sábado, 16 de janeiro de 2016

O BANCO CENTRAL DEVE DIMINUIR AS RESERVAS INTERNACIONAIS?




Por Laura Carvalhoprofessora da FEA-USP

Do "Jornal GGN"

"Em sua coluna na 'Folha de S. Paulo', a professora da FEA-USP, Laura Carvalho, analisa as diferentes propostas para que o Banco Central diminua, deliberadamente, o nível de reservas internacionais. Entre os objetivos de tais propostas, estão a contenção da desvalorização do real e do aumento da inflação, a utilização das reservas para quitar a dívida pública, ou para a realização de investimentos públicos.

Para a professora, os riscos de todas essas propostas são similares. Ela diz que a utilização das reservas pode ser fundamental para "absorver choques maiores e impedir uma eventual crise agravada pelo aumento das dívidas de empresas brasileiras em dólar". Por último, ela afirma que, se o objetivo é estabilizar a dívida bruta e abrir caminho para a retomada dos investimentos públicos, o melhor seria que o Banco Central não continuasse com o ciclo da alta de juros. 

Leia mais abaixo:

Da "Folha":

Quem tem medo das nossas reservas?

Por Laura Carvalho

"Desde o ano passado, diversas propostas vêm surgindo para que o Banco Central reduza deliberadamente o seu nível de reservas internacionais.

Na primeira delas, da qual já tratei na coluna "Versão Brasileira", de 8/10/2015, a ideia era utilizar todas as reservas em um curto espaço de tempo para frear a desvalorização da taxa de câmbio e a aceleração da taxa de inflação.

Na segunda, parte das reservas deveria ser utilizada para quitar a dívida pública, já que o governo paga juros maiores sobre a dívida que emite do que é remunerado pelas reservas que mantém.

Na terceira proposta, as reservas poderiam ser usadas para a realização de investimentos públicos

Apesar dos objetivos distintos —salvo se o que se quer, ao fim e ao cabo, seja simplesmente acabar com as reservas—, os riscos envolvidos são similares.

O debate sobre qual é o nível adequado de reservas cresceu na literatura econômica a partir do seu acúmulo rápido por muitos países emergentes na última década.

Por um lado, as reservas apresentam custo de oportunidade, pois em geral rendem menos do que a dívida emitida para comprá-las. Por outro lado, as reservas funcionam como um colchão para absorver choques externos e reduzir os danos sobre a economia quando há forte fuga de capitais ("Sudden Stops"). Reduzem ainda o risco de default sobre a dívida externa e, assim, a própria probabilidade de que um "Sudden Stop" ocorra.

Há relativo consenso na literatura de que as reservas acumuladas por países emergentes pré-2008 foram fundamentais para amenizar os efeitos da crise nessas economias. No entanto, a pergunta sobre se o nível de reservas já teria atingido um patamar excessivo originou uma série de estudos recentes. Mesmo nos trabalhos que consideram ser esse o caso de alguns países asiáticos, como o de Calvo, Izquierdo e Loo-Kung (2012) publicado pelo "National Bureau of Economic Research", as reservas brasileiras ainda estariam abaixo do nível ótimo.

No ano de 2015, a valorização das nossas reservas em dólar, que enquanto ativos do governo reduzem a dívida pública líquida, quando combinada à quase inexistência de dívida externa soberana, foi fundamental para manter baixo o risco de default sobre títulos brasileiros e, assim, para impedir que a forte volatilidade financeira nos mercados internacionais precipitasse uma crise cambial.

O contexto continua sendo dos mais arriscados. A ameaça de elevação da taxa de juros americana e a turbulência na China continuarão a desencadear fortes movimentos especulativos no mercado internacional, o que, na falta de controles de capital, inevitavelmente golpeia os mercados emergentes. O uso de reservas poderá ser fundamental para absorver choques maiores e impedir uma eventual crise agravada pelo aumento das dívidas de empresas brasileiras em dólar.

Se o objetivo é mesmo o de estabilizar a dívida bruta e supostamente criar espaço para a retomada dos investimentos públicos, melhor seria se o Banco Central não continuasse a elevar a taxa de juros em meio a uma economia deprimida e com taxa de inflação que já sinaliza uma desaceleração. Mas, se o objetivo é nos deixar reféns do FMI e forçar novas privatizações em um futuro próximo, queimar as reservas é um bom começo. "

FONTE: escrito por Laura Carvalho, professora da FEA-USP, na 'Folha de S. Paulo'. Transcrito e comentado no "Jornal GGN"  (http://jornalggn.com.br/noticia/quem-tem-medo-das-reservas-internacionais-por-laura-carvalho).

Um comentário:

Leandro BR disse...

Não sou economista, porém, conheço estudos que apregoam justamente o contrário. De mais a mais, o acúmulo excessivo de reservas cambiais em dólar é um dos motivos da taxa de juros alta e do déficit público brasileiro (por conta do aumento do serviço da dívida interna justamente por conta do custo de oportunidade de acumular reservas externas). Logo, parece que a autora ignora - conscientemente? - estudos amplamente divulgados sobre o assunto (v.g. Christian Vonbum, IPEA, Textos para Discussão 1357 e 1885). Aliás, a contaminação ideológica da autora transparece ao final da sua coluna.