quarta-feira, 6 de outubro de 2010

URI AVNERY: "OS PROTOCOLOS DOS SÁBIOS DE ANTI-SIÃO"

“Eu estava a tremer de medo. Um cavalheiro bem apresentado apareceu na TV. Foi identificado como o chefe de uma associação chamada "Re’uth" (“Visão”), cujo objetivo é monitorar os grupos que negam a legitimidade do Estado de Israel.

Por Uri Avnery, no “Gush Shalom”

O que descobriram é de fato assustador. Os inimigos de Israel, disseram-nos, já não acreditam que podem destruir Israel pela força das armas. Em vez disso, desenvolveram uma nova estratégia: suscitar o colapso de Israel negando a sua própria legitimidade.

As iniciativas de pequenos grupos locais em vários países não são o que aparentam ser. Longe disso! São parte de uma conspiração organizada e coordenada a nível mundial que usa todos os meios para atingir o seu abominável objetivo. Ao contrário dos Protocolos dos sábios de Sião, o documento forjado que foi produzido há cem anos, esta é uma trama genuína, qualquer coisa como “Os protocolos dos sábios de anti-Sião”.

Faltou apenas um detalhe nesta revelação: onde está o quartel-general dessa conspiração internacional?

Felizmente, estou em posição de fornecer a informação em falta. Por mais chocante que seja, o quartel-general dos sábios de anti-Sião está localizado em Jerusalém.

A organização "Re’uth" é um grupo de amadores e lida apenas com sintomas superficiais. Ao contrário deles, eu empreendi a condução de uma investigação profunda.

Quem são os agentes secretos da conspiração que está agora a ameaçar a legitimidade de Israel? Quem são as pessoas que fornecem munições mortais contra nós aos grupos anti-Israel pelo mundo fora?

Aqui está uma lista preliminar dos conspiradores mais perigosos:

No topo da lista surge, claro, Avigdor Ivett Lieberman que usou a sua astúcia para conseguir a posição de Ministro das Relações Externas de Israel.

Em menos de um ano e meio, Lieberman conseguiu sabotar de forma irreparável a legitimidade de Israel em muitos países.

O seu sucesso em ser nomeado Ministro das Relações Externas é, por si só, uma assombrosa conquista para alguém com a sua história. Ele é visto em todo o mundo como um racista desenfreado, em comparação com o qual o francês Jean-Marie le Pen e o austríaco Joerg Haider parecem democratas devotos. Desde que foi apontado para o cargo, muitos dos seus colegas internacionais recusam-se a ser vistos na sua companhia. Evitam-no como uma praga.

Desde então, Lieberman conseguiu fazer com que Israel seja odiado em muitos países. Ele chamou ao suecos e aos noruegueses antissemitas. Insultou os turcos quando o seu obediente substituto humilhou publicamente o embaixador turco sentando-o a um nível inferior ao seu. Disse ao presidente do Egito que “fosse para o inferno”. Parece que se senta no seu escritório todas as manhãs girando o globo e perguntando-se: “Que país novo posso insultar hoje?”

Agora, quase nenhum país no mundo está preparado para o receber, exceto sob coação. A sua atividade como ministro das Relações Externas está majoritariamente limitada aos quatro países ligados às suas origens: Moldávia, Bielorrússia, Ucrânia e Cazaquistão. Nenhum outro ministro das Relações Externas israelense poderia ter causado mais danos à legitimidade do seu país.

Mas Lieberman enfrenta um adversário muito forte: o ministro da Defesa, Ehud Barak.

Durante os últimos dias, ele conseguiu o impossível: transformar também o exército libanês num inimigo.

Para se apreciar a magnitude deste feito, temos de nos lembrar que, há quatro anos apenas, Israel emitiu praticamente um ultimato no qual exigia que o exército libanês fosse colocado na fronteira com Israel. Foi uma das condições de Israel para terminar a 2ª Guerra Libanesa. Só o exército libanês, decretaram os mestres estrategos em Jerusalém, poderia assegurar a tranquilidade na fronteira. Trataram a força das Nações Unidas, a UNIFIL, com um desprezo vagamente disfarçado.

Esta semana, o exército libanês abriu fogo sobre tropas israelenses, matando um comandante de batalhão. Como pôde isto acontecer? Em vários lugares existem pequeno enclaves entre a vedação da fronteira israelense e a fronteira reconhecida internacionalmente. No que diz respeito à soberania, estes enclaves pertencem a Israel. Contudo, a terra em si é trabalhada por aldeões libaneses. O exército israelense decidiu “aparar” as árvores nestas áreas para facilitar a observação.

Os libaneses anunciaram de antemão que se opunham. A UNIFIL pediu a Israel para esperar pelo regresso do seu comandante do estrangeiro, de forma a permitir que ele mediasse o problema. O exército israelense recusou-se a esperar e mandou um buldozer. Quando o braço do monstro passou por cima da vedação, e depois de gritos de aviso, os soldados libaneses abriram fogo.

Uma pessoa normal teria posto em perigo as suas relações com o exército libanês por causa de uns ramos de árvore? Certamente que não. Haverá melhor prova de que Barak está a atuar sob as ordens dos sábios do anti-Sião?

Mas este é apenas o último acontecimento. É ofuscado pela Guerra de Gaza (Operação “Chumbo Fundido”). Não há necessidade de reiterar os pormenores dessa operação: a matança por atacado de civis, incluindo centenas de mulheres e crianças; a demolição de edifícios, incluindo escolas e mesquitas; o uso de armas cruéis, como o fósforo branco; a negação de ajuda médica aos feridos; o bloqueio de vias de saída; e por aí adiante.

A operação “Chumbo Fundido” provocou um choque mundial. Em muitos países, grupos anti-Israel brotaram como cogumelos depois da chuva. A distante Gaza tornou-se o centro da atenção planetária.

Para Barak isso não foi suficiente. Ele convenceu o governo a boicotar a comissão de inquérito nomeada pela ONU encabeçada por um juiz judeu sionista. Não obstante, a comissão fez o seu trabalho, e as suas conclusões detalharam acusações de crimes de guerra israelenses. Em vez de investigar, admitindo, pedindo desculpa e pagando compensações, Barak iniciou uma campanha de difamação pessoal contra o juiz, que apenas aumentou os danos para Israel. Tardiamente, o exército israelense iniciou investigações próprias, que recentemente confirmaram as principais conclusões do Relatório Goldstone. O que é que isto diz sobre Barak?

Mas mesmo isto não foi suficiente para ele. Foi o incidente com a flotilha de Gaza que revelou a sua inteira capacidade para deslegitimar Israel. Se os navios tivessem sido autorizados a entregar a sua pequena e simbólica carga a Gaza, o assunto teria sido esquecido num dia ou dois. A operação militar de Barak conseguiu o oposto: durante meses, já, o mundo tem estado em alvoroço, o bloqueio a Gaza tem permanecido no centro da atenção mundial, a nossa importante relação com a Turquia foi irreparavelmente prejudicada.

Quando a ONU pediu a Israel que cooperasse com uma investigação internacional, Barak reagiu com desprezo. E, em vez de nomear pelo menos uma Comissão Oficial de Inquérito com plenos poderes, o governo israelense anunciou uma comissão sem poderes, sem credibilidade e sem termos de referência sérios. E depois de todos os danos já terem sido causados, esta semana o governo israelense concordou afinal em cooperar com a comissão da ONU. É a história clássica do criado que trouxe peixe podre do mercado para o seu senhor. Quando lhe foi dada a escolha entre comer ele próprio o peixe, ser açoitado ou ser banido da cidade, ele escolheu comer o peixe, mas não pôde terminá-lo. Quando estava a ser duramente açoitado, não conseguiu suportar mais e escolheu então ser banido. Portanto, comeu o peixe podre, foi açoitado e foi banido.

Sem dúvida, o sábios de anti-Sião deveriam oferecer a Barak o título de “herói da deslegitimação”.

O terceiro lugar da lista vai indubitavelmente para o Ministro do Interior, Eli Yishai.

Toda a gente sabe que Israel é o Estado dos sobreviventes do Holocausto, um Estado que personifica os valores básicos do povo judeu. Essa é a peça central da nossa Hasbarah (literalmente “explicação” – na propaganda da realidade).

A prova eminente desta pretensão deveria ter sido a nossa atitude em relação aos pobres refugiados, os sobreviventes de massacres que chegaram ao nosso país e pediram asilo.

Se assim é, por que é que o Ministro do Interior faz tudo o que pode para provar o contrário?

Desde há anos, o Ministério tem vindo a maltratar os refugiados de África e de outros lugares. Os sobreviventes de Darfur, que arriscam as suas vidas para chegar a Israel através do deserto do Sinai, são apanhados nas ruas por esquadrões especiais de perseguição pertencentes ao Ministério, atirados para a prisão e deportados.

Esta semana, o governo decidiu expulsar 400 crianças refugiadas que nasceram em Israel, falam hebreu e nunca conheceram outro país. Isto reaviva memórias trágicas da década de 1930 quando refugiados judeus da Alemanha não conseguiam encontrar asilo em lado nenhum e foram devolvidos ao inferno nazi.

É verdade que Israel não é o único país do mundo que maltrata “imigrantes ilegais”. Muitos países, dos EUA à França, fazem o mesmo. Mas Israel alega ser o Estado Judeu, e o maltrato de crianças refugiadas é um golpe mortal à base da sua legitimidade.

A lista é longa.

O outro pilar central da legitimidade de Israel é a reivindicação de que somos “a única democracia no Médio Oriente”.

Se assim é, o que podemos dizer sobre o juiz de Jerusalém que condenou um homem cuja nova “amiga” israelense teve voluntariamente sexo com ele alguns minutos depois de se terem conhecido e considerou-o culpado de violação apenas porque ele tinha escondido dela que era – Deus não permita! – um árabe?

O que podemos dizer acerca do Ministro da Polícia que apoia abertamente um policial que apontou o revólver à cabeça de um ladrão e disparou à queima-roupa, enquanto o homem estava sentado no seu carro e tentava escapar, porque ele era um árabe?

Todos estes feitos – e muitos mais – estão a contribuir diariamente para a conspiração mundial que pretende conseguir a deslegitimação do Estado de Israel. Mas quem é o cabecilha dos conspiradores?

Todas as provas apontam num sentido: o homem que nomeou todos esses agentes para as suas posições, onde estão a provocar danos irreparáveis: Benjamin Netanyahu. O mestre conspirador que se esconde sob a fachada de um político incompetente.

Como é bem conhecido, os Protocolos dos sábios de Sião foram fabricados pela polícia secreta do czar russo, baseados num panfleto do século 19 originalmente escrito contra Napoleão III.

Os “Protocolos dos sábios de anti-Sião” estão hoje a ser compostos por Benjamin Netanyahu e os seus comparsas.”

FONTE: publicado no “Gush Shalon”, no site “Informação Alternativa” e transcrito no portal “Vermelho” (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_secao=9&id_noticia=138612). Segundo a “Wikipedia”, o autor, Uri Avnery, nasceu em Beckum, Alemanha, em 10 de setembro de 1923, com o nome Helmut Ostermann. É jornalista israelense de esquerda , pacifista e antigo membro da Knesset (1965-1974 e 1979-1981). Durante a juventude foi membro do movimento de direita denominado sionismo revisionista e da organização paramilitar Irgun. É fundador do movimento pacifista Gush Shalom e foi um dos proprietários do HaOlam HaZeh, uma revista israelense de informação, que circulou de 1950 a 1993.

Nenhum comentário: