sexta-feira, 14 de setembro de 2012

PALESTINA, A PRÓXIMA REVIRAVOLTA NO ORIENTE MÉDIO

[Criança palestina (“terrorista”, segundo a "grande" mídia) provoca, com pedras, tropa invasora e ocupante israelense]

“Ao analisarmos a geopolítica do Oriente Médio, qual deveria ser o foco principal? Há pouco consenso na resposta, mas ainda assim essa é a questão-chave. O governo israelense tenta, constantemente e de modo diligente, fazer com que o foco seja o Irã. A maior parte dos observadores vê nesse esforço tentativa de desviar atenções de sua falta de vontade em buscar negociações sérias com a Palestina [que invadiu e ocupou com "assentamentos"].

Por Immanuel Wallerstein, sociólogo norte-americano
De qualquer maneira, o esforço israelense falhou espetacularmente. O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu foi incapaz de conseguir que o governo norte-americano se comprometesse com o apoio a um ataque israelense a Teerã. E a habilidade do Irã de reunir a maior parte do mundo não-ocidental — incluindo Paquistão, Índia, China, Palestina e o secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon — em uma reunião do MPNA (Movimento dos Países Não-Alinhados), ocorrida na última semana, evidencia a impossibilidade política de os israelenses concentrarem a atenção no Irã.

No último ano, o centro das atenções voltou-se para a Síria, não o Irã, mesmo que haja ligação entre os dois. Os primeiros a lutar para isso foram a Arábia Saudita e o Catar. Tiveram considerável sucesso. Alguns observadores sentem que foi esforço para desviar as atenções dos problemas internos da Arábia Saudita e da opressão antixiita praticada nos países do Golfo, especialmente Bahrein.

O foco na Síria, no entanto, está prestes a chegar ao fim, por duas razões. Em primeiro lugar, o governo e sua principal oposição, o “Exército Livre Sírio”, estão mais ou menos travados em seu combate militar. Não parece que nenhum dos lados seja capaz de destruir completamente o outro. Significa que aquilo que se pode chamar hoje de “guerra civil” continuará por período longo e indefinido.

Obviamente, o que poderia terminar rapidamente com a guerra é uma intervenção militar externa. Mas nem os Estados Unidos, Europa Ocidental, Turquia, Arábia Saudita, nem mais ninguém, está pronto a mandar tropas para a Síria. Estão dispostos apenas a fazer ameaças — e isso não é o bastante para acabar os conflitos.

Mas, em segundo lugar, há a reentrada espetacular do Egito na cena geopolítica. O país tem, agora, um governo dominado pela “Irmandade Muçulmana”. O presidente, Mohamed Morsi, parece construir uma agenda bem diferente da de seus precedentes. E Morsi mostrou ser político muito mais capaz de manobras astutas do que se supunha. O jornal [franncês] “Le Monde” registrou isto em editorial intitulado: “O astuto e surpreendente Morsi”.

O presidente voou a Teerã para a reunião dos não-alinhados, parando em Pequim no caminho. Ao fazê-lo, adiou para setembro o convite de Obama para uma visita oficial aos Estados Unidos — um compromisso que visava evitar a viagem efetivamente realizada. Morsi alega que o objetivo de suas visitas é ajudar a resolver a questão síria.

Se era mesmo a Síria que estava em sua cabeça, ele tem um jeito curioso de demonstrar. Começou com uma proposta criativa — que o Egito juntasse forças com a Turquia, a Arábia Saudita e o Irã para formar um grupo com a intenção de resolver os problemas políticos que dividem os dois grupos em luta na Síria. Isso é até construtivo, mas certamente Morsi sabe que, pelo menos no momento, a rejeição da Arábia Saudita (e talvez da Turquia) é certa.

Então, por que ele se preocupou em fazer a proposta? Primeiro de tudo, é claro, ele procura posicionar tanto o Egito quanto a “Irmandade Muçulmana” na condição dos negociadores políticos mais poderosos do Oriente Médio. Nada incomodaria mais os sauditas, é claro. A centralidade egípcia os deslocaria desse papel; e entre eles e a “Irmandade Muçulmana” já há relação hostil histórica.

Em segundo lugar, tendo oferecido a proposta como uma “solução” para o problema sírio, Morsi está evidenciando que, por enquanto, não há saída para a questão. Isso prepara o terreno para a grande mudança — da Síria para a Palestina.

Devemos lembrar de duas coisas sobre a relação do Egito com Israel e a Palestina. Uma é que o Hamas foi fundado por membros da “Irmandade Muçulmana”. As ligações entre ambos são reais, ainda que o Hamas deseje ter papel independente na região.

Mas, além disso, e ainda mais importante, o pacto egípcio-israelense é muito, muitíssimo impopular no Egito. Morsi não está planejando rompê-lo. Sente — e provavelmente tem razão — que não é forte o bastante, nacional e internacionalmente, para fazer isso. E nem vê, necessariamente, nesse passo, grande vantagem para o Egito.

Porém, ele está certamente interessado em revisar os termos do pacto de modo relevante. Em particular, quer mudar as regras sobre como o Egito relaciona-se com a guerra na Palestina. Os egípcios vão continuar tentando mediar as diferenças entre a Autoridade Palestina e o Hamas. E certamente tentarão criar fronteiras mais abertas com Gaza. Depois, talvez ofereçam-se diretamente aos israelenses como intermediários honestos — reivindicando um papel que os Estados Unidos clamam ser sua propriedade exclusiva há algum tempo.

Parece, ao menos, um bom chute apostar que, em 2013, o Egito vai ter silenciado a discussão mundial sobre a Síria e assegurado que seja substituída por debate internacional sobre a Palestina. Os israelenses demonstram estar profundamente contrariados. Os sauditas estarão marginalizados e, em seguida, precisarão afirmar mais vigorosamente suas credenciais pró-Palestina. E os Estados Unidos — seja seu próximo presidente Romney ou Obama — irão se encontrar em posição de muito pouca influência no que acontece, tanto em Israel/Palestina quanto no Egito, Arábia Saudita ou Irã.”

FONTE: escrito por Immanuel Wallerstein, sociólogo norte-americano e professor na Universidade de Yale. Artigo transcrito em “Outras Palavras” e no portal “Vermelho”  (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=193540&id_secao=9) [Imagem obtida no google e trechos entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].

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