Ida
Volta
Por Rubens Ricupero [no jornal da direita, pró-EUA e Israel, "Folha de São Paulo"]
"Faz quase 25 anos que o vazio criado pelo fim do antagonismo entre EUA e URSS não é preenchido.
Nunca foi tão difícil como hoje captar a essência que define a política internacional. O ano próximo assinala não só um século da Primeira Guerra Mundial, mas 25 anos da queda do muro de Berlim e início do fim do comunismo.
Entre 1914 e 1989, jamais se teve dúvida sobre qual era o jogo estratégico dominante, ou a respeito da identidade dos principais adversários de cada lado. Quando as guerras mundiais não ocupavam esses anos, uma trégua precária e sinistra antecipava o conflito seguinte.
Faz quase um quarto de século que o vazio criado pelo desaparecimento do antagonismo entre EUA e União Soviética não consegue ser preenchido por nada permanente.
O ideal, é claro, seria que a colaboração para fortalecer as Nações Unidas e resolver os problemas globais do clima e da miséria substituísse em definitivo os conflitos do passado.
Como a consciência moral da humanidade está longe desse nível, o que temos visto é a disputa entre dois conflitos para definir a agenda dos grandes problemas internacionais. Aquele que vem dominando até agora é o choque entre o Ocidente e o fundamentalismo islâmico.
Os problemas do Oriente Médio, que sob a forma da primeira guerra do Golfo tinham se apoderado do centro do palco antes até da morte formal da URSS (31/12/1991), ganharam o componente novo do fundamentalismo religioso depois dos atentados de 11 de Setembro. A partir de então, [sob esse pretexto talvez até planejado] os EUA vivem no Afeganistão, Iraque, Iêmen, em qualquer refúgio de "terroristas" [assim são denominados todos que lutam contra as invasões e interesses norte-americanos]. Essa guerra já dura 12 anos, o dobro da Segunda Guerra Mundial!
O desígnio de Obama era libertar-se dessas guerras e transferir o eixo estratégico para a Ásia do Leste e o entorno da China. Lá é que se concentraria cada vez mais o crescimento econômico e de população; nessa área é que os americanos julgavam necessário conter o poderio chinês e tranquilizar os vizinhos assustados com a ascensão do antigo 'Império do Meio'.
As precondições para a chamada 'política do pivô' sair do papel, porém, não se realizaram. A primeira consistia na plena recuperação da economia dos EUA, o que, com desemprego acima de 7%, obviamente não se concretizou, apesar das melhoras. As duas condições seguintes se frustraram ao fracassarem a missão do senador Mitchell junto a palestinos e israelenses assim como a de Holbrooke no Paquistão-Afeganistão.
Não só essas feridas permanecem abertas. Outras novas supuraram: o caos na Líbia, o fracasso da Primavera Árabe no Egito, a carnificina na Síria, da qual Obama foi salvo por um triz pela malícia de Putin.
Nessa região, avanços num setor criam complicações em outros. Israel não confia nas negociações com o Irã; a Arábia Saudita não se conforma com o adiamento do ataque à Síria; a Turquia compra sistema antibalístico dos chineses!
Com tais aliados e desafios, é difícil crer num desengajamento próximo dos americanos no Oriente Médio. O panorama estratégico se parece aos versos do poema de Fernando Pessoa: "Tudo é incerto e derradeiro. / Tudo é disperso, nada é inteiro." Cada vez mais, o mundo está envolto em nevoeiro.”
FONTE: escrito por Rubens Ricupero e publicado na "Folha de São Paulo" (http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/136181-nevoeiro-estrategico.shtml). [Imagens do Google e trechos entre colchetes adicionados por este blog ‘democracia&política’].
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