Li no jornal “O Estado de São Paulo” de 03/10 o artigo a seguir transcrito, de autoria de Celso Amorim e Serguei Lavrov. Celso Amorim é ministro das Relações Exteriores do Brasil e Serguei Lavrov é chanceler da Rússia:
“O Brasil foi o primeiro Estado sul-americano com o qual a Rússia estabeleceu relações diplomáticas, há 180 anos. Contatos entre ambos os países antecedem suas relações formais. Em 1804, os navios russos Nadezhda e Neva, em viagens de circunavegação, ancoraram em portos brasileiros. Nos seus primórdios, o relacionamento contou com a valiosa contribuição de renomados representantes dos dois países, como o patrono da diplomacia brasileira, o Barão do Rio Branco, e o cientista e também diplomata russo Georg Henrich von Langsdorf.
Nas últimas décadas tem havido aprofundamento e estreitamento dos laços bilaterais e crescente convergência de posições entre Brasil e Rússia, ambos gigantes territoriais e populacionais, influentes nos respectivos contextos regionais e na arena internacional.
Somos aliados na defesa dos fundamentos coletivos da ordem mundial contemporânea, do papel central da Organização das Nações Unidas (ONU) na resolução dos problemas globais e na afirmação da necessidade de um sistema internacional multipolar. Defendemos também a supremacia do direito internacional, o repúdio às medidas de força unilaterais e a opção pela solução negociada de crises e conflitos. No centro de nossa agenda política comum estão questões-chave como a garantia da segurança global e regional, o combate ao terrorismo internacional, a cooperação em questões que afetam toda a humanidade, como o aquecimento global e a consolidação da estabilidade econômica.
O diálogo político permanente, construtivo e de alto nível assegura que a cooperação bilateral prosseguirá em bases mutuamente vantajosas. Nas cúpulas dos últimos anos foram estabelecidas as metas para a consolidação da parceria estratégica, o aumento dos contatos econômico-comerciais e a formação da aliança tecnológica.
Para cumprir essas metas se destaca o trabalho da Comissão de Alto Nível de Cooperação (CAN), presidida pelo presidente do Governo da Rússia, Vladimir Putin, e pelo vice-presidente do Brasil, José Alencar Gomes da Silva. O grupo de trabalho bilateral, idealizado entre a Secretaria para Assuntos Estratégicos do Brasil e o Conselho de Segurança da Rússia, é o primeiro do gênero estabelecido entre a Rússia e um país latino-americano.
O Brasil é o principal parceiro comercial da Rússia na América Latina e no Caribe; em 2007, o intercâmbio superou os US$ 5 bilhões. Começamos a cooperar na área de investimentos. A inauguração de uma fábrica de processamento de carne em Kaliningrado, no ano passado, iniciou um grande projeto de mais de US$ 100 milhões. Aumentamos a parcela de produtos de alta tecnologia no comércio bilateral e realizamos a cooperação espacial. Com a colaboração russa, foi efetuado o vôo do astronauta brasileiro Marcos Pontes à Estação Espacial Internacional. Energia, construção de aviões, nanotecnologias e área técnico-Militar são prioridades na cooperação.
O intercâmbio cultural é importante na aproximação. Artistas e criadores como Antônio Francisco Lisboa (Aleijadinho), Cândido Portinari, Heitor Villa-Lobos, Machado de Assis, Jorge Amado e Oscar Niemeyer são reconhecidos na Rússia. Muitos russos apreciam a música brasileira, bem como o carnaval e as telenovelas produzidas no Brasil. Os brasileiros demonstram grande interesse pela diversificada cultura russa. Há constante demanda por traduções para o português de obras clássicas da literatura russa. Nosso orgulho comum é a primeira escola de balé do Teatro Bolshoi fora da Rússia, em Joinville (SC). Depositamos grandes esperanças, ainda, na abertura de escolas de futebol brasileiro em Krasnodar e na região de Moscou.
A proximidade ou coincidência de nossas atitudes para a resolução dos problemas-chave da política internacional indica nosso interesse nas Nações Unidas. A Rússia considera o Brasil forte candidato a membro permanente no Conselho de Segurança da ONU reformado, no entendimento de que seja tomada decisão, mediante acordo, sobre a ampliação do Conselho de Segurança da ONU em ambas as categorias.
Nossos países continuam a procurar novas formas de cooperação multilateral. Uma delas é o diálogo entre os BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China), cujos líderes se encontraram pela primeira vez no Japão, em julho, à margem da cúpula do G-8. Em maio, em Ecaterimburgo, os chanceleres emitiram comunicado conjunto para expressar convergência de visões e reafirmar seu compromisso com um sistema internacional mais democrático, fundado na diplomacia multilateral e no primado do direito internacional. Em novembro, os ministros das Finanças e Economia dos BRICs se reunirão no Brasil.
O memorando de entendimento assinado, em 2006, entre a Rússia e o Mercosul contribui para intensificar as relações. Essa parceria ganha importância ante o papel do Mercosul na integração sul-americana. A dinâmica do comércio e a atuação do Mercosul em temas sociais, ambientais e políticos o tornaram centro de influência e crescimento econômico do mundo multipolar.
As relações entre a Rússia e o Brasil, baseadas no respeito mútuo, são vantajosas, voltadas para o futuro e independentes de oscilações conjunturais. Hoje temos a vontade política e os recursos materiais para o êxito da parceria estratégica, respondendo aos interesses de nossos países e nossos povos. A sinergia dessa parceria produzirá frutos que transcenderão o âmbito bilateral, contribuindo para uma ordem global mais democrática e apta a enfrentar os grandes desafios do mundo contemporâneo”.
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