O portal “Terra Magazine” nos traz hoje uma entrevista de Daniel Milazzo com Hélio Jaguaribe sobre a problemática do índio brasileiro. O assunto está na pauta da mídia nos últimos meses. Assim, é oportuno trazer essa contribuição para o debate do tema.
Antes de reproduzir a entrevista, vejamos um pouco da biografia do autor obtida em diversos sites da internet:
Hélio Jaguaribe de Matos formou-se em direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro em 1946. Em meados da década de 1950, iniciou um projeto de expansão da Companhia Ferro e Aço de Vitória, de sua família. A nova usina da Ferro e Aço foi concluída em 1961 e Jaguaribe dirigiu esse empreendimento até 1964, quando renunciou à presidência da empresa.
Em 1952, passou a se reunir com um grupo de intelectuais paulistas e cariocas e,em 1953, fundaram o Instituto Brasileiro de Economia e Sociologia e Política (Ibesp), do qual Jaguaribe foi secretário-geral. Os integrantes do Ibesp decidiram, em 1955, criar um órgão por meio do qual pudessem influenciar nas decisões do poder relativas à orientação do desenvolvimento. Por decreto do governo de Café Filho, foi criado o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (Iseb), um dos núcleos mais importantes de elaboração da ideologia que ficou conhecida como nacional-desenvolvimentismo.
Com o golpe militar de 1964, Jaguaribe afastou-se do país, depois de ter condenado a derrubada de João Goulart. De 1964 a 1966, lecionou na Universidade de Harvard; de 1966 a 1967, na Universidade de Stanford; e de 1968 a 1969, no Massachusetts Institute of Technology (MIT). Ao retornar ao Brasil, em 1969, ingressou nas Faculdades Integradas Cândido Mendes, onde foi diretor de Assuntos Internacionais.
Em 1983, a Universidade Johannes Gutenberg, de Mainz, Alemanha, conferiu-lhe o grau de doutor honoris causa em filosofia, por sua contribuição às ciências sociais e aos estudos latino-americanos.
Jaguaribe coordenou o projeto Brasil 2000, em 1985, encomendado pelo governo José Sarney. Os resultados foram publicados em 1986 com o título "Brasil 2000: para um novo pacto social". A segunda parte do projeto, "Brasil: reforma ou caos", foi lançada dois anos depois. Em 1988, participou da formação do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB).
Em 1992, renunciou aos cargos partidários para ser Secretário da Ciência e Tecnologia do governo Fernando Collor de Mello, deixando o cargo quando foi aprovado o impeachment do presidente, para dedicar-se exclusivamente à vida acadêmica.
A partir de 1994, passou a dirigir um projeto de pesquisa e análise da história universal ("A Critical Study of History"), que ligou o Iepes à Universidade de São Paulo e à Universidade de Buenos Aires, reunindo cientistas sociais e historiadores do mundo todo.
Vejamos a entrevista postada esta tarde por “Terra Magazine”:
JAGUARIBE: DEMARCAÇÃO NÃO PROTEGE CULTURA INDÍGENA
“Aos 85 anos, voz firme, Helio Jaguaribe concedeu entrevista a Terra Magazine, na qual ele qualifica como falaciosa a idéia de que a demarcação de reservas indígenas possa preservar a cultura do índio.
- Isso é uma coisa antropologicamente equivocada - acusa.
O sociólogo Helio Jaguaribe é detentor de um extenso currículo acadêmico, que inclui participações como professor das universidades de Harvard, Stanford e do MIT (Massachusetts Institute of Technology). Além disso, é um dos atuais membros da Academia Brasileira de Letras.
Jaguaribe põe em xeque a política de permitir que grandes extensões territoriais pertençam a estrangeiros, qualificando-a como "equivocada". O sociólogo não acredita que atualmente isso represente um risco à soberania nacional sobre tais territórios e rechaça os rumores de que uma internacionalização da Amazônia já esteja em curso.
- Essa internacionalização seria radicalmente rejeitada inclusive por via militar se for necessário - assegura.
Indagado se a incorporação dos índios à sociedade brasileira não poria em risco a cultura indígena, Jaguaribe proclama:
- Isso certamente, porque nenhuma cultura primitiva subsiste no âmbito de uma cultura civilizada.
A seguir, a entrevista com Helio Jaguaribe.
Terra Magazine - O que o senhor acha dos conflitos entre índios e arrozeiros na reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima?
Helio Jaguaribe - A respeito desse ponto específico eu não o acompanhei com a devida perícia e não estou suficientemente a par do assunto.
Demarcar terras indígenas é uma política viável? É isso que o governo deve fazer?
Isso é uma coisa complexa. A demarcação como idéia de criar uma área protetora da cultura indígena é uma falácia. É uma cultura primitiva, subsiste há prazo relativamente longo no âmbito de uma cultura superior. Portanto isso é uma coisa antropologicamente equivocada.
Por outro lado, a incorporação de comunidades indígenas na comunidade brasileira não se pode fazer subitamente, tem que passar por estágios de acomodação. Nesse sentido, se as reservas indígenas, em lugar de serem reservas, forem campos de aculturamento, aí tem sentido. Pessoas especializadas entram em contato com os povos indígenas, ensinam a língua portuguesa. À medida que as tribos indígenas sejam aculturadas, o Estado pode providenciar emprego adequado e outras facilidades para essas tribos.
Tribos que têm pouco contato ou nunca tiveram contato com populações não-índias devem, então, ser incorporadas à sociedade...
Sim, mas essa incorporação não se pode fazer bruscamente. Ela importa numa modificação muito profunda de padrões culturais. Por isso que eu digo que em lugar de criar reservas indígenas, eu falaria em áreas de aculturamento, em que pessoas especializadas entrem em contato com os indígenas e os encaminhem para sua adaptação à cultura brasileira.
Esse contato colocaria a cultura indígena em risco?
Isso certamente, porque nenhuma cultura primitiva subsiste no âmbito de uma cultura civilizada. É uma falácia pensar que se pode fazer um jardim antropológico, preservando culturas no âmbito de uma cultura superior. Antropológica e historicamente isso não tem sentido.
Então o senhor caracteriza a cultura indígena como primitiva...
A cultura indígena como cultura primitiva está condenada a desaparecer, como todas culturas primitivas, inclusive a nossa, enquanto for primitiva.
O Brasil assinou na ONU, em setembro de 2007, um texto que diz respeito aos Direitos dos Povos Indígenas. Segundo o jurista Francisco Rezek, embora o texto não possua a ‘imperatividade’ jurídica de um tratado internacional, ele abre precedentes para a discussão sobre a internacionalização da Amazônia. O que o senhor acha disso?
Não há precedente nenhum e essa internacionalização seria radicalmente rejeitada inclusive por via militar se for necessário.
Como o Exército deve intensificar a defesa do território nas áreas de fronteira?
Olha, a presença dos militares é simplesmente decisiva. Essa é a principal função do Exército de um país pacífico, que não está pensando em agredir a ninguém, mas que confronta militarmente quem quiser agredi-lo.
O fato de estrangeiros possuírem grandes propriedades na Amazônia põe em risco a integridade nacional brasileira?
Imediatamente não, mas a política de permitir a formação de grandes extensões territoriais sob o controle estrangeiro é completamente equivocada. Eu sou favorável, dada a complexidade das questões envolvidas na Amazônia, a que se constitua uma empresa pública de grande porte, a "Amazoniabrás", que promova a colonização responsável, eqüitativa e ecologicamente correta da região, evitando incrustações estrangeiras perigosas.
Essa empresa seria do porte de uma Petrobras...
Exatamente, seria uma Petrobras da Amazônia.
Voltada apenas para a defesa do território ou para gerir os recursos naturais da floresta?
Não, para tudo. Para uma exploração racional e ecologicamente responsável dos recursos locais.
Há quanto tempo o senhor defende essa idéia?
Não faz tanto tempo assim, porque o problema tornou-se mais agudo mais recentemente... Há um par de anos, digamos assim.”
Assinar:
Postar comentários (Atom)
2 comentários:
Discriminação Racial e Econômica em Roraima
Brasília, 20/06/2008
De: Euris Morato – Economista – Doutor em Desenvolvimento e Ocupação do Espaço Rural
moratoeuris@superig.com.br
Concordo plenamente com o ilustre Prof. Hélio Jaguaribe, mas somos contrários à entrega de quase a metade do território do Estado de Roraima para apenas 20.000 índios! Lembramos que o Estado é formado por terras em sua maioria campos, cerrados agricultáveis e montanhas com enormes jazidas minerais. Roraima possui um território do tamanho de São Paulo ou cerca de 240.000kms2, equivalente a área da Itália. Com a entrega os povoados existentes e incluso o município instalado na Região da Raposa do Sol, além de toda a produção arrozeira e as famílias não índias terão que se retirar da Área. Além do desastre econômico com o desabastecimento de Manaus, Santarém, outras áreas da Amazônia e parte da Venezuela, tal fato provocará a destruição de empregos, rendas e a cadeia produtiva do arroz. A ação em execução, deixará grande parte das fronteiras nacionais desprotegidas, vazias em homens e produção, à mercê de outros interesses e de possíveis invasões por populações de outros países. Em síntese, a economia voltará ao primitivo ou a subsistência, tratando-se de um retrocesso e um crime contra o Brasil. Quem defende totalmente essa tese deverá voltar à Portugal e devolver todo o Brasil aos antigos proprietários, ou sejam os índios brasileiros! Concluindo não somos contra a legalização de reservas indígenas, mas elas devem ser posicionadas em locais menos estratégicos e proporcionais em áreas à sobrevivência de suas populações. Ressaltamos que a política de segregação racial e de culturas é sempre nociva, contrariando os princípios básicos de nossa nacionalidade formada pela integração das três raças: o branco, o índio e o negro! O desenvolvimento amazônico e o meio ambiente devem ser conduzidos de forma integrada, sustentável e unidos e seus princípios devem beneficiar prioritariamente o desenvolvimento sócio-econômico de suas populações. As ações ao contrário deverão fortalecer os municípios, Estados, o País, a defesa e a soberania do território nacional!!!
Prezado Dr Morato,
Muito obrigado pela visita e pelo muito bom comentário. Gostei. Temos sintonia em muitos dos conceitos por você apresentados. Isso pode ser constatado nos diversos artigos sobre índios, Amazônia, interesses externos sobre a região (aliados a espertos ou ingênuos brasileiros), "Calha Norte" e outros, postados desde a inauguração deste blog em janeiro último.
Obrigado
Maria Tereza
Postar um comentário