quarta-feira, 27 de abril de 2011

O QUE A GRANDE IMPRENSA NÃO REVELA

                           A grande mídia oculta


Por Washington Araújo (Artigo publicado originalmente no "Observatório da Imprensa")

“Na quinta-feira (14/4), o sociólogo Fernando Henrique Cardoso escreveu um artigo que, sendo a política um alentado jogo de xadrez, desarrumou completamente as peças do tabuleiro. Nem seus leais admiradores e amigos de longa data se atreveram a parabenizá-lo em público. Obviamente, isso deve ter doído fundo na alma do autor que é referido por 10 entre 10 pessoas que o conhecem como o próprio "príncipe da vaidade".

E por que o artigo mexeu com os brios de gente aliada e forneceu munição pesada a tantos de seus críticos contumazes? Por uma questão apenas: seu partido não deveria lutar pelo povão e sim buscar respaldo na emergente classe C, aqueles que desenvolveram um senso crítico acima da média e deram início não a uma vida pautada pela cidadania e sim pelo consumo.

Façamos um exercício mental deixando um pouco ao largo a questão político-partidária e trazendo à frente a questão da imprensa. E se verdades antes apenas pressentidas passassem a ser declaradas com todas as vogais (e consoantes) por quem detivesse autoridade, por quem –como dizem os que estudam análise de conteúdo– exercesse autoridade no lugar da fala?

Sem muito esforço, após ter passado os últimos anos analisando as idas e vindas da grande mídia e seu real papel como mediadora da informação junto à sociedade brasileira, logo percebi que, ao menos, umas doze afirmações teriam o poder de desarrumar, com igual contundência, o tabuleiro em que se espalham as peças da nossa vistosa imprensa.

DIA, MÊS, ANO

1. A imprensa deveria deixar de informar a opinião pública e trabalhar apenas para formar "a sua" opinião pública;

2. A imprensa deveria deixar de buscar o interesse dos leitores em geral e escrever apenas para os empresários, os anunciantes atuais (e também os potenciais) e para a classe de jornalistas que entende ser formadora de opinião;

3. A imprensa deveria transformar em escândalos reais todo e qualquer indício de corrupção que viceje no entorno da presidenta Dilma Rousseff;

4. A imprensa deveria aproveitar uma reunião de sua Associação Nacional de Jornais e aprovar a criação de um Partido da Imprensa Brasileira, tendo como missão maior manter no poder, por pelo menos 30 anos, governos inteiramente dóceis aos seus interesse financeiros e comerciais;

5. A imprensa deveria aparelhar a sociedade brasileira com novos avatares: o MST da Imprensa, a CUT da Imprensa, a UNE da Imprensa, os Blogues Amarrotados da Imprensa, as ONGs da Imprensa, a Bancada Ruralista da Imprensa, a Bancada da Bala da Imprensa e assim por diante;

6. A imprensa deveria pressionar o governo a presentear cada beneficiário potencial da transposição de águas do rio São Francisco e cada futuro proprietário de moradia do programa Minha Casa, Minha Vida com a assinatura de duas revistas semanais –Veja e Época– e dois jornais de circulação nacional impressos em São Paulo e no Rio de Janeiro;

7. A imprensa deveria continuar pressionando determinados governos estaduais a adquirirem milhares de assinaturas de jornais e revistas para ampla distribuição aos professores de suas redes públicas de educação;

8. A imprensa deveria continuar mobilizando certos atores sociais para influenciar membros do Congresso Nacional a aprovarem uma PEC (Projeto de Emenda Constitucional) dando nova redação ao artigo 225 da Constituição Federal, tornando absolutamente secundário o papel do Estado no processo de concessão de emissoras de rádio e de televisão;

9. A imprensa deveria transformar o Instituto Millenium em Universidade Nacional do Brasil com o objetivo de reformular inteiramente o conteúdo dos cursos de Comunicação Social ora existentes no país, fornecendo-lhes uma nova visão do fazer jornalístico e elencando novas fronteiras do conhecimento neoliberal;

10. A imprensa deveria encampar, de forma aberta e inequívoca, a defesa intransigente de causa popular que seja conducente à supressão da política de cotas raciais para acesso nas universidades públicas;

11. A imprensa deveria possuir a sua própria Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) vasculhando, sempre que for o caso, biografias de esquerdistas notórios do Brasil dos anos 1960-1970 para subsidiar alentadas reportagens sobre aqueles que hoje posam de democratas e que em passado recente não passavam de perigosos terroristas;

12. A imprensa deveria continuar orquestrando ações midiáticas de desmerecimento de políticas públicas nos doze meses anteriores aos pleitos presidenciais, começando sempre com a mobilização de "formadores de opinião" com espaço cativo em rádios de amplitude nacional, passando para aqueles que detêm espaço diário na imprensa escrita e desaguando no espaço editorial do principal telejornal do país.

Infelizmente, boa parte desses itens são levados à ação mesmo sem que sejam precedidos por qualquer forma de declaração ou anúncio. E é tarefa para muitas mentes, das tão-somente medianas àquelas mais brilhantes, correlacionar cada um desses enunciados com a ilustração do fato do dia, do mês, do ano, conforme a prática de nossa imprensa.

Garanto, leitores, que estou lhes sugerindo um interessante exercício mental. Ao menos para aqueles que consideram suas mentes minimamente... arejadas.”

FONTE: escrito por Washington Araújo, jornalista e escritor. Mestre em Comunicação pela UNB; tem livros sobre mídia, direitos humanos e ética publicados no Brasil, Argentina, Espanha, México. Tem o blog http://www.cidadaodomundo.org . Artigo publicado originalmente no “Observatório da Imprensa”. Transcrito no site “Carta Maior” (http://www.cartamaior.com.br/templates/analiseMostrar.cfm?coluna_id=5031) [imagem do Google adicionada por este blog].

Nenhum comentário: