Desembarque francês em Tombuktu, janeiro de 2013
“Uma invasão da África de grandes proporções está em andamento. Os Estados Unidos estão instalando tropas em 35 países africanos, a começar pela Líbia, Sudão, Argélia e Níger. Isso foi informado pela “Associated Press” no dia de Natal, mas ficou omisso na maior parte da imprensa anglo-americana.
Por John Pilger (que já recebeu o prêmio jornalista inglês do ano), em seu site. Artigo transcrito e publicado no “Resistir.info”, de Portugal
A invasão pouco tem a ver com "islamismo" e, quase tudo a ver com a aquisição de recursos, nomeadamente minérios, e com aceleração da rivalidade com a China. Ao contrário da China, os EUA e seus aliados estão preparados para utilizar um grau de violência já demonstrado no Iraque, Afeganistão, Paquistão, Iêmen e Palestina. Tal como na guerra-fria, uma divisão de trabalho exige que o jornalismo ocidental e a cultura popular providenciem a cobertura de uma guerra sagrada contra um "arco ameaçador" de extremismo islâmico, não diferente da falsa "ameaça vermelha" de uma conspiração comunista mundial.
A recordar a Luta pela África no fim do século 19, o “US African Command” (AFRICOM ) construiu uma rede de pedintes entre regimes colaboracionistas africanos ansiosos por subornos e armamentos americanos. No ano passado, o AFRICOM ensaiou a “Operação Esforço Africano” (“Operation African Endeavor”), com as forças armadas de 34 países africanos nela tomando parte, comandadas por militares estadunidenses. A doutrina "soldado para soldado" do AFRICOM insere oficiais dos EUA em todo nível de comando, desde o general até o primeiro-sargento.
É como se a orgulhosa história de libertação da África, desde Patrice Lumumba até Nelson Mandela, estivesse destinada ao esquecimento por uma nova elite colonial negra a serviço do mestre cuja "missão histórica", advertiu Frantz Fanon há meio século, é a promoção de "um capitalismo desenfreado embora camuflado".
Um exemplo gritante é o Congo Oriental, um tesouro de minerais estratégicos, controlado por um grupo rebelde atroz conhecido como M23, o qual, por sua vez, é dirigido por Uganda e Ruanda, os procuradores de Washington.
Planejada há muito como uma "missão" para a OTAN, para não mencionar os franceses sempre zelosos, cujas causas coloniais perdidas continuam em prontidão permanente, a guerra à África tornou-se urgente em 2011 quando o mundo árabe parecia estar se libertando dos Mubaraks e outros clientes de Washington e da Europa. A histeria que isso provocou em capitais imperiais não pode ser exagerada. Bombardeiros da OTAN foram despachados não para Tunis ou Cairo, mas sim para Líbia, onde Muammar Kadafi dominava as maiores reservas petrolíferas da África. Com a cidade líbia de Sirte reduzida a escombros, as SAS britânicas dirigiram as milícias "rebeldes" para o que se revelou como banho de sangue racista.
O povo nativo do Saara, os tuaregues, cujos combatentes berberes Kadafi havia protegido, fugiu através da Argélia para o Mali, onde os tuaregues, desde a década de 1960, reivindicam um estado separado. Como destaca o sempre vigilante Patrick Cockburn, é essa disputa local, não a Al-Qaida, que o Ocidente mais teme no Noroeste da África... "por pobres que possam ser, muitas vezes os tuaregues vivem em cima de grandes reservas de petróleo, gás, urânio e outros minérios valiosos".
Quase certamente a consequência do ataque francês/estadunidense ao Mali em 13 de Janeiro, o cerco a um complexo de gás na Argélia que acabou de forma sangrenta, inspirou em David Cameron um momento “11 de setembro”. O antigo relações públicas da Carlton TV enfureceu-se acerca de uma "ameaça global" que exigiria "décadas" de violência ocidental. Ele queria dizer a implementação dos planos de negócios do Ocidente para a África, juntamente com a violação da Síria multiétnica e a conquista do Irã independente.
Cameron, agora, ordenou o envio de tropas britânicas para o Mali e enviou para lá um drone da RAF, enquanto o seu prolixo chefe militar, general sir David Richards, dirigiu "uma mensagem muito clara a jihadistas de todo o mundo: não nos provoquem e não nos embaracem. Trataremos disso de forma robusta" – exatamente o que jihadistas querem ouvir. O rastro de sangue de vítimas do terror do exército britânico, todos muçulmanos, seus "sistêmicos" casos de torturas atualmente a caminho do tribunal, acrescenta ironia às palavras do general. Certa vez, experimentei os meios "robustos" de sir David quando lhe perguntei se lera a descrição da corajosa feminista afegã Malalai Joya do comportamento bárbaro de ocidentais e seus clientes no seu país. "O senhor é um apologista do Talibã" foi a sua resposta (posteriormente, desculpou-se).
Esses comediantes lúgubres são extraídos diretamente [do escritor] Evelyn Waugh e permitem-nos sentir a estimulante aragem da história e da hipocrisia. O "terrorismo islâmico", que é a sua desculpa para o roubo continuado das riquezas da África, foi praticamente inventado por eles. Já não há qualquer desculpa para engolir a linha da BBC/CNN e não conhecer a verdade. Leiam “Secret Affairs: Britain's Collusion with Radical Islam de Mark Curtis” (“Serpent's Tail”) http://www.bookdepository.co.uk/search?searchTerm=Secret+Affairs%3A+Britain%27s+Collusion+with+Radical+Islam&search=Find+book, ou “Unholy Wars: Afghanistan, America and International Terrorism” http://www.bookdepository.co.uk/search?searchTerm=Unholy+Wars%3A+Afghanistan%2C+America+and+International+Terrorism&search=Find+book , de John Cooley (Pluto Press) ou “The Grand Chessboard” http://www.bookdepository.co.uk/search?searchTerm=The+Grand+Chessboard&search=Find+book, de Zbigniew Brzezinski (HarperCollins), que foi o parteiro do nascimento do moderno terror fundamentalista. Com efeito, os mujahedin da Al-Qaida e os Talibans foram criados pela CIA, o seu equivalente paquistanês, o “Inter-Services Intelligence”, e o MI6 britânico.
Brzezinski, conselheiro de segurança nacional do presidente Jimmy Carter, descreve uma diretiva presidencial secreta em 1979 que principiou aquilo que se tornou a atual "guerra ao terror". Durante 17 anos, os EUA, deliberadamente, cultivaram, financiaram, armaram e fizeram lavagem cerebral a extremistas da jihad que "saturaram de violência uma geração". Com o nome de código “Operation Cyclone”, esse foi o "grande jogo" para deitar abaixo a União Soviética, mas que deitou abaixo as Torres Gêmeas.
Desde então, as notícias que pessoas inteligentes e educadas tanto distribuem como ingerem tornou-se uma espécie de jornalismo Disney, fortalecido, como sempre, pela licença de Hollywood para mentir e mentir. Está para ser lançado o filme “Dreamworks” sobre a “WikiLeaks”, uma trama inspirada por um livro de tagarelices pérfidas de dois jornalistas do “Guardian” que se enriqueceram, e há também o “Hora negra” (“Zero Dark Thirty”), filme que estimula a tortura e o assassinato, dirigido pela ganhadora do Oscar Kathryn Bigelow, a Leni Riefenstahl do nosso tempo, que promove a voz do seu mestre tal como fez a realizadora de estimação do Fuhrer. Esse é o espelho de sentido único através do qual nós mal vislumbramos aquilo que o poder faz em nosso nome.”
FONTE: escrito por John Pilger (que já recebeu o prêmio jornalista inglês do ano), em seu site. Artigo transcrito e publicado no “Resistir.info”, de Portugal. Transcrito no portal “Vermelho” (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=205786&id_secao=6).
Nenhum comentário:
Postar um comentário