sexta-feira, 20 de junho de 2014

HIPOCRISIA AMAZÔNICA



Por Paulo Moreira Leite, diretor da sucursal da revista ISTOÉ em Brasília


Forças que fizeram o possível para bloquear construção de Belo Monte denunciam atraso na obra e falta de energia

"Examinada com frieza, a notícia de que Belo Monte deverá sofrer um atraso – quem sabe de um ano – para começar a produzir energia não deve ser vista como denúncia. Pelo contrário, pode ser comemorada. Explico.

Os mais rudimentares estudos sobre a carência de energia num pais onde a luz ainda não chegou a 100% das casas e está longe de atender às demais necessidades de uma sociedade do seculo XXI mostram que os megawatts que Belo Monte irá oferecer já estão fazendo falta.

Agravam nossos problemas de infraestrutura, complicam as mazelas de nossa logística. Se queremos uma sociedade com computadores, metrô, carro elétrico, conforto decente e consumo aceitável, é preciso ter energia, numa escala que vai muito além daquela tomada que liga uma lâmpada. As opções são muitas, mas vamos combinar que a hidroelétrica é limpa e relativamente acessível pelo preço e pela geografia do país.

O desagradável é que a turma que, não muito secretamente, passou os últimos anos torcendo por um apagão para prejudicar o governo Dilma, numa repetição do desastre ocorrido no segundo mandato de Fernando Henrique/PSDB, é a mesma que fez o possível para impedir a construção de uma das três maiores usinas do mundo.

Belo Monte foi rascunhada pela primeira vez há mais de 30 anos. De lá para cá o projeto sofreu tantas modificações e enfrentou tantas pressões – ecológicas, politicas, econômicas -- que seria absurdo esperar que as obras cumprissem os prazos definidos quando, enfim, a construção pode ser iniciada.

Mesmo depois disso, reivindicações justíssimas e pleitos absolutamente irracionais foram somados e multiplicados para impedir o avanço das obras.

Alvo de permanente campanha de descrédito e denúncia em todo território nacional, os sindicatos em atividade no local das obras foram glorificados toda vez que sua mobilização contribuía para paralisar os trabalhos.

Ações judiciais foram glorificadas. Os direitos das nações indígenas, sempre desprezados, ali são sacralisados.

A pressão internacional incluiu estrelas da TV, de Hollyowood e entidades ligadas aos interesses mais retrógrados das finanças internacionais, que mobilizam um ambientalismo excludente, para travar um investimento necessário para um país que precisa desenvolver-se, gerar empregos e combater a pobreza. São aqueles que dizem -- sem sentir vergonha -- que o crescimento econômico, "o desenvolvimento e a ampliação do mercado interno são incompatíveis com a preservação da natureza". Do alto de suas fortunas, protegidas com ferocidade, planejam uma sociedade onde a maioria da população só tenha direito a migalhas.

Há economistas que condenam o direito do brasileiro consumir bife nas refeições porque o pum do gado afeta a camada de osônio.

Não vamos nos enganar. As vozes que hoje denunciam o atraso nas obras são as mesmas que fizeram o possível para impedir que Belo Monte saisse do papel. Hoje, denunciam os custos e os danos que as usinas termoelétricas – que são mesmo caras e poluentes – provocam na natureza e na conta de luz de cada família, como se não tivessem contribuído com todas as forças para criar uma situação de emergência.

Tenha certeza: quando a usina ficar pronta, vão dizer que Belo Monte gera pouca energia, relativamente. É verdade. Só não vale apagar os registros da história. Foi a pressão ambiental, aceita pelo governo, numa concessão que se julgou politicamente irresistível, que levou a aplicação de uma tecnologia, chamada "fio d’água", que só permite gerar 15% da energia potencial.

Deu para entender, não?"


FONTE: escrito por Paulo Moreira Leite, diretor da sucursal da revista ISTOÉ em Brasília. É autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época. Também escreveu "A Mulher que Era o General da Casa".  (http://www.istoe.com.br/colunas-e-blogs/colunista/48_PAULO+MOREIRA+LEITE).

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