terça-feira, 15 de junho de 2010

FÁBIO PINA: “A CLASSE MÉDIA ESTÁ MAIOR E DIFERENTE”

“Desde que tinha 28 anos, o economista Fabio Pina, hoje aos 40, estuda o comportamento das famílias brasileiras com relação ao consumo. Recentemente, um estudo da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio), da qual Pina é o principal assessor econômico, mostrou que o crescimento do consumo de produtos e serviços nas classes C, D e E vai continuar na faixa de 8% ao ano, contra 4% das classes A e B. Houve quem, ao analisar o estudo, saudasse a chegada de uma “nova classe media”. Pina não gosta da expressão:

“É boa para sair no jornal, mas não é verdadeira. A classe media está sempre se renovando. O tempo todo há uma nova classe media. A novidade é que o Brasil passou a ter uma classe media muito maior”.

Foi sobre esse tema que Fabio Pina conversou com Brasília Confidencial em seu escritório na Bela Vista, o bairro italiano do centro de São Paulo onde ficam algumas das melhores cantinas do país.

Brasília Confidencial – O que há de novo na classe media brasileira?

Fabio Pina -
Ela está maior e diferente. É uma grande ascensão das classes mais baixas, são novas pessoas nesse mercado com um padrão de consumo muito mais elevado do que antes. O sujeito continua na classe C ou D, mas tem um bom celular, dá uma melhorada na casa. Pode não trocar de carro, mas troca de fogão, geladeira… Isso não se conquista de um dia para o outro, pode levar décadas. No caso do Brasil, só veio com a estabilização econômica.

BC - Com a derrota da hiperinflação.

Pina -
Com a derrota da hiperinflação. Nada acontece com a hiperinflação. A economia para. Tenho 40 anos, me lembro das maquininhas de remarcação de preços nos supermercados. Iam aumentando a cada 5 minutos. Nesse ambiente, não há crédito, não tem como emprestar dinheiro sem saber o valor da moeda.

BC - E qual é o quadro hoje?

Pina -
Melhorou bastante. Antes, as previsões orçamentárias no Brasil eram peça de ficção. Escrevia-se qualquer número e depois a gente via o que dava. Hoje, temos previsões que podem não ser as melhores, mas existem, são feitas às claras. Hoje, há transparência e se pode acreditar com tranquilidade que o país continuará crescendo entre 4% e 5,5% ao ano. É pouco? Não é China? Mas queremos ser a China, sem legislação trabalhista? Podemos nos espelhar no caso da Europa, onde a crise está forte (crescimento médio anual de 1,2%) a ponto de a Alemanha fazer pacote econômico. Uma coisa é crise na Grécia; outra, bem diferente, é crise na Alemanha. Por isso, na média disso tudo, o Brasil vai bem, obrigado.

BC - Como o Brasil chegou a essa situação confortável?

Pina -
Financiando casas e carros com prazos alargados e juros menores. A saída do governo federal em 2009, diante da crise mundial de 2008, foi a mais adequada: colocou em campo os bancos públicos. Como fazer para a economia não parar? Investir na construção civil e na produção de automóveis. Quem financia isso? O Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal. Lembra o que eu falei no começo sobre a grande mudança? Antes, só quem era rico tinha cartão de crédito. Hoje, um economista como eu tem, um jornalista como você tem. Muita gente tem. O BB e a Caixa foram atrás desse público – do sujeito que mora na favela, mas tem antena parabólica – e se deram bem. E os grandes bancos privados tiveram que correr atrás.

BC – Como essa situação se reflete no consumo do brasileiro?

Pina -
É preciso entender que o consumo está sempre ligado a sonho, a desejo. Basta olhar a pesquisa recentemente divulgada pelo IBGE para perceber do que estou falando: hoje no Brasil, 9% do consumo é desse pessoal recém-chegado à classe media. Eles já perceberam que, com o crédito, além de comprar bens como computadores e outros tantos equipamentos eletrônicos, também podem ir a restaurantes, viajar, andar de avião, de navio. O consumo se sofistica e é isso o que o Brasil vive. O fato de comer iogurte pode parecer bobagem para um monte de gente bem nascida, que sempre estudou em colégio particular, mas quem come iogurte pela primeira vez está sofisticando seu consumo.

BC – Que caminhos segue o Brasil, diante desse quadro?

Pina -
Se você quer saber o que vai estar na prateleira dos supermercados daqui a 10 anos, não tenho a menor ideia. Todo mundo quer saber isso. Se eu soubesse, ficava rico, mas nunca fui bom em antecipações. Mesmo assim, dá para imaginar que, no curto ou médio prazo, o Brasil seja levado a melhorar sua infraestrutura, como apontou o IPEA recentemente. Quem anda de avião, sabe o drama que se vive nos aeroportos. Quem já embarcou no porto de Santos, sabe como é se sentir gado. Quanto aos brasileiros que estão melhorando de vida, penso que vão investir em segurança, saúde e educação, áreas em que, infelizmente, o Estado ainda é muito deficiente.”

FONTE: reportagem de Valério Campos publicada no site “Brasília Confidencial” e reproduzida no blog de Luis Favre

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