quinta-feira, 16 de maio de 2013

SOMENTE OS MÉDICOS CUBANOS PRECISAM REVALIDAR DIPLOMA?

Médicos cubanos devem ser avaliados pela função que exercerão no Brasil: médicos de família

Médico brasileiro comenta gritaria da mídia sobre médicos cubanos

“Acho estranho o governo ter falado em atrair médicos cubanos, portugueses e espanhóis, e a gritaria ser somente em relação aos médicos cubanos. Será que somente os médicos cubanos precisam revalidar diploma?

Por Pedro Saraiva, no blog do Nassif

Bom, como opinião inteligente se constrói com o contraditório, vou tentar levantar aqui algumas informações sobre a vinda de médicos cubanos para regiões pobres do Brasil que ainda não vi serem abordadas.

-- O principal motivo de reclamação dos médicos, da imprensa e do Conselho Federal de Medicina (CFM) seria uma suposta validação automática dos diplomas desses médicos cubanos, coisa que, em momento algum, foi afirmado por qualquer membro do governo. Pelo contrário, o próprio ministro da saúde, Alexandre Padilha, já disse que concorda que a contratação de médicos estrangeiros deve seguir critérios de qualidade e responsabilidade profissional. Portanto, o governo não anunciou que trará médicos cubanos indiscriminadamente para o país. Isso é uma interpretação desonesta.

-- Acho estranho o governo ter falado em atrair médicos cubanos, portugueses e espanhóis, e a gritaria ser somente em relação aos médicos cubanos. Será que somente os médicos cubanos precisam revalidar diploma? Sou médico e vivo em Portugal, posso garantir que, nos últimos anos, conheci médicos portugueses e espanhóis que tinham nível técnico de sofrível para terrível. E olha que, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), Espanha e Portugal têm, respectivamente, o 6º e o 11º melhores sistemas de saúde do mundo (não tarda a Troika dar um jeito nesse excesso de qualidade). Profissional ruim há em todos os lugares e profissões. Do jeito que o discurso está focado nos médicos de Cuba, parece que o problema real não é bem a revalidação do diploma, mas sim puro preconceito.

-- Portugal já importa médicos cubanos desde 2009. Aqui também há dificuldade de convencer os médicos a ir trabalhar em regiões mais longínquas, afastadas dos grandes centros. Os cubanos vieram estimulados pelo governo, fizeram prova e foram aprovados em grande maioria (mais à frente vou dar maiores detalhes desse fato). A população aprovou a vinda dos cubanos, e em 2012, sob pressão popular, o governo português renovou a parceria, com amplo apoio dos pacientes. Portanto, um dos países com melhores resultados na área de saúde do mundo importa médicos cubanos e a população aprova o seu trabalho.

-- Acho que é ponto pacífico para todos que médicos estrangeiros tenham que ser submetidos a provas aí no Brasil. Não faz sentido importar profissionais de baixa qualidade. Como já disse, o próprio ministro da saúde diz concordar com isso. Eu mesmo fui submetido a cinco provas aqui em Portugal para poder validar meu título de especialista. As minhas provas foram voltadas a testar meus conhecimentos na área em que iria atuar, que no caso é Nefrologia. Os cubanos que vieram trabalhar em Medicina de família também foram submetidos a provas, para que o governo tivesse o mínimo de controle sobre a sua qualidade.

Pois bem, na última leva, 60 médicos cubanos prestaram exame e 44 foram aprovados (73,3%). Fui procurar dados sobre o Revalida, exame brasileiro para médicos estrangeiros e descobri que, no ano de 2012, de 182 médicos cubanos inscritos, apenas 20 foram aprovados (10,9%). Há algo de estranho em tamanha dissociação. Será que estamos avaliando corretamente os médicos estrangeiros?

Seria bem interessante que nossos médicos se submetessem a esse exame ao final do curso de medicina. Não seria justo que os médicos brasileiros também só fossem autorizados a exercer medicina se passassem no Valida? Se a preocupação é com a qualidade do profissional que vai ser lançado no mercado de trabalho, o que importa se ele foi formado no Brasil, em Cuba ou China? O CFM se diz tão preocupado com a qualidade do médico cubano, mas não faz nada contra o grande negócio que se tornaram as faculdades caça-níqueis de Medicina. No Brasil, existe um exército de médicos de qualidade pavorosa. Gente que não sabe a diferença entre esôfago e traqueia, como eu já pude bem atestar. Por que tanto temor em relação à qualidade dos estrangeiros e tanta complacência com os brasileiros?

REVALIDA

-- Em relação este exame de validação do diploma para estrangeiros, abro um parênteses para contar uma situação que presenciei quando ainda era acadêmico de medicina, lá no Hospital do Fundão da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Um rapaz, se não me engano brasileiro, tinha feito seu curso de medicina na Bolívia e havia retornado ao Brasil para exercer sua profissão. Como era de se esperar, o rapaz foi submetido a um exame, que eu acredito ser o Revalida (na época, realmente, não procurei me informar). O fato é que a prova prática foi na enfermaria que eu estava estagiando e por isso pude acompanhar parte da avaliação. Dois fatos me chamaram a atenção: o primeiro é a grande má vontade dos componentes da banca com o candidato. Não tenho dúvidas que ele já havia sido prejulgado antes de a prova ter sido iniciada. Outro fato foi o tipo de perguntas que fizeram. Lembro bem que as perguntas feitas para o rapaz eram bem mais difíceis que aquelas que nos faziam nas nossas provas. Lembro de eles terem pedido informações sobre detalhes anatômicos do pescoço que só interessam a cirurgiões de cabeça e pescoço. O sujeito que vai ser médico de família não tem que saber todos os nervos e vasos que passam ao lado da laringe e da tireoide. O cara tem que saber tratar diarreia, verminose, hipertensão, diabetes e colesterol alto. Soube, dias depois, que o rapaz tinha sido reprovado.

Não sei se todas as provas do Revalida são assim, pois só assisti a uma, e mesmo assim parcialmente. Mas é muito estranho os médicos cubanos terem alta taxa de aprovação em Portugal e pouquíssimos passarem no Brasil. Outro número que chama a atenção é o fato de mais de 10% dos médicos em atividade em Portugal serem estrangeiros. Na Inglaterra, são 40%. No Brasil, esse número é menor que 1%. E vou logo avisando, meu salário aqui não é maior do que dos meus colegas que ficaram no Brasil.

-- Até agora, não vi nem o CFM nem a imprensa irem lá nas áreas mais carentes do Brasil perguntar o que a população sem acesso à saúde acha de virem 6 mil médicos cubanos para atendê-los. Será que é melhor ficar sem médico do que ter médicos cubanos? É o óbvio ululante que o ideal seria criar condições para que médicos brasileiros se sentissem estimulados a ir trabalhar no interior. Mas em um país das dimensões do Brasil e com a responsabilidade de tocar a medicina básica pulverizada nas mãos de centenas de prefeitos, isso não vai ocorrer de uma hora para outra. Na verdade, o governo até lançou, nos últimos anos, o Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica (PROVAB), que oferece salários mensais de R$ 8 mil e pontos na progressão de carreira para os médicos que vão para as periferias. O problema é que, até hoje, só 4 mil médicos aceitaram participar do programa. Não é só salário, faltam condições de trabalho. O que fazemos então? Vamos pedir para os mais pobres aguentarem mais alguns anos até alguém conseguir transformar o SUS naquilo que todos desejam? Vai lá para a criança com diarreia ou para a mãe grávida sem pré-natal e diz para ela segurar as pontas sem médico, porque os médicos do sul e sudeste do Brasil, que não querem ir para o interior, acham que essa história de trazer médico cubano vai desvalorizar a medicina do Brasil.

-- É bom lembrar que Cuba exporta médicos para mais de 70 países. Os cubanos estão acostumados e aceitam trabalhar em condições muito inferiores. Aliás, é nisso que eles são bons. Eles fazem medicina preventiva em massa, que é muito mais barata, e com grandes resultados. Durante o terremoto do Haiti, quem evitou uma catástrofe ainda maior foram os médicos cubanos. Em poucas semanas, os médicos dos países ricos deram no pé e deixaram centenas de milhares de pessoas sem auxílio médico. Se não fosse Cuba e seus médicos, haveria uma tragédia humanitária de proporções dantescas. Até o “New England Journal of Medicine”, a revista mais respeitada de medicina do mundo, fez, há poucos meses, um
artigo sobre a medicina em Cuba. O destaque vai exatamente para a capacidade do país em fazer medicina de qualidade com recursos baixíssimos.

-- Com muito menos recursos, a medicina de Cuba dá um banho em resultados na medicina brasileira. É, no mínimo, uma grande arrogância achar que os médicos cubanos não estão preparados para praticar medicina básica aqui no Brasil. O CFM diz que a medicina de Cuba é de má qualidade, mas não explica por que a saúde dos cubanos, como muito menos recursos tecnológicos e com uma suposta inferioridade qualitativa, tem índices de saúde infinitamente melhores que a do Brasil e semelhantes à avançada medicina americana (dados da OMS).

-- Agora, ninguém tem que ir cobrar do médico cubano que ele saiba fazer cirurgia de válvula cardíaca ou que seja mestre em dar laudos de ressonância magnética. Eles não vêm para cá para trabalhar em medicina nuclear ou para fazer hemodiálises nos pacientes. Medicina altamente tecnológica e ultraespecializada não diminui mortalidade infantil, não diminui mortalidade materna, não previne verminose, não conscientiza a população em relação a cuidados de saúde, não trata diarreia de criança, não aumenta cobertura vacinal, nem atua na área de prevenção. É isso que parece não entrar na cabeça de médicos que são formados para serem superespecialistas, de forma a suprir a necessidade uma medicina privada e altamente tecnológica. Atenção! O governo quer trazer médicos para tratar diarreia e desidratação! Não é preciso grande estrutura para fazer o mínimo. Essa população mais pobre não tem o mínimo!

Que venham os médicos cubanos, que eles façam o Revalida, mas que eles sejam avaliados em relação àquilo que se espera deles. Se os médicos ricos do sul maravilha não querem ir para o interior, que continuem lutando por melhores condições de trabalho, que cobrem dos governos em todas as esferas, não só da Federal, melhores condições de carreira, mas que, ao menos, se sensibilizem com aqueles que não podem esperar anos pela mudança do sistema, e aceitem de bom grado os colegas estrangeiros que se dispõem a vir aqui salvar vidas.

Infelizmente, até a classe médica aderiu ao ativismo de Facebook. O cara lê a Veja ou O Globo, se revolta com o governo, vai no Facebook, repete meia dúzia de clichês ou frases feitas e sente que já exerceu sua cidadania. Enquanto isso, a população carente, que nem sabe o que é Facebook morre à mingua, sem atendimento médico brasileiro ou cubano.”

FONTE: escrito por Pedro Saraiva, médico, brasileiro; exerce a profissão em Portugal. Artigo publicado no portal de Luis Nassif e no portal “Vermelho”    (
http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=213696&id_secao=1
).

4 comentários:

Unknown disse...

Olha.....Eu acho que o brasil ainda nao esta na posiçao de importar medicos, simplesmente ainda por nao ter alcançado um nivel aconomico maior....Quando formos um pais de primeiro mundo nao vai ter problema vir medico da china ou da conchinchina, mais antes disso necessitamos aumentar vagas de medicina no brasil, sendo custeada pela iniciativa privada.E dar chances e formar mais brasileirinhos nosso...somos um pais de 200 milhoes....prioridade ao nosso antes para depois abranger assim se cresce de uma forma ordenada, corecta e com sentido de um objetivo.....Prioridade no brasil no momento e educaçao ,ensino,professores , colegio, faculdade...
A nossa saude so tem que ser melhor distribuida...E como fazer a melhor forma de distribuir medicos no brasil...primeiro fazendo ou montando ou melhorando hospitais e deixarem a um nivel desejavel de lugar de trabalho(bons equipamentos, boas equipes , boa infra estrutura , Limpo..rssr), segundo compensaçoes....Ou seja se o governo fizer a parte dele, todas as cidades do brasil...que sao varias rs....vao ter um bom ensino publico,um bom sistema de saude e tal , com isso a ccidade vai estar boa , desenvolvida e agradavel para se morar e nao vai ter problemaa em trabalhar nela poi la vai ter um teatro um cinema ou pelo menos ao seu entorno no minimo....rs
MEU IRMAO, O BRASIL E GIGANTE SOLIDARIO E RECEPTIVO , A HISTORIA MOSTRA MAIS CADA MOMENTO COM O SEU MOMENTO.....NEM CUBANO ,NEM ESPANHO NEM PORTUGUES ISSO E O MODO MAIS FACIL MAIS NEM SEMPRE O MAIS FACIL E O MAIS CERTO...

Unknown disse...

Eduardo,
Respeito suas opiniões. Porém, sugiro ler a seguinte postagem deste blog: http://democraciapolitica.blogspot.com.br/2013/05/frei-betto-medicos-cubanos-no-brasil.htmlpo
Maria Tereza

Cláudia Magalhães disse...

Esse texto está fora da realidade e desatualizado...
O ministro já disse que eles NÃO vão fazer o Revalida, o CFM sempre brigou para que TODOS fizessem o exame, não só os cubanos, e essa de que a experiência com os cubanos é uma maravilha, os venezuelanos e bolivianos já disseram que não é. Muito pelo contrário.
Leia: http://saude.ig.com.br/minhasaude/2013-06-30/medicos-de-venezuela-e-bolivia-criticam-experiencia-de-importar-cubanos.html

O que o Brasil precisa é de infraestrutura, não de mais profissionais. Se o governo federal acha que vai resolver a sua incompetência dessa forma, está redondamente enganado. Ou pior: está enganando o povo brasileiro.

Eclésia Sites disse...

Mas que inveja é essa de alguns médicos brasileiros?, não digo que chamaram
as médicas cubanas de empregadas domésticas. por causa da simplicidade?.
porventura não são humanas as domésticas?
não estou fazendo pouco caso dos médicos daqui,, mas eu tenho certeza absoluta
que os médicos estrangeiros não medirão esforços em trabalhar numa cidade
cuja as ruas não tem asfalto, mas poeira e lamas.

QUERO VER AS PATRICINHAS E OS MAURICINHOS ENFRENTAR
AS ÁREAS MAIS POBRES DO PAÍS