FRANÇA ANUNCIA GUERRA CONTRA O ESTADO ISLÂMICO
"Na manhã deste sábado, o presidente francês François Hollande falou à população e classificou os atentados terroristas de ontem, que deixaram mais de uma centena de mortos em Paris, como um "ato de guerra" cometido por um "exército terrorista", fazendo referência ao Estado Islâmico. Hollande decretou três dias de luto e convocou o parlamento para uma sessão extraordinária. A França, que já [bombardeou a Líbia e] vinha [armando e municiando "rebeldes do bem" e] bombardeando a Síria, deve anunciar fortes reações no campo militar. A grande complexidade da questão é que o Estado Islâmico não possui um estado a ser atacado – é uma força paramilitar que foi alimentada pelo Ocidente para derrubar o regime de Bashar al-Assad e que, agora, se volta contra o próprio Ocidente. A guerra civil na Síria já matou 250 mil pessoas e deslocou 11 milhões de pessoas, levando 800 mil refugiados à Europa.
FONTE: "Brasil 247" (http://www.brasil247.com/pt/247/mundo/205180/Fran%C3%A7a-anuncia-guerra-contra-o-Estado-Isl%C3%A2mico.htm)
A ORIGEM DO ATENTADO
O mundo inteiro está chocado com as notícias do atentado terrorista em Paris.
Não há justificativas para a insana e desumana matança, mas não se deve tapar os olhos para a origem do problema que resultou no trágico acontecimento de sexta-feira, 13, à noite. É o mesmo que já vinha causando o tsunami de refugiados invadindo a Europa. É a errada política externa dos EUA no Oriente Médio.
Simplificando e resumindo, segundo a propaganda oficial e a imprensa ocidental, o Iraque, a Líbia, a Síria foram atacados e arrasados com grande mortandade "por razões humanitárias", "porque eram governados por ditadores sanguinários", "porque Saddam teria feito bombas atômicas", porque precisavam de "democracia e liberdade". Desculpas rasteiras, que somente enganam os trouxas. Saddam Hussein, Kaddafi e Assad não eram mais ditadores e sanguinários do que os terríveis ditadores dos intocáveis regimes da Arábia Saudita e do Qatar, estreitos aliados dos Estados Unidos.
O Iraque, na realidade, foi vítima por possuir muito petróleo, assim como a Líbia e a Síria. Agravando isso, Saddam Hussein e Kaddafi caíram na desgraça porque ameaçaram negociar suas exportações em outras moedas, saindo do petrodólar. Isso seria pecado gravíssimo para os reis do mundo, os poucos megabanqueiros e rentistas que hoje governam todos os países e decidem as guerras. Para os EUA, a Síria, além de tudo, precisa ter seu governo substituído para assim cancelarem a autorização de as forças navais russas terem uma base no litoral sírio no Mar Mediterrâneo. "Bons rebeldes" sírios receberam dinheiro, foram armados, treinados e municiados para derrubar Assad.
A Arábia Saudita e o Qatar nisso muito ajudam, para assim conseguirem a até hoje negada autorização para a construção do oleoduto que escoará para o Mediterrâneo, através da Síria, o petróleo e o gás saudita e do Qatar.
Em sua maioria, esses escolhidos e treinados "terroristas sírios do bem" fugiram com as modernas armas recebidas e aderiram ao nascente Estado Islâmico.
Nesse cenário, a França, submissa e alegremente, para agradar seu idolatrado patrão norte-americano, também bombardeou a Líbia e o Iraque, e continua atacando a Síria, com seus lindos e ruidosos Rafales. A guerra no Iraque causou um milhão de mortos, direta e indiretamente. Na Líbia e na Síria, outras centenas de milhares já morreram.
Antes de serem atacados, aqueles países estavam razoavelmente controlados. No Iraque, sunitas e xiitas conviviam nos mesmos quarteirões, as crianças frequentavam as mesmas escolas. A Líbia ostentava altos índices de IDH. A Síria apresentava boa qualidade de vida.
Porém, os mortíferos ataques dos EUA e seus aliados destruíram tudo e tiraram as tampas das panelas de pressão. Tudo saiu do controle. Sem lideranças e instituições fortes, vieram o caos, lutas fratricidas entre sunitas, xiitas, curdos, radicais religiosos criando e rapidamente expandindo por meio do terror o Estado Islâmico, milhões de fugitivos desesperados buscando refúgio na Europa, morrendo no meio do caminho. Os que conseguem chegar, raramente são integrados à sociedade. Os europeus, de modo geral, discriminam e rejeitam os imigrantes, especialmente os muçulmanos, semeando revolta e ódio.
Mas tudo tem seu preço.
O pior é que os EUA, a França, outros aliados e a Rússia ainda estão pensando que com mais bombas poderosas lançadas de belos aviões resolverão tudo.
Agora, vem a conta. Chegou ao ponto da tragédia de sexta-feira à noite em Paris.
Um detalhe. Por que o Bataclan? Uma hipótese. Aquela casa de espetáculos já foi ameaçada de atentados algumas vezes nos últimos anos. Por quê? Os proprietários são judeus e anualmente ali ocorrem festas de congraçamento de militares israelenses que atuam no território sírio usurpado, das colinas de Golã, e nas terras palestinas cada vez mais invadidas e apropriadas por Israel, onde matam árabes palestinos às pencas.
O artigo abaixo, de Vicenç Navarro, professor de ciências políticas e de políticas públicas da "Universidade Pompeu Fabra" (Espanha), e da "The Johns Hopkins University" (EUA) foi escrito há algumas semanas e então postado neste blog. Ele se refere apenas aos refugiados. Mas suas causas também são as mesmas do atentado em Paris]:
[A seguir, onde se lê "Refugiados", leia-se "Atentados terroristas e refugiados"]:
Créditos da foto: President of the European Council / Flickr
As causas do problema dos refugiados
Os governos que hoje reclamam do fluxo de refugiados são os mesmos que criaram as situações bélicas das quais os refugiados fogem.
Por Vicenç Navarro, professor de ciências políticas e de políticas públicas da "Universidade Pompeu Fabra" (Espanha), e da "The Johns Hopkins University" (EUA)
"A grande verdade da Europa nestes últimos dias é que os refugiados procedentes da Síria e de outros países, como Afeganistão e Líbia, onde há conflitos militares, são considerados inimigos pelos Estados integrantes da OTAN, incluindo os Estados Unidos, o Reino Unido França, a Alemanha e a Espanha, entre outros.
Essa afirmação pode ser obscurecida pela necessidade de responder aos anseios dos refugiados, fazendo referência à importância dos direitos humanos e da solidariedade que supostamente caracteriza a União Europeia.
Leiam os discursos recentes do presidente francês Hollande, ou da chanceler alemã, a senhora Merkel, e verão argumentos reticentes sobre o fato de a União Europeia ser o ponto de referência da democracia e do apoio às pessoas cuja dignidade e bem-estar vêm sendo negados, devido aos conflitos causados por regimes políticos denunciados no mundo.
Algo parecido ocorre nos discursos sobre os refugiados, realizados por dirigentes do governo espanhol de Mariano Rajoy, um dos governos europeus mais dóceis e servis aos interesses da União Europeia e à política externa dos Estados Unidos, além de um dos que têm maior poder dentro dessa comunidade político-administrativa.
Como era previsto, os maiores meios de informação da Espanha funcionam como grandes caixas de ressonância a essas mensagens, que visam a mobilizar a população a favor da acolhida aos refugiados. Contudo, esses mesmos meios de informação e persuasão mantêm silêncio ensurdecedor sobre a origem do problema dos refugiados.
A causa desse silêncio não é outra senão o fato de que os mesmos governos que agora estão pedindo ajuda para os refugiados são os mesmos (repito, os mesmos) governos que criaram as situações bélicas das quais os refugiados fogem. A situação é semelhante à mesma que, se uma pessoa que assassina os pais de uma criança pedisse ajuda para a órfã que resultou de seu ato criminoso. Aos que não acreditam nisso, basta buscar os dados a respeito (embora eles raramente apareçam nos tais meios).
Quem causou as crises bélicas que provocaram o problema dos refugiados?
A primeira observação sobre esse tema é com respeito aos financiamentos: os maiores Estados que apoiaram historicamente a Al Qaeda e/ou o ISIS (com armas, dinheiro e outros recursos) foram – em diferentes períodos – os Estados Unidos, a França, a Arábia Saudita, o Qatar, os países do Golfo e a Turquia, e em menor medida os demais países da OTAN.
Vejamos os dados, começando com o apoio do governo dos Estados Unidos, que se iniciou em 1979, e foi parar nas mãos dos fundamentalistas islâmicos do Afeganistão, incluindo um dirigente da Al Qaeda chamado Osama Bin Laden, em sua tentativa de lutar contra o comunismo, temerosos de que a União Soviética estabelecesse um governo comunista naquele país. Os dados estão aí para que qualquer pessoa possa vê-los.
Além do Afeganistão, os Estados Unidos, junto com outros países da OTAN, deram ajuda a militantes fundamentalistas islâmicos na Bósnia, no Kosovo, na Líbia, no Cáucaso e na Síria. Sempre junto com a OTAN, os norte-americanos patrocinaram a derrubada de governos laicos no Afeganistão, no Iraque e na Líbia. Agora, o plano é fazer o mesmo na Síria, contra outro governo laico, como é o de Bashar Al-Asad.
Cada uma dessas tentativas – que tiveram sucesso no caso do Afeganistão, do Iraque e da Líbia, mas que ainda está com desfecho pendente no caso da Síria – criou milhões de refugiados, sem contar que foram essas mesmas intervenções a maior causa do crescimento da Al Qaeda e do ISIS. Foi justamente o presidente Barack Obama quem reconheceu esse fato, ao indicar que “o ISIS é uma derivação da Al Qaeda, cuja expansão se deve à nossa invasão no Iraque. É um caso claro das consequências inesperadas e indesejadas das nossas ações (…) o que deveria nos ensinar que temos que afinar melhor nossa visão de um problema antes de começar a bombardeá-lo” – citado no artigo de William Blum, “Are You Confused by the Middle East?”, publicado em "ZCommunications", do qual retiro grande parte da informação citada neste artigo.
Não quero dizer que os ditadores laicos, que essas intervenções tentaram eliminar, eram santos da minha devoção, longe disso. Mas o fato de que foram ditadores não é a causa pela qual foram atacados por aqueles Estados supostamente democráticos. Os Estados Unidos e os demais membros da OTAN e da União Europeia apoiaram, e continuam apoiando, alguns dos ditadores mais terríveis que governam hoje no mundo – incluindo os dos regimes feudais da Arábia Saudita e do Qatar, este último promovido até mesmo pela camiseta do Barcelona, cuja instituição costuma dizer que “é mais que um clube de futebol”.
A razão que punha esses ditadores na lista de “inimigos” era que não eram sensíveis aos interesses dos poderes da OTAN e da União Europeia. No caso da Síria, a hostilidade contra o regime de Assad existe devido à sua oposição a que se construa um gasoduto através do território sírio, que permita às companhias de gás do Qatar chegar até a Europa, o que diminuiria a dependência que a Europa tem do gás da Rússia – fato citado pelo artigo de William Blum.
Os demais ditadores, exceto o da Síria, foram substituídos por governos ainda piores, que deram lugar à expansão do fundamentalismo islâmico e provocaram a fuga de milhões de pessoas, que são uma parte dos refugiados que chegam diariamente à Europa."
FONTE: escrito por Vicenç Navarro, professor de ciências políticas e de políticas públicas da "Universidade Pompeu Fabra" (Espanha), e da "The Johns Hopkins University" (EUA). Artigo publicado em "Público.es" (Espanha), dia 9 de novembro de 2015. Publicado no site "Carta Maior" com tradução de Victor Farinelli (http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Internacional/As-causas-do-problema-dos-refugiados/6/34950).[Título e trechos entre colchetes acrescentados por este blog 'democracia&política'].
Os governos que hoje reclamam do fluxo de refugiados são os mesmos que criaram as situações bélicas das quais os refugiados fogem.
Por Vicenç Navarro, professor de ciências políticas e de políticas públicas da "Universidade Pompeu Fabra" (Espanha), e da "The Johns Hopkins University" (EUA)
"A grande verdade da Europa nestes últimos dias é que os refugiados procedentes da Síria e de outros países, como Afeganistão e Líbia, onde há conflitos militares, são considerados inimigos pelos Estados integrantes da OTAN, incluindo os Estados Unidos, o Reino Unido França, a Alemanha e a Espanha, entre outros.
Essa afirmação pode ser obscurecida pela necessidade de responder aos anseios dos refugiados, fazendo referência à importância dos direitos humanos e da solidariedade que supostamente caracteriza a União Europeia.
Leiam os discursos recentes do presidente francês Hollande, ou da chanceler alemã, a senhora Merkel, e verão argumentos reticentes sobre o fato de a União Europeia ser o ponto de referência da democracia e do apoio às pessoas cuja dignidade e bem-estar vêm sendo negados, devido aos conflitos causados por regimes políticos denunciados no mundo.
Algo parecido ocorre nos discursos sobre os refugiados, realizados por dirigentes do governo espanhol de Mariano Rajoy, um dos governos europeus mais dóceis e servis aos interesses da União Europeia e à política externa dos Estados Unidos, além de um dos que têm maior poder dentro dessa comunidade político-administrativa.
Como era previsto, os maiores meios de informação da Espanha funcionam como grandes caixas de ressonância a essas mensagens, que visam a mobilizar a população a favor da acolhida aos refugiados. Contudo, esses mesmos meios de informação e persuasão mantêm silêncio ensurdecedor sobre a origem do problema dos refugiados.
A causa desse silêncio não é outra senão o fato de que os mesmos governos que agora estão pedindo ajuda para os refugiados são os mesmos (repito, os mesmos) governos que criaram as situações bélicas das quais os refugiados fogem. A situação é semelhante à mesma que, se uma pessoa que assassina os pais de uma criança pedisse ajuda para a órfã que resultou de seu ato criminoso. Aos que não acreditam nisso, basta buscar os dados a respeito (embora eles raramente apareçam nos tais meios).
Quem causou as crises bélicas que provocaram o problema dos refugiados?
A primeira observação sobre esse tema é com respeito aos financiamentos: os maiores Estados que apoiaram historicamente a Al Qaeda e/ou o ISIS (com armas, dinheiro e outros recursos) foram – em diferentes períodos – os Estados Unidos, a França, a Arábia Saudita, o Qatar, os países do Golfo e a Turquia, e em menor medida os demais países da OTAN.
Vejamos os dados, começando com o apoio do governo dos Estados Unidos, que se iniciou em 1979, e foi parar nas mãos dos fundamentalistas islâmicos do Afeganistão, incluindo um dirigente da Al Qaeda chamado Osama Bin Laden, em sua tentativa de lutar contra o comunismo, temerosos de que a União Soviética estabelecesse um governo comunista naquele país. Os dados estão aí para que qualquer pessoa possa vê-los.
Além do Afeganistão, os Estados Unidos, junto com outros países da OTAN, deram ajuda a militantes fundamentalistas islâmicos na Bósnia, no Kosovo, na Líbia, no Cáucaso e na Síria. Sempre junto com a OTAN, os norte-americanos patrocinaram a derrubada de governos laicos no Afeganistão, no Iraque e na Líbia. Agora, o plano é fazer o mesmo na Síria, contra outro governo laico, como é o de Bashar Al-Asad.
Cada uma dessas tentativas – que tiveram sucesso no caso do Afeganistão, do Iraque e da Líbia, mas que ainda está com desfecho pendente no caso da Síria – criou milhões de refugiados, sem contar que foram essas mesmas intervenções a maior causa do crescimento da Al Qaeda e do ISIS. Foi justamente o presidente Barack Obama quem reconheceu esse fato, ao indicar que “o ISIS é uma derivação da Al Qaeda, cuja expansão se deve à nossa invasão no Iraque. É um caso claro das consequências inesperadas e indesejadas das nossas ações (…) o que deveria nos ensinar que temos que afinar melhor nossa visão de um problema antes de começar a bombardeá-lo” – citado no artigo de William Blum, “Are You Confused by the Middle East?”, publicado em "ZCommunications", do qual retiro grande parte da informação citada neste artigo.
Não quero dizer que os ditadores laicos, que essas intervenções tentaram eliminar, eram santos da minha devoção, longe disso. Mas o fato de que foram ditadores não é a causa pela qual foram atacados por aqueles Estados supostamente democráticos. Os Estados Unidos e os demais membros da OTAN e da União Europeia apoiaram, e continuam apoiando, alguns dos ditadores mais terríveis que governam hoje no mundo – incluindo os dos regimes feudais da Arábia Saudita e do Qatar, este último promovido até mesmo pela camiseta do Barcelona, cuja instituição costuma dizer que “é mais que um clube de futebol”.
A razão que punha esses ditadores na lista de “inimigos” era que não eram sensíveis aos interesses dos poderes da OTAN e da União Europeia. No caso da Síria, a hostilidade contra o regime de Assad existe devido à sua oposição a que se construa um gasoduto através do território sírio, que permita às companhias de gás do Qatar chegar até a Europa, o que diminuiria a dependência que a Europa tem do gás da Rússia – fato citado pelo artigo de William Blum.
Os demais ditadores, exceto o da Síria, foram substituídos por governos ainda piores, que deram lugar à expansão do fundamentalismo islâmico e provocaram a fuga de milhões de pessoas, que são uma parte dos refugiados que chegam diariamente à Europa."
FONTE: escrito por Vicenç Navarro, professor de ciências políticas e de políticas públicas da "Universidade Pompeu Fabra" (Espanha), e da "The Johns Hopkins University" (EUA). Artigo publicado em "Público.es" (Espanha), dia 9 de novembro de 2015. Publicado no site "Carta Maior" com tradução de Victor Farinelli (http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Internacional/As-causas-do-problema-dos-refugiados/6/34950).[Título e trechos entre colchetes acrescentados por este blog 'democracia&política'].
Nenhum comentário:
Postar um comentário