“O filósofo
e professor, que lança no dia 31 de agosto a edição alemã do seu livro "Brasil - mercado em crescimento",
fala também ao Portal do PT sobre a sua nova obra.
Dia 31 de agosto chega às livrarias a edição alemã
do livro de Moniz Bandeira: “Wachstumsmarkt
Brasilien - Der deutsche Wirtschafts- und Handelsbeitrag in Geschichte und
Gegenwart” (Brasil - mercado em
crescimento - A contribuição econômica e comercial da Alemanha na História e no
Presente), publicada por uma das maiores editoras da Alemanha, a “Springer
Gabler”.
O livro já está anunciado na “Amazon” e será
apresentado na Feira do Livro de Frankfurt, da qual o Brasil será este ano o
país-tema. A apresentação será feita pelo economista Dr. Wolfgang Müller e pelo
sociólogo Gilberto Calcagnotto, na Feira do Livro de Frankfurt, no dia 10 de
outubro, às 10h45, na Halle 4.2, Forum Fachmedien. Em seguida, Springer Gabler
Verlag, no seu stand, oferecerá uma recepção. Está prevista a presença da
ministra da Cultura, Marta Suplicy. A 2ª edição em português, lançada pela Editora
UNESP, tem o título “O ‘milagre alemão’ e o desenvolvimento do
Brasil”.
O lançamento dessa obra na Alemanha é da maior
importância, num momento em que o Brasil e o governo de nossa presidente Dilma
estão a sofrer ataque especulativo, contra o real e sua economia, movido pelo
sistema financeiro internacional e sob influência dos Estados Unidos.
Também de Moniz Bandeira, saiu na China a edição em
mandarim de “Formação do Império
Americano”. O livro foi publicado há dois anos pela “Casa das Américas”
(Cuba), assim como na Argentina, há mais tempo.
ENTREVISTA AO PORTAL DO PT
Moniz Bandeira concedeu no final de semana, por
e-mail, uma entrevista ao Portal do PT onde ele analisa os 40 anos do golpe
militar no Chile que derrubou o presidente Salvador Allende, as manifestações
de junho ocorridas no Brasil e fala, também, sobre o seu novo livro “A
Segunda Guerra Fria - Geopolítica e Dimensão Estratégica dos Estados Unidos” (Das
rebeliões na Eurásia à África do Norte e Oriente Médio).
Confira a íntegra abaixo:
--No próximo dia 11 de setembro, o golpe de Estado
contra o presidente Salvador Allende completará 40 anos. Quais são, em sua
opinião, as reflexões que devemos fazer nessa data, que nos sejam úteis na
atual conjuntura latino-americana e mundial?
A principal reflexão que se pode tirar da tragédia
do Chile é a de que não se pode cobrar da história uma fatura que ainda não
venceu. Marx expôs, no prefácio de “Zur
Kritik der Politschen Ökonomie”, os resultados de suas pesquisas que uma
formação social nunca desmorona sem que as forças produtivas dentro dela
estejam suficientemente desenvolvidas, e que as novas relações de produção
superiores jamais aparecem, no lugar, antes de que as condições materiais de
sua existência sejam incubadas nas entranhas da própria sociedade antiga. E
essa não era a situação do Chile, um país cuja economia se baseava fundamente
na exploração do cobre, que dependia do mercado mundial, sob a regência do
sistema capitalista. Nem Marx, nem Engels, nem Lenin jamais conceberam o socialismo
como via de desenvolvimento ou modelo alternativo para o capitalismo, o único
modo de produção que se expandiu globalmente. Logo na primeira parte do “Manifesto
Comunista”, de 1848, Marx e Engels salientaram que a indústria havia criado o
mercado mundial, mediante o qual burguesia deu um caráter cosmopolita à
produção e ao consumo de todos os países, retirando da indústria sua base
nacional. As antigas indústrias nacionais - salientaram
Marx e Engels- foram destruídas ou estavam sendo cotidianamente destruídas
ou suplantadas por novas indústrias, cuja introdução se convertia em questão
vital para as nações civilizadas, por indústrias que não mais empregavam
matérias-primas domésticas, e sim matérias-primas oriundas de distantes
regiões, e seus produtos não só eram consumidos no próprio país, porém, ao
mesmo tempo, em todas as partes do mundo. Essa lição mostrava a inviabilidade do
projeto socialista da União Popular, ademais dentro do contexto do Conflito
Leste-Oeste, em que a CIA efetuava terrível guerra psicológica, visando a
aterrorizar o povo e fraturar ainda mais a sociedade chilena. Se o presidente
João Goulart, cujas reformas pretendidas tinham apenas caráter reformista e
nacional-desenvolvimentistas, os Estados Unidos näo toleraram e trataram de
derrubar seu governo, é evidente que fariam o mesmo, ou mais, contra o governo
do presidente Salvador Allende, que se alinhara com Cuba e a União Soviética.
--Ainda sobre o Chile, a experiência do governo da
Unidade Popular parece ter antecipado alguns dos dilemas estratégicos
enfrentados, hoje, por vários governos progressistas e de esquerda latino
americanos. Em sua opinião, o que aquela experiência tem de atual, para os
partidos de esquerda que dirigem ou participam de governos eleitos em nossa
região?
A situação atual é muito diferente da que existia
nos anos 1960, quando os Estados Unidos sustentaram e encorajaram o golpe
militar no Brasil - e em 1970-1973. Àquele tempo, quando promoviam o
ognominioso golpe no Chile, estavam a perder a Guerra do Vietnã. Todo seu
poderio militar não bastou para dar-lhes a vitória sobre forças que viviam no
seu próprio habitat, na mais perfeita simbiose com a natureza e sobreviviam nas
condições mais primitivas, combatiam extremamente bem, com eficiência, e
recebiam o mais amplo suporte da população, em todos os lugarejos do Vietnã do
Sul. E, desde 2001-2003, os Estados Unidos estão chafurdados nas guerras no
Afeganistão e no Iraque, onde os ataques e atentados terroristas mais do que se
intensificaram e quadruplicaram e dos quais não conseguem retirar totalmente
suas tropas. E os Estados Unidos, chafurdados ainda em profunda crise
econômica, tornaram-se uma superpotência dependente. Dependem de tudo,
inclusive de capitais e financiamentos, que foram possibilitados pela compra de
bônus do Tesouro americano pela China, Brasil e outros países. Como bem
observaram Bill Bonner e Addison Wigging, “a
nação mais rica, mais poderosa do mundo, depende das poupanças dos países mais
pobres”. O poderio militar dos Estados Unidos defronta-se, portanto, com
severos limites econômicos e financeiros. Mas Washington, quer seja George W.
Bush ou Barack Obama o presidente, jamais toleraram, evidentemente, os governos
progressistas que emergiram na América do Sul, contra os quais promovem
operações de guerra por meio da mídia nacional e internacional e outros
métodos, através de ONG, financiadas pela NED (National Endowment for Democracy), e entidades civis, como “Freedom
House”, o “Open Society Institute” (renomeado
a USAID, “Open Society Foundations” [OSF] em 2011), e outras organizações não governamentais, como fachada
para promover a política de “regime change” sem golpe de Estado. A “Open Society
Foundations”, a NED e a USAID financiaram alguns movimentos e certos veículos
da mídia, encorajando a denúncia de fraudes reais ou não nas eleições de vários
países, como Sérvia, Geórgia e Ucrânia – nos
quais encorajaram “nonviolent revolutions”, levando a oposição às ruas, por
meio de ativistas, muitas vezes remunerados em manifestações contra o governo.
O livro básico para a formação desses ativistas é “From Dictatorship to
Democracy”, do professor do Gene Sharp, que ensina como intervir em eleições
estrangeiras sob a máscara de interesse imparcial. Segundo ele explica, a luta
não violenta é travada por vários meios, tais como a guerra psicológica,
social, econômica e política, aplicados pela população e pelas instituições da
sociedade. Tais meios são, e.g., protestos, greves, não cooperação,
deslealdade, boicotes, marchas, desfiles de automóveis, procissões etc. É o
modelo do pós-moderno “coup d’etat” patrocinado Estados Unidos, adaptado às
condições pós-comunismo, uma forma de “cold
war revolutionary”, conforme definiu o coronel David Galula, as atividades
subversivas desenvolvidas dentro da legalidade. Aliás, já nos anos 1980,
William Colby (1920-1996), então diretor da CIA, declarou que muitas operações,
antes conduzidas de forma encoberta (covert
actions) pela CIA, poderiam doravante ser realizadas pelas ONG (um terço das cem maiores estava baseado nos
Estados Unidos), abertamente e sem questionamento.
--Seguindo na mesma toada, como você avaliou os
eventos de junho no Brasil e em que medida isso se conecta com as dificuldades
vividas, não apenas no Brasil, pelos governos progressistas e de esquerda?
Desde o início, vi os eventos de junho com
suspeita. O Brasil não está a sofrer grave crise econômica e social. As contas
públicas não estão insolventes Não há risco de default, de um calote na dívida interna e externa. Pelo contrário.
O balanço de pagamentos não está em crise. Entretanto, enquanto o governo
passou a enfrentar enorme dificuldade para conter a ameaça inflacionária,
ocorreu forte desvalorização do real frente ao dólar, provocada, em larga
medida, pela expectativa de mudança da política monetária americana, e pelo
fato de que o real se valorizara mais do que as outras moedas em 2008. No
entanto, ao mesmo tempo em que o ataque especulativo aproveitava tais
circunstâncias, ocorreram, simultaneamente, manifestações de protestos,
chegando até mesmo à violência, em diversas cidades, sobretudo Rio de Janeiro e
São Paulo. Os motivos existem, são muito antigos, de várias décadas, gerados,
em parte, durante o regime militar, e agravados com o neoliberalismo, que
incentivou ainda mais a privatização como, e.g., da saúde e educação, pelos
governos de Collor de Melo e Fernando Henrique Cardoso. Causas reais,
inegavelmente, havia. Porém, foram largamente ultrapassadas pela intensidade e
continuidade das manifestações, que buscaram desmoralizar as instituições, os
governos e o país, prejudicando sua economia e imagem no exterior. Se
possivelmente elas foram (em parte) espontâneas, não se pode desconsiderar que
houve e há tentativa de solapar a estabilidade e a força econômica, política e
militar, sem recorrer ao uso da força, provocando violentas medidas, a serem
denunciadas como truculência do governo. A divulgação de informações falsas ou
verdadeiras, através da mídia nacional e internacional, teve como objetivo
solapar a credibilidade e a confiança não somente no governo como no Brasil.
Quem leu e conhece a doutrina que o general Collin Powel estabeleceu, em 1992, como chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas (The Military Strategy of the United States. US Government, Printing Office, ISBN 0-16-036125-7, 1992, p 7), que os Estados Unidos, após o colapso da União Soviética, tratariam de preservar sua “credible capability to forestall any potential adversary from competing militarly”, impedindo a União Européia de tornar-se potência militar, fora da OTAN, a remilitarização do Japão e da Rússia, e desencorajando qualquer desafio à sua preponderância ou tentativa de reverter a ordem econômica e política internacionalmente instituída, deviam consistir tão somente em manter uma capacidade militar necessária para autodefesa, combater o narcotráfico e exercer atividades policiais. Os Estados Unidos empenham-se, naturalmente, em criar as maiores dificuldades para o Brasil na medida em que ele se encaminha para tornar-se uma potência global e forma com a China e Índia um grupo de resistência à sua “full-fledged dominance”.
--Finalmente, você está lançando um novo livro: “A
Segunda Guerra Fria - Geopolítica e Dimensão Estratégica dos Estados Unidos”
(Das rebeliões na Eurásia à África do Norte e Oriente Médio). Falemos dele.
Esse novo livro – “A Segunda Guerra Fria -
Geopolítica e Dimensão Estratégica dos Estados Unidos” (Das rebeliões na Eurásia
à África do Norte e Oriente Médio) - aprofunda, desdobra e atualiza minha outra
obra - Formação do Império Americano
- que este ano foi lançada na China e, em 2011, em Cuba. Nele, tratei de
demonstrar, com documentos e informações procedentes das mais variadas fontes,
que as chamadas “revoluções coloridas”, na Sérvia, Ucrânia, Georgia e em outras
repúblicas da extinta União Soviética, bem como nos países da África do Norte e
Oriente Médio - comemoradas como Primavera
Árabe - não foram nem espontâneas, ainda que condições domésticas houvesse
para que elas ocorressem, nem democráticas. O papel dos Estados Unidos, assim
como da França e da Grã-Bretanha, foi fundamental na promoção da agitação e da
subversão, por meio do envio de armas e de pessoal, direta ou indiretamente,
através do Qatar e da Arábia Saudita. Além das intervenções da OTAN, abertas,
como no caso da Líbia, ou veladas, as organizações não governamentais (ONG) e
dissidentes ativistas treinados pela “Middle East Partnership Initiative”
(MEPI), como parte da “freedom agenda”, constituíram uma das armas empregadas
para promover a “political warfare”, mobilizando multidões, com o pretexto de
fomentar o desenvolvimento da democracia, o que significava “regime change”,
i.e., subverter governos e instalar regimes favoráveis aos investimentos e
interesses estratégicos do cartel ultraimperialista, formado pelos Estados
Unidos e seus aliados da União Européia, contrapondo-se ao advento da China e à
recuperação da Rússia sob a direção do presidente Vladimir Putin. Os
brasileiros devem estar atentos para a possibilidade de que os interesses
imperiais também não tentem fragmentar o Brasil, como parece ser o objetivo de
redesenhar o Oriente Médio e, de certo modo, fragmentar partes da China
(Xinjiang) e da Rússia (Tchetchênia e outras regiões).
As ameaças existem, conquanto possam parecer remotas. Como várias vezes adverti, o perigo que representa uma grande potência, tecnologicamente superior, mas com enormes carências, sobretudo de energia, pode ser muito maior, quando ela está a perder a preeminência, e quer mantê-la, do que quando expande seu império. Ela respeita a lei internacional, senão entre as potências cujas forças se equilibram. Neste momento, eu estou indignado com a armação que os Estados Unidos e os chamado “rebeldes” armaram para a intervenção na Síria. Crianças não constituem alvo militar. Crianças atacadas com gás tóxico só servem para efeito de propaganda contra o regime, através da exibição de vídeos pela mídia, ecoando e endossando as acusações da guerra psicológica. É preciso denunciar isto em alto e bom som. Pode usar minhas palavras. Trata-se de outra trágica encenação armada pelos salafista-al-Qa’ida-Estados Unidos e seus aliados ocidentais."
FONTE: publicado Portal
do PT, com informações do “Página 13” (http://www.pt.org.br/noticias/view/entrevista_moniz_bandeira_analisa_os_40_anos_do_golpe_militar_no_chile).
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