terça-feira, 6 de agosto de 2013

DESAFIOS DO SETOR DE PETRÓLEO BRASILEIRO


“A expansão da produção de petróleo no Brasil constitui, atualmente, o principal desafio estratégico para o Brasil. Para viabilizar essa expansão, o país deverá trilhar caminhos perigosos e arriscados. A velocidade que se pretende impor à caminhada não deixa margem para erros. Qualquer pequena barbeiragem pode levar a um acidente grave, dado o risco de se passar direto pelas curvas sinuosas que deverão ser trilhadas.

A descoberta do Pré-sal trouxe o petróleo para o centro da cena política nacional. A expectativa criada na sociedade com o “bilhete premiado” canalizou todos os esforços políticos para a discussão sobre a apropriação e divisão da renda petrolífera. Entretanto, pouca atenção política tem sido dada ao fato de que o projeto de expansão da produção nacional de petróleo, dos atuais 2 milhões de barris, para mais de 4 milhões em 2020 constitui empreitada épica para nosso país; comparada a um esforço de guerra. Isso porque requer mobilização de recursos humanos, financeiros, tecnológicos e também políticos numa escala sem precedentes.

Pouca atenção está sendo dada ao fato de que, antes de se alcançar o “bilhete premiado”, existe um importante período de sacrifícios para a sociedade. A duração desse período dependerá das escolhas e dos acertos da política setorial. O grande risco para o país é o atraso nas metas de crescimento da produção, com a inviabilização do projeto tal como está colocado atualmente.

Analisando-se a questão do ponto de vista macroeconômico, a elevação da produção de petróleo implica num aumento significativo dos investimentos. Estão previstos investimentos de mais de 300 bilhões de dólares no setor de petróleo até 2020. Esses investimentos, por sua vez, contribuirão para a elevação das importações, o que afetará negativamente a balança comercial. Mesmo considerando a manutenção dos atuais níveis de conteúdo local (o que também será um enorme desafio, como veremos adiante), cerca da metade do valor dos investimentos tendem a ser tornarem importações.

No atual contexto de baixa competitividade da economia nacional, crescentes déficits na balança comercial podem contribuir para um processo de desvalorização cambial. Essa desvalorização teria enorme impacto financeiro sobre a Petrobras e outras empresas atuando no Brasil, dificultando o financiamento dos enormes investimentos das mesmas. Portanto, é fundamental que a produção e as exportações de petróleo aconteçam conforme planejado, para contribuir para o equilíbrio macroeconômico do país. Ou seja, no ambiente macroeconômico em que estamos, um atraso na elevação da produção pode criar dificuldades muito sérias para todo o Projeto Pré-sal.

Olhando a questão pelo ângulo microeconômico, o sucesso do Projeto Pré-sal depende da capacidade de financiamento das empresas. No caso da Petrobras, essa capacidade está diretamente associada ao equilíbrio do seu fluxo de caixa. A Petrobras já atingiu o limite de endividamento para manutenção da sua nota de 'investiment grade' pelas agências de avaliação internacionais. Ao depender do autofinanciamento, o ritmo de investimento da Petrobras está sujeito basicamente à sua capacidade de gerar receitas próprias. Essa capacidade dependerá basicamente de três fatores: i) da política de preços dos combustíveis no Brasil; ii) da capacidade da empresa de vender ativos; iii) e do próprio ritmo de elevação da produção. Portanto, um eventual atraso na elevação da produção de petróleo traz consigo uma elevação do risco de desequilíbrio financeiro da Petrobras. Esse desequilíbrio financeiro, sem dúvida, colocaria em cheque o Projeto Pré-sal, alongando de forma importante o período de sacrifícios da sociedade Brasileira.

A Petrobras é a empresa líder do Projeto Pré-sal. Na atual estrutura da indústria de petróleo nacional, as empresas parceiras não podem substituir a Petrobras, e deverão caminhar no ritmo da Petrobras. Não existe espaço político para que as empresas substituam a Petrobras nesse processo de liderança. Provavelmente, tal substituição não seria possível nem mesmo se fosse viável politicamente, tendo em vista as capacitações necessárias e o tamanho da empreitada. Conclui-se assim que a Petrobras é a variável chave da equação de viabilidade do Projeto Pré-sal.

Tendo em vista o colocado em acima, é absolutamente fundamental definir como prioridade da política energética e econômica nacional a elevação da produção nacional do petróleo, conforme previsto no Projeto Pré-sal. Sem estabelecer adequadamente essa questão como prioridade nacional, não será possível enfrentar corretamente os desafios que tal projeto coloca para a sociedade. Sem querer esgotar os desafios, a elevação da produção de petróleo dependerá do sucesso do enfrentamento de duas questões principais: i) capacidade de financiamento dos investimentos por parte da Petrobras; ii) as metas de conteúdo local;

Voltando à questão do financiamento dos investimentos, vale ressaltar que essa questão não depende apenas da habilidade empresarial da Petrobras para definir estratégias de negócios financeiramente sustentáveis. A questão do financiamento passa por decisões de política econômica e energética, já que a Petrobras é hoje a única empresa responsável pela segurança do suprimento de combustíveis no país. A decisão do governo de segurar o alinhamento dos preços dos combustíveis doméstico com o mercado internacional afeta diretamente o fluxo de caixa da Petrobras. Atualmente, o caixa da empresa é o amortecedor das flutuações e, principalmente das elevações, do preço dos combustíveis no mercado internacional. Essa política, eventualmente, pode contribuir para reduzir os impactos econômicos da elevação do preço dos combustíveis, mas certamente está desalinhada com o objetivo de priorizar o Projeto Pré-sal.

Além de interferir na precificação dos combustíveis no Brasil, o governo frequentemente vem utilizando a Petrobras como ferramenta importante na implementação de outros objetivos de política energética, tais como: i) a redução do déficit nacional na produção de derivados do petróleo; ii) a reativação da produção nacional de Etanol; iii) o suprimento de gás natural para o setor elétrico em condições favoráveis (mas com prejuízos para a Petrobras); iv) o fortalecimento do programa nacional de biodiesel; v) a redução do déficit nacional na importação de fertilizantes; entre outros.

A incorporação desses outros objetivos setoriais na agenda da Petrobras tem duas implicações para o financiamento da empresa. Por um lado, agrega uma agenda de investimento que drena recursos do Projeto Pré-sal. Por outro lado, não deixa margem para a empresa vender ativos dessas áreas para alavancar recursos para investir na produção de petróleo. 

Concluímos, assim, que a sustentabilidade financeira da Petrobras e a viabilidade do Projeto Pré-sal dependem de escolhas e decisões de política energética. Dessa forma, é importante que o governo defina claramente para a Petrobras qual é a prioridade nos diversos objetivos colocados para a empresa. Ao estabelecer a prioridade, caberá à empresa estabelecer sua estratégia de modo a minimizar os riscos de uma crise financeira.

A questão das metas de conteúdo local não é menos importante entre os desafios do projeto Pré-sal. A política de conteúdo local representa atualmente um instrumento central da Política Industrial Brasileira. Não cabe questionar o mérito e a importância da promoção do conteúdo local na indústria de bens e serviços para o setor de petróleo. Cabe, isto sim, definir qual é o limite aceitável para eventuais impactos negativos desta política na dinâmica de investimentos setorial.

O simples fato de se ter que criar regras para compras locais significa que a oferta local encontra-se em desvantagem com as importações para o suprimento da indústria de petróleo. A reserva de parte do mercado doméstico para empresas locais implica necessariamente em algum sobrecusto para os investimentos. Esse sobrecusto – caso seja um fenômeno temporário, que não inviabiliza economicamente os projetos petrolíferos – pode ser considerado um preço aceitável da política de conteúdo local.

Entretanto, vale ressaltar as seguintes questões: i) o Projeto Pré-sal inclui também bens e serviços da fronteira tecnológica do setor de petróleo; ii) a escala dos investimentos do Projeto Pré-sal requer um grande investimento na cadeia de fornecedores para desenvolver uma capacidade de oferta adequada. As questões acima podem implicar em gargalos da indústria nacional de bens e serviços, em particular no horizonte até 2020. As consequências desses gargalos seriam não apenas o sobrepreço, mas também atrasos na entrega dos bens e serviços, principalmente das plataformas e sondas de perfuração.

Atrasos na entrega dos bens e serviços significam retardar a produção, com os riscos acima mencionados. Portanto, para realmente se priorizar o Projeto Pré-sal, é necessário avaliar e reconhecer os limites da política de conteúdo local. É importante que o governo e as empresas busquem o “plano B” quando ficar claro a inviabilidade de alguma meta da política de conteúdo local.

Por fim, cabe ressaltar que o sucesso do Projeto Pré-sal dependerá basicamente da capacidade política e institucional do Estado. Será necessário que o governo utilize seu capital político para defender o Projeto Pré-sal como prioridade nacional. O Projeto Pré-sal é apenas mais uma questão a pressionar o governo na complexa teia de interesses vinculados ao setor energético. Defender esse projeto como prioritário vai requerer não apenas lucidez, mas a utilização de capital político para enfrentar os interesses associados às outras questões que perdem prioridade. Da mesma forma, o desafio requer o fortalecimento institucional de atores chave como a ANP, a Petrobras, e o MME; bem como a criação de novas instituições como a PPSA.”

FONTE: escrito por Edmar Almeida no "Infopetro". Transcrito no portal de Luis Nassif (http://infopetro.wordpress.com/2013/08/05/desafios-do-setor-de-petroleo-brasileiro/) e (http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/desafios-do-setor-de-petroleo-brasileiro).

Nenhum comentário: