Desde 2003, o Brasil tem boa política industrial
ABDI
Por Ariovaldo Rocha
"Nas últimas semanas, parte da imprensa aproveitou a transição no Ministério do Desenvolvimento - com a saída de Fernando Pimentel e a entrada de Mauro Borges – para criticar a política industrial. Para alguns, não ficou pedra sobre pedra, e estaria tudo errado. Certamente, essas críticas são influenciadas pelo cenário eleitoral. Na realidade, os governos de Lula e Dilma adotaram medidas claras de política industrial, bem ao contrário do que antes ocorria.
Em países já prontos, como Estados Unidos, Japão e Alemanha, a política industrial se destina a corrigir detalhes: é um pequeno incentivo a um setor que se mostra com problemas específicos e a negociação com empresários sobre importações a preços artificialmente baixos – "dumping". Uma boa política industrial tem seus limites, pois o que ocorre no resto do mundo tem impacto sobre decisões internas, mas em muitos casos a ação é efetiva e seus benefícios permanecem por décadas e até séculos.
Nas gestões anteriores, não havia política industrial. Dizia-se que "a globalização impunha competição" e, em diversas áreas, isso significou importação em massa, representando submissão ao exterior. No caso específico da construção naval, os governos do PSDB optaram – não se trata de comentário, mas de verdade histórica – por realizar compras no exterior.
Só a Petrobras necessitará de mais de uma centena de plataformas e de meia centena de navios-sonda – cada um a preços em torno de US$ 1 bilhão, a grosso modo. Antes de 2003, a ordem era importar. Isso não significava que o preço final fosse menor nem que os prazos seriam cumpridos, pois os sobrepreços foram muitos; houve caso de falência de um estaleiro estrangeiro e transferência de plataforma para outro país, a custos fantásticos.
Ao contrário, a tão criticada política industrial de Lula e Dilma está sendo um sucesso. Dezenas de plataformas e navios-sonda estão sendo feitos no país; inúmeros estaleiros se modernizaram, e há ainda os que estão em fase de implantação, para atender a essa demanda gerada pela política industrial.
No caso dos navios, a comparação é mais dura. Lula e Dilma criaram os Programas de Modernização da Frota (PROMEF) I e II, que implicaram encomenda de 49 navios, por cerca de R$ 10 bilhões, pela Transpetro.
Isso é política industrial: sempre houve demanda, mas faltava crédito e apoio político, através da garantia de que as encomendas não seriam repassadas para o exterior ante qualquer empecilho. Com tudo pronto, ainda faltava confiança e o Ministério da Fazenda criou um fundo garantidor – que também é parte de uma política industrial firme.
No governo do PSDB, foi lançado, na Transpetro, o programa "Navega Brasil", que, por não ter implicado a encomenda sequer de um navio, foi chamado por parte da imprensa de "Naufraga Brasil". Aí está a diferença entre uma política industrial e outra. Antes, aceitava-se tudo como "imposição da globalização" e, a partir de 2003, houve decisão de se impor a construção no Brasil, mesmo aceitando a fase de aprendizado – em que preços e prazos levam algum tempo para se adequar, como ocorre em toda parte.
De forma tragicômica, dois navios importados pela Transpetro, antes de 2003, têm nomes bem brasileiros: "Cartola" e "Ataulfo Alves". Mas geraram empregos na Coréia do Sul. O "Cartola" era o antigo "Mega Hawk", e o Ataulfo Alves veio ao mundo com o nome de "Mega Eagle".
Além da construção naval, a política industrial implicou créditos especiais a diversos setores e desonerações na folha de pagamento para um grupo enorme de segmentos industriais. Isso realmente é fazer uma política industrial.
O que os críticos não vêem é que a supervalorização dos preços de minério e produtos agrícolas fez com que o país se desviasse para obter tais ganhos. A relativa queda da indústria e aumento de cotação de itens primários foi mais imposição do mercado do que opção de governo.
Além disso, nesse período, houve diversas crises, na Europa e Estados Unidos, com implicações diretas no Brasil. A política anterior de Washington fortalecia exageradamente o real, o que foi doloroso para a indústria em geral, pois, ao tempo em que estimulou importações, bloqueou exportações. Agora, ocorre o contrário: desvalorização, igualmente acentuada, do real, o que obriga o Banco Central a agir, para não desconcertar a economia.
É claro que um real bem fraco estimularia exportações, mas geraria inflação exagerada e rápida em itens básicos, como combustíveis, e iria encarecer itens da própria indústria nacional que usa componentes importados.
Em resumo, temos uma excelente política industrial, com visão clara e objetivos definidos. Se a indústria está contida, isso se deve a diversos fatores, especialmente ao que ocorreu com o câmbio nos últimos anos e ainda pela política pragmática da China e países asiáticos, de vender produtos a qualquer preço, muitas vezes sem levar em conta proteção ao trabalhador, salários razoáveis nem dar importância ao ambiente.
Não é só o Brasil, mas todo o mundo que se defronta com o desafio chinês. Sem a aplicação de uma política industrial pelos governos brasileiros, a partir de 2003, o impacto negativo na indústria local teria sido muito pior."
FONTE: escrito por Ariovaldo Rocha, presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção Naval (SINAVAL). Transcrito no "Jornal GGN" (http://jornalggn.com.br/noticia/desde-2003-o-brasil-tem-boa-politica-industrial).
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