Fotos: Ricardo Stuckert
Por Paulo Moreira Leite, jornalista, escritor e editor do "247" em Brasília
"Lula é o que há de melhor"
"Para o dirigente sindical norte-americano Gary Casteel, que veio ao Brasil participar de um protesto de trabalhadores contra a Nissan, montadora oficial das Olimpíadas do Rio de Janeiro, a perseguição ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva envolve "um ícone do movimento sindical mundial, inclusive nos Estados Unidos. Ele representa o que há de melhor no movimento sindical."
Secretário-tesoureiro da UAW, entidade que representa os metalúrgicos da maior indústria automobilística do mundo, em entrevista ao "247" Gary Casteel comparou o momento político brasileiro à situação política de Alemanha e outros países da Europa, onde se assiste ao renascimento de movimentos de extrema direita, inclusive neonazistas.
Sua entrevista:
PERGUNTA -- Líder operário, presidente do Brasil durante dois mandatos, Luiz Inácio Lula da Silva hoje é alvo de investigação pela Justiça. Nada se demonstra, mas muito se fala contra ele. Como você vê essa situação?
GARY CASTELL-- Ele é um ícone do movimento sindical americano. Já recebeu todas as honras e homenagens que poderia ter recebido da UAW. Ele representa o que há de melhor no movimento sindical. Ele veio do sindicalismo, defendeu os trabalhadores e mudou este país -- profundamente.
PERGUNTA --Muitos brasileiros comparam o processo que se vive hoje no país, de criminalização do principal partido de esquerda e suas lideranças, ao período da história norte-americana conhecido como macharthysmo, ocorrido no final da década de 40 até 1960. Qual a importância das perseguições daquela época -- retratadas recentemente no filme "Trumbo," -- na memória dos trabalhadores norte-americanos?
GARY -- Para minha geração, o macharthysmo se passou há muito tempo. Mas eu acho que o que está acontecendo no Brasil é o que está acontecendo na Alemanha. Há um grande movimento da direita. É o grande capital tentando encontrar uma maneira de vencer. Estão tentando fazer com que as pessoas se revoltem e deixem de lado as posições que, no fundo, são melhores para elas. Dessa maneira, conseguem fazer com que as pessoas votem contra os seus próprios interesses. Na última vez que estive aqui, os nossos companheiros do movimento sindical diziam que os movimentos de direita eram uma loucura porque as ruas costumavam ser nossas. Na Alemanha, há manifestações da direita todas as segundas-feiras. Há uma volta ao nazismo, ao isolacionismo, tudo impulsionado pela questão da imigração.
PERGUNTA -- Como explicar o desempenho de Donald Trump, candidato ultraconservador, nas primárias do Partido Republicano?
GARY-- Trump está atraindo certo apoio, mas não sei em qual porcentagem. Não acho que terá o apoio da maioria. O melhor de Trump é que ele expôs a cara da direita. Suas políticas e posições são tão radicais que apenas um pequeno porcentual o apoia. Mas dá pra ver quem são essas pessoas. Elas são antidireitos humanos, anti-imigrantes, sem nenhuma compaixão pelo próximo. Ele realmente identificou quem é essa direita. E acho que ele não vai conseguir a maioria dos votos dos trabalhadores. Nem de longe.
PERGUNTA --Como você avalia o governo Barack Obama?
GARY-- Ele enfrentou problemas porque não conseguiu a cooperação da Câmara dos Representantes e do Senado. Para impedir que Obama tivesse êxito, a direita combateu até medidas que antes apoiava e dizia que eram positivas. Eu acho que Obama foi um presidente tão bom quanto ele poderia ter sido nas circunstâncias, sendo que as circunstâncias foram muito ruins.
PERGUNTA -- Dá para explicar isso melhor?
GARY -- No começo do mandato, houve a questão em torno do "Employee Free Choice Act", (uma reforma trabalhista progressista) que não avançou. No cotidiano, temos mais acesso ao presidente Obama que a qualquer outro presidente dos Estados Unidos, ao menos do que eu posso me lembrar. Podemos telefonar para ele e receber uma resposta. Ele conversa. Isso é importante. Ele age assim com os sindicatos em geral, mas particularmente com a UAW pelo fato do nosso presidente, Dennis Williams, ser do mesmo estado dele, Illinois. É uma relação que se estende desde que Obama foi candidato ao Senado estadual.
PERGUNTA -- Os sindicatos preferem Bernie Sanders a Hillary Clinton? E a UAW?
GARY-- Nós ainda não apoiamos nenhum candidato oficialmente. Antes de anunciar qualquer posição, faremos um processo de consulta às lideranças regionais, pois esta não é uma decisão que se toma de cima para baixo. Muito provavelmente não tomaremos uma decisão antes do final das primárias. Alguns sindicatos já apoiam oficialmente algum candidato. Não é o nosso caso.
PERGUNTA - O Tratado de comércio do Pacífico, TPP, tem sido apresentado, no Brasil, como um exemplo de acordo internacional que deveria ser seguido por todos os países. Como você vê o TPP?
GARY -- Sou contra, institucional e pessoalmente. O TPP não contempla proteção aos direitos humanos, aos direitos trabalhistas, nem contra manipulações da taxa de câmbio. Temos experiência nesses acordos, que não é positiva.
PERGUNTA -- Duas décadas depois, qual balanço que se pode fazer do NAFTA, o tratado de livre comercio entre EUA, Canadá e México?
GARY -- O NAFTA reduziu salários. Representou danos econômicos para os trabalhadores americanos e nada fez pelos trabalhadores mexicanos. Representou a estagnação. O tratado continha cláusulas que previam a recapacitação para os trabalhadores americanos. A recapacitação foi feita, mas não havia mais empregos para eles. Só se beneficiaram as empresas transnacionais, capazes de explorar os trabalhadores de todos os países.
PERGUNTA -- Num reflexo das mudanças econômicas promovidas no governo de Ronald Reagan, a partir dos anos 1980 vimos um período de demonização dos sindicatos no mundo inteiro, inclusive nos EUA. Denúncias sobre privilégios de dirigentes sindicais se tornaram frequentes, e ajudavam a enfraquecer as entidades. Como está esse debate hoje?
GARY-- Esse processo criou mecanismos externos de controle e prestação de contas que, em nome da boa contabilidade, só contribuíram para impedir o crescimento dos sindicatos, que era seu objetivo real. Fala-se em salários altos e outros privilégios, mas isso não tem a ver com a realidade. Esses registros são engordados com despesas de trabalho, como, por exemplo, viagens internacionais. O meu salário, por exemplo, é menos da metade do que consta nessa contabilidade. Os dirigentes da UAW recebem o terceiro salário mais baixo dos Estados Unidos e, no entanto, somos o sindicato mais rico dos Estados Unidos. Muitos dos trabalhadores das três grandes empresas do setor automotivo ganham mais que o presidente do nosso sindicato.
PERGUNTA -- Embora a recuperação econômica dos Estados Unidos tenha se mostrado, comparativamente, melhor sucedida do que na Europa, nós sabemos que estamos assistindo a um crescimento com empregos precários, e salários baixos. O que acontece?
GARY -- Um dirigente sindical muito sábio já disse no passado: toda vez que saímos de uma recessão, os lucros voltam, mas os empregos ficam para trás. E os níveis salariais e as condições de trabalho permanecem achatados. Eu digo que essa situação existe devido à falta de sindicatos. As corporações enfrentam dificuldades, perdem dinheiro, e quando a produção volta a crescer, elas querem recuperar a rentabilidade e o fazem as custas do trabalhador. Algo assim aconteceu na indústria automotiva.
PERGUNTA --Dá para explicar?
GARY - Das três grandes empresas americanas do setor que nós representamos, duas foram à falência (GM e Chrysler) e outra (a Ford) estava à beira da falência. Hoje, todas três têm lucros bilionários por trimestre. Desde 2008, os trabalhadores abriram mão de muitas conquistas para ajudar as empresas a saírem da falência. Chegamos a 2015 com a recuperação do setor automotivo, os trabalhadores sindicalizados conseguiram fechar acordos coletivos com melhorias econômicas expressivas. Isso não aconteceu com os não sindicalizados. Se a pergunta é por que os novos empregos são precários e têm salários baixos a resposta está na falta de sindicalização.
PERGUNTA -- Vocês vieram ao Brasil apoiar um protesto contra a Nissan junto ao Comitê Organizador das Olimpíadas no Rio. A acusação é que a subsidiária da Nissan persegue sindicatos e utiliza terceirizados de forma permanente, por longos períodos.
GARY-- Estamos aqui para apoiar os sindicatos brasileiros, que são os condutores do processo. Nós apenas apoiamos. Uma montadora alemã vai ter os seus principais mercados na própria Alemanha, no Brasil e nos Estados Unidos. Se for uma empresa japonesa, os principais mercados costumam ser Brasil e Estados Unidos. Então, 54% das vendas da Nissan são nos EUA, o que mostra a operação da empresa na América do Norte é muito lucrativa. Ela está lá há bastante tempo e, por isso, deveria acompanhar os padrões americanos e permitir que os trabalhadores sejam representados por um sindicato se assim desejarem. Eles dizem que nos EUA não é normal que os trabalhadores dos EUA sejam sindicalizados.
PERGUNTA -- Isso é verdade?
GARY-- São apenas as montadoras estrangeiras que não têm unidades sindicalizadas. As multinacionais, que combatem a sindicalização. Elas vêm ao nosso país, colhem os frutos do nosso mercado e querem oprimir os trabalhadores e evitar que eles formem um sindicato. O sindicato permitiria que eles negociassem questões como salários e trabalho precário, saúde e segurança no trabalho e todas as outras coisas que o sindicato negocia.
PERGUNTA --Em vários países, há um movimento de crítica a indústria automobilística, seja pelo trânsito nas grandes cidades, mas também pelos danos que a poluição causa à saúde das pessoas. Nós sabemos que a indústria automobilística é um setor de cauda longa, capaz de gerar empregos em grande quantidade, criando benefícios preciosos e inegáveis. Como se pode responder a essas questões?
GARY-- Meu ponto de vista é que os países industrializados seriam simplesmente dizimados se resolvessem acabar com a indústria automotiva. Ela é a cauda longa da economia.
PERGUNTA -- O que se pode fazer, então?
GARY -- Se você analisar os avanços nos automóveis, há uma grande evolução. Não dá para comparar o padrão de emissão da década de 1980 com os padrões de hoje. Os fabricantes de alguns caminhões pesados chegam a dizer que o ar que sai do escapamento é às vezes mais limpo que o ar que entrou no motor. Isso é impressionante. Quanto aos carros de passeio, nos Estados Unidos o padrão de emissões é cerca de 100 vezes mais rigoroso do que era há alguns anos. A indústria automotiva, ao contrario da indústria do tabaco, reconhece que existem questões relativas ao meio-ambiente e à saúde pública e tem tentado enfrentá-las. E existem regulamentos do governo que exigem isso. Não é uma indústria que foge da raia. Eu acho que existe uma consciência. Como resultado da resolução desses problemas, estão sendo gerados trabalhos em outras áreas, nas chamadas tecnologias verdes e o marketing envolvido. Surgem novas oportunidades de trabalho de engenharia que foge do convencional, por exemplo, os novos fabricantes de baterias para carros elétricos. Os países industrializados, como eu estava falando antes, perderiam muito em termos de emprego e receitas. Nos Estados Unidos, então, nem se fala: os carros fazem parte da sua persona. É normal nos EUA você trabalhar a 150 km de casa e ir de carro para o trabalho. Isso varia de país a país. Mas eu diria que, nos Estados Unidos, culturalmente, as pessoas não aceitariam não ter um carro. Vale a pena dizer: os empregos envolvidos em toda a cadeia automotiva me fazem crer que os carros vão continuar existindo por um bom tempo."
FONTE: escrito por Paulo Moreira Leite, jornalista, escritor e editor do "247" em Brasília (http://www.brasil247.com/pt/blog/paulomoreiraleite/217529/%E2%80%9CLula-%C3%A9-o-que-h%C3%A1-de-melhor%E2%80%9D.htm).
PERGUNTA -- Líder operário, presidente do Brasil durante dois mandatos, Luiz Inácio Lula da Silva hoje é alvo de investigação pela Justiça. Nada se demonstra, mas muito se fala contra ele. Como você vê essa situação?
GARY CASTELL-- Ele é um ícone do movimento sindical americano. Já recebeu todas as honras e homenagens que poderia ter recebido da UAW. Ele representa o que há de melhor no movimento sindical. Ele veio do sindicalismo, defendeu os trabalhadores e mudou este país -- profundamente.
PERGUNTA --Muitos brasileiros comparam o processo que se vive hoje no país, de criminalização do principal partido de esquerda e suas lideranças, ao período da história norte-americana conhecido como macharthysmo, ocorrido no final da década de 40 até 1960. Qual a importância das perseguições daquela época -- retratadas recentemente no filme "Trumbo," -- na memória dos trabalhadores norte-americanos?
GARY -- Para minha geração, o macharthysmo se passou há muito tempo. Mas eu acho que o que está acontecendo no Brasil é o que está acontecendo na Alemanha. Há um grande movimento da direita. É o grande capital tentando encontrar uma maneira de vencer. Estão tentando fazer com que as pessoas se revoltem e deixem de lado as posições que, no fundo, são melhores para elas. Dessa maneira, conseguem fazer com que as pessoas votem contra os seus próprios interesses. Na última vez que estive aqui, os nossos companheiros do movimento sindical diziam que os movimentos de direita eram uma loucura porque as ruas costumavam ser nossas. Na Alemanha, há manifestações da direita todas as segundas-feiras. Há uma volta ao nazismo, ao isolacionismo, tudo impulsionado pela questão da imigração.
PERGUNTA -- Como explicar o desempenho de Donald Trump, candidato ultraconservador, nas primárias do Partido Republicano?
GARY-- Trump está atraindo certo apoio, mas não sei em qual porcentagem. Não acho que terá o apoio da maioria. O melhor de Trump é que ele expôs a cara da direita. Suas políticas e posições são tão radicais que apenas um pequeno porcentual o apoia. Mas dá pra ver quem são essas pessoas. Elas são antidireitos humanos, anti-imigrantes, sem nenhuma compaixão pelo próximo. Ele realmente identificou quem é essa direita. E acho que ele não vai conseguir a maioria dos votos dos trabalhadores. Nem de longe.
PERGUNTA --Como você avalia o governo Barack Obama?
GARY-- Ele enfrentou problemas porque não conseguiu a cooperação da Câmara dos Representantes e do Senado. Para impedir que Obama tivesse êxito, a direita combateu até medidas que antes apoiava e dizia que eram positivas. Eu acho que Obama foi um presidente tão bom quanto ele poderia ter sido nas circunstâncias, sendo que as circunstâncias foram muito ruins.
PERGUNTA -- Dá para explicar isso melhor?
GARY -- No começo do mandato, houve a questão em torno do "Employee Free Choice Act", (uma reforma trabalhista progressista) que não avançou. No cotidiano, temos mais acesso ao presidente Obama que a qualquer outro presidente dos Estados Unidos, ao menos do que eu posso me lembrar. Podemos telefonar para ele e receber uma resposta. Ele conversa. Isso é importante. Ele age assim com os sindicatos em geral, mas particularmente com a UAW pelo fato do nosso presidente, Dennis Williams, ser do mesmo estado dele, Illinois. É uma relação que se estende desde que Obama foi candidato ao Senado estadual.
PERGUNTA -- Os sindicatos preferem Bernie Sanders a Hillary Clinton? E a UAW?
GARY-- Nós ainda não apoiamos nenhum candidato oficialmente. Antes de anunciar qualquer posição, faremos um processo de consulta às lideranças regionais, pois esta não é uma decisão que se toma de cima para baixo. Muito provavelmente não tomaremos uma decisão antes do final das primárias. Alguns sindicatos já apoiam oficialmente algum candidato. Não é o nosso caso.
PERGUNTA - O Tratado de comércio do Pacífico, TPP, tem sido apresentado, no Brasil, como um exemplo de acordo internacional que deveria ser seguido por todos os países. Como você vê o TPP?
GARY -- Sou contra, institucional e pessoalmente. O TPP não contempla proteção aos direitos humanos, aos direitos trabalhistas, nem contra manipulações da taxa de câmbio. Temos experiência nesses acordos, que não é positiva.
PERGUNTA -- Duas décadas depois, qual balanço que se pode fazer do NAFTA, o tratado de livre comercio entre EUA, Canadá e México?
GARY -- O NAFTA reduziu salários. Representou danos econômicos para os trabalhadores americanos e nada fez pelos trabalhadores mexicanos. Representou a estagnação. O tratado continha cláusulas que previam a recapacitação para os trabalhadores americanos. A recapacitação foi feita, mas não havia mais empregos para eles. Só se beneficiaram as empresas transnacionais, capazes de explorar os trabalhadores de todos os países.
PERGUNTA -- Num reflexo das mudanças econômicas promovidas no governo de Ronald Reagan, a partir dos anos 1980 vimos um período de demonização dos sindicatos no mundo inteiro, inclusive nos EUA. Denúncias sobre privilégios de dirigentes sindicais se tornaram frequentes, e ajudavam a enfraquecer as entidades. Como está esse debate hoje?
GARY-- Esse processo criou mecanismos externos de controle e prestação de contas que, em nome da boa contabilidade, só contribuíram para impedir o crescimento dos sindicatos, que era seu objetivo real. Fala-se em salários altos e outros privilégios, mas isso não tem a ver com a realidade. Esses registros são engordados com despesas de trabalho, como, por exemplo, viagens internacionais. O meu salário, por exemplo, é menos da metade do que consta nessa contabilidade. Os dirigentes da UAW recebem o terceiro salário mais baixo dos Estados Unidos e, no entanto, somos o sindicato mais rico dos Estados Unidos. Muitos dos trabalhadores das três grandes empresas do setor automotivo ganham mais que o presidente do nosso sindicato.
PERGUNTA -- Embora a recuperação econômica dos Estados Unidos tenha se mostrado, comparativamente, melhor sucedida do que na Europa, nós sabemos que estamos assistindo a um crescimento com empregos precários, e salários baixos. O que acontece?
GARY -- Um dirigente sindical muito sábio já disse no passado: toda vez que saímos de uma recessão, os lucros voltam, mas os empregos ficam para trás. E os níveis salariais e as condições de trabalho permanecem achatados. Eu digo que essa situação existe devido à falta de sindicatos. As corporações enfrentam dificuldades, perdem dinheiro, e quando a produção volta a crescer, elas querem recuperar a rentabilidade e o fazem as custas do trabalhador. Algo assim aconteceu na indústria automotiva.
PERGUNTA --Dá para explicar?
GARY - Das três grandes empresas americanas do setor que nós representamos, duas foram à falência (GM e Chrysler) e outra (a Ford) estava à beira da falência. Hoje, todas três têm lucros bilionários por trimestre. Desde 2008, os trabalhadores abriram mão de muitas conquistas para ajudar as empresas a saírem da falência. Chegamos a 2015 com a recuperação do setor automotivo, os trabalhadores sindicalizados conseguiram fechar acordos coletivos com melhorias econômicas expressivas. Isso não aconteceu com os não sindicalizados. Se a pergunta é por que os novos empregos são precários e têm salários baixos a resposta está na falta de sindicalização.
PERGUNTA -- Vocês vieram ao Brasil apoiar um protesto contra a Nissan junto ao Comitê Organizador das Olimpíadas no Rio. A acusação é que a subsidiária da Nissan persegue sindicatos e utiliza terceirizados de forma permanente, por longos períodos.
GARY-- Estamos aqui para apoiar os sindicatos brasileiros, que são os condutores do processo. Nós apenas apoiamos. Uma montadora alemã vai ter os seus principais mercados na própria Alemanha, no Brasil e nos Estados Unidos. Se for uma empresa japonesa, os principais mercados costumam ser Brasil e Estados Unidos. Então, 54% das vendas da Nissan são nos EUA, o que mostra a operação da empresa na América do Norte é muito lucrativa. Ela está lá há bastante tempo e, por isso, deveria acompanhar os padrões americanos e permitir que os trabalhadores sejam representados por um sindicato se assim desejarem. Eles dizem que nos EUA não é normal que os trabalhadores dos EUA sejam sindicalizados.
PERGUNTA -- Isso é verdade?
GARY-- São apenas as montadoras estrangeiras que não têm unidades sindicalizadas. As multinacionais, que combatem a sindicalização. Elas vêm ao nosso país, colhem os frutos do nosso mercado e querem oprimir os trabalhadores e evitar que eles formem um sindicato. O sindicato permitiria que eles negociassem questões como salários e trabalho precário, saúde e segurança no trabalho e todas as outras coisas que o sindicato negocia.
PERGUNTA --Em vários países, há um movimento de crítica a indústria automobilística, seja pelo trânsito nas grandes cidades, mas também pelos danos que a poluição causa à saúde das pessoas. Nós sabemos que a indústria automobilística é um setor de cauda longa, capaz de gerar empregos em grande quantidade, criando benefícios preciosos e inegáveis. Como se pode responder a essas questões?
GARY-- Meu ponto de vista é que os países industrializados seriam simplesmente dizimados se resolvessem acabar com a indústria automotiva. Ela é a cauda longa da economia.
PERGUNTA -- O que se pode fazer, então?
GARY -- Se você analisar os avanços nos automóveis, há uma grande evolução. Não dá para comparar o padrão de emissão da década de 1980 com os padrões de hoje. Os fabricantes de alguns caminhões pesados chegam a dizer que o ar que sai do escapamento é às vezes mais limpo que o ar que entrou no motor. Isso é impressionante. Quanto aos carros de passeio, nos Estados Unidos o padrão de emissões é cerca de 100 vezes mais rigoroso do que era há alguns anos. A indústria automotiva, ao contrario da indústria do tabaco, reconhece que existem questões relativas ao meio-ambiente e à saúde pública e tem tentado enfrentá-las. E existem regulamentos do governo que exigem isso. Não é uma indústria que foge da raia. Eu acho que existe uma consciência. Como resultado da resolução desses problemas, estão sendo gerados trabalhos em outras áreas, nas chamadas tecnologias verdes e o marketing envolvido. Surgem novas oportunidades de trabalho de engenharia que foge do convencional, por exemplo, os novos fabricantes de baterias para carros elétricos. Os países industrializados, como eu estava falando antes, perderiam muito em termos de emprego e receitas. Nos Estados Unidos, então, nem se fala: os carros fazem parte da sua persona. É normal nos EUA você trabalhar a 150 km de casa e ir de carro para o trabalho. Isso varia de país a país. Mas eu diria que, nos Estados Unidos, culturalmente, as pessoas não aceitariam não ter um carro. Vale a pena dizer: os empregos envolvidos em toda a cadeia automotiva me fazem crer que os carros vão continuar existindo por um bom tempo."
FONTE: escrito por Paulo Moreira Leite, jornalista, escritor e editor do "247" em Brasília (http://www.brasil247.com/pt/blog/paulomoreiraleite/217529/%E2%80%9CLula-%C3%A9-o-que-h%C3%A1-de-melhor%E2%80%9D.htm).
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