quinta-feira, 16 de julho de 2009

GOVERNO E EMPRESÁRIOS QUEREM INSERIR INOVAÇÃO NA AGENDA ANTICRISE

“Governo e indústria estão juntando forças para aumentar os investimentos em inovação. A ação quer, ao mesmo tempo, evitar que a crise reduza os gastos das empresas em pesquisa e desenvolvimento (P&D) e preparar o Brasil para uma maior concorrência quando a economia mundial voltar a crescer.

No âmbito público, depois das reduções dos juros nas linhas de financiamento, a agenda volta-se para ampliação do crédito, o que passa pela capitalização da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), vinculada ao Ministério de Ciência e Tecnologia.

O presidente da Finep, Luis Fernandes, disse ao Valor que até o fim deste mês deverá estar desenhada uma solução para a capitalização da empresa, tema encaminhado na área econômica do governo, o que lhe permitirá ampliar as operações de crédito para inovação. A Finep também quer definir até agosto formas de ampliar a captação de recursos de financiamento para atender a demanda de projetos em carteira que, em junho, somava R$ 3,4 bilhões.

O número considera projetos em todas as etapas do processo de tramitação da empresa, da consulta à contratação. Na comparação com dezembro de 2008, quando a demanda em análise na Finep era R$ 1,6 bilhão, a carteira mais que dobrou. Esse é, segundo o presidente da Finep, um indicador de que setores empresariais veem a crise como oportunidade para ampliar os investimentos em inovação.

A disposição de investir em novos produtos e processos ou em P&D, indicada na carteira da Finep, se verifica apesar do adiamento de investimentos na ampliação da capacidade produtiva, como resultado da retração da demanda em um cenário de desaceleração econômica.

Na área privada, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) tenta transformar a inovação em um tema prioritário para as empresas, esforço que envolve presidentes de grandes corporações privadas e estatais como Gerdau, Ultra, Brasken, Petrobras, Microsoft, Ford, Coteminas, Fiat, IBM, Eletrobrás, Boticário, Merck, Novartis, Dell e Votorantim, além de associações setoriais e federações da indústria.

Em agosto, a CNI vai promover, em São Paulo, o 3º Congresso Brasileiro de Inovação na Indústria quando lançará um “manifesto pela inovação” - posicionamento político com a meta de alçar o tema à agenda estratégica das indústrias.

“A ideia é criar uma consciência sobre a importância da inovação como principal fator de competitividade das empresas na gestão e no modelo de negócio”, diz Rafael Lucchesi, diretor de operações da CNI. A busca por consenso em torno da inovação na indústria repete, de certa maneira, o movimento lançado, na década de 90, em torno da melhoria da qualidade nas empresas, que se transformou no Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade (PBQP).

Claudio Gastal, diretor-presidente do Movimento Brasil Competitivo (MBC), entende que é preciso estreitar a parceria público-privada na busca pela inovação. A inovação foi incorporada à Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), a nova política industrial no segundo governo Lula, mas falta, na visão do MBC, que os atores se integrem mais a essa política. “É uma mudança de comportamento”, diz Gastal.

Por muito tempo, o meio empresarial esteve “divorciado” das atividades científicas e tecnológicas, concentradas em institutos de pesquisa e universidades. Havia baixa adesão dos empresários à temática da inovação e o mundo acadêmico permanecia desconectado, em grande medida, do esforço de desenvolvimento no meio empresarial. Essa realidade está mudando.

Tanto no setor público como no privado parte-se da premissa de que a inovação, em suas variadas vertentes (P&D, novos produtos, processos ou métodos organizacionais e de marketing), é fundamental para a competitividade sustentável das empresas.

“Na era do conhecimento, quem não se voltar para a inovação como força motriz do desenvolvimento, termina prisioneiro de uma espécie de novo pacto colonial em que a tecnologia é desenvolvida em determinados polos que os demais (países) aplicam”, compara Luis Fernandes, o presidente da Finep.

Ele não quis dar detalhes sobre as negociações em curso no governo para ampliar o crédito à inovação. Disse que o tema evolui de forma favorável. As discussões passam pelas fontes tradicionais de recursos da Finep, que incluem o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) e o Fundo Nacional de Desenvolvimento (FND).

A empresa também opera com recursos próprios. Finep e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) poderão passar a ter ações integradas. Uma possibilidade é a Finep atuar como agente financeiro do BNDES no crédito à inovação.

O objetivo da Finep é ter condições de operar a carteira dentro de uma realidade que combina, de um lado, aumento de demanda por crédito à inovação, e, de outro, restrição de recursos como resultado de cortes orçamentários.

“Há uma negociação integrada na área econômica para ampliar a capacidade de concessão de crédito e recompor o orçamento do FNDCT, em especial o orçamento da subvenção econômica”, disse Fernandes. Segundo ele, está prevista a edição de um decreto que vai recompor, a curto prazo, R$ 100 milhões dos recursos da subvenção, que consiste no apoio financeiro não reembolsável às empresas. O restante seria recomposto ao longo deste semestre.

No total, a Finep viu seu orçamento de 2009 ser reduzido em R$ 1 bilhão e trabalha, por enquanto, com R$ 2,5 bilhões para apoiar a inovação. Desse total, R$ 1,7 bilhão são destinados ao FNDCT para financiamentos não reembolsáveis, incluindo apoio a instituições de ciência e tecnologia, infraestrutura de pesquisa, subvenção e outros. Os R$ 800 milhões restantes são para operações de crédito reembolsável.

João Alberto De Negri, pesquisador do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), entende que falta ao país uma política de inovação para o período pós-crise. Ele defende a ampliação dos mecanismos de crédito, subvenção e incentivos fiscais para P&D. E prega uma ação articulada entre BNDES, Finep e Petrobras voltada para o núcleo de empresas geradoras de conhecimento novo para a inovação na indústria.

São cerca de 700 empresas industriais para as quais o governo teria de garantir financiamentos reembolsáveis de cerca de R$ 3 bilhões, via Finep, com juro zero em operação equalizada via fundo Verde Amarelo, programa de estímulo à integração universidade-empresa. O financiamento teria o objetivo de manter os investimentos em P&D e o pessoal ocupado na área por um período de dois anos.

O presidente da Finep disse que a política de inovação para o pós-crise está inscrita na PDP. Ele reconheceu que até a redução dos juros nas linhas de financiamento à inovação, o que foi possível com a última queda da TJLP, o tema não havia sido incorporado à agenda da crise, diferente dos Estados Unidos que inseriram os investimentos em ciência e tecnologia no primeiro pacote de combate à crise. Agora a agenda volta-se para a ampliação do crédito na inovação, insistiu Fernandes.

META É APLICAR 0,65% DO PIB EM PESQUISA

O Brasil tem como meta na nova política industrial aumentar os investimentos das empresas em pesquisa, desenvolvimento e inovação de 0,51% para 0,65% do Produto Interno Bruto (PIB) até o fim de 2010. Para dar esse salto, serão necessários investimentos de R$ 18,2 bilhões, dos quais o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) se comprometeu a financiar R$ 6 bilhões, disse Helena Tenório, chefe de departamento da área de planejamento da instituição.

A parcela restante, disse ela, será financiada pelo Ministério de Ciência e Tecnologia, Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e pelas próprias empresas. As áreas estratégicas são saúde, energia, defesa, tecnologias da informação e da comunicação (TIC), biotecnologia e nanotecnologia.

Os últimos dados disponíveis da Pesquisa de Inovação Tecnologia (Pintec), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2005, mostram que de um total de 91 mil empresas industriais, 30,4 mil implementaram produtos e ou processos tecnologicamente novos ou substancialmente aprimorados.

A taxa de inovação, que considera o número de empresas inovadoras sobre o universo industrial da pesquisa, foi relativamente baixa, de 33,4%, e praticamente igual à taxa da Pintec 2003, de 33,3%. Em 2005, nas empresas com mais de 500 empregados, a taxa de inovação foi a maior, de 79,2%. Mas quanto menor a empresa, menor a taxa, como mostra a última Pintec.

Nas empresas com 10 a 49 empregados, por exemplo, a taxa foi de 28,9%. Para as gerentes da Pintec, Mariana Rebouças e Fernanda Vilhena, o aumento da taxa de inovação depende de esforços das micro, pequenas e médias empresas. “A cultura de mobilização pela inovação tem que ser maior na pequena e média empresa”, disse Mariana.

O Movimento Empresarial pela Inovação, organizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) para tornar o tema uma prioridade nas empresas, envolve o Sebrae. O objetivo é ampliar o número de pequenas e médias empresas que fazem inovação com foco, inclusive, nos arranjos produtivos locais (APLs). Pretende criar o prêmio nacional de gestão na inovação como forma de mobilizar as pequenas e médias empresas em relação ao tema.

Ainda segundo a Pintec, 5 mil indústrias das áreas extrativa e de transformação gastaram cerca de R$ 7 bilhões em P&D em 2005. Desse total, 690 empresas, que empregavam mais 500 pessoas, investiram R$ 5,6 bilhões em P&D. No setor de serviços, 1,1 mil empresas desembolsaram R$ 3,27 bilhões em pesquisa e desenvolvimento. No total, entre indústria e serviços, 6,1 mil empresas investiram R$ 10,3 bilhões em P&D.

Fernanda Vilhena, a gerente da Pintec, disse que em 1º de agosto o IBGE começará a pesquisa do período 2006-2008. Os resultados serão conhecidos em julho de 2010. Haverá equipes coletando informações por telefone e diretamente nas empresas. A nova Pintec vai incorporar o novo conceito da inovação que inclui, além de gastos em P&D, a implementação de produto novo ou aprimorado, de processo ou novo método organizacional e de marketing.”

FONTE: reportagem de Francisco Góes, publicada no jornal Valor Econômico e reproduzida no site “Vermelho” em 15/07/2009.

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