Maria Clotilde Lemos Petta é coordenadora da Secretaria de Políticas Internacionais da Contee e diretora do Sinpro Campinas e Região, da CTB e da Fise
Política externa de Aécio Neves: a ALCA em pauta
Por Maria Clotilde Lemos Petta*, para o portal "Vermelho"
“Este é um governo que não fala fino com os EUA nem grosso com a Bolívia”, (Chico Buarque de Holanda).
A política externa implementada nos governos Lula e Dilma tem como uma de suas marcas o papel protagonista do Brasil nas relações internacionais. Essa marca tem sido reconhecida por eminentes estudiosos da atual conjuntura.
De fato, uma análise da política externa iniciada no governo Lula com o chanceler Amorim, e que tem continuidade no governo Dilma, tem como uma das suas características uma posição altiva do Brasil nas relações exteriores, em especial com os EUA, e no avanço do processo de integração latino-americana. Sendo assim, é extremamente preocupante a possibilidade de eleição do senador Aécio Neves. Embora tente se apresentar como candidato da mudança, uma análise de sua trajetória política e de suas propostas referentes à política internacional demonstra que sua eleição significará um grave retrocesso no posicionamento do Brasil no cenário internacional.
Um primeiro fato que chama atenção nos seus pronunciamentos e no debate eleitoral é seu posicionamento em relação ao Mercosul. No programa de governo apresentado oficialmente, essa questão é tratada de forma muito genérica. É colocada em termos de “…um acordo preferencial com os Estados Unidos….” ou “…restabelecer a primazia da liberalização comercial …”. Em relação ao Mercosul “…flexibilizar suas regras… e …nova estratégia de negociações comerciais bilaterais, regionais e globais…”(02).
No entanto, na sua trajetória política e em recente pronunciamento é que sua posição frente à política externa fica evidenciada. Em abril passado, em palestra durante o Fórum da Liberdade, promovido pelo Instituto de Estudos Empresariais (IEE), ele classificou o Mercosul como “coisa anacrônica” que “não está servindo a nenhum interesse dos brasileiros”(03).
Aécio Neves repetiria esse posicionamento em vários pronunciamentos e eventos. Em entrevista a um jornal da Argentina, o ‘La Nacional’, declarou: “Temos que ter a coragem de repensar e revisar o Mercosul… Temos que transformar o Mercosul em uma área de livre comércio, que permita a cada Estado-membro firmar acordos comerciais com outros países”, afirmou Aécio. Ele deu uma ideia do que considera adequado: “A Aliança do Pacífico, constituída por México, Colômbia, Peru e Chile, é um exemplo de dinamismo”(04).
O que impressiona nessas declarações é que elas entram em contradição com números apresentados pelo próprio setor empresarial. Newton Lima*, em artigo, considera que, em recente estudo intitulado “Agenda para a integração externa”, produzido pela Federação das Indústrias de São Paulo, conclui-se que nos últimos dez anos as exportações brasileiras para os países do Mercosul somaram US$ 169 bilhões, com superávit acumulado da ordem de US$ 46 bilhões. E mais: mesmo com os efeitos da crise, a partir de 2008, o intercâmbio entre os países do Mercosul foi superior ao do comércio internacional: enquanto as trocas globais aumentaram 13% no período 2008-2012, o comércio intra-Mercosul cresceu mais de 20%(02). Carlos cita artigo do jornal Folha de S.Paulo (18.06.2013), no qual o empresário Benjamin Steinbruch lamenta que as opiniões favoráveis ao abandono do Mercosul “se apoiem em razões ideológicas”(05).
E quais seriam essas razões ideológicas senão Aécio Neves dar continuidade a sua trajetória política marcada pela defesa da nossa subalternização aos interesses norte-americanos? Essa marca de Aécio fica evidente no seu grande apoio dado na tentativa de implantação da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA). Cabe lembrar que, proposta rejeitada pelos brasileiros, a ALCA – um projeto lançado pelo ex-presidente dos EUA, Bill Clinton – foi abraçada pelo governo tucano de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). O senador é autor do prefácio do livro “O Brasil e a ALCA”, uma produção fruto do debate feito na Câmara em 2001. Nele, Aécio denota que tinha expectativas de ver a ALCA consolidada até 2005, e que considerava “formidável” a liberalização do comércio em um território cujo PIB soma U$ 11 trilhões(06).
Esse posicionamento de Aécio não deixa dúvidas sobre sua intenção de colocar novamente em pauta a proposta da ALCA, atendendo estritamente aos interesses dos EUA. A forma de camuflar uma proposta que já foi amplamente rejeitada pelos brasileiros é tentar se colocar como candidato das mudanças usando expressões como “flexibilização do Mercosul “e “revisar o Mercosul “. Sua eleição, sem dúvida, significará um grande golpe no processo de integração latino-americana e um grande retrocesso na inserção soberana de nosso país no âmbito internacional.
Tem razão Chico Buarque de Holanda, como sempre muito lúcido, que, ao justificar, entre outras razões, seu apoio à reeleição de Dilma Housseff, resumiu sua posição numa frase que já ficou célebre: “Este é um governo que não fala fino com os EUA nem grosso com a Bolívia”.
NOTAS:
01- Perry Anderson – historiador marxista britânico – conferência no evento Fronteiras do Pensamento, Salão de Atos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). De 1815 a 2013: a América Latina e o concerto político das nações.
02- Plano de governo (baixar em PDF)
03- Acessível em http://www.valor.com.br/politica/3509098/no-rio-grande-do-sul-aecio-neves-propoe-o-fim-do-mercosul#ixzz3G7vsdb7O
04- josiasdesouza.blogosfera.uol.com.br/…/aecio-critica-o-mercosul-e-defen...
05- Newton Lima (*) – deputado federal (PT-SP), parlamentar do Mercosul, ex-prefeito de São Carlos e ex-reitor da UFSCar (http://www.parlamentodelmercosur.org/innovaportal/v/8345/2/parlasur/newton_lima_condena_aecio_neves_que_defendeu_fim_do_mercosul.html
06- Prefácio de Aécio Neves (www.marcoscintra.org/2010/download/livro_O_brasil_e_a_alca.pdf)
FONTE: escrito por Maria Clotilde Lemos Petta, coordenadora da Secretaria de Políticas Internacionais da CONTEE e diretora do SINPRO Campinas e Região, da CTB e da FISE. Artigo publicado no portal "Vermelho"
(http://www.vermelho.org.br/noticia/251662-1).
“Este é um governo que não fala fino com os EUA nem grosso com a Bolívia”, (Chico Buarque de Holanda).
A política externa implementada nos governos Lula e Dilma tem como uma de suas marcas o papel protagonista do Brasil nas relações internacionais. Essa marca tem sido reconhecida por eminentes estudiosos da atual conjuntura.
Um primeiro fato que chama atenção nos seus pronunciamentos e no debate eleitoral é seu posicionamento em relação ao Mercosul. No programa de governo apresentado oficialmente, essa questão é tratada de forma muito genérica. É colocada em termos de “…um acordo preferencial com os Estados Unidos….” ou “…restabelecer a primazia da liberalização comercial …”. Em relação ao Mercosul “…flexibilizar suas regras… e …nova estratégia de negociações comerciais bilaterais, regionais e globais…”(02).
No entanto, na sua trajetória política e em recente pronunciamento é que sua posição frente à política externa fica evidenciada. Em abril passado, em palestra durante o Fórum da Liberdade, promovido pelo Instituto de Estudos Empresariais (IEE), ele classificou o Mercosul como “coisa anacrônica” que “não está servindo a nenhum interesse dos brasileiros”(03).
Aécio Neves repetiria esse posicionamento em vários pronunciamentos e eventos. Em entrevista a um jornal da Argentina, o ‘La Nacional’, declarou: “Temos que ter a coragem de repensar e revisar o Mercosul… Temos que transformar o Mercosul em uma área de livre comércio, que permita a cada Estado-membro firmar acordos comerciais com outros países”, afirmou Aécio. Ele deu uma ideia do que considera adequado: “A Aliança do Pacífico, constituída por México, Colômbia, Peru e Chile, é um exemplo de dinamismo”(04).
O que impressiona nessas declarações é que elas entram em contradição com números apresentados pelo próprio setor empresarial. Newton Lima*, em artigo, considera que, em recente estudo intitulado “Agenda para a integração externa”, produzido pela Federação das Indústrias de São Paulo, conclui-se que nos últimos dez anos as exportações brasileiras para os países do Mercosul somaram US$ 169 bilhões, com superávit acumulado da ordem de US$ 46 bilhões. E mais: mesmo com os efeitos da crise, a partir de 2008, o intercâmbio entre os países do Mercosul foi superior ao do comércio internacional: enquanto as trocas globais aumentaram 13% no período 2008-2012, o comércio intra-Mercosul cresceu mais de 20%(02). Carlos cita artigo do jornal Folha de S.Paulo (18.06.2013), no qual o empresário Benjamin Steinbruch lamenta que as opiniões favoráveis ao abandono do Mercosul “se apoiem em razões ideológicas”(05).
E quais seriam essas razões ideológicas senão Aécio Neves dar continuidade a sua trajetória política marcada pela defesa da nossa subalternização aos interesses norte-americanos? Essa marca de Aécio fica evidente no seu grande apoio dado na tentativa de implantação da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA). Cabe lembrar que, proposta rejeitada pelos brasileiros, a ALCA – um projeto lançado pelo ex-presidente dos EUA, Bill Clinton – foi abraçada pelo governo tucano de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). O senador é autor do prefácio do livro “O Brasil e a ALCA”, uma produção fruto do debate feito na Câmara em 2001. Nele, Aécio denota que tinha expectativas de ver a ALCA consolidada até 2005, e que considerava “formidável” a liberalização do comércio em um território cujo PIB soma U$ 11 trilhões(06).
Esse posicionamento de Aécio não deixa dúvidas sobre sua intenção de colocar novamente em pauta a proposta da ALCA, atendendo estritamente aos interesses dos EUA. A forma de camuflar uma proposta que já foi amplamente rejeitada pelos brasileiros é tentar se colocar como candidato das mudanças usando expressões como “flexibilização do Mercosul “e “revisar o Mercosul “. Sua eleição, sem dúvida, significará um grande golpe no processo de integração latino-americana e um grande retrocesso na inserção soberana de nosso país no âmbito internacional.
Tem razão Chico Buarque de Holanda, como sempre muito lúcido, que, ao justificar, entre outras razões, seu apoio à reeleição de Dilma Housseff, resumiu sua posição numa frase que já ficou célebre: “Este é um governo que não fala fino com os EUA nem grosso com a Bolívia”.
NOTAS:
01- Perry Anderson – historiador marxista britânico – conferência no evento Fronteiras do Pensamento, Salão de Atos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). De 1815 a 2013: a América Latina e o concerto político das nações.
02- Plano de governo (baixar em PDF)
03- Acessível em http://www.valor.com.br/politica/3509098/no-rio-grande-do-sul-aecio-neves-propoe-o-fim-do-mercosul#ixzz3G7vsdb7O
04- josiasdesouza.blogosfera.uol.com.br/…/aecio-critica-o-mercosul-e-defen...
05- Newton Lima (*) – deputado federal (PT-SP), parlamentar do Mercosul, ex-prefeito de São Carlos e ex-reitor da UFSCar (http://www.parlamentodelmercosur.org/innovaportal/v/8345/2/parlasur/newton_lima_condena_aecio_neves_que_defendeu_fim_do_mercosul.html
06- Prefácio de Aécio Neves (www.marcoscintra.org/2010/download/livro_O_brasil_e_a_alca.pdf)
FONTE: escrito por Maria Clotilde Lemos Petta, coordenadora da Secretaria de Políticas Internacionais da CONTEE e diretora do SINPRO Campinas e Região, da CTB e da FISE. Artigo publicado no portal "Vermelho"
(http://www.vermelho.org.br/noticia/251662-1).
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