Por Fernando Brito
“Diante da notícia de que o Governo resolveu marcar para outubro a
primeira licitação para a exploração de uma nova área do pré-sal, muita confusão vai se formar na
cabeça das pessoas e é preciso fazer alguns comentários.
O primeiro deles é afirmar, sem medo
de patrulhismos, que isso não é o ideal, mas o possível. O desejável seria que
a exploração ficasse totalmente em mãos do Estado brasileiro, sem participação
alguma de empresas privadas e, mais ainda, estrangeiras.
Mas o volume de petróleo – e o de investimentos necessários à sua
retirada – é tão grande que isso não é, objetivamente, factível. Uma
simples olhada nas projeções da “Agência Internacional de Energia” da ONU sobre
as exportações de petróleo em 2035, no gráfico aí em cima, dá ideia do tamanho
do desafio.
Só o “campo de Libra”, o primeiro – e único – do pré-sal que irá a leilão
este ano, tem reservas recuperáveis entre 8 e 14 bilhões de barris. Se estiver
na estimativa máxima, essas reservas equivalem a todo – vejam bem, todo mesmo
– o petróleo contido nas reservas provadas do país até hoje.
Mas para esse petróleo valerá a nova
lei do petróleo, que nada tem a ver com o “regime de concessão” implantado por
Fernando Henrique Cardoso e vigente até agora. Essa nova regulamentação dá à
Petrobras a condição de operadora das perfurações e da produção, com
participação mínima de 30% nos poços de Libra.
E nada impede, sobretudo agora que a
empresa fez caixa com o lançamento de títulos no mercado internacional, que ela
aumente sua parcela. Mesmo assim, é possível que ela faça novas captações, para
poder aumentar seu poder de negociar a formação de consórcios de exploração.
E, ainda, quando o Governo entender
que é conveniente, pode adjudicar áreas, sem leilão ou outra forma de
licitação, à Petrobras.
Além dessa fatia, o Brasil ficará
com uma percentagem – o que vai ser
propriamente o “lance” do leilão – do petróleo produzido que exceder os
custos da exploração – daí uma das
necessidades de a Petrobras ser a operadora exclusiva – além de dar à
empresa o controle das encomendas de equipamentos e serviços, o que garante o
máximo de indução à economia brasileira, o que não ocorreria com empresas
estrangeiras, que tenderiam a adquirir fora todo o necessário para desenvolver
e operar os poços.
Fica assegurado, assim, controle da
estatal dos pontos de medição da extração, que jamais ficarão sob
responsabilidade de empresas privadas. Isso é ainda mais importante porque
parte do petróleo será exportada centenas de quilômetros mar adentro, sem
sequer vir à terra, gerando insegurança sobre o volume produzido.
Nada disso acontece no atual modelo
[tucano], o “de concessão”.
Ainda é cedo para especular de
quanto serão as ofertas, mas certamente não serão pequenas, tanto nos valores
pagos pela concessão quanto na parcela entregue ao Estado brasileiro. Mas, ao
contrário, já se sabe que serão imensas as necessidades de capital para colocar
em operação essas áreas em curto e médio prazos.
Calculados os custos de produção à
razão de 8,5 dólares o barril, o mesmo usado na operação de
capitalização da empresa,
em 2010, isso pode levar os investimentos e custos operacionais, só em “Libra”,
a mais 100 bilhões de dólares.
E a Petrobras não teria como fazer
frente a isso senão se endividando de maneira suicida, porque boa parte dos
investimentos precede a produção e os preços do petróleo não são previsíveis.
Logo, também não é o fluxo temporal de receitas. Nem, também, o que isso
impacta sobre a velocidade de extração, vencida a etapa de implantação dos
poços de produção.
Traduzindo: é muito importante “controle da torneira”, porque reserva de petróleo é
um estoque o qual se vende não apenas conforme a procura, mas dependendo do
preço de mercado.
Embora as multis do petróleo estejam
interessadíssimas nos campos do pré-sal, o modelo vai ser mais convidativo às
empresas estatais, como é o caso das chinesas, que se pouparam do leilão de
petróleo de extração convencional para esperar pelas áreas do pré-sal. A razão
é simples: sua visão de negócios é mais estratégica que imediatista e a
negociação com a petroleira estatal brasileira será facilitada pelas relações
governo a governo.
Se a licitação, como é provável,
subdividir o campo em muitos blocos, isso será ainda mais conveniente ao país,
pela multiplicidade de parceiros possíveis à Petrobras, reduzindo
percentualmente a participação de cada um dos outros sócios na área total de
exploração e, portanto, elevando a concentração de poder decisório da estatal.
É por essas razões que a Petrobras
está se preparando financeiramente para o imenso desafio de explorar o campo
gigante de “Libra”. Ela irá, certamente, ao limite de suas forças.
E ela tem forças imensas, mas o que
vem pela frente é tão grande que, mesmo assim, elas não bastariam para tirar do
fundo do mar o oceano de petróleo que está lá.”
FONTE: escrito por Fernando Brito no seu
blog “Tijolaço” (http://www.tijolaco.com.br/index.php/para-entender-a-exploracao-do-pre-sal/).
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