sexta-feira, 8 de julho de 2011
BRASIL E ARGENTINA, COOPERAÇÃO NUCLEAR
Por Antonio de Aguiar Patriota e Héctor Marcos Timerman (respectivamente, Ministros das Relações Exteriores do Brasil e da Argentina)
“No próximo dia 18 de julho, completam-se 20 anos da assinatura, entre a República Federativa do Brasil e a República Argentina, do ‘Acordo para o Uso Exclusivamente Pacífico da Energia Nuclear’.
Por meio desse acordo, a Argentina e o Brasil renunciaram conjuntamente ao desenvolvimento, à posse e ao uso das armas nucleares, afirmaram seu compromisso inequívoco com o uso exclusivamente pacífico da energia nuclear e criaram a ‘Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares’ (ABACC), para controlar os compromissos assumidos.
Cinco meses depois, os dois países firmaram um acordo quadripartite com a ABACC e a ‘Agência Internacional de Energia Atômica’ (AIEA), para a aplicação de salvaguardas abrangentes em todas as suas instalações nucleares.
Esse passo transformou substancialmente o caráter de nossa relação bilateral no plano político.
O tema nuclear deixou, definitivamente, de ser ponto de possíveis suspeitas e se converteu num pilar central da confiança e da cooperação na relação estratégica entre os dois Estados sul-americanos, mediante processo negociador e estrutura jurídica sem precedentes em nenhuma outra região.
A grande maioria dos países do mundo adotou os compromissos e controles internacionais em matéria nuclear ao aderir ao ‘Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares’ (TNP). Nós iniciamos esse caminho por meio do acordo bilateral e do acordo quadripartite, para, em seguida, nos somarmos ao Tratado de Tlatelolco -que transformou a América Latina e o Caribe numa Zona Livre de Armas Nucleares- e ao TNP.
O Brasil e a Argentina estiveram, também, entre os primeiros países a assinar e a ratificar o ‘Tratado para a Proibição Completa dos Testes Nucleares’ (CTBT).
A criação da ‘Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares’ representou a culminação, em termos jurídicos, de um processo de aproximação iniciado pelos então novos regimes democráticos da Argentina e do Brasil, com a ‘Declaração Conjunta sobre Política Nuclear’, de Foz de Iguaçu, em 1985. Ao mesmo tempo, constituiu o ponto de partida para a consolidação de relação bilateral estratégica numa área central da segurança internacional.
Na ABACC -que é organização independente-, as inspeções das instalações nucleares argentinas são levadas a cabo por inspetores brasileiros, e as inspeções das instalações nucleares brasileiras são conduzidas por inspetores argentinos. Essa dinâmica gerou, por si mesma, elevado grau de confiança mútua sobre natureza pacífica dos nossos programas nucleares.
Igualmente importante é a plena confiança que a ‘Agência Internacional de Energia Atômica’ tem no trabalho da ABACC. Os dois organismos atuam de forma independente, porém complementar, buscando sinergias e evitando a duplicação de esforços.
É a partir dessa referência que nos temos posicionado conjuntamente ante as diferentes questões que se colocam no debate sobre os temas nucleares. Temos muito clara a prioridade que a comunidade internacional deve atribuir ao desarmamento nuclear, entre os esforços para evitar a proliferação e construir um mundo mais pacífico e seguro, sem a ameaça das armas de destruição em massa.
As recentes ‘Declarações Conjuntas sobre Cooperação Nuclear’, de 3 de agosto de 2010 e de 31 de janeiro de 2011, mostram a amplitude e a profundidade que alcançou essa relação e ratificam o compromisso da Argentina e do Brasil com caminho conjunto.
Esses pronunciamentos presidenciais destacam o caráter singular da ABACC como mecanismo de construção da confiança mútua e internacional que assegura o controle de todas as atividades nucleares da Argentina e do Brasil, e como fundamento da cooperação bilateral em matéria nuclear. Ao mesmo tempo, decidem que a ABACC deve ser constantemente aperfeiçoada e reforçada em suas funções e seus objetivos.
Em seu 20° aniversário, esta ABACC consolidada começou a participar, com status de observadora, das reuniões da ‘Junta de Governadores da Agência Internacional de Energia Atômica’, da mesma forma que nela atua, por exemplo, a agência europeia -a ‘Comunidade Europeia da Energia Atômica’ (EURATOM ou CEEA).
Além disso, numa coincidência de caráter histórico, há menos de duas semanas o ‘Grupo de Supridores Nucleares’ (NSG, na sigla em inglês), integrado por 46 países, estabeleceu novos requisitos para a transferência das tecnologias mais avançadas no campo nuclear e reconheceu, naquele ato, numa decisão sem precedentes, a participação na ABACC como critério alternativo ao cumprimento do ‘Protocolo Adicional da Agência Internacional de Energia Atômica’.
O significado da experiência argentino-brasileira na promoção da transparência e da confiança mútua no campo nuclear foi também reconhecido em diversos documentos da AIEA e das conferências do ‘Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares’.
Serve, assim, de exemplo e fonte de inspiração para outras regiões do mundo, onde, infelizmente, a presença de armas nucleares e de outras armas de destruição em massa é ainda realidade.
Celebrar a ‘Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares’ é celebrar uma Argentina e um Brasil que olham para o mundo a partir de sua relação estratégica.
É celebrar nossa vocação regional para a paz.”
FONTE: escrito por Antonio de Aguiar Patriota e Héctor Marcos Timerman (respectivamente, Ministros das Relações Exteriores do Brasil e da Argentina). Publicado pela Agência Estado e transcrito no site “DefesaNet” (http://www.defesanet.com.br/defesa/noticia/1790/Endosso-de-peso-ao-Brasil-na-ONU) [imagem do Google adicionada por este blog].
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