quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

ARGENTINA E BRASIL, por Benayon

Por Adriano Benayon

01. A Argentina, sob Nestor Kirchner e, agora, Cristina Fernández, renacionaliza empresas de setores estratégicos: petróleo e gás, água e esgotos, transportes aéreos, correios.

02. Refunda-se o Estado, praticamente liquidado após várias rodadas de devastação ao longo de 50 anos. A mais brutal delas foi com Menem, 1989/1999.

03. Para mudar de curso, foi preciso o povo sair às ruas, em dezembro de 2001, exigindo a queda de De la Rua e do ministro Cavallo. Este comandava a economia desde Menem, e, em 1991, introduzira o “Plano Austral”, com conversibilidade e paridade (1 peso = 1 dólar), precursor do “Plano Real” (1994).

04. Com o Austral, a dívida pública causada pelo modelo dependente crescera ainda mais, com grande parte em moratória desde 2001. Ao assumir Kirchner, em 2003, ela equivalia a 140% do PIB e a 428% das exportações de bens e serviços (no Brasil 79% e 284%).

05. Diferentemente do Brasil, a Argentina negociou com soberania e obteve, em março de 2005, descontos médios de 70% do valor nominal dos títulos. A dívida externa total foi reduzida de US$ 192 bilhões para US$ 126 bilhões.

06. O Brasil, até hoje, não realizou sequer a auditoria da dívida, inflada por fraudes e pela capitalização de taxas de juros, tarifas e comissões descabidas, inclusive nas rolagens e “reestruturações.” Seu serviço prossegue fazendo gastar quase 50% do orçamento federal.

07. Na Argentina, a partir de 2003, deu-se notável reversão da queda livre do PIB, havida de 1998 a 2002, do índice 100 para 77. Em 2012, recuperou-se para 151, e, computando a base 2002 = 100, subiu a 206 (mais que dobrou). O do Brasil chegou a só 142.

08. A economia argentina ainda está grandemente desnacionalizada, mas menos que a do Brasil, e as transnacionais têm menos privilégios, subsídios e isenções que aqui. Além disso, as pequenas e médias empresas argentinas têm peso razoável.

09. Assim, os déficits nas transações correntes são inexpressivos. No Brasil, ao contrário, vêm-se avolumando. De 2008 a 2012, somaram US$ 204,1 bilhões, sendo US$ 54,2 bilhões em 2012.

10. Esses déficits fazem acelerar ainda mais a desnacionalização e o endividamento, com risco de as contas externas desencadearem grave crise. Assinala Carlos Lopes (HP 24.01.2013) que, de 2004 a 2011, foram desnacionalizadas 1.296 empresas brasileiras, e as remessas oficiais de lucros ao exterior montaram a US$ 405 bilhões. Ora, as remessas disfarçadas em outras contas são um múltiplo disso.

11. Arestauração do Estado na Argentina faz-se acompanhar de excelentes resultados. Ademais, como escreveu o jornalista Beto Almeida, o presidente Kirchner, enfrentou o oligopólio da mídia, fortaleceu e expandiu a TV Pública Argentina, firmando as bases para aprovar-se a “Lei de Meios de Comunicação” no governo de Cristina Kirchner.

12. Criou, ademais, um canal cultural de alto nível, eliminou a reserva de mercado de emissoras privadas sobre o futebol, agora também transmitido por canais públicos. Determinou a divisão do espaço eletromagnético nos segmentos estatal, privado e público, no qual a CGT e a Universidade Nacional, por exemplo, podem ter seus canais. Foi, ainda, instituído operador nacional de TV a cabo e outro, estatal, para TV digital.

13. Os carteis da mídia recorrem a quaisquer meios para combater governos que defendam o interesse nacional. Por isso, a grande mídia argentina é monolítica em sua hostilidade aos Kirchner.

14. No Brasil, a ojeriza ao governo é matizada, porque: 1º) embora não tão querido pelos carteis como a oposição, ele segue o esquema econômico das transnacionais; 2º) porque financia “generosamente” os carteis com verbas públicas.

15. O governo argentino, alvo de serviços secretos estrangeiros para desestabilizá-lo, promovendo e financiando greves e incidentes, necessita, pois, elevar sempre o grau de fidelidade e a qualidade de seus quadros de inteligência e segurança.

16. No Brasil, há que reverter o processo intensificado sob FHC, de eliminar estatais e perverter o serviço público, pois:

a) criaram-se agências “independentes” – mas não dos carteis mundiais - “responsáveis” por serviços públicos privatizados;
b) transformaram a administração em mera repassadora de verbas e outorgadora de concessões;
c) os investimentos são tolhidos pela fiscalização legalista (sob leis inadequadas) e até ideológica dos Ministérios Públicos e Tribunais de Contas, IBAMA, FUNAI etc.

17. Em suma, um serviço público, que:

a) se preocupa antes em não se comprometer que em realizar e, cada vez menos, presta serviços sequer de educação e de saúde;
b) fica indiferente ao desperdício e à corrupção, se combatê-los prejudicar a carreira.

18. Enquanto isso, o governo:

a) subsidia banqueiros, concentradores e transnacionais;
b) dá-lhes tratamento fiscal favorecido;
c) financia-os através do BNDES e outros bancos públicos;
d) entra nas PPPs com o grosso do capital e garante o risco dos sócios privados;
e) não consegue aplicar no PAC o grosso das verbas alocadas e as investe mal, através das empreiteiras e outros concessionários. O pouco investido na infraestrutura é mal escolhido e custa caro.

19. Se a sociedade não tem o Estado a seu serviço, é fatal que ela sucumba. Por isso, os que querem a ruína de um País, desorganizam, desmoralizam e liquidam o Estado. Collor e FHC radicalizaram essa tendência, e os sucessores não sabem ou não querem revertê-la.

IDEOLOGIA E ESTADO

20. Uma das características dos sistemas de dominação é fazer das ideias que favorecem seus interesses a opinião prevalecente. Nesse contexto, é importante a conexão entre a destruição dos valores éticos da civilização e o marketing do encolhimento do Estado e de sua colocação a serviço de interesses privados concentradores.

21. Os propugnadores do “Estado-mínimo” argumentam desse modo: como as pessoas se orientam pelo hedonismo e são desonestas, quem estiver em posição de se locupletar na função pública, o fará, e, portanto, o Estado deve ser descartado. Por isso, o império trabalha para que assim seja.

22. Não por acaso, fomenta-se a falta de caráter, elimina-se a decência, a dignidade e o respeito aos seres humanos, através de: relativização dos valores; implantação da antimúsica com ruídos desestabilizadores do equilíbrio orgânico e psíquico; difusão das drogas.

23. Isso e o consumismo são reforçados pelas técnicas de publicidade, inclusive o ‘merchandising’ na indústria do entretenimento (rádio, cinema, TV, videogames, I-Pads etc.).

24. O objetivo é que ninguém lute, no Estado ou fora dele, pelo bem comum. Vantagens atraem gente para servir os concentradores, e os meios de apassivar as pessoas são os acima resumidos, planejados em institutos de psicologia aplicada.

25. Criam-se, aos milhões, alienados de todo tipo, incapazes de absorver informação, e a grande mídia encarrega-se de ocultar dos demais tudo que contenha verdade sobre questões econômicas e políticas.

26. Os pensadores orgânicos difundem teorias como a do “Estado mínimo”, contaminadas por contradições insanáveis, raro desmascaradas, por falta de espaço na mídia e nas universidades.

27. Segundo Adam Smith, a busca da utilidade egoísta pelos indivíduos ou empresas só funciona em favor do bem-comum, se não tiverem poder sobre o mercado. Claro, pois, na lógica do sistema, que os dirigentes dos poderosos carteis usam a “liberdade” para aumentar a concentração e a tirania.

28. A experiência dos países que prosperaram, comprova que o desenvolvimento se deveu a estadistas e a funcionários capazes e honestos. Inviabilizar esse tipo de gente entre nós é condenar o País à exploração irreversível por parte dos impérios.

29. Formaram-se aqui bons quadros e carreiras no serviço público, restando ainda técnicos e funcionários competentes, hoje, na maioria,desaproveitados, por causa da corrosão do Estado.”

FONTE: escrito por Adriano Benayon, doutor em economia e autor do livro “Globalização versus Desenvolvimento”. Postado por Castor Filho no blog ~Redecastorphoto”  (http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2013/02/estado-argentina-e-brasil.html). [Imagem do Google adicionada por este blog ‘democracia&política’].

4 comentários:

Unknown disse...

Por favor né blog!!! Não tentem elogiar quem nao merece, e a Argentina é um exemplo a nao ser seguido, um país que que a decadas atrás tinha um padrao de vida quase europeu, hoje está fadado ao fracasso, com mentiras, truculencia, fraudes e o pior, uma presidenta doida, com vários ministros mais doidos ainda.

Unknown disse...

Unknown,
Realmente, na primeira metade do século passado, a Argentina tinha padrão de vida equiparável a alguns países europeus. Depois, veio a decadência, fortemente acentuada nos anos neoliberais de Menem.
Esses conceitos seus sobre a Argentina pós-Menem são propagados por interesse dos grandes conglomerados financeiros que comandam a mídia direitista no mundo inteiro, inclusive no Brasil. Eles não aceitam ter perdido o controle da Argentina, nem aceitam terem parte dos seus gordos lucros reduzidos pela moratória. Não se trata de opinião deste blog, mas de relatórios do FMI, BID e outros, que expressam que, apesar da atual crise da Europa e EUA, a economia argentina hoje está muito melhor do que nos trágicos anos neoliberais de Menem.
Maria Tereza

iurikorolev disse...

MT
Achei muito pertinentes as criticas ao modelo de Estado brasileiro.
Só não gostei dos elogios ao Governo argentino, que para mim consegue ser muito pior do que o daqui : é populista, incompetente, maquiador de inflação etc.

Unknown disse...

Iurikorolev,
Sua opinião sobre os atuais governos da Argentina e do Brasil são compartilhadas pelos grandes banqueiros internacionais e pela grande mídia, que eles controlam. Qualquer país fora das grandes potências cujo governo seja mais voltado para diminuir as desigualdades sociais e para melhorar a qualidade de vida dos mais pobres e que diminua um pouco o expoente da curva exponencial de crescimento dos lucros dos investidores, esse governo é denegrido como "populista", "ditador", "nacionalista jurássico, incompetente, doido etc". O mundo é assim.
Maria Tereza