“Na semana passada, fui e voltei de ônibus ao interior de São Paulo – há anos que deixei de viajar sozinho de carro. Na volta, sentei-me ao lado de um distinto sexagenário com o qual logo entabulei conversa.
Meu interlocutor identificou-se como um dos dois subprefeitos de Araraquara e presidente do PPS naquela cidade. Não tardou, obviamente, para abordarmos a política, porém sem que eu dissesse mais sobre minhas opiniões, pois as dele é que passaram a me interessar, pois não perco chance de deixar essa gente se enredar no próprio discurso.
Deixei que o sujeito desfiasse seu previsível rosário de chavões sobre “corrupção” do governo Lula e, em seguida, passei a lhe fazer provocações sobre a governança do país, perguntando se ele achava que o discurso da “ética” seria capaz, no ano que vem, de desmoralizar um governo que tem apresentado resultados tão exitosos na economia.
Como também era previsível, o sujeito recitou todo o besteirol sobre FHC ser o detentor dos méritos pelos êxitos econômicos do país. Quando perguntado sobre o que fundamentaria tal alegação, falou do “fim” da inflação proporcionado pelo Plano Real, da Lei de Responsabilidade Fiscal e do “saneamento do sistema bancário”, que seriam responsáveis por o Brasil estar resistindo à crise econômica.
Quando lhe perguntei se os problemas do país também eram de responsabilidade do governo anterior ou se a divisão de responsabilidades seria do que é bom para o governo anterior e do que é ruim para este governo, o homem ficou embatucado.
Mas o que surpreendeu mesmo o político – e que constatei que ele não sabia – foi quando lhe expliquei sobre a bobagem que era atribuir ao Proer a responsabilidade pela quase imunidade que o país tem demonstrado diante da crise econômica internacional.
O pepessista, ocupando um cargo político tão importante, surpreendeu-me ao demonstrar não saber por que foi feito o Proer. E nem sabia – ou se lembrava - de que sua implantação começou em 1995.
Por conta daquele episódio, decidi escrever uma série de artigos sobre a herança de FHC que demonstrará o quanto ela dificultou a reordenação da economia brasileira pelo governo Lula.
Comecemos, então, pelo Proer, atualmente vendido pela imprensa oposicionista como responsável maior pela resistência do Brasil à crise.
É absurda a teoria de que um programa de socorro ao sistema bancário brasileiro implantado há quase quinze anos seja responsável por esse sistema estar resistindo hoje à crise financeira internacional.
Em primeiro lugar, há que explicar que o Proer foi criado porque, com a derrubada brutal e brusca da inflação em 1994, desapareceu aquela que então era a maior fonte de receita dos bancos.
As instituições financeiras lucravam abusivamente com a inflação porque não recompensavam a quase totalidade de seus clientes pela perda diária do valor do dinheiro depositado.
Quem tinha dinheiro suficiente para fazer aplicações financeiras numa época em que a inflação chegou a 30% ao mês, perdia menos – porém perdia, pois a remuneração das aplicações era muito inferior à inflação real e ao que era cobrado pelos bancos quando emprestavam dinheiro. A maioria absoluta das pessoas, porém, deixava salários e outras fontes de renda parados em conta corrente.
O sujeito recebia seu salário no início do mês e, a cada dia em que o dinheiro permanecia parado em sua conta corrente, o banco aplicava o valor sem pagar um centavo ao seu dono.
Essa conversa mole sobre FHC ter “saneado” o sistema bancário, portanto, é uma falácia que tenta induzir a sociedade a acreditar que, ao assumir a Presidência, o tucano encontrou um sistema bancário falido. O fato, porém, é que o sistema bancário se viu naquela situação porque o Plano Real foi implantado às pressas por conta das eleições de 1994.
Antes do Real, os bancos lucravam absurdamente, tanto ou mais do que hoje. Mas como se acomodaram com a receita inflacionária e permitiram que ela se transformasse em fonte praticamente única de lucros, com a derrubada da inflação a banca tupiniquim se viu em maus lençóis.
Dali em diante, FHC permitiu aos bancos cobrarem as tarifas extorsivas que cobram até hoje, de forma a compensar a perda de lucratividade com a receita inflacionária.
Não houve “saneamento” algum do sistema bancário e, sim, um programa emergencial – e caro – para corrigir um dos muitos erros que seriam cometidos nos anos seguintes, como a manutenção do real sobrevalorizado até as eleições de 1998, o que constituiu o maior estelionato eleitoral da história brasileira.
Mas essa é outra história, que ficará para os próximos capítulos que escreverei sobre a herança maldita de FHC.”
FONTE: texto escrito por Eduardo Guimarães em seu blog “Cidadania.com”, publicado em 03/08/2009.
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Um comentário:
Efetivemente, é interessante o artigo do Sr. Eduardo Guimarães acerca da herança de FHC, conqunto o referido petista incondicional, tanto quanto os mentores e lideres do PT (José Dirceu, Florestan Fernandes (pai)e outros, apenas referem-se a essa herança como maldita. Olvidam-se a "BENDITA" que foi deixada por FHC que assumiu o Brasil, após períodos negros de nossa história, tais como, a ditadura militar, seu final, com o atual "amiguinho" do Planalto, José Sarney e o desastre que foi o desgoverno do mais novo amigo de Lula, Collor. A herança bendita foi, acima de tudo, a "casa arrumada"! Tanto é assim que, inteligentemente, pelo menos na economia, o Governo atual desse bossal ignorante que nos governa, nào mexeu uma virgula, sequer, da mesma, mantendo tudo igualzinho. Está colhendo tudo, sem nada ter plantado!
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