[Acelerador de partículas, o SSRF - Shangai
Synchrotron Radiation Facility, ou acelerador de partículas de Xangai, que já nasce como a maior plataforma de
pesquisas na China na área de física, biologia e materiais. Fonte: Google/Site Inovação Tecnológica - 04/05/2009]
Por José
Luís Fiori
"As
happened with other great powers, China seems to be following a technological
road where the search for modern defense systems constitutes a primum mobile
for national scientific endeavors and modern technologies". [N. Trebat e C. A. Medeiros,
"Military modernization in Chinese Technical Progress and Industrial
Innovation", 2013, p: 25 (1)]
É visível, a olho nu, que a
liderança da inovação tecnológica se concentra nos países com maior poder
dentro do sistema internacional. E que os países que ocupam posições inferiores
acessam as tecnologias de "ponta", por meio da cópia, da importação
ou de pequenas adaptações incrementais, mediante pagamento de "direitos de
propriedade intelectual". Por isso, invariavelmente, os países que se
propõe mudar sua posição dentro da hierarquia internacional também mudam, em
algum momento, seu sistema de pesquisa e inovação. Como vem acontecendo com a
China, segundo estudo recente dos professores N. Trebat e C. Medeiros, que
demonstra que os chineses estão deixando para trás a "cópia
tecnológica" e estão se aproximando rapidamente do modelo americano, onde
o "sistema de defesa" do país ocupa lugar central no seu
"sistema de inovação".
AS GRANDES INOVAÇÕES VIERAM DA ESTRATÉGIA DE DEFESA E DA PREPARAÇÃO
PARA A GUERRA, NÃO REGIDOS PELAS FORÇAS DE MERCADO
Nos EUA, a mudança se acelerou
durante a II Guerra Mundial, com a criação do “National Defense Research Council” (NDRC), que foi responsável pelo
“projeto Manhattan” e pela criação da primeira bomba atômica, e pela
reorganização da pesquisa cientifica dentro das universidades e das empresas
privadas reunidas dentro de um mesmo "complexo-militar-industrial-acadêmico"
de pesquisa e inovação, orientado pela competição militar com a União
Soviética.
Donde se possa dizer, hoje, que a
Guerra Fria foi responsável - em última
instância - pelos principais avanços tecnológicos americanos da segunda
metade do século XX, no campo aeroespacial e da energia nuclear, da computação,
das fibras óticas e dos transistores, assim como da química, da genética e da
biotecnologia. Em todos esses setores, a estratégia de defesa americana
funcionou como primeiro motor na criação das tecnologias "duais" que
revolucionaram a economia mundial. Hoje, a "Agência de Projetos Avançados de Pesquisa em Defesa" (DARPA) -
que responde ao Departamento de Defesa
dos EUA - conta com orçamento de mais de US$ 3 bilhões, e financia
investigações em todo e qualquer setor considerado estratégico para a segurança
americana, independentemente do seu objeto específico, bastando se propor
"inovações radicais" na fronteira do conhecimento humano.
No caso chinês, a inflexão começou
nos anos 90, depois da Guerra do Golfo, quando a China reconheceu a necessidade
de modernizar seu sistema de defesa e mudou o rumo da sua pesquisa científica e
tecnológica, adotando, progressivamente, o modelo norte-americano de integração
da academia com o setor publico e privado, na produção de "tecnologias
duais" capazes de dinamizar, ao mesmo tempo, a economia civil chinesa.
O passo inicial foi dado, ainda na
década de 80, com a criação da "Comissão
de Ciência, Tecnologia e Indústria, para a Defesa Nacional", mas o
verdadeiro salto aconteceu depois de 1990, quando foi criado o "Programa 863" de financiamento à
pesquisa de "ponta" e, depois de 2001, quando foi lançado o "Projeto de Segurança Estatal 998",
com objetivo explícito de desenvolver a capacidade chinesa de contenção das
forças norte-americanas no Mar do Sul da China.
Entre 1991 e 2001, o gasto militar
chinês cresceu 5% ao ano, e entre 2001 e 2010, 13%. Hoje, a China possui o
segundo maior orçamento militar do mundo, mas o que importa, neste caso, é que
os gastos com a "defesa" já alcançam cerca de 30% de todo o gasto
governamental com pesquisa e inovação, e foram os grandes responsáveis pelo
avanço dos chineses nos últimos anos, na microeletrônica, computação,
telecomunicação, energia nuclear, biotecnologia, química, e no campo
aeroespacial. Mais recentemente, o "Plano de Desenvolvimento Nacional
Científico e Tecnológico de Médio e Longo Prazo", para o período entre
2006 e 2020, aumentou a tônica no desenvolvimento das tecnologias "duais",
e na importância da conquista da autonomia militar da China. E apesar de que os
chineses sigam utilizando tecnologias importadas, a verdade é que eles
obtiveram avanços notáveis nestas últimas duas décadas. Nesse sentido, o novo
caminho tecnológico da China parece reforçar verdade antiga e obliterada
sistematicamente pela "ciência econômica": que o ritmo e liderança da pesquisa e inovação de "ponta",
nos países que lideram a hierarquia internacional, não são determinados pelas forças de mercado. Nestes casos - e cada vez mais - as grandes inovações
vieram de sua estratégia de defesa e
de sua permanente "preparação para a
guerra". Goste-se ou não, foi sempre assim, e ainda mais, no caso dos
Estados nacionais que criaram e lideraram, ou lutaram pela liderança do sistema
interestatal capitalista, através do séculos.”
NOTA: (1) N.
Trebat e C. A. Medeiros, "Military modernization in Chinese Technical
Progress and Industrial Innovation", paper, "World Keynhes
Conference", Izmair Economics University, junho de 2013.
FONTE: escrito por José Luís Fiori, professor titular de economia política
internacional da UFRJ, autor do livro "O Poder Global", da Editora
Boitempo, e coordenador do grupo de pesquisa do CNPQ/UFRJ "O Poder Global
e a Geopolítica do Capitalismo". Publicado no jornal “Valor” e transcrito
no portal de Luis Nassif
(http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/sobre-o-desenvolvimento-chines-por-jose-luis-fiori-0). [Imagem do Google e sua legenda adicionadas por este blog
‘democracia&política’].
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