveito da similaridade que existe entre os países da América Latina, pela proximidade de língua. Tenho tentado trazer o México mais para a América do Sul, para que a economia do México não fique apenas dependendo de uma potência econômica excepcional, como os Estados Unidos ou como o Canadá, que têm que se espraiar para ajudar os países da América Central. No fundo, no fundo, o que eu quero é que a gente tenha um continente mais justo e mais democrático.
Jornalista: Uma nova ordem mundial está emergindo, não é? Qual papel o Brasil poderá desempenhar nas próximas duas décadas, nos próximos 20 anos?
Presidente: Olha, eu, sinceramente, acho que vai depender muito do comportamento de quem estiver dirigindo o Brasil. Você sabe que em política as pessoas não reconhecem você com líder, ou seja, você tem que ocupar o seu espaço, você tem que lutar, você tem que brigar. Eu fico muito feliz quando eu vejo as revistas do mundo inteiro enaltecendo a seriedade da política econômica brasileira, a seriedade do crescimento brasileiro, como nós enfrentamos a crise econômica, o controle que o Banco Central brasileiro tem do sistema financeiro brasileiro, eu fico muito feliz, não pense que eu não fico, eu fico muito feliz.
Agora, você não é líder porque você é presidente do Brasil, o Brasil é importante. Então, nós nos aproximamos muito da China porque temos coisas com a China, nós estamos nos aproximando da Índia porque temos muita coisa importante com a Índia, e com a Rússia. Então, os BRIC... O que nós queremos? Nós queremos extrair o potencial que cada um de nós tem, na relação com o outro: no avanço científico-tecnológico, na questão industrial, na questão agrícola... Isso é importante, isso é importante porque nos aproxima, na OMC, de grandes potências, como o conjunto da União Europeia e os Estados Unidos. Eu vou lhe dar um exemplo: nós quase chegamos perto de fazer o acordo da Rodada de Doha, em 2008. Não fizemos por causa das eleições nos Estados Unidos, e não fizemos por causa das eleições na Índia. Hoje, já estamos há dois anos parados, e quem está pagando o preço é o povo pobre do mundo, que poderia estar exportando para o mercado mais rico.
Bem, o Brasil vai continuar tendo papel importante na medida em que os seus dirigentes sejam sérios, cumpram os acordos firmados e desenvolvam o Brasil, façam a economia brasileira crescer. Eu acho que é assim que a gente vai ganhando respeitabilidade na nossa relação internacional.
Jornalista: Embora o senhor tenha herdado alguns problemas históricos, o senhor teve um sucesso econômico extraordinário no Brasil. Mas ainda continua existindo uma enorme disparidade entre ricos e pobres. Embora essa diferença tenha diminuído, ela continua existindo. Alguma coisa entre 11% da população continua na extrema pobreza. Como esse problema pode ser enfrentado?
Presidente: Olha, é que você não consegue resolver o desajuste de 500 anos, em oito anos. Nós começamos um processo e se esse processo tiver continuidade, e a gente continuar fazendo esse tipo de política durante mais 10, 15 ou 20 anos, eu estou convencido de que, antes de 10 anos, o Brasil será a quinta economia do mundo. Mas eu quero que o Brasil seja a quinta economia do mundo, não apenas no PIB, eu quero que seja em política social, em diminuir as desigualdades. As informações que nós temos no Brasil são extraordinárias, a renda do povo negro brasileiro e do povo pardo cresceu 222% no meu governo. A renda dos aposentados que ganham menos cresceu muito no meu governo; os pobres começaram a frequentar shopping! Esse é um passo importante, mas ainda falta muito, e eu sei que...
Jornalista: Bem, é uma questão de contrastes. Por um lado, o senhor tem essa indústria aeroespacial de última geração, por outro, o senhor tem os povos indígenas vivendo na Amazônia, e eles não se importam muito com a modernidade, em grande medida ligada ao desmatamento. Como ajudar essas pessoas, que não querem fazer parte desse sonho?
Presidente: Olha, primeiro, eu duvido que exista no mundo um país que cuide dos índios como nós cuidamos no Brasil. Segundo, eu sou o presidente, hoje, em todo o mundo, que mais criou reservas florestais. Vou repetir: eu sou o primeiro presidente que criou o maior número de reservas florestais do mundo.
Jornalista: Mas, ainda assim, o desmatamento continua a um ritmo aterrorizante, não é?
Presidente: Diminuiu de forma extraordinária, diminuiu de forma excepcional! Nós assumimos o compromisso, em Copenhagen, de reduzir o desmatamento da Amazônia em 80%, até 2020. Nós assumimos o compromisso de diminuir o gás de efeito estufa em 39%. Foi a melhor proposta feita em Copenhagen. E não pedi dinheiro para ninguém, não, vamos fazer por responsabilidade. Então, veja, o Brasil tem noção exata de que é o país que tem a matriz energética mais limpa do mundo, de que tem o combustível, para os nossos carros, mais limpo do mundo.
Jornalista: O problema é que sempre tem gente que sai perdendo. Veja o caso do projeto hidrelétrico que está sendo implantado na floresta amazônica. São 17 bilhões de dólares. Você tem que continuar alimentando a máquina. Para o Brasil crescer à taxa que estamos falando, ele precisa de energia em grande escala. Mas o problema é que esse projeto vai deslocar 20 mil pessoas!
Presidente: Olha, deixa eu lhe falar uma coisa: não, não acredite em fantasia. Esse projeto está sendo discutido há 30 anos. Nós diminuímos o lago em 60 %, são R$ 3,5 bilhões para cuidar da questão ambiental e para cuidar da questão social. É por isso que nós vamos fazer a usina de Belo Monte, porque nós não vamos jogar fora a oportunidade de construir a hidrelétrica mais moderna e mais limpa do mundo. O problema é que, às vezes, as pessoas se acham no direito de dar palpites sobre coisas que não conhecem.
Jornalista: E as pessoas que moram lá? Vinte mil pessoas terão que ser removidas por causa disso. Elas têm direito...
Presidente: O Brasil, o Brasil, veja, o Brasil tem 190 milhões de habitantes. E nós, nós vamos cuidar agora, no dia 2 de junho eu tenho uma reunião com a comunidade indígena, no Brasil, para discutir Belo Monte, porque nós já fizemos todas as reuniões públicas possíveis, e nós vamos garantir que as pessoas que tiverem que mudar de local vão ser tratadas condignamente, e a floresta será respeitada. Nós estamos, agora, criando um sistema de construir hidrelétrica no Brasil, chamado hidrelétrica-plataforma. Nós iremos construí-la, iremos fechar a mata e, para chegar lá, só de helicóptero, para evitar que haja crescimento de cidade em volta da floresta.
Então, nós queremos dar exemplo ao mundo sobre energia limpa. Nessa área, ninguém ensina o Brasil. Ou é isso ou é termelétrica a carvão, ou é termelétrica a óleo diesel, ou é energia nuclear. Entre tudo isso, eu prefiro as hidrelétricas, limpas.
Jornalista: Falando sobre petróleo, o Brasil descobriu grandes reservas em alto-mar, e que podem atender à grande demanda da economia nos próximos anos. Olhando para o que aconteceu no Golfo do México, essa é uma preocupação relacionada à exploração de petróleo em alto-mar?
Presidente: Há muita preocupação. Eu, inclusive, já disse ao Presidente da Petrobras, primeiro, oferecer toda a ajuda que a gente puder oferecer aos Estados Unidos para ajudar a conter o vazamento de óleo. Segundo, para que a gente faça uma reparação na manutenção da Petrobras, para que a gente não permita que aconteça o que aconteceu no Golfo. Você sabe que tem problema, porque tem que fazer um novo furo, um novo poço e tamponar lá por baixo. Isso demora. Então, eu acho que esse acidente que aconteceu nos Estados Unidos deve alertar todas as empresas de petróleo do mundo a serem mais responsáveis, porque o prejuízo será enorme para a Humanidade na questão ambiental.
Na questão do petróleo do Brasil, eu mandei um projeto de lei... porque eu não quero que o dinheiro do petróleo seja para os dirigentes comprarem relógio Rolex ou seja para os dirigentes... Eu, na verdade, eu quero que o dinheiro recupere o tempo perdido na educação, na ciência e tecnologia, na questão ambiental e na questão cultural. Por isso, no projeto de lei nós estamos criando um Fundo para cuidar da educação, da ciência e tecnologia, da cultura, da questão ambiental e da questão da saúde, para que o dinheiro não seja jogado no ralo da economia comum.
Jornalista: Nós estamos chegando ao final da entrevista, mas há um assunto sobre o qual eu gostaria de falar, que é a Copa do Mundo de 2014. O Brasil estará pronto?
Presidente: Pronto, vai estar pronto. Vai estar pronto porque se tem uma coisa que nós sabemos fazer, e com perfeição, é jogar futebol. Nós já temos um programa...
Jornalista: Se o senhor escutar o que a Fifa está dizendo: a luz vermelha foi acesa pra o Brasil. O país não está cumprindo os prazos, é incrível como o Brasil está atrasado...
Presidente: Olhe, eu pedi para o meu Ministro do Esporte responder à Fifa. A Fifa fique tranquila, não venha com aquela mentalidade eminentemente europeia, sem conhecer a América do Sul e [sem] conhecer o Brasil. Nós vamos fazer uma Copa do Mundo melhor do que eles fizeram, mais alegre do que eles já fizeram, só corremos o risco de o Brasil ser campeão outra vez! Mas nós estamos preparados para a Copa do Mundo e preparados para as Olimpíadas. Nós sabemos o que isso significa para o Brasil, nós sabemos o que significa para a imagem do Brasil.
Jornalista: Os estádios estarão prontos? Os prazos serão cumpridos?
Presidente: Lógico que vamos estar prontos, lógico que vamos estar prontos! Vai estar pronta a política... os corredores de transporte, vão estar prontos os estádios. Eu só espero que a gente tenha a Seleção pronta. Eu vou lhe contar uma coisa, eu vou lhe contar uma coisa. Eu conheço muitos estádios do mundo. O Maracanã foi feito em 1950, não existe nada similar ao Maracanã. Todos são estádios de futebol. O Maracanã é uma casa de espetáculos, de tão perfeito que é, e sobreviveu a 60 anos. Então, nós vamos fazer... pode ficar certo de que nós vamos mostrar como é que se faz uma Copa do Mundo.
Jornalista: Esperemos por isso. Nesse meio tempo, para a Copa da África do Sul, o time do Brasil está pronto para ela?
Presidente: Está pronta, está pronta. Acho que... a convocação foi feita agora, e eu acho que o nosso técnico convocou o time que ele já tinha na cabeça, que é um time ganhador, que com ele ganhou tudo de que participou. Então... Tem gente que não gosta, porque no Brasil...
Jornalista: Então, o senhor está confiante?
Presidente: Eu estou confiante, eu estou confiante.
Jornalista: E o senhor assistirá [aos jogos]?
Presidente: Eu vou à Final.
Jornalista: Ok."
FONTE: publicado no Blog do Planalto.
Presidente: Vou à Final porque, como o Brasil vai realizar em 2014, eu vou participar do festejo final. Mas eu tenho uma viagem para cinco países africanos e tenho uma visita de Estado à África do Sul, na sexta-feira, dia 9. Dia 10 é um sábado, eu descanso, e dia 11 vamos para fazer o jogo, seja o Brasil ou não. Aí, não importa.
Jornalista: Eu preciso perguntar: o senhor vai testemunhar o capitão do Brasil segurando a taça neste verão?
Presidente: Deus queira, Deus queira.
Jornalista: Presidente Lula, foi um prazer. Obrigado.
Presidente: O prazer foi meu.
Jornalista: Obrigado."
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